História e Desenvolvimento.
A Douglas Aircraft Company, uma das mais influentes fabricantes de aeronaves dos Estados Unidos ao longo do século XX, foi fundada em 22 de julho de 1921, na cidade de Santa Mônica, Califórnia, pelo engenheiro aeronáutico Donald Wills Douglas, após a dissolução da Davis-Douglas Company. Desde seus primeiros anos, a empresa destacou-se pela capacidade de aliar rigor técnico, inovação e visão estratégica, fatores que a conduziriam à produção de algumas das aeronaves mais emblemáticas da aviação civil e militar. O início de sua trajetória no campo militar ocorreu já em 1922, com o desenvolvimento do Douglas DT, seu primeiro projeto destinado às forças armadas. Concebido como um bombardeiro-torpedeiro biplano para a Aviação Naval da Marinha dos Estados Unidos (U.S. Navy), o DT foi projetado para operar inicialmente a partir de navios de guerra e, posteriormente, de porta-aviões, lançando as bases conceituais da aviação embarcada de ataque naval, que se consolidaria nas décadas seguintes. Em 1923, a Douglas alcançou projeção internacional ao participar do ambicioso programa “World Flight”, promovido pelo Serviço Aéreo do Exército dos Estados Unidos (United States Army Air Service – USAAS), cujo objetivo era realizar a primeira circum-navegação aérea do globo. Para atender a essa missão inédita, a empresa desenvolveu o Douglas World Cruiser (DWC), uma versão profundamente modificada do Douglas DT, sob a liderança do talentoso engenheiro Jack Northrop. Quatro aeronaves foram encomendadas, sendo a última entregue em 11 de março de 1924. Apesar das severas dificuldades operacionais, incluindo acidentes e perdas de aeronaves ao longo da jornada, a missão foi concluída com êxito, consagrando a Douglas e originando o célebre lema corporativo “First Around the World”. Durante a década de 1930, a Douglas ampliou e diversificou significativamente seu portfólio, passando a atender às crescentes demandas por aeronaves de treinamento militar. Nesse contexto, desenvolveu a série BT (Basic Trainer) para o United States Army Air Corps (USAAC). O BT-2B, versão aprimorada do BT-2, incorporava melhorias no grupo motopropulsor e nos sistemas de controle, aumentando a confiabilidade, a segurança operacional e facilitando a manutenção. Embora de concepção simples, o BT-2B desempenhou um papel fundamental na formação de milhares de pilotos militares, funcionando como elo de transição entre o treinamento primário e as aeronaves táticas mais avançadas que começavam a entrar em serviço naquele período. Paralelamente, a empresa expandiu suas atividades para o desenvolvimento de aeronaves anfíbias e aviões de transporte de médio porte, transferindo suas principais instalações industriais para Clover Field, em Santa Mônica. Esse processo culminou, em 1933, no lançamento do Douglas DC-1, seguido pelo DC-2, em 1934. O verdadeiro marco, entretanto, ocorreu em 1935, com a introdução do Douglas DC-3, aeronave que revolucionou o transporte aéreo comercial ao estabelecer padrões inéditos de eficiência, confiabilidade e viabilidade econômica. Sua versão militar, o C-47 Skytrain, tornou-se um dos principais vetores logísticos da Segunda Guerra Mundial, notabilizando-se pela versatilidade e robustez em todos os teatros de operações.
