História e Desenvolvimento.
A General Motors Corporation, uma das maiores e mais renomadas montadoras de veículos em escala global, foi fundada em 16 de setembro de 1908 por William C. Durant, um bem-sucedido empresário do setor de carruagens. A companhia teve início na cidade de Flint, no estado de Michigan, como um modesto empreendimento voltado para o emergente mercado automotivo. Rapidamente, o negócio prosperou e, em sua trajetória de expansão, incorporou empresas de prestígio, como a Buick Company e, posteriormente, a Oldsmobile Company, ambas reconhecidas pela confiança e respeito no mercado norte-americano. Nos anos seguintes, a General Motors ampliou seu portfólio com a aquisição de outras marcas, destacando-se a Cadillac Motor Car Division, símbolo de luxo e sofisticação, que passou a operar em conjunto com a recém-criada Pontiac, uma marca premium da companhia. Contudo, o ritmo acelerado de crescimento trouxe desafios, incluindo divergências frequentes entre William Durant e os demais acionistas, o que culminou em sua saída da empresa. Em 1911, movido por sua vocação empreendedora, Durant fundou, em parceria com o mecânico e piloto suíço Louis Chevrolet, a Chevrolet Motor Company of Michigan. No mesmo ano, foi lançada a marca GMC, dedicada à produção e comercialização de caminhonetes e caminhões leves. Paralelamente às fusões e aquisições, a General Motors passou a explorar oportunidades no mercado internacional. Em maio de 1918, a companhia estabeleceu sua primeira operação comercial no Canadá, uma iniciativa que obteve resultados positivos e incentivou a abertura de filiais em diversos outros países. Em 1919, a empresa incorporou a Frigidaire Company, tradicional fabricante de refrigeradores, marcando sua entrada em um setor não automotivo, como parte de sua estratégia de expansão global. A partir da década de 1920, a General Motors passou a desempenhar um papel significativo no setor militar, fornecendo grandes quantidades de caminhões com tração integral às Forças Armadas dos Estados Unidos. Modelos como o Chevrolet G-506 e G-621, com trações 4x4 e 6x2, destacaram-se nesse contexto. Na década seguinte, a evolução tecnológica no setor automotivo levou o Exército dos Estados Unidos a iniciar um amplo processo de modernização de suas forças motomecanizadas. Esse plano incluiu a aquisição em larga escala de uma nova família de caminhões com tração 6x6, destinada a substituir ou complementar modelos em uso, como os Chevrolet G-506, G-621, Dodge e Ford G-540. Em meados da década de 1930, o agravamento das tensões internacionais, impulsionado pelas políticas expansionistas da Alemanha Nazista e do Império do Japão, gerou um estado de alerta nas autoridades norte-americanas. Apesar das restrições impostas à Alemanha pelo Tratado de Versalhes, firmado em 1918, tornou-se evidente que o país estava comprometido com um amplo processo de rearmamento, com ênfase no desenvolvimento de uma capacidade motomecanizada eficaz.
