Curtiss D-12 Falcon no Brasil



História e Desenvolvimento
A empresa Curtiss Airplane and Motor Company detém um grande legado de pioneirismo em sua história, seu fundador o Glenn Hammond Curtiss (21 de maio de 1878 - 23 de julho de 1930) foi um dos norte-americanos pioneiros na indústria aeronáutica nos Estados Unidos. Este visionário iniciou sua carreira como ciclista profissional e construtor de bicicletas, tendo evoluído rapidamente para a produção de motocicletas.  Os eventos decorrentes do primeiro voo dos Irmãos Wright em 17 de dezembro de 1903 levariam Glenn a vislumbrar um novo e promissor nicho de mercado, com este anseio se materializando na produção dos primeiros motores aeronáuticos leves em 1904 para o emprego em dirigíveis, com a primeira aplicação real acontecendo em julho do mesmo ano quando a aeronave “California Arrow” propulsada por um motor de motocicleta Curtiss 9 HP V-twin realizou o primeiro voo, se tornado o primeiro dirigível de sucesso na América do Norte. Em 1908, Curtiss ingressou na Aerial Experiment Association – AEA, um grupo pioneiro de pesquisa, fundado por Alexander Graham Bell em Beinn Bhreagh, Nova Escócia, para construir máquinas voadoras. Entre 1908 e 1910, a Aerial Experiment Association - AEA produziu quatro aeronaves, com o terceiro modelo sendo totalmente projetado por Glenn. Em 8 de junho de 1911, Glenn Hammond Curtiss recebeu a licença de piloto nº 1 do Aero Club of America, porque o primeiro lote de licenças foi emitido em ordem alfabética. Durante os anos seguintes a promissora empresa começou a participar do segmento de aviação desportiva e começou a ensaiar os primeiros passos no segmento militar. O modelo de maior sucesso da empresa no segmento militar naquele período inicial seria representado pela família de aeronaves Curtiss JN-1, JN-2, JN-3 e JN-4 Jenny, gerando assim um forte relacionamento com as armas militares norte americanas, passando a ser envolvida frequentemente nos processos de desenvolvimento e fornecimento de novas aeronaves militares.

Na primeira metade da década de 1920 o United States Army Air Service (USAAS – Serviço Aéreo do Exército dos Estados Unidos) emitiu uma consulta sobre interesse para vários fabricantes aeronáuticos a fins de participação em uma concorrência pública para o desenvolvimento de uma nova aeronave de combate, cuja célula básica daria origem a uma variada família de aviões de caça, ataque e observação, buscando assim implementar o inovador conceito de comunalidade de plataforma visando reduzir custos de operação e manutenção. Curiosamente ao militares norte-americanos estipularam que motor Lincon Liberty L-12 de 400 hp de potência, deveria ser incluído grupo motopropulsor em qualquer projeto que fosse apresentado na concorrência, exigência esta, que se devia ao enorme estoque destes motores, frutos de compras realizadas anos antes. Diversas empresas apresentaram suas propostas, com a Curtiss Airplane and Motor Company participando desta contenda com o modelo de designação militar XO-1, dentre os vários participantes se destacava também o modelo Douglas XO-2. Os programas de ensaios para avaliação dos projetos foram iniciados no segundo semestre de 1924, porém o modelo da empresa acabou sendo derrotado. Porém ficou clarificado para as autoridades do Exército Norte Americano (US Army) que o motor Lincon Liberty L-12 era completamente inadequado para o emprego em modernas aeronaves de combate, e quer mais vantajoso em termos estratégico em sucatear o estoque destes motores, do que por questões econômicas dispor de aeronaves de menor desempenho.
De volta ao ponto inicial, decidiu-se pela abertura de uma nova concorrência, agora deixando aos fabricantes a liberdade de escolha do grupo motopropulsor. Assim no início de 1925 este programa foi reaberto, com a aeronave da Curtiss Aeroplane & Motor Co. agora equipada com um motor Packard 1A-1500 sendo declarada vencedora. O modelo foi oficialmente designado como Curtiss O-1 Falcon, recebendo do United States Army Air Service (USAAS – Serviço Aéreo do Exército dos Estados Unidos) o primeiro contrato para produção em série no início do ano de 1927. Ao contrário dos protótipos o modelo em série receberia o Curtiss V-1150 (D-12) de 435 cv, sendo alteração demandada por uma exigência do Exército Americano (US Army). O novo avião apresentava uma configuração do tipo biplano com asas em madeira e a fuselagem composta com estrutura de tubos de alumínio e hastes de aço recobertas com tecido aeronáutico, possuía trem de pouso fixo com uma haste para derrapagem traseira, sendo este sistema substituído mais tarde por uma roda de manobra. Esta versão inicial de ataque recebeu a designação de A3 Falcon e estava armado com quatro metralhadora calibre .30 dianteiras (duas sob a asa e duas no nariz), 2 metralhadoras calibre .30 montadas nem uma torre giratória operada pelo observador, e capacidade para levar 90 kg de bombas, atingindo uma velocidade máxima de 225 km/h e tinha raio de ação de 1000 km. As primeiras aeronaves do modelo A3 Falcon (M44) foram recebidas em outubro de 1927, com as entregas sendo finalizadas em meados do ano seguinte, totalizando sessenta e seis células, destas seis seriam convertidas pela Curtiss Aeroplane & Motor Co em aeronaves de treinamento com controle duplicados, sendo renomeadas como A3-A.

