Dodge WC-54 Ambulância no Brasil


História e Desenvolvimento. 
Fundada em 1914 a Dodge Motors Company, iniciou a produção de carros de passeio ganhando grande notoriedade de marca no mercado norte americano. Este sucesso permitiu a empresa a angaria fundos para com recursos próprios para iniciar em fins da década de 1920 esforços para o desenvolvimento de veículos utilitários leves para uso civil. Os primeiros modelos criados e lançados no mercado norte americano, eram baseados nas plataformas dos veículos comerciais de passageiros da marca, gerando assim menores investimentos para projeto e produção (pois usava o mesmo ferramental). A exemplo dos veículos de passeio, esta nova série de veículos alcançou rapidamente excelentes resultados comerciais em vendas no mercado interno, provando que marca Dodge também poderia ser associada a robustez para emprego no transporte de cargas e outras atividades pesadas e fora de estrada. As vendas em constante ascenção proveriam mais recursos ainda a montadora que almejaria voo mais longos a curto e médio prazo. Na primeira metade da década de 1930 um cenário preocupante começava a se avizinhar na Europa, principalmente com a chegada ao poder do partido Nazista de Adolf Hitler. Atentos a uma possível nova corrida armamentista em escala mundial a direção da Dodge Motors Company, resolveu olhar o nicho militar com maior esmero e atenção, assim fazendo uso novamente de recursos próprios em 1934, iniciou o projeto e desenvolvimento dos primeiros protótipos de caminhões militares dedicados de porte médio e grande (pois a empresa já havia fornecidos ao governo veículos leves durante a Primeira Guerra Mundial). Apresentações realizadas ao comando do Exército Norte Americano  de seu primeiro caminhão com tração nas quatro de  uma tonelada experimental de 1 1⁄2 tonelada designado K-39-X-4, a boa impressão causada resultaria na primeira encomenda de 796 unidades, que seriam nos anos seguidos por novos contratos, tendo como mais representativos os que envolviam os modelos VC-1 e VC-6 ½ ton Dodge.

O sucesso dos caminhões motivaria a expansão da linha com novos modelos, visando assim ocupar as linhas de produção de sua recém-inaugurada planta industrial em Warren Truck Assembly em Michigan que seria voltada a construção de caminhões leves e médios, que fora inaugurada em 1938. No ano seguinte a Dodge apresentou uma linha completamente redesenhada de picapes e caminhões, que apresentavam uma aparência moderna com a designação de "Job-Rated" visava atender a todos os trabalhos e tarefas. Neste mesmo período era claro que as forças armadas norte americanas deveriam ser modernizadas e reequipadas visando fazer frente as ameaças que se aproximavam. No que tange a veículos de transporte foi definido um padrão a ser adotado se dividindo em cinco classes e caminhões, baseados em carga útil sendo 1⁄2 ton, 1 1⁄2 ton, 2 1⁄2-, 4- e 7 1⁄2 ton. Em junho de 1940 o Quartermaster Corps (Q.C.), havia testado e aprovado seus três primeiros caminhões comerciais padrão, com tração nas quatro rodas: o Dodge de 1 1⁄2 tonelada 4x4, o GMC 2 de 1⁄2 tonelada 6x6 e um 6x6 de Mack6 e 6x6 de Mack 6. Definiu que cada uma das principais montadoras receberia um contrato para a produção de uma classe específica de caminhões, assim no verão de 1940 a Dodge / Fargo Division da Chrysler recebeu um contrato para a entrega de 14.000 unidades do modelo de meia tonelada com tração 4X4, que foi denominado pelo fabricante como série VC. Sua produção em série  em larga escala teve início em novembro de 1940 e logo após o início da Segunda Guerra Mundial o modelo teve sua designação original alterada para WC, com letra “ W  “ para representar o ano do início da produção (1941) e C para classificação de meia tonelada, sendo que  código C, posteriormente foi mantido para a tonelada ¾ e 1 ½ tonelada 6×6, com o  primeiro modelo desta família sendo representado pela versão G-505 WC de  ½ tonelada.
Aproveitando esta nova característica decidiu-se criar uma versão de transporte para comandantes em campo, tendo em vista que os carros oficiais existentes até então e não eram aptos a operar nas estradas já bastantes castigas pela guerra. Basicamente este novo veículo era, mecanicamente virtualmente idêntico ao WC-54, sendo equipado com uma carroceria de um modelo civil da Dodge de 1939, modificada para especificações militares. Estava equipado com um motor convencional de cabeçote plano de válvulas laterais, (do tipo flathead que foi produzido pela Chrysler até a década e 1960),  possuía seis cilindros, 3.800 cm³ e 105 CV com baixa taxa de compressão, que lhe concedia um torque significativo ideal para operações fora de estrada, porem como ponto negativo apresentava um alto consumo. Sua carroceria possuía quatro grandes janelas laterais pivotantes, assentos dobráveis para possibilitar acesso ao banco traseiro, para otimizar o espaço interno o estepe foi fixado externamente ao lado da porta do motorista, embora a porta estivesse totalmente operacional, ela não podia ser aberta. Na extremidade traseira havia duas portas facilitando o acesso de carga ou ainda manutenção do sistema de rádio. A produção teve início em fins de 1941, com as primeiras unidades sendo entregues as unidades em território nacional, onde passaram a atuar nas tarefa de transporte de oficiais, já nos fronts de combate os Dodge WC-53 passaram a ser empregados também em missões de reconhecimento e também como base de rádio para uso de comandantes no campo de batalha, foram empregados em todos as frentes de batalha, foi também muito usado pela Força Aérea Americana em bases áreas para o transporte de oficiais e pilotos.

