História e Desenvolvimento.
A história da Stearman Aircraft Company representa o verdadeiro reflexo do empreendedorismo norte-americano, da inovação e da determinação em enfrentar as adversidades do setor de construção aeronáutica. Fundada na cidade de Venice, Califórnia, em 10 de dezembro de 1926, por Lloyd Carton Stearman, a empresa contava com Fred Hoyt como vice-presidente e George Lyle como secretário. O primeiro modelo da empresa, o biplano Stearman C1, foi lançado em 1927; no entanto, não resultou em vendas, limitando-se à construção de apenas uma unidade. No mesmo ano, uma versão aprimorada, o Stearman C2, conseguiu comercializar trinta e três unidades, o que incentivou a diretoria a continuar aperfeiçoando o projeto, culminando no desenvolvimento do modelo Stearman C3. Esta aeronave, um robusto biplano com asas retas simples, era equipada com um trem de pouso resistente com amortecedores a óleo e possuía dois cockpits abertos, com o piloto localizado na parte traseira e dois assentos para passageiros lado a lado na frente. O C3 representava uma versão ligeiramente modificada do modelo anterior, o C2, incluindo um tanque de óleo de maior capacidade e um compartimento de bagagem ampliado. Introduzido em 1928, o Stearman C3 era alimentado por uma variedade de motores, variando de 128 a 225 cv, e era destinado ao transporte de passageiros e voos executivos. Seu bom desempenho e excelente relação custo-benefício refletiram-se nas vendas, resultando em 179 aeronaves comercializadas. No entanto, apesar de seu talento no desenvolvimento de aeronaves, Lloyd Carton Stearman carecia das habilidades necessárias para a gestão financeira de sua empresa. Em 1929, com a eclosão da Grande Depressão, a Stearman Aircraft Company, assim como outras empresas do setor, foi severamente afetada pelo cenário econômico, levando Lloyd Carton Stearman a vender sua companhia para o conglomerado United Aircraft and Transport Corporation. Embora não fosse mais o controlador da empresa, Stearman manteve-se na presidência, deixando um legado significativo, representado por uma linha de aeronaves de treinamento e turismo, destacando-se o Stearman Model 6 Cloud Boy, que realizou seu primeiro voo no início de 1931. Esta nova aeronave foi projetada como um treinador básico para o mercado civil e incluiu uma versão militar, oferecida ao Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) sob a designação de YPT-9; no entanto, a aeronave não despertou interesse por parte das forças armadas. A empresa também tentou comercializar o modelo no mercado civil, mas o país ainda enfrentava uma grave crise econômica, resultando na venda de apenas três unidades.
Em 1932, a Stearman Aircraft Company enfrentava mais um período de incertezas e dificuldades econômicas, reduzindo seu quadro de pessoal para apenas vinte e cinco funcionários. No entanto, a empresa conseguiu uma importante oportunidade ao ser subcontratada pela Boeing Aircraft Company para a produção de componentes críticos para o Boeing 247, iniciando assim uma parceria significativa com este gigante da indústria aeronáutica. Como resultado da Lei do Correio Aéreo de 1934, a empresa United Aircraft and Transport Corporation foi reorganizada, tornando-se a United Airlines Transport Corporation. Este processo culminou na absorção da empresa pela promissora Boeing Aircraft Company, que renomeou sua divisão aeronáutica para Stearman. Todos os projetos originais foram mantidos, incluindo um novo treinador primário derivado diretamente do Stearman Model 6 Cloud Boy, designado como YPT-9, que começou a ser desenvolvido em 1933. A nova aeronave recebeu a denominação comercial de Stearman Model 70, apresentando uma configuração biplano e com dois lugares, sendo especificamente projetada para tarefas de instrução e treinamento. Embora tivesse um desempenho modesto em comparação com aeronaves da mesma categoria, seus projetistas apostaram na excelente relação custo-benefício tanto em termos de operação quanto de manutenção, como um dos principais diferenciais competitivos do novo produto. Essa decisão mostrou-se acertada, pois as características do Stearman Model 70 atendiam perfeitamente aos requisitos técnicos estabelecidos pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) e pela aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy), que anteriormente definiram em conjunto os parâmetros para o desenvolvimento de uma aeronave de treinamento primário. Uma proposta técnica e comercial foi apresentada aos militares norte-americanos no final de 1934, e após uma sinalização positiva destes, em seguida seria realizada sua apresentação oficial em voo, com o primeiro protótipo recebendo muito elogios nesta oportunidade. As impressões positivas causadas pelo Stearman Model 70 resultaram na celebração do primeiro contrato com o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) no final de 1934, envolvendo a aquisição de 61 aeronaves de uma versão aprimorada designada Stearman Model 73. Logo em seguida, a aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) firmou um contrato semelhante, recebendo suas primeiras aeronaves no mesmo período, no início do ano 1935.