Esse esforço visava conferir às forças terrestres alemãs uma mobilidade excepcional, materializada no inovador conceito de "Guerra Relâmpago" (Blitzkrieg), que logo se tornaria conhecido mundialmente. Diante dessas percepções geopolíticas, os comandantes militares dos Estados Unidos reconheceram a necessidade urgente de fortalecer suas forças armadas, sendo a motomecanização um dos pilares centrais dessa estratégia. Nesse contexto, em julho de 1939, foi lançada uma concorrência para o desenvolvimento de um novo caminhão com tração integral 6x6, que deveria atender a requisitos específicos, incluindo uma área de carga útil de 3,7 metros e capacidade de transporte de até 2.268 kg. Diversas montadoras, como Ford Motors, General Motors, Studebaker Corporation, Corbitt Automobile, REO Motors, Federal Motors, Biederman Motors e Kenworth Motors, apresentaram propostas, que foram minuciosamente avaliadas por uma equipe técnica do Corpo de Armas do Exército dos Estados Unidos (United States Army Ordnance Corps). Após a análise, apenas os projetos da Ford Motors e da General Motors foram considerados promissores, dado o histórico consolidado dessas empresas na produção de caminhões militarizados para as forças armadas norte-americanas. A concorrência foi concluída em janeiro de 1940, com a proposta da General Motors sendo declarada vencedora. O modelo apresentado baseava-se no GMC ACKWX 353 6x6, desenvolvido em 1939 para o Exército Francês (Armée de Terre). Diferentemente de seu antecessor, o novo modelo incorporava a cabine do caminhão comercial Chevrolet G-506 e apresentava extensas modificações e aprimoramentos na plataforma original, de modo a atender integralmente aos parâmetros estabelecidos na concorrência. No início da Segunda Guerra Mundial, as conquistas territoriais do Eixo destacaram a necessidade de operações anfíbias para a retomada de territórios. A logística de suporte às forças invasoras tornou-se essencial, demandando veículos capazes de operar em ambientes aquáticos e terrestres. O caminhão anfíbio foi projetado para ser lançado de navios de desembarque, transportando cargas e pessoal até as praias, eliminando a dependência de portos improvisados. Sua estrutura em forma de barco e tração 6x6 permitiam mobilidade em águas agitadas e terrenos acidentados. Iniciado em 1941, o projeto foi coordenado pelo Comitê de Pesquisa de Defesa Nacional e pelo Escritório de Pesquisa e Desenvolvimento Científico, com liderança dos engenheiros Roderick Stephens Jr., Dennis Puleston (Sparkman & Stephens, Inc.) e Frank W. Speir (MIT). O veículo foi baseado no chassi do caminhão General Motors AFKWX, um modelo cab-over-engine de 2,5 toneladas com tração 6x6. Um casco estanque e uma hélice foram adicionados para garantir funcionalidade anfíbia, mantendo a compatibilidade com peças de reposição de plataformas existentes. A concepção do caminhão anfíbio respondeu à necessidade de agilidade logística, permitindo o rápido reabastecimento das linhas de frente e reforçando a capacidade operacional das forças aliadas em cenários de desembarque.

A concepção do caminhão anfíbio respondeu à necessidade de agilidade logística, permitindo o rápido reabastecimento das linhas de frente e reforçando a capacidade operacional das forças aliadas em cenários de desembarque junto as praias. Estaria equipado com um motor a gasolina GMC Model 269 de seis cilindros em linha de 5,4 (270 L), acoplado a uma transmissão overdrive de cinco velocidades, que acionava uma caixa de transferência para a hélice e, em seguida, uma caixa de transferência de duas velocidades para acionar os eixos. A hélice e o eixo dianteiro eram selecionáveis a partir de sua caixa de transferência. O primeiro protótipo seria completado no início do ano seguinte, recebendo o codinome militar de DUWK, sendo a letra D referente ao ano de 1942, U de utilitário, K de veículo sobre rodas e a letra W referente a seus dois eixos de hélice. Em seguida seria disponibilizado a Marinha dos Estados Unidos (US Navy) para aplicação em um programa de testes, porém apesar de promissores resultados este programa seria inicialmente rejeitado pelos oficiais do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC). No entanto este conceito seria superado em um evento, quando uma lancha de patrulha da Guarda Costeira dos Estados Unidos, encalharia em um balcão de areia nas cercanias de Provincetown, no estado de Massachusetts. Neste momento um protótipo deste modelo estava próximo a esta área, e mesmos os ventos de até 60 nós (110 km/h) chuva e ondas pesadas que impediam que as embarcações convencionais resgatassem os sete homens, não limitariam que este novo veículo executasse esta tarefa com êxito. Este inusitado evento derrubaria toda e qualquer oposição militar ao emprego do caminhão anfíbio GMC 353 Duwk, com este programa recebendo sinal verde para continuidade. Assim seu projeto final de produção seria aperfeiçoado pela equipe de engenharia da Yellow Truck & Coach em Pontiac, Michigan. Entre os refinamentos seria incorporado um sistema de bomba de porão de alta capacidade, que manteria a tona o veículo, se o casco fino fosse rompido por furos de até 2 polegadas (51 mm) de diâmetro. Seria também o primeiro caminhão militar a dispor de um sistema de controle de pressão dos pneus, sendo operado remotamente pelo motorista, permitindo assim a para adaptação dos pneus em ambientes de terrenos diversos, como de areia, para desembarque nas praias, estradas de terra e estradas pavimentadas. Os primeiros contratos de fornecimento seriam celebrados em regime emergencial, com sua produção sendo destinada principalmente as fábricas da General Motors Corporation, tendo em vista que neste momento as linhas da Yellow Truck and Coach Corporation estava praticamente ocupadas pela produção dos caminhões GMC CCKW 352 e CCKW 353. As primeiras entregas seriam priorizadas ao Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC) para futuro emprego no teatro de operações do Pacífico, com os lotes subsequentes sendo destinados ao Exército dos Estados Unidos (US Army).