A versatilidade e resistência desta família de utilitários, motivou o desenvolvimento de inúmeras versões especiais, entre elas o modelo de ambulância de campo para operação em qualquer terreno. Este novo veículo que tinha por finalidade substituir os antigos modelos ambulância – socorro médico produzidos pela Dodge que se dividiam nas versões WC-9, WC-18 e WC-27 que até então dotavam as unidades médicas das forças armadas americanas e já se mostravam não adequadas a operação no moderno front de batalha terrestre na Europa. Além de se substituir estes modelos já classificados como obsoletos por uma versão mais nova, o principal objetivo deste processo de aquisição era o de padronizar a frota de ambulâncias em um único veículo, unificando a linha de suprimentos de peças de reposição. E por se tratar de um Dodge WC, este objetivo seria plenamente atingido.  Apesar de compartilhar a mesma plataforma, a versão original, o WC-54 Ambulância sofreu algumas alterações no projeto original para se adaptar satisfatoriamente à nova missão. Possuía uma cabine frontal confeccionada em chapa de aço fechada, dispunha de um maior espaçamento entre os eixos com uma nova suspensão redesenhada, para assim suavizar seu deslocamento em campo, proporcionando assim melhor conforto no transporte de feridos e enfermos. Era ainda equipado com um sistema de aquecimento elétrico e podia transportar até sete pacientes deitados em macas dobráveis.  internamente, recebeu uma plataforma dobrável na traseira para facilitar o acesso de pacientes e médicos. As primeiras entregas as forças americanas tiveram início em 1942, o WC-54 foi ainda fornecido em larga escala para países aliados através dos termos do Leand  & Lease Act.
Esteve presente em todos dos fronts de combate durante a Segunda Guerra Mundial, com sua produção sendo somente encerrada em meados de 1945, tendo o modelo atingido a cifra de 22.857 unidades entregues. Em seu país de origem o modelo começou a ser substituído após o término da Guerra da Coreia por veículos mais novos equipados com uma suíte médica mais eficiente entre ele o Dodge M43 (versão ambulância do Dodge M37). Após o conflito um grande número de veículos foi estocado sendo classificados como “excedente de guerra”, sendo então transferidos a países com que o governo dos Estados Unidos mantinha boas relações diplomáticas, já nestas nações os Dodge WC-54 se mantiveram em uso até pelo menos o início da década de 1980.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil passou a ter uma posição estratégica tanto no fornecimento de matérias primas de primeira importância para o esforço de guerra aliado, quanto no estabelecimento de pontos estratégicos para montagem bases aéreas e operação de portos na região nordeste. Isto se dava pois esta região especifica representava em termos de  translado aéreo, o ponto mais próximo entre os continentes americano e africano. Assim a costa  nordeste brasileira seria fundamentalmente estratégica no processo de envio de tropas, veículos, suprimentos e aeronaves para emprego no teatro europeu. No entanto este apoio poderia gerar gestos de agressão por parte das forças do Eixo, o que levaria a necessidade de defesa não só desta região mas também de todo o território nacional. Neste contexto havia a latente necessidade de se promover a modernização dos meios e  das doutrinas (neste caso com grande influencia francesa desde fins da Primeira Guerra Mundial) das Forças Armadas Brasileiras que operavam com alto grau de obsolescência em armamento e equipamento. Este processo de modernização  teria início em meados de 1941 após a adesão do governo brasileiro do presidente Getúlio Vargas ao programa norte americano de ajuda militar denominado  Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos). Os termos garantidos por este acordo viriam a criar uma linha inicial de crédito ao país da ordem de cem milhões de dólares, para a aquisição de material bélico, proporcionando ao país acesso a modernos armamentos, aeronaves, veículos blindados e carros de combate. Estes materiais e equipamento seriam vitais para que o país pudesse estar capacitado para fazer frente as ameaças do Eixo que se apresentavam no Atlântico Sul e nos possíveis outros futuros teatros de operações