Com a eclosão do conflito global, a Douglas Aircraft Company consolidou-se definitivamente como um dos pilares da indústria aeronáutica aliada. Operando múltiplas fábricas espalhadas pelos Estados Unidos, a empresa chegou a empregar mais de 160 mil trabalhadores no auge do esforço de guerra. Entre os modelos mais representativos produzidos nesse período destacam-se o A-20 Havoc, o SBD Dauntless, o DC-3 e, sobretudo, o C-47 Skytrain, cuja contribuição foi decisiva para o sucesso das operações aéreas e logísticas dos Aliados. Ao conjugar excelência técnica, inovação contínua e capacidade industrial em larga escala, a Douglas Aircraft Company afirmou-se como uma referência histórica na aviação mundial, deixando um legado duradouro tanto na esfera militar quanto na aviação civil. Em meados da década de 1930, o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (United States Army Air Corps – USAAC) passou a reconhecer, de forma cada vez mais clara, a urgência de modernizar sua frota de bombardeiros médios, então baseada no Martin B-10, aeronave que, apesar de inovadora no início da década, já se encontrava rapidamente superada pelos avanços tecnológicos da aviação mundial. Esse contexto levou o comando do Exército dos Estados Unidos (U.S Army) a lançar, em julho de 1934, uma concorrência formal destinada ao desenvolvimento de um novo bombardeiro médio, dotado de desempenho e alcance compatíveis com as exigências estratégicas emergentes. O edital estabelecia requisitos técnicos ambiciosos para a época. A aeronave deveria ser monoplana e bimotora, capaz de transportar até uma tonelada de carga útil, atingir velocidade máxima de 354 km/h a 3.000 metros de altitude, apresentar raio de ação superior a 3.218 km e possuir autonomia de missão superior a dez horas de voo. Tais parâmetros refletiam a crescente importância atribuída à projeção de poder aéreo, à flexibilidade operacional e à capacidade de atuação em longas distâncias. Diversas empresas aeronáuticas norte-americanas responderam ao chamado, apresentando propostas conceituais que refletiam diferentes filosofias de projeto. Entre as mais relevantes destacaram-se: Martin Model 146: Tratava-se de uma versão aperfeiçoada do Martin B-10. Embora representasse uma evolução incremental, foi rapidamente descartada por se apoiar em uma plataforma considerada tecnologicamente superada para os padrões pretendidos pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC). Boeing Model 299: Projeto altamente inovador, que daria origem ao futuro Boeing B-17 Flying Fortress. Apesar de seu notável potencial técnico, a proposta foi rejeitada em razão do custo elevado, considerado incompatível com as restrições orçamentárias então vigentes, e também em decorrência de um acidente fatal envolvendo o protótipo durante os voos de avaliação, fato que pesou negativamente na decisão final. Douglas DB-1 (Douglas Bomber 1): Desenvolvido pela Douglas Aircraft Company, este projeto destacou-se por oferecer uma solução equilibrada, combinando desempenho adequado, viabilidade técnica e custos compatíveis com as expectativas do USAAC. Por essas razões, foi selecionado para avançar no processo de avaliação.

O Douglas DB-1 foi concebido a partir da consagrada plataforma do Douglas DC-2, uma aeronave comercial amplamente reconhecida por sua confiabilidade e eficiência. A adaptação para uso militar envolveu modificações significativas, sem comprometer a robustez do projeto original. Entre suas principais características destacavam-se: Estrutura e concepção geral: O DB-1 manteve a configuração monoplana de asa baixa do DC-2, com asas e superfícies de cauda ligeiramente ampliadas. A fuselagem foi redesenhada para uma configuração de meia-altura, permitindo a instalação de um compartimento interno de bombas sob a seção central da aeronave. A estrutura apresentava seção circular, com um nariz arredondado e sem degraus, otimizado para a integração de um sistema de mira de bombardeio instalado na parte inferior. Armamento defensivo: A proteção defensiva era assegurada por três metralhadoras Colt M-2 calibre 7,62 mm, posicionadas no nariz, em uma torreta elétrica superior retrátil e em uma posição ventral, proporcionando cobertura básica contra ataques de aeronaves inimigas. A proposta da Douglas foi amplamente favorecida pela comissão avaliadora por reunir tecnologia comprovada, herdada do DC-2, com adaptações militares bem fundamentadas, atendendo de forma pragmática às necessidades operacionais do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC). Em contraste, a alternativa da Martin revelou-se limitada por sua base ultrapassada, enquanto a da Boeing, embora promissora, mostrou-se financeiramente e circunstancialmente inviável naquele momento. Dessa forma, em setembro de 1934, a Douglas Aircraft Company foi oficialmente declarada vencedora da concorrência promovida pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), sendo selecionada para o desenvolvimento do novo bombardeiro médio que marcaria uma etapa decisiva na evolução da aviação militar norte-americana. Em setembro de 1934, a Douglas Aircraft Company formalizou um contrato de grande envergadura com o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (United States Army Air Corps – USAAC), prevendo a construção de duas aeronaves de pré-produção do novo bombardeiro médio, então designado Douglas B-18, além de 133 unidades iniciais de série, com um compromisso total que poderia alcançar 370 aeronaves. Esse acordo refletia a confiança depositada pelo USAAC na proposta da Douglas, considerada tecnicamente sólida e economicamente viável para atender às necessidades estratégicas do período. O voo inaugural da primeira aeronave de pré-produção ocorreu em 1º de abril de 1935, dando início a um rigoroso programa de ensaios e avaliações em voo. Durante essa fase, verificou-se que os motores originalmente especificados, os Wright R-1820-G45 Cyclone, com potência de 850 hp, não ofereciam desempenho compatível com os requisitos operacionais estabelecidos. Como resposta a essa limitação, a Douglas optou por substituir esses propulsores, na linha de produção, pelos mais potentes Curtiss-Wright R-1820-45, capazes de desenvolver 930 hp cada.