Seu batismo de fogo ocorreria em de agosto de 1942, quando do inicio da Campanha de Guadalcanal. Durante a invasão de 7 de agosto de 1942, os DUKWs ainda estavam em fase de teste e produção, com um número limitado disponível. No entanto, a partir de setembro de 1942, pequenos contingentes de DUKWs foram empregados para transportar suprimentos, como munições, alimentos e combustível, das praias para as posições aliadas, especialmente em torno do Campo Henderson. Sua capacidade de operar em águas rasas e praias rochosas foi crucial, dado que as condições do terreno dificultavam o uso de veículos convencionais. Os DUKWs foram usados para manter o fluxo de suprimentos em um ambiente onde os japoneses frequentemente bombardeavam as praias e os navios de apoio. Com capacidade de carga de até 2.268 kg (5.000 libras) ou 25 soldados equipados, o DUKW permitia o transporte rápido de recursos essenciais, como suprimentos médicos e peças de artilharia, diretamente dos navios para depósitos improvisados. Além do transporte de carga, os DUKWs ocasionalmente serviram como plataformas improvisadas para evacuação de feridos e até como suporte para operações de reconhecimento costeiro, aproveitando sua mobilidade anfíbia. Sua bomba de porão de alta capacidade, capaz de lidar com perfurações de até 51 mm no casco, garantiu operação contínua mesmo em condições adversas. Neste mesmo teatro de operações, os GMC Duwks seriam empregados em travessias de áreas de recifes de corais como Saipan e Guam, com seus pneus e cascos não sendo afetados por estas formações naturais. Os caminhões anfíbios GMC DUKW, desempenharam um papel crucial durante a invasão da Sicília, codinome Operação Husky, realizada entre 9 de julho e 17 de agosto de 1943. Esta operação marcou a estreia do DUKW no teatro de operações europeu, sendo um dos primeiros usos em larga escala de veículos anfíbios em uma invasão aliada. Durante os primeiros três dias da invasão, os DUKWs foram amplamente utilizados para desembarcar tropas, veículos e suprimentos nas praias da Sicília, particularmente nas áreas de Gela, Licata e Scoglitti, onde o Sétimo Exército concentrou seus esforços. O sucesso dos DUKWs na Sicília foi tão significativo que o General Dwight D. Eisenhower, comandante supremo das forças aliadas, descreveu o veículo como "um dos equipamentos mais valiosos produzidos pelos Estados Unidos durante a guerra". O General George S. Patton também utilizou cerca de 1.000 DUKWs em uma missão de reabastecimento durante a campanha, destacando sua versatilidade. O comandante aliado General Harold Alexander afirmou que "o DUKW revolucionou o problema de manutenção nas praias", facilitando o suporte logístico às tropas em avanço. Além de seu uso logístico, os DUKWs foram empregados em diversas funções, como plataformas de artilharia e veículos de evacuação médica, demonstrando sua versatilidade. Sua capacidade de operar sob fogo inimigo e em condições adversas contribuiu para o rápido estabelecimento de cabeças de praia, permitindo que o Sétimo Exército avançasse para Palermo em 22 de julho, cortando as forças italianas na metade oeste da ilha.