A partir de fins e 1941 começaram a ser recebidos no Brasil os lotes de veículos militares destinados as forças armadas brasileiras que estavam dispostos no termo do acordo de empréstimos e arrendamentos. No final do ano de 1942 começaram a ser recebidos no Brasil as primeiras unidades dos modelos Dodge 4X4 WC-51 e WC-52 Beep, juntamente com estes veículos modernos estavam os primeiros lotes da versão de remoção média o Dodge WC-54 Ambulância, os contratos firmados previam a entrega de 149 unidades novas que basicamente se tratavam de veículos novos saídos das linhas de produção da Dodge e Fargor que estavam empenhadas na produção desta família de veículos utilitários.  Neste tipo de missão junto ao Exercito Brasileiro os Dodge WC-54 com tração 4X4 vieram a substituir e complementar modelos civis de ambulâncias produzidas pela Ford e Chevrolet adquiridas no início da década de 1930 (em substituição as lendárias ambulâncias baseadas na plataforma do Ford T) que eram até então empregadas, veículos estes que e não se equiparavam em hipótese nenhuma as qualidades off road das ambulâncias da Dodge que foram especificadamente projetadas para operar no campo de batalha nas piores situações de terreno, proporcionado assim a força terrestre médica brasileira uma mobilidade jamais atingida com as versões civis com tração 4X2.
A participação brasileira no esforço de guerra aliado seria ampliada em breve, pois Getúlio Vargas afirmou que o país não se limitaria ao fornecimento de materiais estratégicos para os países aliados, e que que “o dever de zelar pela vida dos brasileiros obrigados a medir as responsabilidades de uma possível ação fora do continente. De qualquer modo, não deveremos cingir-nos à simples expedição de contingentes simbólicos”. Este pensamento seria concretizado em   09 de agosto de 1943 quando através da Portaria Ministerial nº 4.744, publicada em boletim reservado de 13 do mesmo mês, foi estruturada a Força Expedicionária Brasileira (FEB), constituída pela 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE) e por órgãos não-divisionários. A 1ª DIE, que seria comandada por um general-de-divisão, João Batista Mascarenhas de Morais. Esta força seria composta de quatro grupos de artilharia (três de calibre 105 e um de calibre 155); uma esquadrilha de aviação destinada à ligação e à observação; um batalhão de engenharia; um batalhão de saúde; um esquadrão de reconhecimento, e uma companhia de transmissão (na verdade, de comunicações). A tropa especial, além de seu próprio comando, deveria incluir o comando do quartel-general, um destacamento de saúde, uma companhia do quartel-general, uma companhia de manutenção, uma companhia de intendência, um pelotão de sepultamento, um pelotão de polícia e uma banda de música. O contingente estimado seria da ordem de 25.000 soldados e dentro do conceito norte americano a FEB deveria ter alta capacidade de mobilidade, devendo assim ser dotada de muitos veículos de transporte de pessoal de todos os modelos, sendo os mesmo em uso nas forças aliadas que eram na maioria produzidos nos Estados Unidos.

