No início da década de 1930, a indústria automotiva alemã, após um longo e desafiador processo de recuperação pós-Primeira Guerra Mundial, havia finalmente reconquistado sua vitalidade. Contudo, as montadoras, em um equívoco estratégico, concentravam seus esforços exclusivamente na produção de veículos de luxo, inacessíveis à maior parte da população. O país, imerso em uma severa crise econômica, enfrentava dificuldades que limitavam o poder de compra dos cidadãos. Para a maioria dos alemães, possuir um automóvel era um sonho distante; com apenas um carro para cada cinquenta habitantes, a aquisição de veículos estava restrita, na melhor das hipóteses, a motocicletas básicas. Esse cenário de desigualdade e escassez moldava o cotidiano de um povo que lutava por sua subsistência. A ascensão de Adolf Hitler ao poder, como chanceler pelo Partido Nazista, trouxe uma mudança profunda nesse panorama. Seu plano de governo priorizava a recuperação econômica da Alemanha, com foco no fortalecimento da indústria metal-mecânica e na criação de um ciclo virtuoso de prosperidade. Central para essa visão era a democratização do acesso a bens de consumo, que impulsionaria a economia nacional e traria maior qualidade de vida à população. Nesse contexto, a indústria automotiva emergiu como um pilar estratégico. O chanceler propôs à sua equipe o desenvolvimento de um carro popular, acessível à maioria dos cidadãos, que seria batizado de “Volkswagen” – o “carro do povo”. O projeto foi confiado ao renomado engenheiro Ferdinand Porsche, cuja missão era criar um veículo que atendesse a especificações rigorosas: capacidade para transportar dois adultos e três crianças a uma velocidade de 100 km/h, com um consumo eficiente de 7 litros por 100 km. O motor, refrigerado a ar, deveria suportar as duras condições do inverno alemão, e o design precisava ser simples, tanto no conceito quanto na produção, para garantir um preço acessível, não superior a 990 Reichsmarks. Em uma época em que o salário médio de um operário alemão girava em torno de 130 Reichsmarks, a aquisição do Volkswagen foi facilitada por um inovador programa governamental de poupança, conhecido como “Sparkarte”. Esse sistema permitia que os cidadãos pagassem prestações módicas, tornando o sonho do automóvel próprio uma realidade palpável. O projeto inicial do Volkswagen foi apresentado ao chanceler em 17 de janeiro de 1937. Contudo, a busca por aprimoramentos adiou a finalização do desenvolvimento para o início de 1938. As primeiras unidades de pré-produção foram concluídas apenas no início de 1939, com a expectativa de que as linhas de produção da Deutsche Arbeitsfront (Frente Trabalhista Alemã) atingissem plena capacidade no segundo semestre de 1940. O Volkswagen não era apenas um veículo; simbolizava a esperança de mobilidade e progresso para um povo que, até então, via o automóvel como um privilégio reservado a poucos.
No entanto, em 1939, os ambiciosos planos de expansão territorial do chanceler Adolf Hitler conduziram a Europa à iminência de um conflito devastador. Esse cenário alterou drasticamente as prioridades da indústria alemã, redirecionando todos os recursos disponíveis para o esforço de guerra. As linhas de produção da Deutsche Arbeitsfront, até então conhecidas como Volkswagen e celebradas como símbolo da capacidade tecnológica alemã, foram rapidamente absorvidas pela máquina militar do Terceiro Reich. O projeto do “carro do povo”, que prometia democratizar a mobilidade para os cidadãos, teve sua produção em série interrompida após a fabricação de apenas um número reduzido de unidades. As fábricas, antes dedicadas a um ideal de progresso social, passaram a se concentrar na produção de motores e componentes para veículos militares, atendendo às demandas urgentes do conflito que se aproximava. Embora o conceito de um veículo militar baseado no Volkswagen tivesse sido discutido entre Adolf Hitler e o engenheiro Ferdinand Porsche ainda em abril de 1937, foi somente em janeiro de 1938 que autoridades do alto escalão do regime abordaram formalmente Porsche. A solicitação era clara: desenvolver um veículo de transporte militar leve, de baixo custo e capaz de operar com confiabilidade tanto em estradas pavimentadas quanto em terrenos acidentados, mesmo nas condições climáticas mais adversas. O veículo deveria acomodar até quatro soldados equipados e ser projetado para uma construção simplificada, permitindo a produção em larga escala. Fontes não oficiais sugeriam que a durabilidade do veículo não era uma prioridade, sendo mais econômico substituí-lo por uma nova unidade do que realizar reparos extensos ou manutenções preventivas. O resultado foi um veículo extremamente leve, projetado com uma engenhosidade que refletia as exigências do contexto. Sua estrutura permitia que dois ou três soldados conseguissem levantá-lo para trocar um pneu sem a necessidade de um macaco, uma solução prática para operações em campo. A carroceria, composta por finas chapas de aço com relevos estampados, foi desenhada para garantir a integridade estrutural, resistindo às torções do chassi em terrenos irregulares. Esse design era particularmente adequado para o futuro teatro de operações no Leste Europeu, onde a precária infraestrutura rodoviária exigiria veículos capazes de enfrentar condições desafiadoras com robustez e simplicidade. Assim, o Volkswagen, inicialmente concebido como um símbolo de esperança e progresso, foi transformado em um instrumento de guerra, refletindo as complexas tensões de uma era marcada por mudanças rápidas e profundas.