No âmbito do programa de assistência militar Lend-Lease Act (Lei de Arrendamento e Empréstimo), foram fornecidos 2.000 caminhões anfíbios GMC DUKW ao Reino Unido e 535 à Austrália. Esses veículos foram amplamente utilizados durante a segunda onda de desembarques nas praias da Normandia, na Operação Overlord, em junho de 1944, e posteriormente na Operação Dragoon, no sul da França, em 15 de agosto do mesmo ano. Nessas operações, o DUKW demonstrou notável navegabilidade, cruzando o Canal da Mancha com eficiência. Posteriormente, participou de operações cruciais, incluindo a Batalha do Escalda, a Operação Veritable e a Operação Plunder. Nessas campanhas, as cabeças de ponte anfíbias eram extremamente vulneráveis a contra-ataques inimigos, e o risco de esgotamento de munições pelas unidades desembarcadas era iminente. Nesse contexto, o DUKW desempenhou um papel indispensável, transportando suprimentos dos navios para terra e realizando a evacuação médica de feridos das praias para navios-hospital. Próximo ao fim do conflito, os DUKWs foram utilizados pela 10ª Divisão de Montanha do Exército dos Estados Unidos na travessia do Lago de Garda, na Itália. Durante essa operação, um veículo afundou na travessia de Torbole sul Garda para Riva del Garda, na noite de 30 de abril de 1945. Até o final de 1945, as plantas industriais da Yellow Truck and Coach Co. (posteriormente GMC Truck and Coach Division após 1943), Pontiac West e Chevrolet Division da General Motors Corporation produziram um total de 21.147 unidades do DUKW. Após a Segunda Guerra Mundial, um número reduzido permaneceu em serviço nos Estados Unidos, Reino Unido, França e Austrália, enquanto a maioria foi armazenada para descarte ou reciclagem de materiais. Em 1946, uma quantidade significativa foi transferida para a França, sendo empregada pelas Troupes de Marine em tarefas de transporte nos territórios ultramarinos franceses. Com o início da Guerra da Coreia (1950-1953), pelo menos 400 DUKWs foram reativados. O 1º Grupo de Treinamento de Substituição de Transporte foi responsável pelo treinamento das tripulações, e os veículos foram extensivamente utilizados para transporte de suprimentos durante a Batalha do Perímetro de Pusan e nos desembarques anfíbios em Incheon. O Reino Unido empregou seus DUKWs durante a Emergência Malaia (1948-1960) e, posteriormente, realocou alguns para Bornéu durante o Confronto Indonésia-Malásia (1962-1966). Na França, os DUKWs foram utilizados durante a Primeira Guerra da Indochina (1946-1954). Na década de 1970, alguns receberam novos cascos, permanecendo em serviço até sua aposentadoria final em 1982. Notavelmente, cinco DUKWs foram mantidos em condições operacionais pelo Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha Real Britânica (Royal Marines) até 2012.Emprego na Marinha do Brasil
No início da Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos passou a encarar com profunda apreensão a possibilidade de uma incursão do Eixo — Alemanha, Itália e Japão no continente americano. A capitulação da França, em junho de 1940, intensificou essas preocupações, pois a ocupação nazista de territórios estratégicos, como as Ilhas Canárias, Dacar e outras possessões coloniais francesas, oferecia aos alemães a oportunidade de estabelecer bases avançadas muito próximas às rotas do Atlântico Sul. Nesse novo cenário geopolítico, o Brasil assumiu papel central, tanto pela sua posição geográfica quanto pela extensão de sua costa. A proximidade do Nordeste brasileiro em relação ao continente africano transformava o território nacional no ponto mais vulnerável a uma possível ofensiva inimiga e, simultaneamente, em um dos locais mais estratégicos para o esforço de guerra dos Aliados. Além disso, as conquistas japonesas no Sudeste Asiático e no Pacífico Sul provocaram um colapso na oferta tradicional de látex, tornando o Brasil o principal fornecedor de borracha natural para os Estados Unidos e demais potências aliadas. A borracha constituía matéria-prima indispensável à indústria bélica, empregada, entre outros usos, na fabricação de pneus, cabos elétricos, revestimentos e equipamentos essenciais ao esforço militar. A convergência desses fatores acelerou um movimento de aproximação política, militar e econômica entre Brasília e Washington. Essa cooperação bilateral materializou-se em uma série de acordos estratégicos, dos quais se destaca a adesão do Brasil ao programa de assistência militar conhecido como Lend-Lease Act (Lei de Arrendamento e Empréstimo). O objetivo do programa era fortalecer militarmente as nações aliadas por meio do fornecimento de materiais modernos, treinamento e créditos de aquisição. Por intermédio do Lend-Lease