Para atender a essa crescente demanda, tanto o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) quanto a aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) identificaram a necessidade urgente de constituir uma extensa frota de aeronaves destinadas ao treinamento primário para milhares de pilotos militares. Nesse contexto, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos passou a consultar os principais fabricantes aeronáuticos do país com o objetivo de viabilizar a produção em larga escala dessas aeronaves de treinamento. Entre as empresas consultadas, destacou-se a Stearman Aircraft Division, que apresentou uma versão aprimorada de seu modelo PT-13D. Assim nasceu o PT-17, que logo foi submetido à avaliação das autoridades militares norte-americanas. Após a aprovação de sua proposta sob os aspectos técnico e comercial, foram iniciadas negociações que culminaram em uma significativa encomenda de 3.500 unidades, cuja produção em série teve início em janeiro de 1940. O Stearman PT-17A, assim como seu antecessor, foi projetado para o treinamento básico de pilotos. Tratava-se de uma aeronave de configuração biplana, com uma estrutura composta por tubos de aço soldados e asas de madeira, revestidas inteiramente por tela. Possuía duas cabines abertas dispostas em tandem, destinadas ao aluno e ao instrutor, e era equipada com o motor radial a pistão Continental R-670-5, capaz de gerar 210 cavalos de potência. Nos primeiros lotes produzidos, destacaram-se 18 unidades configuradas especificamente para treinamento por instrumentos, as quais receberam a designação PT-17B. Em meados de 1941, a produção do PT-17 enfrentou um desafio significativo devido à escassez de motores, o que ameaçava comprometer os prazos de entrega estabelecidos. Diante dessa situação, foram avaliadas alternativas que resultaram na adoção dos motores radiais Jacobs R-755, com 225 cavalos de potência — os mesmos utilizados nos modelos Beechcraft Model 17 Staggerwing e Cessna AT-17 Bobcat. Essa adaptação deu origem a 150 unidades do Stearman PT-18A. No âmbito do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), o Stearman PT-17 consolidou-se como o treinador primário padrão. O mesmo conceito foi adotado pela Aviação Naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy), que incorporou o modelo sob a designação Stearman N2S. As versões destinadas à Marinha foram equipadas com uma variedade de motores Continental, incluindo os modelos R-670-14, R-680-8, R-670-4 e R-680-17. Além da versão inicial, foram desenvolvidas variantes aprimoradas, como N2S-1, N2S-2, N2S-3, N2S-4 e N2S-5, totalizando a produção de aproximadamente 4.300 aeronaves. Assim, o Stearman PT-17 e suas variantes desempenharam um papel fundamental no esforço de preparação das forças armadas norte-americanas para o conflito global, atendendo às exigências de formação de pilotos em larga escala com eficiência e confiabilidade.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
O processo de formação e treinamento de pilotos militares brasileiros teve início em fevereiro de 1914, com a fundação da Escola Brasileira de Aviação, localizada no Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Essa instituição foi estabelecida por meio de uma parceria entre o Ministério da Guerra e a empresa italiana Gino, Buccelli & Cia. Em 1916, essa organização foi sucedida pela criação da Escola de Aviação Naval (EAvN), que se tornou a primeira instituição exclusivamente militar dedicada à formação de pilotos militares no Brasil. Posteriormente, em 1919, sob a orientação técnica da Missão Militar Francesa de Aviação (MMFA), foi instituída a Escola de Aviação Militar (EAM), marcando o início da integração da aviação como uma arma do Exército Brasileiro, embora esse processo tenha enfrentado inúmeras dificuldades em seus primeiros anos. Nos anos iniciais, a frota da Escola de Aviação Militar (EAM) entre os modelos utilizados, destacaram-se, ao longo do tempo, aeronaves relativamente modernas para a época, como o Morane-Saulnier MS.147Ep2 e o MS.130ET2. A primeira renovação significativa dos meios aéreos destinados à formação de pilotos no Exército Brasileiro ocorreu no início da década de 1930, com a incorporação dos biplanos ingleses De Havilland DH-60T Moth Trainer e de modelos norte-americanos, como o Fleet Model 11, o Waco RNF, o Waco CTO e o Curtiss-Wright CW-16. Contudo, a