A versão definitiva do Kübelwagen, o Type 82, entrou em produção em larga escala em fevereiro de 1940 na fábrica da Volkswagen em Wolfsburg, com componentes adicionais fornecidos por outras empresas, como a Ambi Budd Presswerke (carroceria) e fábricas da Tatra, Mercedes-Benz e Opel. Projetado para transportar até quatro soldados equipados, o Type 82 era extremamente leve (550 kg vazio, 950 kg carregado), com uma carroceria de aço estampado e chassi plano que permitia deslizar sobre areia, neve ou lama. Seu motor refrigerado a ar era confiável em climas extremos, e a partir de março de 1941, foi equipado com o motor Volkswagen Boxer VW 1.3, oferecendo maior potência e torque. Com o avanço do conflito, a fabricação foi gradualmente expandida para outras linhas de montagem pelo país, incluindo fábricas da Tatra, Mercedes-Benz e Opel. Durante a produção, o Type 82 recebeu pequenas modificações, como a eliminação de partes desnecessárias e reforços em componentes vulneráveis, além de melhorias como eixos com cubos de redução, amortecedores reforçados, rodas de 16 polegadas e um diferencial de deslizamento limitado. Essa versão foi amplamente utilizada em todos os fronts da guerra, do Leste Europeu ao norte da África, destacando-se por sua tenacidade e simplicidade. As mudanças implementadas focavam principalmente na eliminação de componentes desnecessários e no reforço de partes que se mostraram insuficientes para as exigências do campo de batalha. A única modificação de maior relevância ocorreu em março de 1941, com a adoção do motor Volkswagen Boxer VW 1.3, que oferecia maior potência e torque em comparação ao propulsor anterior, originalmente desenvolvido para a versão anfíbia Type 166 Schwimmwagen. Essa melhoria ampliou a versatilidade do Kübelwagen, permitindo seu uso em uma ampla gama de condições adversas, desde o rigoroso inverno europeu, com neve e gelo, até o calor abrasador dos desertos do norte da África. A produção em larga escala garantiu que o veículo equipasse unidades em todos os fronts de batalha, demonstrando uma capacidade notável de adaptação a diferentes cenários operacionais. Os resultados em combate foram surpreendentemente positivos, conquistando até mesmo os oficiais mais céticos, que inicialmente questionavam a viabilidade de um veículo de tração nas duas rodas (4x2) para operações militares. Um dos aspectos mais notáveis do Kübelwagen era a parte inferior lisa e plana de seu chassi, que permitia ao veículo deslizar como um trenó motorizado quando suas rodas afundavam em areia, neve ou lama. Essa característica, aliada à sua leveza, conferia ao Kübelwagen uma tenacidade impressionante, permitindo que acompanhasse até mesmo veículos com tração integral. O motor refrigerado a ar revelou-se outro trunfo, funcionando com confiabilidade em climas extremos, quentes ou frios, e apresentando menor vulnerabilidade a projéteis por não depender de um radiador. Para operação em condições de inverno rigoroso, o veículo contava com um pequeno tanque auxiliar de combustível volátil, essencial para facilitar a partida em temperaturas baixas.