Essa alteração permitiu melhorias sensíveis no desempenho geral da aeronave. Com os novos motores, o B-18 passou a atingir velocidade máxima de aproximadamente 350 km/h, um alcance da ordem de 3.000 km, teto de serviço de cerca de 3.700 metros e uma capacidade de carga ofensiva de até 2.200 kg de bombas, parâmetros considerados adequados para um bombardeiro médio da segunda metade da década de 1930. As primeiras unidades de produção do Douglas B-18 começaram a ser entregues às unidades operacionais do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) em janeiro de 1937. A partir desse momento, a aeronave consolidou-se como o principal bombardeiro de longo alcance do arsenal norte-americano, desempenhando papel central na aviação de bombardeio dos Estados Unidos até a introdução de modelos mais modernos no final da década. Em maio de 1938, teve início a produção de uma versão aperfeiçoada, designada Douglas B-18A. Essa variante incorporava motores Wright R-1820-53, com potência de 1.000 hp, além de modificações estruturais no nariz da aeronave, que passaram a oferecer melhor integração do visor de bombardeio e uma área envidraçada ampliada, favorecendo a precisão nas missões de ataque. Até o final de 1938, 217 unidades do B-18A haviam sido entregues, em estrita conformidade com o cronograma contratual estabelecido com o USAAC. Durante sua vida operacional, o B-18 também serviu como plataforma experimental para diferentes conceitos táticos e tecnológicos. Uma de suas células foi equipada, em caráter de teste, com um canhão de 75 mm, destinado a avaliar a viabilidade de ataques diretos contra alvos terrestres e navais fortificados. Embora essa configuração tenha sido considerada operacionalmente inviável naquele momento, os ensaios forneceram dados valiosos que influenciariam projetos posteriores, em especial variantes especializadas do North American B-25 Mitchell. Outro marco relevante ocorreu em janeiro de 1940, quando o B-18 foi empregado no primeiro teste de operação aerotransportada do Exército dos Estados Unidos (U.S Army). Na ocasião, 38 aeronaves do 7º Grupo de Bombardeio transportaram um batalhão de tropas, estabelecendo um precedente importante para o desenvolvimento da doutrina de emprego de forças aerotransportadas, que ganharia grande relevância durante a Segunda Guerra Mundial. Paralelamente aos contratos firmados com o governo norte-americano, a Douglas Aircraft Company passou a enxergar o mercado de exportação como uma oportunidade estratégica. A empresa lançou uma campanha de promoção do B-18 junto a potenciais clientes europeus, iniciando negociações com a Royal Air Force (RAF). Contudo, essas tratativas não prosperaram, em razão do compromisso britânico com a aquisição do Lockheed A-28 Hudson. Apesar desse revés, a Douglas obteve êxito ao exportar 20 aeronaves adaptadas para a Real Força Aérea Canadense (Royal Canadian Air Force – RCAF), onde passaram a operar sob a designação Douglas Digby Mk.I, ampliando a presença internacional do modelo e reforçando sua relevância histórica.