Act, o Brasil recebeu uma linha de crédito inicial de US$ 100 milhões (cerca de US$ 2 bilhões em valores ajustados para 2025), destinada à compra de armamentos modernos, aeronaves de combate e transporte, veículos blindados, carros de combate e demais equipamentos essenciais para a elevação da capacidade operacional das Forças Armadas. Nesse contexto, a Marinha do Brasil foi contemplada com um expressivo conjunto de meios navais, sobretudo navios e equipamentos voltados para operações de guerra antissubmarino (ASW) — área considerada prioritária diante da intensificação das ações de submarinos alemães no Atlântico Sul. Todavia, essa ênfase nas operações ASW acabou por restringir o desenvolvimento de outras capacidades navais, especialmente aquelas relacionadas ao combate anfíbio, tema que havia ganhado destaque estratégico durante a guerra. Embora a ideia de estruturar uma força anfíbia fosse antiga nos círculos de planejamento da Marinha Brasileira, ela não havia recebido a devida prioridade em termos de meios, doutrina e equipamentos específicos. Com o término da guerra, em agosto de 1945, tornou-se evidente a importância e a eficácia das operações anfíbias — largamente demonstradas nos desembarques dos Aliados na Europa, no Norte da África e, principalmente, nas campanhas do Pacífico conduzidas pelo Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC).
Inspirada pelo êxito dessas operações e amparada pela nova conjuntura internacional, a Marinha do Brasil iniciou, já em 1946, os primeiros esforços sistemáticos para constituir uma força de combate anfíbia propriamente dita, moldada nos princípios doutrinários e organizacionais do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC). As campanhas anfíbias observadas durante a guerra serviram como base para estudos detalhados e para a adaptação de uma doutrina nacional, que em curto prazo começaria a orientar a formação e consolidação de uma força terrestre especializada a futura estrutura anfíbia brasileira, que então dava seus primeiros passos. A constituição de uma força anfíbia moldada nos padrões do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos (USMC) representou um ponto de inflexão na história do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil (CFN). Para que essa ambição se concretizasse, seria necessário promover transformações profundas nos paradigmas organizacionais e doutrinários que, até então, orientavam a infantaria naval brasileira. Àquela época, a formação do CFN baseava-se majoritariamente em referenciais herdados do Exército Brasileiro, uma vez que muitos dos oficiais do Corpo realizavam seus cursos de aperfeiçoamento em estabelecimentos de ensino do próprio Exército. Embora esse intercâmbio proporcionasse sólida instrução militar geral, ele não contemplava, de forma específica, os preceitos fundamentais da guerra anfíbia, uma modalidade de combate altamente especializada que exige integração estreita entre forças navais e terrestres, técnicas de desembarque, logística peculiar e equipamentos dedicados. Além do desafio doutrinário, o CFN carecia de meios materiais adequados para desempenhar operações de desembarque. Faltavam-lhe tanto veículos anfíbios quanto, sobretudo, navios e embarcações de desembarque, sem os quais nenhuma ação anfíbia poderia ser executada de forma eficaz. A expressiva participação do Brasil no esforço de guerra aliado durante a Segunda Guerra Mundial aproximou profundamente a Marinha do Brasil da Marinha dos Estados Unidos (US Navy), abrindo espaço para uma cooperação inédita. Graças a esse relacionamento fortalecido, foram instituídos os primeiros programas de intercâmbio, nos quais grupos de oficiais brasileiros foram enviados aos Estados Unidos para realizar cursos, estágios e instruções especializadas. Lá, esses militares tiveram contato direto com a doutrina, as práticas operacionais e a experiência de combate anfíbio acumulada pelo USMC nos mais diversos teatros de operações, especialmente no Pacífico. Ao retornarem ao país, esses oficiais assumiram papel central na difusão dos novos conhecimentos. Atuaram como instrutores e multiplicadores nas escolas de formação da Marinha do Brasil, contribuindo decisivamente para a criação de um ambiente institucional propício à modernização doutrinária. Contudo, a aplicação prática dessas inovações enfrentava limitações materiais concretas: na ausência de meios adequados, muitos exercícios de desembarque tinham de ser realizados de maneira improvisada, com emprego de recursos navais e terrestres limitados. Na década de 1950, a consolidação de uma doutrina e de uma estrutura anfíbias tornou-se prioridade estratégica no planejamento naval brasileiro.