Além da versão padrão o Type 82 (Versão de Produção Padrão, 1940–1945), seriam desenvolvidas variantes especificas como O Type 82/E (Versão de Estado-Maior) destinada a oficiais de alto escalão e equipes de comando. Diferentemente da versão padrão, essa configuração incluía acabamentos mais refinados, como assentos estofados e, em alguns casos, capotas de lona mais robustas ou até mesmo carrocerias parcialmente fechadas para maior proteção contra intempéries. Embora mantivesse as mesmas características técnicas do Type 82 padrão, o Type 82/E era usado principalmente em funções administrativas ou de supervisão, garantindo mobilidade rápida para oficiais em zonas de operação. Durante o conflito, o Kübelwagen foi adaptado para diversas funções específicas, resultando em configurações personalizadas: Type 82/1 Rádio, Type 82/2 Sirencar (carro sirene), Type 82/3 Carro de batedor simulado, Type 82/5 picape, Type 82/6 "Tropenwagen" com carroceria de de Fusca e corpo de van box, Type 82/7 Carro de comando, Type 82/8 com carroceria feita em madeira para economizar em escassos recursos siderúrgicos e por fim o Type 87 "Kommandeurwagen, com carroceria de Fusca, equipado com paralamas mais largos para pneus off-road Kronprinz de maior diâmetro , roda sobressalente montado sob capô (acompanhado de uma lata de gás, uma tomada, um pequeno kit de ferramentas e uma pá). Alguns foram fornecidos a oficiais de alto escalão, que poderiam empurrar praticamente qualquer tipo de terreno com eles, a produção desta versão atingiria 667 carros. Ao longo da Segunda Guerra Mundial, aproximadamente 50.000 unidades do Kübelwagen (Type 82 e suas variantes) foram produzidas, desempenhando um papel crucial em diversas frentes de batalha. Sua capacidade de operar em condições extremas, aliada à facilidade de manutenção e produção, fez dele um dos veículos militares mais emblemáticos de sua época. O Kübelwagen não apenas superou as expectativas iniciais, mas também inspirou desenvolvimentos posteriores na indústria automotiva, consolidando a reputação da Volkswagen como uma marca de inovação e resiliência. Muito depois do fim da guerra, a Volkswagen ressuscitou o design básico de Kübelwagen com o modelo Type 181 em 1969, sendo este veículo, desenvolvido para as Forças Armadas Federais alemãs e mais tarde também produzido para o mercado civil. Embora semelhante em aparência e design, quase nenhuma peça foi intercambiável com o Type 82.
Emprego na Força Aérea Brasileira.
No início da Segunda Guerra Mundial, o governo norte-americano passou a considerar com extrema preocupação a possibilidade de uma invasão do continente americano pelas forças do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Essa ameaça tornou-se ainda mais evidente após a capitulação da França, em junho de 1940, pois, a partir desse momento, a Alemanha Nazista poderia estabelecer bases operacionais nas Ilhas Canárias, em Dacar e em outras colônias francesas, criando um ponto estratégico para uma eventual incursão militar no continente. Nesse contexto, o Brasil foi identificado como o local mais provável para o lançamento de uma ofensiva, devido à sua proximidade com o continente africano, que à época também figurava nos planos de expansão territorial alemã. Além disso, as conquistas japonesas no Sudeste Asiático e no Pacífico Sul transformaram o Brasil no principal fornecedor de látex para os Aliados, matéria-prima essencial para a produção de borracha, um insumo de extrema importância para a indústria bélica. Além dessas possíveis ameaças, a posição geográfica do litoral brasileiro mostrava-se estrategicamente vantajosa para o estabelecimento de bases aéreas e portos militares na região Nordeste, sobretudo na cidade de Recife, que se destacava como o ponto mais próximo entre os continentes americano e africano. Dessa forma, essa localidade poderia ser utilizada como uma ponte logística para o envio de tropas, suprimentos e aeronaves destinadas aos teatros de operações europeu e norte-africano. Diante desse cenário, observou-se, em um curto espaço de tempo, um movimento de aproximação política e econômica entre o Brasil e os Estados Unidos, resultando em investimentos estratégicos e acordos de cooperação militar. Entre essas iniciativas, destacou-se a adesão do Brasil ao programa de ajuda militar denominado Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), cujo principal objetivo era promover a modernização das Forças Armadas Brasileiras. Os termos desse acordo garantiram ao Brasil uma linha inicial de crédito de US$ 100 milhões, destinada à aquisição de material bélico, possibilitando ao país o acesso a armamentos modernos, aeronaves, veículos blindados e carros de combate. Esses recursos revelaram-se essenciais para que o país pudesse enfrentar as ameaças impostas pelos ataques de submarinos alemães, que intensificavam os riscos à navegação civil, impactando o comércio exterior brasileiro com os Estados Unidos, responsável pelo transporte diário de matérias-primas destinadas à indústria de guerra norte-americana. A participação brasileira no esforço de guerra aliado logo se ampliaria. A participação brasileira no esforço de guerra aliado logo se ampliaria. O então presidente Getúlio Vargas declarou que o Brasil não se limitaria ao fornecimento de materiais estratégicos e sinalizou a possibilidade de uma participação mais ativa envolvendo o possível envio de tropas brasileiras para algum teatro de operações de relevância.