Em 7 de dezembro de 1941, o ataque surpresa do Império do Japão às bases norte-americanas em Pearl Harbor, Havaí, resultou na destruição da maioria das 33 aeronaves Douglas B-18A estacionadas no Campo Hickam, atingidas no solo. Esse evento acelerou a substituição dos B-18A pelos bombardeiros Boeing B-17A e B-17B, que superaram a aeronave da Douglas Aircraft Company, vencedora da concorrência contra o protótipo do B-17 em 1935. Ainda em dezembro de 1941, outras 12 células do B-18 foram destruídas em solo durante ataques japoneses ao Campo Clark, nas Filipinas. As aeronaves Douglas B-18 remanescentes no continente norte-americano foram redistribuídas para os 7º, 5º, 19º e 2º Grupos de Bombardeio, além dos 38º e 21º Esquadrões de Reconhecimento. Contudo, ficou evidente que o B-18 estava obsoleto e inadequado para enfrentar caças de alta performance alemães, italianos e japoneses. Dadas essas limitações, o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) restringiu seu uso a missões locais, proibindo sua transferência para teatros de operações ativos. Devido à sua limitada capacidade de autodefesa, o Douglas B-18 Bolo foi inicialmente empregado em missões de treinamento, formando tripulações para os novos bombardeiros Boeing B-17 e Consolidated B-24 Liberator. Essa transição refletiu a inadequação do B-18 para operações de combate em cenários de alta intensidade. Com o intensificar da Batalha do Atlântico e a ameaça de submarinos alemães ao litoral norte-americano, o USAAC e a Marinha dos Estados Unidos (US Navy) enfrentaram escassez de aeronaves de patrulha marítima. O Douglas B-18 Bolo, com sua grande autonomia e capacidade de carga, incluindo cargas de profundidade, revelou-se ideal para essa função. A partir de janeiro de 1942, 122 células foram convertidas para missões de patrulhamento marítimo, recebendo a designação Douglas B-18B. Essas aeronaves foram equipadas com um radar de busca Western Electric SCR-517-T4 no nariz e um sistema de detecção de anomalias magnéticas. O Douglas B-18B teve seu batismo de fogo em 2 de outubro de 1942, quando uma aeronave do 99º Grupo de Bombardeio, em patrulha ao largo da costa de Caiena, Guiana Francesa, avistou o submarino alemão U-512 (Tipo IXC). O B-18B atacou, lançando cargas de profundidade que resultaram no afundamento do submarino, demonstrando a eficácia da aeronave nessa nova função. A partir de meados de 1943, os Douglas B-18B começaram a ser gradualmente substituídos pelos quadrimotores Consolidated PBJ-24 Liberator em missões de patrulha marítima. Relegados a tarefas de treinamento multimotor e transporte, os B-18B foram completamente retirados do serviço ativo ao final da Segunda Guerra Mundial, com todas as células remanescentes sendo sucateadas. Embora obsoleto para missões de bombardeio, o Douglas B-18 encontrou uma nova utilidade na patrulha marítima, contribuindo significativamente para a defesa do litoral norte-americano durante a Batalha do Atlântico. Sua trajetória reflete a capacidade da Douglas Aircraft Company de adaptar suas aeronaves a contextos emergentes, mesmo diante de limitações tecnológicas e operacionais.Emprego na Força Aérea Brasileira.