partir da segunda metade dessa década, tornou-se evidente que a rápida evolução da tecnologia aeronáutica, responsável pelo desenvolvimento de aeronaves mais robustas e de maior desempenho, estava levando os treinadores brasileiros a uma obsolescência prematura. Diante desse cenário, os comandantes da Aviação Militar do Exército Brasileiro reconheceram a necessidade de modernizar a frota de aeronaves de treinamento, com o objetivo de reduzir o significativo desnível tecnológico existente entre os modelos de instrução e as aeronaves operacionais de linha de frente. Para atender a essa demanda, foi lançada uma concorrência internacional visando a aquisição de até trinta aeronaves de treinamento avançado. O convite foi direcionado a fabricantes de renome da França, do Reino Unido e dos Estados Unidos. As propostas começaram a ser apresentadas ao comando do Exército Brasileiro no segundo semestre de 1936, dando início imediato aos estudos comparativos sob os aspectos técnicos e comerciais, com o intuito de selecionar a opção mais adequada às necessidades estratégicas do país. Esse processo reflete o esforço contínuo das forças armadas brasileiras em acompanhar os avanços da aviação militar global, consolidando as bases para o desenvolvimento de uma capacidade aérea mais moderna e eficiente.
Dentre as propostas submetidas na concorrência internacional promovida pelo Exército Brasileiro, destacou-se a oferta apresentada pela empresa norte-americana Stearman Aircraft Division. Esta proposta oferecia condições comerciais particularmente vantajosas para a versão de exportação do PT-13A, designada como Stearman Model 76. Esse modelo havia sido concebido não apenas para atender às necessidades básicas de treinamento e formação de pilotos, mas também para desempenhar funções como aeronave de ataque leve. Para tanto, contava com adaptações que incluíam a possibilidade de instalação de cabides ventrais para bombas e metralhadoras Colt-Browning MG-28 calibre .30, destinadas à autodefesa. Adicionalmente, a variante possuía uma capacidade de combustível ampliada, com tanques suplementares que adicionavam 110 litros, e era equipada com um motor mais potente, o Wright R-975-E3 de 420 cavalos de potência, o que a tornava a versão de melhor desempenho já produzida dentro dessa família de aeronaves. Com base nessas características, a Diretoria de Aeronáutica do Exército Brasileiro optou pela proposta da Stearman, formalizando um acordo para o fornecimento de trinta unidades configuradas conforme essa versão de exportação. Para atender às especificações exigidas pela Aviação Militar brasileira, as aeronaves foram adaptadas com instrumentos cujos mostradores utilizavam o sistema métrico e incluíam a provisão para a instalação de uma metralhadora móvel na nacele traseira. A encomenda foi dividida em dois lotes distintos: metade das aeronaves, designadas como Model A76-C3, foi equipada com uma metralhadora fixa instalada na asa direita inferior; o lote restante, identificado como Model B76-C3, recebeu, em substituição à metralhadora fixa, uma câmera fotográfica Fairchild K-3B, ampliando sua versatilidade para missões de reconhecimento. Após a assinatura do contrato, foi estabelecido um cronograma detalhado para a produção e entrega das aeronaves. As primeiras unidades foram concluídas nas instalações da Stearman Aircraft Division em maio de 1937. Uma comitiva de oficiais brasileiros realizou uma inspeção no local para verificar a conformidade das aeronaves com as especificações acordadas. Em seguida, os aviões foram desmontados, acondicionados em caixas de madeira e transportados por via naval ao Brasil, chegando ao porto do Rio de Janeiro vinte dias após o embarque. Posteriormente, as aeronaves foram trasladadas por via terrestre até o Parque Central de Aviação do Exército, situado no Campo dos Afonsos. Nesse local, sob a supervisão de equipes técnicas enviadas pelo fabricante norte-americano, as aeronaves foram remontadas e submetidas a ensaios de voo, garantindo sua plena operacionalidade antes da integração à frota da Aviação Militar brasileira. Esse processo de aquisição reflete o esforço estratégico do Exército Brasileiro em modernizar seus meios aéreos, alinhando-se às demandas de uma aviação militar mais avançada e versátil, capaz de atender tanto às necessidades de treinamento quanto às exigências operacionais da época.