Os primeiros avanços se materializaram com a promulgação de uma nova regulamentação para o Corpo de Fuzileiros Navais, que representou uma ruptura significativa com os paradigmas anteriores. Esse marco normativo estabeleceu uma organização moderna, orientada para o desenvolvimento progressivo da capacidade anfíbia. Entre suas disposições estava a criação da Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE), formulada como núcleo estruturante da futura força anfíbia brasileira embora sua ativação plena estivesse projetada para etapas posteriores. A partir da segunda metade da década, os progressos tornaram-se mais tangíveis. A Marinha do Brasil recebeu seus primeiros navios especialmente destinados ao transporte de tropas, veículos e materiais, fortalecendo sua capacidade expedicionária. Entre os principais meios incorporados estavam os transportes G-20 Custódio de Mello, G-16 Barroso Pereira, G-21 Ary Parreiras e G-22 Soares Dutra, complementados por embarcações de desembarque de pessoal, material e viaturas (EDVP e EDVM). Esses recursos inauguraram uma nova era para a Marinha do Brasil e para o CFN, estabelecendo a infraestrutura essencial para a realização de operações anfíbias em larga escala e pavimentando o caminho para a consolidação de uma doutrina anfíbia genuinamente brasileira. Nesse período, iniciaram-se os primeiros investimentos destinados à construção efetiva de uma capacidade anfíbia no âmbito da Marinha do Brasil. Foram então incorporados os primeiros veículos concebidos para apoiar operações de desembarque, entre eles os jipes M-38A1, M-38A1C, os Willys CJ-5 de fabricação nacional (militarizados para o serviço), bem como os utilitários leves Dodge M-37. Essas viaturas, robustas e de fácil manutenção, passaram a operar a partir das recém-adquiridas Embarcações de Desembarque de Viaturas e Material (EDVM), possibilitando os primeiros ciclos de adestramento com foco em desembarques de baixa complexidade envolvendo tropas, veículos leves, peças de artilharia e cargas gerais. Entre as atividades de instrução realizadas nesse período, destacam-se a Operação Brisa, em outubro de 1959, e a Operação Corvina, em novembro do mesmo ano. Esta última marcou um momento simbólico e operacionalmente relevante: a ativação, pela primeira vez, do Destacamento de Praia, componente essencial em qualquer operação anfíbia moderna. Em setembro de 1960, a Operação Arfagem representou mais um avanço significativo no amadurecimento da doutrina e das práticas de desembarque. Paralelamente, unidades da Força de Fuzileiros da Esquadra (FFE) passaram a participar de exercícios e manobras interaliadas, que ampliaram o repertório técnico e tático de oficiais e praças, colocando-os em contato direto com a doutrina anfíbia contemporânea e consolidando uma cultura operacional marcada pela interoperabilidade e pelo profissionalismo. Esse conjunto de esforços preparatórios elevou substancialmente a capacidade de projeção anfíbia do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), criando as condições para a execução de operações de maior envergadura. Assim, no início de 1964, foi conduzida no litoral do Espírito Santo a primeira edição da série Operações Dragão, marco histórico da evolução anfíbia brasileira. O exercício envolveu o lançamento de uma tropa percussora helitransportada a partir do porta-aviões ligeiro A-11 Minas Gerais, seguida pela projeção terrestre em um intervalo de apenas dez horas de 800 militares, 20 viaturas leves M-38A1 e M-37, e quatro obuseiros M-3A3 de 105 mm, empregando-se tanto o transporte por superfície como o movimento navio-terra direto sobre a cabeça de praia.