As tropas brasileiras desembarcaram na Itália em agosto de 1944,  e após um breve período de treinamento, passarão a integrar os efetivos do V Exército norte-americano sob o comando do general Mark Clark, nesta etapa a FEB recebeu todo o equipamento, armas e veículos que iria empregar em sua campanha, dentre estes recursos estavam 30 carros que seriam empregados pelo Batalhão de Saúde do exército e pelo menos uma unidade que foi destinada a Força Aérea Brasileira, para servir de apoio junto ao 1º Grupo de Avião de Caça (1° GAvCa) e a1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1ºELO), em seus deslocamentos. No Front Italiano os Dodge WC-54 receberam identificação marcante, sendo visível a grande distância, pois ela possuía uma grande cruz vermelha sobre fundo branco nas laterais, teto e traseira, além de duas pequenas acima do para-brisa, tendo no centro a inscrição em branco “Ambulance”, salientando que algumas ambulâncias  chegaram a ter o emblema pintado na grade frontal. Os carros brasileiros além destas marcações padrão também receberam como identificação o emblema do Cruzeiro do Sul dentro de um círculo branco nas laterais da porta e marcações no para-choque dianteiro, onde à direita estava a palavra FEB, seguida do número 710 ou 310(número de todos os veículos do Batalhão de Saúde), mais letra K (Destacamento de Comando). Podia ter também apresentar as marcações com as  letras A B e C (1ª, 2ª e 3ª Cia de Evacuação, respectivamente) ou ainda a letra D (Cia de Tratamento), seguido de um pequeno emblema do Cruzeiro do Sul e o número do veículo (1 a 30), nas laterais, no alto, atrás das portas dianteiras e no lado direito da porta traseira e no alto.
O batismo de fogo da Força Expedicionária Brasileira (FEB), e dos Dodges ocorreria em 15 de setembro de 1944, dentro das operações em um cenário de guerra, os motoristas e enfermeiros destes carros estavam expostos aos mesmos riscos dos demais combatentes, com os WC-54 sendo alvejados frequentemente por rajadas de metralhadoras do Exército Alemão. Havia ainda o risco de se trafegar por trafegar por estradas estreitas, às vezes lamacentas, o que exigia o uso de correntes nos pneus, e com grandes penhascos, onde qualquer erro poderia ser fatal. Os Dodge foram muito importantes durante a campanha da Itália, onde em conjunto com os enfermeiros e médicos do Batalhão de Saúde ajudaram a salvar a vida de muitos combatentes brasileiros, transportando-os desde a frente de batalha até os hospitais na retaguarda. Após o fim da guerra, todas os carros em condição de uso foram remetidos ao Brasil juntamente com o restante do equipamento da FAB, e foram incorporadas ao Exército Brasileiro e  Força Aérea Brasileira, sendo distribuídos a diversas unidades espalhadas pelo território nacional. Especula-se que mais veículos foram recebidos em fins da década de 1940, mas não encontramos registros oficiais que comprovem estas informações com datas e quantidades. Os Dodge WC-54 Ambulância foram empregados pelo Exército Brasileiro até fins da década de 1970, quando as últimas unidades foram retiradas do serviço ativo, sendo substituídas por modelos de fabricação nacional.

Em Escala.
Para representarmos o  Dodge WC-54 “FEB 710”, fizemos uso do antigo kit da Italeri na escala 1/35, modelo este que apesar de ser de fácil montagem, carece de um melhor nível de detalhamento interno. Não há a necessidade de realizar nenhuma alteração para se compor a versão utilizada pela Exército Brasileiro no teatro de operações italiano. Empregamos decais confeccionados pela Eletric Products presentes no set “FEB Corpo Médico” em conjunto com decais originários  do próprio modelo.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura do Exército Americano em suas ambulâncias durante a Segunda Guerra Mundial, com a aplicação das marcações nacionais. Durante sua carreira no pós-guerra no Brasil os veículos mantiveram este padrão de pintura até serem substituídos no serviço ativo.


Bibliografia : 

- Dodge WC Series – Wikipédia - https://en.wikipedia.org/wiki/Dodge_WC_series
- WC-54 Ambulance – Wikipédia - https://en.wikipedia.org/wiki/Dodge_WC54
- Ambulâncias Dodge WC-45 FEB – Expedito C.S.Bastos -  http://www.ecsbdefesa.com.br/arq/Art%2018.htm
- Manual Técnico – Exército Brasileiro 1951
- Características Gerais de Veículos do Exército Brasileiro – Ministério da Guerra 1947