No início da Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos passou a encarar com crescente apreensão a possibilidade de uma ofensiva do Eixo contra o continente americano. Essa preocupação intensificou-se de forma decisiva após a capitulação da França, em junho de 1940, evento que abriu a perspectiva de a Alemanha nazista estabelecer bases aéreas e navais em territórios coloniais franceses, como Dacar, no Senegal, e, potencialmente, nas Ilhas Canárias, ampliando de maneira significativa o raio de ação das forças do Eixo no Atlântico. Nesse contexto estratégico, o Brasil foi rapidamente identificado como um dos pontos mais sensíveis da defesa hemisférica, sobretudo em razão de sua proximidade geográfica com o continente africano, região que figurava nos planos de expansão e influência alemães. A situação tornava-se ainda mais crítica diante das conquistas japonesas no Sudeste Asiático e no Pacífico Sul, que comprometeram o acesso dos Aliados às tradicionais fontes de borracha natural. Como consequência, o Brasil assumiu um papel central como principal fornecedor de látex, matéria-prima essencial para a indústria bélica, indispensável à produção de pneus, vedações e inúmeros componentes militares. A posição geográfica brasileira, em especial o litoral do Nordeste, com destaque para a região de Recife, revelou-se de valor estratégico inestimável. Tratava-se do ponto mais estreito entre os continentes americano e africano, condição que favorecia o estabelecimento de bases aéreas, portos militares e centros logísticos. Essas infraestruturas tornaram-se fundamentais para o translado de tropas, suprimentos e aeronaves destinados aos teatros de operações da Europa e do Norte da África, funcionando como uma verdadeira ponte aérea e marítima no esforço de guerra aliado. Diante desse cenário, verificou-se uma rápida e progressiva aproximação política, econômica e militar entre o Brasil e os Estados Unidos, culminando na assinatura de acordos de cooperação estratégica e em vultosos investimentos em infraestrutura e defesa. Um dos marcos mais relevantes desse processo foi a adesão do Brasil ao Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), programa de assistência militar criado pelo governo norte-americano com o objetivo de fortalecer as nações aliadas. Por meio desse acordo, o Brasil passou a dispor de uma linha de crédito inicial da ordem de US$ 100 milhões, destinada à modernização de suas Forças Armadas, então marcadas por severa obsolescência em termos de equipamentos, armamentos e doutrina operacional. Esses recursos possibilitaram a aquisição de aeronaves modernas, veículos blindados, carros de combate e sistemas de apoio, elementos essenciais para enfrentar a crescente ameaça representada pelos submarinos alemães e italianos, responsáveis por intensificar os ataques à navegação civil e militar no Atlântico Sul. Tais ações impactavam diretamente o comércio exterior brasileiro e o fluxo de matérias-primas estratégicas destinadas à indústria bélica norte-americana.
Nesse período, a Força Aérea Brasileira (FAB), oficialmente criada em 20 de janeiro de 1941, herdou um parque aéreo heterogêneo e tecnicamente ultrapassado, oriundo da antiga Aviação Militar do Exército Brasileiro e da Aviação Naval da Marinha do Brasil. Grande parte dessas aeronaves mostrava-se inadequada para enfrentar ameaças contemporâneas, especialmente no que se referia às missões de patrulha marítima e guerra antissubmarino. Mesmo os modelos mais modernos então disponíveis na FAB, como os Vultee V-11, North American AT-6B, Vought V-65B Corsair e os bimotores Focke-Wulf Fw 58 Weihe, revelaram-se insuficientes para operações prolongadas sobre o mar, carecendo de autonomia, sensores e armamentos adequados para o combate eficaz contra submarinos do Eixo. Nesse contexto, o Lend-Lease Act assumiu papel decisivo não apenas no fornecimento de aeronaves mais apropriadas, mas também na atualização da doutrina operacional, permitindo que a Força Aérea Brasileira (FAB), se estruturasse para a defesa do litoral brasileiro e para uma contribuição efetiva ao esforço de guerra dos Aliados no Atlântico Sul. Essas atribuições assumiam caráter vital para o esforço de guerra nacional, sobretudo no enfrentamento à crescente ameaça representada pelos submarinos alemães e italianos, responsáveis por sucessivos ataques à navegação civil e militar ao longo do litoral brasileiro. A limitação dos meios disponíveis evidenciou, de forma inequívoca, a necessidade de um programa emergencial de modernização dos recursos aéreos da Força Aérea Brasileira (FAB), com ênfase nas missões de patrulha marítima e guerra antissubmarino. Na fase inicial de sua atuação durante o conflito, a FAB restringiu-se essencialmente a voos de presença e vigilância costeira, cuja finalidade principal era demonstrar soberania e acompanhar o tráfego marítimo nas águas jurisdicionais brasileiras. Essa realidade começou a se transformar de maneira gradual no início de 1942, quando, sob o efeito combinado de incentivos econômicos e pressões diplomáticas internacionais, o governo brasileiro autorizou o emprego de bases aéreas nacionais por unidades de patrulha da Marinha dos Estados Unidos (US Navy). Tal decisão representou um marco decisivo, pois possibilitou os primeiros confrontos efetivos contra submarinos do Eixo, operações acompanhadas de perto por oficiais brasileiros, que passaram a observar e assimilar as táticas, técnicas e procedimentos empregados pelas forças norte-americanas. A busca por uma solução estrutural para as deficiências operacionais brasileiras começou a se concretizar por intermédio da Comissão de Compras de Material Aeronáutico, instalada em Washington, D.C.. Essa comissão tinha como missão identificar, selecionar e viabilizar a aquisição de aeronaves modernas no âmbito do Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), priorizando modelos capazes de atender às necessidades imediatas de patrulha marítima e combate antissubmarino impostas pelo cenário estratégico do Atlântico Sul.