Um segundo contrato com o Serviço Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAS), seria celebrando em 1929, prevendo agora a aquisição de setenta e oito células agora da versão A-3B (modelo 37H) que passava a ser equipado com seis metralhadoras calibre .30. Atendo ao inovador conceito de comunalidade de plataforma sugiram derivado do modelo 37A as versões de aeronave de observação de dois lugares designadas como O-1 e O-1A, além de uma célula convertida para transporte especial de oficiais o VIP Especial O-1. Fazendo parte desta linhagem seriam ainda produzidas as variantes designadas como O-1C e O-1F (transporte), O-1E, O-39 e O-1G (observação). Em serviço militar as aeronaves da Curtiss se notabilizaram na missão de aeronaves de observação voando principalmente nos esquadrões de observação 1º, 5º e 99º do 9º Grupo de Observação, baseados em Mitchel Field, Nova York. Já as versões de ataque A-3 Falcon foram empregadas em unidades de primeira linha como os o 8º, 13º e 19º Esquadrões de Ataque do 3º Grupo de Ataque, baseados em Barksdale Field, Louisiana e no 26º Esquadrão de Ataque no Havaí de 1928 a 1934, com as últimas aeronaves em serviço sendo mantidas na reserva até meados do ano de 1937. Em uso na Marinha Americana (US Navy) as aeronaves foram designadas como F8C-1 e o F8C-3 Falcon operando embarcadas, sendo redesignadas como OC-1 e OC-2 para uso do Corpo de Fuzileiros Navais (US Marine Corps) nas missões de observação e bombardeio. A variante F8C-4 Helldiver foi inicialmente empregada pela aviação naval, sendo posteriormente transferidas vinte e cinco aeronaves em 1931 para o Corpo de Fuzileiros Navais (US Marine Corps), recebendo a designação de O2C-1, sendo transferidos para a Reserva Naval e retirados de serviço em fins de 1936.
Uma vigorosa campanha de marketing voltada a exportação seria empreendida pela Curtiss Airplane and Motor Company, resultando em importantes contratos de encomenda de forças aéreas da Ásia e América do Sul. Assim muitos exemplares exportados, quer do modelo Curtiss Falcon, quer da versão monoposto do caça Hawk, seriam empregados em guerras, como a sino-japonesa e o conflito entre o Equador e o Peru em 1933.  Em 1930 a Curtiss-Wright, através de um convenio com a Aviação Militar Chilena, instalou uma linha de montagem de modernos aviões de observação e ataque da versão de exportação designada como Curtiss D-12 Falcon na cidade de Los Cerrilhos. A produção seria encerrada em 1931, totalizando trezentos e trinta e oito células produzidas para a Serviço Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAS), cento e cinquenta células para a Marinha Americana (US Navy) e Corpo de Fuzileiros Navais (US Marine Corps) e duzentas e vinte e três  aeronaves para exportação que foram destinadas a armas áreas Bolívia, Brasil , Colômbia, Chile, Colômbia, Finlândia, Peru e Filipinas.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante o ano de 1932, a América do Sul foi palco de dois conflitos com uso efetivo da aviação como arma militar: a Guerra do Chaco, entre a Bolívia e o Paraguai, e a Revolução Constitucionalista no Brasil. Embora fosse toda uma nação contra apenas dois estados da federação, o principal Estado revoltoso era São Paulo, que por ser já na época uma potência industrial e agrícola, prolongaria por três meses o conflito com intensos combates e perdas de muitas vidas. Em julho daquele ano, logo que a revolução foi deflagrada, uma das preocupações das forças Constitucionalistas, era a capacidade de abastecer com armas e munições para fazer frente às tropas federais. Além da fabricação de munição, as indústrias paulistas projetaram e construíram vários armamentos como trens blindados, carros de combate, armas leves etc, entretanto não dispunham de estrutura para fabricar aviões. Cientes da necessidade de frear a força industrial paulista, porém evitando atingir a população civil, as tropas federais bombardearam com aviões as usinas de transformação de energia. Logo a aviação mostrou para ambos os lados que era uma arma essencial, pois embora na época tivessem pouca eficácia em atingir os alvos, seu efeito psicológico às tropas em terra era devastador, o que motivou a necessidade de adquirir novos aviões, obrigando os dois lados a procurar fornecedores no exterior. O Governo Federal buscaria soluções para aquisição de aeronaves junto ao governo francês e norte americano, logrando êxito na compra de aeronaves de pelo menos duzentos aviões incluindo Waco CSO, Waco CTO, Waco RNF, Bellanca Pacemaker, Vought V66-B Corsair e os, então moderníssimos, caças Boeing F4-B4, entregando ao Brasil antes mesmo da Marinha Americana (US Navy).