Diante desse contexto, a transição planejada não se concretizou de imediato, cabendo aos responsáveis pela futura Escola de Aeronáutica implementar as adaptações necessárias para atender às demandas emergentes da nova estrutura organizacional. Assim, os Stearman A76-C3 e B76-C3 desempenharam um papel essencial na modernização do treinamento de pilotos militares brasileiros, oferecendo uma plataforma versátil que contribuiu para o aprimoramento técnico e tático da Aviação Militar até o início da década de 1940. Neste mesmo período a Aviação Militar do Exército começaria a enfrentar uma situação delicada, pois sua frota de aeronaves de treinamento primário, que na época era composta por aeronaves de concepção antiga, como os De Havilland DH-60T Moth Trainer e Muniz M7 e M-9, passavam a apresentar cada vez menores índices de disponibilidade operacional. Este fator se dava principalmente pela falta de peças de reposição mais notadamente pertinente aos motores Havilland Gipsy Major, que eram de origem inglesa e se tornariam extremamente escassos para a aquisição devido ao início da Segunda Guerra Mundial. Desta maneira a fim de evitar um apagão em seu processo de instrução básica, a Diretoria de Aeronáutica do Exército (DAEx) sairia em buscas de alternativas. Porém diante do conflito em curso, as fontes europeias seriam descartadas, buscando-se assim uma opção norte-americana. A escolha natural recairia sobre o modelo de instrução básica o Stearman A75-L3, pois afinal, excluindo itens como motor, tanques extras de combustível e material associado ao armamento, esta versão era praticamente idêntica as aeronaves Stearman A76-C3 e B76-C3 em operação no pais. Esta aquisição viria a criar uma certa padronização dos processos de manutenção e fluxo de peças de reposição. No início do segundo semestre de 1939 seria celebrado um contrato prevendo a aquisição de vinte células deste modelo, com o Brasil se tornando o primeiro operador dessa versão do Stearman Model 75. As primeiras células seriam recebidas desmontadas na sede da Escola de Aeronáutica do Exército (EAerEx) em março de 1940, sendo prontamente montados no local sobre a supervisão de técnicos da Stearman Aircraft Division. Estas aeronaves seriam montadas e colocadas em condições de voo em maio do mesmo ano, passando logo a ser empregadas no processo de instrução primária, repartindo suas surtidas de treinamento com os poucos Munis M-9 ainda em operação. Em função das diferenças presentes entre os dois modelos os A75-L3 foram apelidados de "Stirminhas" e os A76-C3 e B76-C3 de “Stirmões “em uma clara alusão ao desempenho de ambos. Mas o uso dos Stearman A75-L3 na Aviação Militar do Exército seria breve, pois em janeiro de 1941, seria criado o Ministério da Aeronáutica (MAer), e aquelas aeronaves logo passariam para o controle da Força Aérea Brasileira.

Em Escala.
Para representarmos o Stearman A75-L3 "K-132” nas cores da Aviação Militar do Exército Brasileiro, quando sua operação junto a Escola de Aeronáutica do Exército (EAerEx) fizemos uso da única opção disponível na época da montagem na escala 1/48, um kit produzido pela Lindberg. Para se compor a versão nacional, não é necessário prover nenhuma alteração com o modelo podendo ser montado diretamente da caixa . Empregamos decais produzidos pela FCM Decals presentes no antigo set 48/04.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura empregado por todos os Stearman A75-L3 e A76-C3 e B76-C3 quando de seu recebimento a partir do ano de 1937. Ao longo dos anos seriam aplicadas pequenas diferenças de marcações para identificar os esquadrões, após sua incorporação na Força Aérea Brasileira este esquema de pintura seria mantido se alterando apenas os números de série das aeronaves.
Bibliografia :
- Boeing Stearman Model A75/A76 - Wikipedia - http://en.wikipedia.org/wiki/Boeing-Stearman_Model_75
- História da Força Aérea Brasileira , Prof Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html
- Boeing Stearman no Brasil - Incaer , Aparecido Camazano Alamino - www.incaer.aer.mil.br/ideias_42.pdf
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015 - Jackson Flores Jr
- Boeing Stearman no Brasil - Incaer , Aparecido Camazano Alamino - www.incaer.aer.mil.br/ideias_42.pdf
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015 - Jackson Flores Jr