A partir de abril de 1942, a Força Aérea Brasileira (FAB) passou a receber os primeiros resultados desse esforço, com a incorporação de diversas aeronaves militares, entre as quais se destacavam dois bombardeiros Douglas B-18 Bolo, transladados ao Brasil por tripulações norte-americanas. Após sua chegada, essas aeronaves foram destinadas ao Agrupamento de Aviões de Adaptação (AAA), unidade criada em 4 de fevereiro de 1942, na cidade de Fortaleza, Ceará. O AAA, operando sob a supervisão direta de militares do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), tinha como objetivo central a transferência de doutrina operacional e a capacitação acelerada de tripulações brasileiras, preparando-as para o emprego real em missões de combate. No âmbito do Agrupamento de Aviões de Adaptação (AAA), os Douglas B-18 Bolo foram inicialmente empregados tanto na instrução prática das tripulações nacionais quanto em missões efetivas de patrulhamento marítimo, cobrindo áreas litorâneas dos estados do Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte. Durante os primeiros meses do envolvimento brasileiro no conflito, essas aeronaves operaram com tripulações mistas, formadas por militares norte-americanos experientes e aviadores brasileiros em fase final de formação operacional. Esse arranjo visava assegurar a rápida e segura assimilação das táticas de patrulha e guerra antissubmarino, com a perspectiva de que o AAA fosse desativado tão logo as tripulações brasileiras alcançassem plena autonomia operacional. Concluído o período de adaptação e treinamento, os dois Douglas B-18 Bolo foram redistribuídos às unidades regulares da FAB. A aeronave Douglas B-18 Bolo “FAB 6300” foi incorporada ao Grupo de Aviões Bimotores (GAB), sediado na Base Aérea de Natal, no Rio Grande do Norte, enquanto o Douglas B-18 Bolo “FAB 7032” foi destinado ao Grupo de Aviões Bimotores (GAB) baseado em Recife, Pernambuco. Essa redistribuição representou um passo importante na consolidação da capacidade brasileira de patrulha aérea e defesa do litoral, marcando a transição da Força Aérea Brasileira (FAB) de uma força essencialmente observadora para uma estrutura progressivamente apta ao combate no Atlântico Sul.,Equipadas com visores de bombardeio Stopey D-8 e derivômetros B-3, essas células careciam de meios eletrônicos avançados, como os radares Western Electric SCR-517-T4 ou detectores de anomalias magnéticas (MAD). Diferentemente das versões especialmente configuradas para a guerra antissubmarino em serviço no Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), os Douglas B-18 Bolo da Força Aérea Brasileira (FAB) operavam com capacidade de detecção restrita exclusivamente à observação visual, o que limitava significativamente sua eficácia na vasta área marítima sob sua responsabilidade. No tocante ao armamento ofensivo, os B-18 Bolo empregavam cargas de profundidade MK-17 Mod 1, fornecidas diretamente pelos estoques da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) já existentes em território brasileiro.