O governo federal além da necessidade de importar material bélico procurava pelos meios diplomáticos impedir, a todo custo, que algum país eventualmente fornecesse armas para os constitucionalistas, que procuravam desesperadamente não só equipamentos bélicos, mas também combustível notadamente para a aviação. Vários emissários constitucionalistas foram enviados aos países vizinhos notadamente ao Paraguai e para a Argentina na tentativa de adquirir armas, entretanto. Em 1930 a Curtiss-Wright, tradicional fábrica de aviões dos Estados Unidos, através de um convenio com a Aviação Militar Chilena, instalou uma linha de montagem de modernos aviões de observação e ataque Curtiss D-12 Falcon. Embora toda a produção de vinte aviões fosse destinada a aviação militar chilena, devido a uma crise naquele país agravada após a queda do presidente da república, quase a metade dos aviões produzidos não haviam sido entregues aguardando destino em 1932. Com a eclosão da Guerra do Chaco, a América do Sul começou a ser vista como um promissor mercado para vender aviões militares, tanto que foi enviado a Buenos Aires C.K. Webster, presidente da Curtiss-Wright Export Corporation subsidiária da Curtiss-Wright. Os dois agentes constitucionalistas contataram Webster, e negociaram a compra dos Curtiss D-12 Falcon, excedentes produzidos no Chile. Foram adquiridos um total de nove aviões ao preço unitário de US$ 31 mil dólares para os dois primeiros e US$ 27,5 mil dólares para os subsequentes. Além do valor pago, os Constitucionalistas tiveram várias despesas adicionais.  A entrega dos aviões tinha foi feita por via aérea, passando por território argentino e paraguaio até chegar ao estado do Mato Grosso. Webster contratou pilotos estadunidenses e ingleses para fazer a entrega até a região centro oeste, onde foram substituídos por pilotos Constitucionalistas.
Estas aeronaves foram entregues gradativamente sendo os últimos quatro recebidos em 27 de setembro. Apesar de serem adquiridos nove aviões, e oito efetivamente chegarem ao território brasileiro, nunca foram vistos mais do que três aviões em cada missão. Consta que alguns tiveram problemas de disponibilidade, e pelo menos um deles teve a hélice inutilizada durante a tentativa de sincronização das metralhadoras dianteiras. Apesar de ter sido um reforço considerável para a combalida aviação constitucionalista, a vinda destes aviões foi tardia. Em setembro, grande parte do território paulista já havia sido conquistada pelas tropas federais, e os Curtiss Falcon pouco puderam fazer na tentativa de reverter este quadro. No entanto participaram ativamente em diversos combates importantes no final da campanha A última ação de vulto dos Curtiss Falcon durante o conflito, foi o ataque ao Arsenal de Marinha de Ladário. No final de setembro, após a retirada das tropas constitucionalistas da região de Porto Esperança, o Arsenal de Marinha de Ladário, recebeu um ultimado dos constitucionalistas para que abandonassem as suas instalações, senão seriam atacados pelos aviões dos rebeldes. No início de outubro, três Curtiss Falcon provenientes de Campo Grande, atacaram o Arsenal, lançando bombas e efetuando ataques contra o rebocador “Voluntário” com tiros de metralhadoras e causando consideráveis danos. Os Avro 504 N/O não decolaram, mas a “Oiapock” e abriu fogo, obrigando os atacantes a se retirarem.