A execução dessa operação revelou de forma inequívoca a necessidade de dotar o CFN de veículos anfíbios sobre esteiras, capazes não apenas de desembarcar diretamente sobre praias não preparadas, mas também de transportar tropas e cargas da zona de desembarque até as linhas avançadas de combate. À época, destacavam-se internacionalmente modelos como o norte-americano LVTP-5 (veículo de desembarque de pessoal) e o blindado FMC M-113, que embora possuísse mobilidade anfíbia limitada, era amplamente empregado como transporte de tropas. No entanto, tais equipamentos estavam muito acima das possibilidades orçamentárias da Marinha do Brasil, especialmente em um contexto nacional marcado por restrições financeiras e prioridades concorrentes. Diante disso, ao final da década de 1960, passaram a ser avaliadas alternativas de compras de oportunidade, buscando material bélico eficiente, disponível e economicamente viável. Foi nesse contexto que ganhou força a possibilidade de adquirir os caminhões anfíbios GMC 353 DUKW, fabricados originalmente na década de 1940. Embora veteranos da Segunda Guerra Mundial, esses veículos ainda existiam em grande quantidade no mercado internacional, apresentavam manutenção relativamente simples e encontravam-se, em muitos casos, em bom estado de conservação características que os tornavam particularmente adequados às necessidades e às condições orçamentárias brasileiras. Dentre as opções existentes, chamaria a atenção a uma proposta apresentada em 1972, pelo governo francês, para o fornecimento de um lote de caminhões anfíbios deste modelo. A Marinha Nacional Francesa (Marine Nationale) após o término da Segunda Guerra Mundial ser tornara o segundo maior operador dos caminhões GMC Duwk, dispondo ainda neste período de uma grande quantidade destes veículos em sua frota. As as tratativas comerciais serem finalizadas, uma comitiva de oficiais brasileiros seria enviada a base naval de Angoulême, sede do 1º Regimento de Infantaria de Fuzileiros Navais (1º RIMa), para proceder a escolha de trinta e quatro caminhões deste modelo, tomando como critério o estado de conservação. Neste meio tempo seria negociado junto a empresa brasileira Novatração Artefatos de Borracha Ltda, um contrato para revitalização e revisão destes veículos, com esta empresa passando a alugar instalações de manutenção no porto de Antuérpia localizado em Flandres na Bélgica. Este processo seria conduzido com pleno êxito, com os trinta e quatro caminhões sendo então despachados por via naval ao Brasil e dezembro do ano de 1973. Após seu recebimento e incorporação junto a frota do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil, os caminhões GMC Dukw, receberiam a designação de Caminhão Anfíbio - CAMANF. Após a realização do treinamento de seus condutores e equipes de manutenção estes veículos seriam destacados para operação do Batalhão de Blindados do Corpo de Fuzileiros Navais, sediado no Rio de Janeiro. Com a adoção deste caminhão, seria possível enfim implementar completamente a doutrina de desembarque anfíbio, empregando os GMC Duwk realizando o reabastecimento rápido de suprimentos e munição para as tropas nas cabeças de ponte. Sua excelente capacidade de transporte de carga (incluindo até um jipe leve) ou de até cinquenta e nove soldados totalmente equipados, seriam de extrema importância na consolidação da doutrina de operações de transporte e desembarque de tropas das forças anfíbias.

