L-4H-PI Piper Grasshoper no Brasil

História e Desenvolvimento.
A origem desta vasta linhagem de aeronaves leves de ligação transporte e instrução, de grande sucesso mundial tanto no mercado civil como militar, tem início em 1927 com a fundação da empresa Taylor Brothers Aircraft Manufacturing. Apresentando como primeiro produto de destaque o Taylor Cub, um pequeno avião biplace de asa alta cuja produção foi iniciada em 1931 atingindo a cifra de mais quatro mil aeronaves produzidas. Em dezembro de 1937, está pujante empresa passaria a ser renomeada como Piper Aircraft Company, e rapidamente sua marca se tornaria sinônimo de aeronaves leves de treinamento e transporte, com suas vendas sempre se baseando na casa milhares de células entregues ao mercado civil. O primeiro modelo a ser lançado foi o Piper J-2, com os modelos J-2E, J-2F, J-2G e J-2H, totalizando até 1938 a impressionante cifra de um mil e duzentas aeronaves entregues ao mercado. A próxima versão a ser produzida seria a Piper J-3 uma aeronave melhorada, que contava agora com o emprego de um motor melhor, desenvolvendo 50 cv de potência, como diferencial competitivo mantinha a mesma excelente relação de custo-benefício, apresentando como preço de venda ao consumidor final de apenas US$ 1.000,00 a aeronave. A simplicidade e a robustez do projeto lhe permitiam operar em aeroportos com baixa infraestrutura de apoio com baixo custo operacional. Estas qualidades e atributos levariam a celebração muitos de contratos de exportação para o mundo todo, encontrando um farto mercado nos países em desenvolvimento. Inicialmente suas aeronaves eram exportadas em kits,  sendo montadas nos países de destino, logo em seguida o fabricante começou a negociar os direitos de licença de produção local, permitindo a inclusão de um percentual de componentes produzidos localmente.

Em fins da década de 1930 era cada vez mais claro que o mundo seria arrastado para um novo conflito de ordem mundial, com as tensões se agravando dia a dia na Europa com os desejos expansionistas da Alemanha nazista e no Pacífico Central com o Império do Japão. Este provável cenário levaria o governo norte-americano a mobilizar esforços e investimentos em um vasto programa de rearmamento, passando envolver uma série de indústrias estratégicas no atendimento desta demanda, entre elas a Piper Aircraft Company, que passaria a produzir componentes para diversos equipamentos e sistema de defesa. Em setembro de 1939 a invasão da Polônia pelas forças armadas alemãs, tornaria emergencial não só produzir armas e equipamentos, mas também dispor de pessoal adequado para operar e manutenir, com o cenário mais prioritário focado nas armas aéreas da marinha e do exército. Para atender a esta demanda seria criado no país o Programa Civil de Treinamento de Pilotos (CPTP Civilian Pilot Training Program), e para equipar esta iniciativa seria decido na fase de instrução primária, empregar as aeronaves Piper J3L-65 Cub que estavam equipadas com o novo motor Lycoming O-145-B1 de 65hp. Esta iniciativa seria mantida até fins de 1944, chegando a formar um total de mais de quatrocentos mil pilotos militares. No entanto o baixo custo de aquisição e operação já haviam despertado o interesse do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) que buscava neste período uma aeronave leve destinada a missões de ligação e observação no campo de batalha, que dentre inúmeras atividades poderia ser empregada ainda em tarefas de vigilância de fronteira.
Assim uma concorrência seria lançada, e para atendimento a esta demanda, a Piper Aircraft Company apresentaria ao comando do Exército Americano (US Army) o modelo J3-O59, sendo esta aeronave era mecanicamente idêntica a versão civil, sendo distinguível sesta, apenas pela utilização de uma claraboia em plexiglas com efeito de estufa e janelas traseiras maiores, para melhor visibilidade. No processo de análise dos concorrentes, a balança penderia para o lado da Piper Aircraft Company, gerando o primeiro contrato de compra de quatro unidades do modelo Piper J3C-65, que foram designados pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) como YO-59. Em novembro de 1941 uma nova encomenda seria feita, agora abrangendo quarenta células que foram redesignados como Piper L-4-PI, estas novas aeronaves incorporavam uma série de modificações que os adaptavam as tarefas militares, como painéis transparentes na seção central da asa e equipamento de rádio. Assim que. As primeiras unidades a entrarem em serviço passaram a ostentar a designação militar O-59, com o “O” indicando a tarefa de observador, nesta missão embarcava-se junto com o piloto um observador equipado com radio a fins de se comunicar com o pessoal em solo para a correção de disparos de artilharia. Antes dos Estados Unidos entrarem na Segunda Guerra Mundial, os J-3 faziam parte de um programa de angariação de fundos para apoiar o Reino Unido. Anunciado como Flitfire, um Piper Cub J3 com as insígnias da Força Aérea Real (Royal Air Force) foi doado por W. T. Piper e Franklin Motors ao Fundo Benevolente da força aérea para ser sorteado. Os distribuidores da Piper Aircraft Company em todo o país foram incentivados a fazer o mesmo, resultando em mais quarenta e oito aeronaves doadas rapidamente. No entanto o modelo seria logo adotado pelo governo mexicano para o emprego em sua força aérea, representando assim o primeiro cliente de exportação da aeronave. 