Essa dependência logística perdurou até que a Base Aérea de Fortaleza fosse devidamente equipada para o armazenamento e a manutenção desse tipo de munição, bem como de outros artefatos utilizados pela Aeronáutica. Progressivamente, as operações de patrulha marítima passaram a ser reforçadas com a incorporação dos primeiros North American B-25B Mitchell e, pouco depois, de aeronaves especificamente concebidas para esse tipo de missão, como os Lockheed A-28A Hudson, o que ampliou de forma sensível a capacidade operacional no Atlântico Sul. O primeiro registro de um ataque realizado por um Douglas B-18 contra um submarino inimigo ocorreu em 8 de maio de 1943, às 12h10, no litoral de Maceió, Alagoas. A aeronave “FAB 6300”, pertencente ao Grupo de Aviões Bimotores (GAB), sediado na Base Aérea de Natal, era tripulada pelo 1º Tenente-Aviador Zamir de Barros Pinto, pelo Aspirante-Aviador Geraldo Labarthe Lebre e pelos Sargentos Castro e Jayme. Durante a missão, a tripulação avistou o submarino alemão U-154 (Tipo IX), que havia atacado, às 05h45 do mesmo dia, o navio-tanque mercante norte-americano Motorcarline. Ao perceber a aproximação da aeronave brasileira, o submarino efetuou uma manobra de mergulho de emergência. O B-18 lançou duas cargas de profundidade e uma carga de instrução, que explodiram à frente da esteira de espuma deixada pela embarcação submersa, provocando o surgimento de uma extensa mancha de óleo na superfície do mar. A aeronave permaneceu em órbita sobre o local por cerca de uma hora, porém não foi possível confirmar o afundamento do submarino. Nesse mesmo período, ficou estabelecido que a Força Aérea Brasileira (AB) deveria assumir uma parcela cada vez mais significativa das atividades de patrulhamento marítimo e guerra antissubmarino em seu mar territorial. Essa transição foi viabilizada pela chegada de um número crescente de aeronaves especializadas, como os Lockheed PV-1 Ventura, Consolidated PBY-5A Catalina e, posteriormente, os Lockheed PV-2 Harpoon. Ainda assim, duas células do Douglas B-18 Bolo permaneceram em operação, executando missões de patrulha marítima e guerra antissubmarino até o encerramento do conflito, demonstrando a importância residual do modelo mesmo diante de suas limitações tecnológicas. Com o término do conflito, em maio de 1945, os dois Douglas B-18 Bolo, então concentrados na Base Aérea de Recife, em Pernambuco, passaram a ser empregados predominantemente em missões de treinamento e transporte. Registra-se que, em algum momento daquele ano, uma das células foi temporariamente transferida para o Parque de Aeronáutica dos Afonsos (PAMAAF), no Rio de Janeiro, onde operou como aeronave orgânica da unidade. Em julho de 1945, o Ministério da Aeronáutica (MAer) instituiu um novo sistema de matrículas de quatro dígitos para suas aeronaves. Nesse contexto, os Douglas B-18 Bolo receberam as novas designações FAB 5026 (anteriormente 6300) e FAB 5027 (anteriormente 7032), encerrando simbolicamente o ciclo operacional de um dos primeiros bombardeiros empregados em missões reais de combate no Atlântico Sul.