Ao longo dos anos seguintes os GMC Duwk participariam ativamente de exercícios operacionais de grande escala, como as operações Dragão. Apesar desta boa performance operacional, estes veículos haviam sido produzidos há mais de trinta anos e já apresentavam o peso da idade, com este fator agravado por problemas no fluxo de peças de reposição do motor a gasolina GMC 270. Esta combinação de fatores passaria a gerar altos índices de indisponibilidade da pequena frota existente. Inicialmente no ano de 1975, pensou-se em aplicar um processo de revitalização e remotorização da frota existente (a exemplo do que foi realizado pelo Exército Brasileiros com com os caminhões GMC CCKW e Studebaker). Porém posteriormente aferiu-se que o estado de conservação da grande maioria dos GMC Duwk era precário, levantando-se assim dúvidas sobre a viabilidade econômica de um tal programa. Nesse contexto, surgiu a iniciativa de desenvolver um veículo anfíbio nacional, inspirado em esforços semelhantes realizados na União Soviética durante a década de 1950. Para atender a essa demanda estratégica, o Ministério da Marinha passou a consultar empresas nacionais. A companhia paulista Biselli Viaturas e Equipamentos Ltda. respondeu a esse programa, celebrando um contrato para o desenvolvimento de uma nova viatura anfíbia. O acordo previa a produção de 25 caminhões anfíbios e a reforma de quatro GMC DUKWs em melhores condições de conservação. O chassi selecionado foi o do caminhão nacional Ford F-7000 6x6, que passou por modificações e reforços estruturais. A carroceria, inspirada no design do GMC DUKW, era composta inteiramente de aço laminado a frio, com uma proa reforçada, tração nas seis rodas e pneus PPB à prova de balas, modelo 900x20 de rodagem simples. O veículo incorporava um sistema de inflação e desinflação dos pneus, adaptável a diferentes terrenos, que armazenava ar em um reservatório de alta pressão e o distribuía por tubos de cobre às laterais do veículo, onde mangueiras com conectores para enchimento dos pneus eram fixadas em suportes próximos à tomada de ar. O modelo era equipado com um motor nacional Detroit Diesel 4-53N de 145 cv, acoplado a uma transmissão manual Clark Equipment. Um eixo de transmissão adicional conectava a transmissão à caixa de transferência da hélice, atravessando o veículo até a hélice posicionada na traseira, em configuração semelhante à do DUKW original. Esse conjunto mecânico e o casco foram projetados para atingir uma velocidade máxima de 72 km/h em terra e 14 km/h na água, com autonomia de 480 km em terra ou 18 horas em água. O veículo possuía um peso de 13.500 kg e capacidade de carga de 5 toneladas em terra ou águas calmas, reduzida a 2,5 toneladas em águas agitadas. Para autodefesa, podia ser equipado com uma metralhadora Browning M-2HB calibre .50 (12,7 mm). Embora os protótipos tenham apresentado resultados promissores durante os testes, o modelo, conhecido como Biselli CAMANF (Caminhão Anfíbio), não foi produzido em larga escala. Apenas cinco unidades foram concluídas, que, ainda assim, prestaram serviços relevantes ao Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) da Marinha do Brasil. A decisão de não prosseguir com a produção em massa foi motivada pela priorização de recursos para a aquisição de veículos anfíbios mais modernos e com maior proteção blindada, como o Engesa EE-11 Urutu e os M-113A1 ACAV, cujo recebimento teve início em 1976. Os últimos Biselli CAMANFs foram retirados do serviço ativo no final de 1988, com uma unidade preservada no Quartel do Corpo de Fuzileiros Navais, no Rio de Janeiro, como parte do acervo histórico.
Em Escala.
Para representarmos o GMC Duwk 353 "CFN 2343319", pertencente ao Batalhão de Blindados do Corpo de Fuzileiros Navais, utilizamos a nova edição do kit da Italeri na escala 1/35, sendo este modelo de ótima qualidade e nível de detalhamento. Para completarmos o conjunto fizemos uso de itens de carga em resina produzidos pela Eletric Products. Empregamos decais confeccionados pela Decals e Books, pertencentes ao set "Forças Armadas do Brasil".
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão empregando em todos as unidades dos modelos GMC Duwk 353 e Bisseli CAMANF operadas pelo Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil, desde o seu recebimento até sua desativação em fins da década de 1980. Como principal diferença visual entre os modelos, o CAMANF apresentava a logomarca da Biselli em alto relevo aplicada na parte frontal do casco.
Bibliografia :
- DUWK - Wikipedia - http://http://en.wikipedia.org/wiki/DUKW
- CAMANF – Um americano naturalizado brasileiro - http://nivelandoaengenharia.com.br/
- DUWK Caminhão Anfíbio do CFN - Expedito Carlos S. Bastos - http://www.ecsbdefesa.com.br/fts/DUKW.pdf