Desde o início do conflito, as potências beligerantes dedicaram esforços minuciosos ao estudo de armas e equipamentos capturados ou abandonados nos campos de batalha. Essa análise meticulosa buscava não apenas identificar os pontos fortes e vulnerabilidades do armamento inimigo, mas também explorar inovações tecnológicas que poderiam ser incorporadas por meio de engenharia reversa. Nesse cenário, o Exército Brasileiro beneficiou-se amplamente de relatórios de inteligência fornecidos pelos Aliados, que detalhavam o material bélico do Eixo. Esses documentos foram essenciais para que o Brasil compreendesse as capacidades adversárias, fortalecendo sua preparação para os desafios de um conflito de escala global. A participação brasileira na guerra transcendeu o fornecimento de recursos estratégicos e a defesa de seu território; ela representou um compromisso com a modernização militar e uma integração profunda ao esforço aliado, consolidando o papel do país em um dos momentos mais críticos do século XX. Em novembro de 1943, as forças americanas, intrigadas pelo design singular e pela motorização do utilitário alemão Type 82 Kübelwagen, capturado durante as batalhas no norte da África, iniciaram um programa de testes detalhados. Essas avaliações foram conduzidas no Campo de Provas do Exército dos Estados Unidos, em Aberdeen, Maryland, culminando, em janeiro de 1944, na publicação do Manual Técnico do Departamento de Guerra TM E9-803. Este documento foi distribuído às tropas americanas envolvidas na Operação Overlord, o desembarque nas praias da Normandia em 6 de junho de 1944, conhecido como Dia D. O manual tinha como objetivo fornecer conhecimentos técnicos básicos aos soldados que, em campo, poderiam encontrar Kübelwagens abandonados – muitas vezes por falta de combustível ou pequenos problemas mecânicos – e, com orientações práticas, reativá-los para uso como veículos suplementares. Essa possibilidade era especialmente valiosa para unidades de paraquedistas, que dependiam de mobilidade rápida em terrenos hostis. O TM E9-803 era notavelmente abrangente, incluindo instruções detalhadas para manutenção em campo e até mesmo recomendações para operação em temperaturas extremamente baixas, demonstrando o cuidado dos Aliados em maximizar o aproveitamento de recursos capturados. Paralelamente, na Grã-Bretanha, um programa semelhante de avaliação foi conduzido pela Humber Car Company, utilizando um Kübelwagen também capturado no norte da África, após a derrota das forças de Erwin Rommel. Contudo, ao contrário da abordagem americana, o relatório britânico foi marcadamente crítico, subestimando o potencial do veículo e expressando desdém por suas características. Como resultado, as forças britânicas optaram por não empregar o Kübelwagen em operações, contrastando com a visão pragmática dos Estados Unidos.


Em Escala.
Para representarmos o Type 82 Kubelwagem "Brasileiro" empregamos o kit da Tamiya na escala 1/35, modelo de fácil montagem, porém com carência de detalhamentos. Para se representar a versão empregada pela 1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO), não há necessidade de se proceder nenhuma alteração. Fizemos uso de decais produzidos pela Decals e Books, presentes como complemento do livro " FEB na Segunda Guerra Mundial" de Luciano Barbosa Monteiro, adicionamos também uma bandeira brasileira em tecido para cobrir o estepe localizado da parte frontal.
Bibliografia :
- Livro "FEB na Segunda Guerra Mundial" de Luciano Barbosa Monteiro
- Volkswagen Kübelwagen - Wikipédia http://pt.wikipedia.org/wiki/Volkswagen_K%C3%BCbelwagen
- Um jipe chamado Caroço: o Kübelwagen dos brasileiros na Itália - EXTRA