Os aviões constitucionalistas apresentavam como identificação duas faixas negras pintados nas pontas de cada asa, e não possuíam numeração. Entretanto alguns deles foram batizados como o Nieuport Delage de “NEGRINHO“e o Potez 25 T.O.E. A-212 de “NOSSO POTEZ”. Os Curtiss Falcon não possuíam quaisquer insígnias, sendo a pintura de alumínio natural, tal qual saíram da fábrica, porém pelo menos quatro deles foram batizados pelos constitucionalistas e tiveram seus nomes escritos na carenagem: “KAVURÉ-I”, “KYRI-KYRI” “TAGUATÓ”, e “JOSÉMARIO”, esse último em homenagem aos dois tripulantes mortos no ataque ao cruzador “Rio Grande do Sul. A revolução constitucionalista terminou em 03 de outubro, e quando as tropas federais comandadas pelo Major Eduardo Gomes chegaram ao Campo de Marte em 15 de outubro, ordenou que todos os sete Curtiss Falcon sobreviventes fossem encaminhados ao Rio de Janeiro para serem incorporados na Aviação Militar do Exército. Na Aviação Militar do Exército os Curtiss Falcon foram operados inicialmente pelo Núcleo do 3º Regimento de Aviação (Nu 3º RAv), em Santa Maria-RS. Em 1937, sob nova denominação de 3º Regimento de Aviação (3º RAv), são transferidos para Canoas no estado do Rio Grande do Sul, sendo o último deles finalmente descarregado em 1941. Nesse ínterim, pelo menos dois deles tiveram seus motores originais V-1150-5 substituídos no Brasil por motores radiais norte-americanos.
Com a perda de uma aeronave em outubro de 1935, restariam apenas seis Curtiss Falcon as vésperas da criação do Ministério da Aeronáutica (MAer) em janeiro de 1941. Por força do decreto estas aeronaves passaram a compor a frota da recém-criada Força Aérea Brasileira. Neste contexto todo o pessoal do 3º Regimento de Aviação (3º RAv) passou a fazer parte dos efetivos desta nova arma. É sabido que desde o ano de 1939 os Curtiss Falcon foram retirados das missões de combate, sendo destinados a eles as missões de treinamento, sendo reunidos na Esquadrilha de Adestramento do 3º Regimento de Aviação, sendo utilizados também para missões de ligação entre diversas bases aéreas dispostas na região sul do país. Apesar do processo de remotorizaçao ter logrado êxito, o prenuncio do recebimento de grandes quantidades de aeronaves novas nos termos do Leand & Lease Bill Act (Lei de Empréstimos e Arrendamento) tornaria este programa redundante, assim para manter as aeronaves em condições de voo a equipe técnica do Parque da Base Aérea de Canoas passou a fazer uso do processo de canibalização de peças. Em 1943 a Diretoria de Material Aeronáutico (DIRMA) excluiu da carga do Ministério da Aeronáutica (MAer) três células, devendo elas servir de estoque de peças de reposição manter duas aeronaves em condições de voo. Em 1945   estas aeronaves foram classificadas como BT-FA (aeronave de treinamento básico em reconhecimento), em dezembro do mesmo a Diretoria de Material Aeronáutico (DIRMA)  declarou-os totalmente obsoletos, estabelecendo os procedimentos para desativação e alienação. Assim, a Base Aérea de Canoas excluiu de sua carga os últimos dois Curtiss Falcon em outubro de 1946, encerrando mais um capítulo da aviação militar brasileira.

Em Escala.
Para representarmos o Curtiss D-12 Falcon em uso pela Aviação Militar do Exército Brasileiro, empregamos o kit produzido pela Ardpol na escala 1/72, modelo que apresenta bom nível de detalhamento com peças em resina e photo etched. Apesar de haver diferenças entre a versão de exportação empregada pelo Brasil e a versão americana do kit, em função da escala optamos por não proceder alterações pelas mesmas serem mínimas. Fizemos uso de decais confeccionados pela FCM Decais, presentes em diversos sets do fabricante.

O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura empregado nos Curtiss Falcon quando sem serviço na versão militar, derivando do padrão original de seu recebimento pelas forças constitucionalistas. Este esquema foi alterado com a retirada da marcações da Aviação Militar do Exército para substituição da identificação padrão da Força Aérea Brasileira, mantendo este esquema até sua desativação em 1946.



Bibliografia:

- Curtiss Falcon – Wikipedia  https://en.wikipedia.org/wiki/Curtiss_Falcon
- A Saga dos Curtiss Falcon no Brasil – Paulo R Bastos Jr – Tecnologia e Defesa  - https://tecnodefesa.com.br/
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015 – Jackson Flores Jr