Em 18 de outubro de 1946, a Diretoria de Material da Aeronáutica (DIRMA) determinou a transferência das aeronaves Douglas B-18 Bolo, matrículas FAB 5026 e FAB 5027, para o Parque de Aeronáutica de São Paulo (PASP), com o objetivo de utilizá-las em missões de transporte. Contudo, ambas as células apresentavam significativo desgaste estrutural decorrente de seu uso intensivo durante a Segunda Guerra Mundial, comprometendo sua operacionalidade. FAB 5026: Considerada inapta para o voo até São Paulo, a aeronave foi desativada em 10 de fevereiro de 1947 pelo Núcleo do Parque de Aeronáutica de Recife (NuPARF). A célula foi desmontada para aproveitamento de peças, e sua estrutura foi sucateada. FAB 5027: Translada com êxito ao PASP, a aeronave passou por uma revisão estrutural que confirmou seu avançado estado de deterioração, levando à decisão de sua desativação. Em vez de ser alienada, foi destinada à Escola Técnica de Aviação (ETAv), no bairro da Mooca, São Paulo. Desmontada e transportada por caminhões, a célula passou a ser utilizada como ferramenta de instrução prática para os alunos da instituição. A Força Aérea Brasileira (FAB) recebeu uma terceira célula, pertencente à versão Douglas B-18A, que se diferenciava das anteriores por contar com motores Wright R-1820-53 mais potentes e uma estação de bombardeio realocada. Essa aeronave foi transladada em voo de San Antonio, Texas, Estados Unidos, partindo em 8 de agosto de 1944 e chegando ao Rio de Janeiro em 16 de agosto. Apesar de estar em condições de voo, a célula foi classificada pela Força Aérea do Exército dos Estados Unidos (USAAF) como “War Weary” (cansada de guerra), sendo inadequada para operações intensivas de combate. Assim, foi destinada ao 1º Grupo Misto de Instrução (1º GMI) da Escola Técnica de Aviação (ETAv), em São Paulo, onde foi empregada em atividades de instrução no solo para os alunos do Curso de Formação de Sargentos Especialistas. Em fevereiro de 1945, uma quarta aeronave Douglas B-18 foi cedida à FAB, também destinada a atividades de instrução no solo. Contudo, durante o voo de translado para o Brasil, a aeronave sofreu uma pane que obrigou a tripulação a realizar um pouso de emergência em uma praia a poucos quilômetros ao sul de San José, Guatemala. Embora o pouso tenha causado danos mínimos, a chegada da maré cheia ao entardecer danificou irreparavelmente a célula, inviabilizando sua recuperação. Com a chegada da terceira célula, a ETA, localizada no Hipódromo da Mooca, São Paulo, passou a contar com duas aeronaves Douglas B-18 (FAB 5027 e a B-18A) para fins educacionais. Em 1949, uma dessas aeronaves foi desmontada e sucateada, reduzindo o número de células ativas na instituição. Com a fusão de recursos materiais e humanos da ETA com a Escola de Especialistas de Aeronáutica (EEAr), em Guaratinguetá, São Paulo, a última célula remanescente do Douglas B-18 foi transferida para as novas instalações. Alguns anos depois, provavelmente com a chegada de múltiplas células do recém-desativado Douglas A-20K, o último Douglas B-18 foi sucateado, marcando o fim de sua utilização no Brasil.Em Escala.
Para representar o Douglas B-18 Bolo, matrícula “FAB 7032”, foi utilizado o kit da Special Hobby na escala 1/72. Este modelo, caracterizado por detalhes em baixo relevo, oferece um elevado nível de detalhamento, incluindo peças em resina e componentes photo-etched. Sua concepção permite uma montagem fácil e rápida, atendendo às expectativas de modelistas que buscam precisão e qualidade. Foram empregados os decais originais fornecidos com o kit. No entanto, foi necessária a correção dos cocares da FAB aplicados na fuselagem, uma vez que os decais do modelo apresentavam incorreções. Na aeronave real, o cocar nacional era sobreposto à estrela do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), detalhe que exigiu ajustes para garantir a fidelidade histórica da representação.
O esquema de cores (FS) descrito a seguir corresponde ao padrão de pintura original adotado pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) para o Douglas B-18 Bolo. Este mesmo padrão foi mantido pela Força Aérea Brasileira (FAB) durante toda a operação da aeronave, até sua retirada de serviço. Destaca-se que, no final de sua carreira operacional, a célula em questão passou a portar a matrícula “FAB 5027”. Essa mudança decorreu da implementação de um novo sistema de marcações adotado pelo Ministério da Aeronáutica (MAer) em julho de 1945, que introduziu matrículas de quatro dígitos para as aeronaves brasileiras.
Bibliografia:
- Bombardeiros Bimotores da FAB, Aparecido Camazano Alamino - C&R Editorial
- História da Força Aérea Brasileira, Prof Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html
- B-18 o Primeiro Grande da FAB – Revista Asas Nº 3
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 - 2015 - Jackson Flores Junior