A partir de abril de 1942 a aeronave seria redesignada como L-4 classificando a como aeronave de ligação, posteriormente o modelo receberia seu nome de batismo como Grasshoper. A aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) viria a ser o terceiro operador militar da aeronave, celebrando em 1942 um contrato para a aquisição de duzentas e cinquenta aeronaves distribuídas entre as variantes NE-1 e NE-2. Já em combate nos teatros de operações do Pacífico e Europa os L-4 além de serem empregados em missões de ligação e regulagem de tiro de artilharia, passaram a ser imbuídos em tarefas de transporte leve e evacuação médica. Durante a invasão aliada da França em junho de 1944, observou-se a tendência para o emprego da aeronave em missões de observação do campo de batalha, se tornado rapidamente a plataforma ideal para observação e detecção de veículos blindados alemães escondidos, pois sua baixa velocidade de cruzeiro e alta manobrabilidade o permitiam orbitar extensas áreas do campo de batalha. Para esta missão as aeronaves eram equipadas com um sistema de rádio que era operado por um segundo tripulante que também realizava a tarefa de observador. Curiosamente algumas células chegaram a ser equipadas com prateleiras para o transporte de bazucas, operando em duplas ou quartetos, abastecendo as tropas de infantaria aliadas na linha de frente para o ataque aos tanques alemães. O mais celebre destes L-4 configurados como aviões de apoio as tropas de, foi o “Rosie The Rocketeer”, pilotado pelo Major. Charles "Bazooka Charlie" Carpenter, a qual  foram creditados com a eliminação de seis tanques inimigos e vários carros blindados durante o seu serviço, especialmente durante a batalha de Arracourt no interior da França entre 18 e 29 de setembro de 1944.
Sua produção foi descontinuada somente em 1947, sendo entregues um total de 19.888 células, salientando que nos estágios emergências durante a Segunda Guerra Mundial, sua produção havia atingido a cadência de uma aeronave a cada 20 minutos. No período pós-guerra os L-4 foram extensivamente pela Força Aérea Americana (USAF) e pela Força Aérea da Coreia do Sul (Daehanminguk Gong-gun), atuando nas mesmas missões de regulagem de tiro de artilharia, remoção aero médica, reconhecimento do campo de batalha e controle aéreo avançado. Também neste período, centenas de aeronaves foram classificadas como excedentes de guerra e transferidas a nações como Tailândia e a França que empregariam versões destas aeronaves durante a Guerra da Algéria em 1953. A maioria das aeronaves no entanto seriam transferidas para o mercado civil onde se mantiveram e voo pelo menos até fins da década de 1960. Atualmente ainda é possível encontrar dezenas de aeronaves em condições de voo ao redor do mundo.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil passaria a representar no cenário global, uma posição de destaque estratégica dentro do contexto do conflito, representando um importante fornecedor de matérias primas estratégicas (borracha, metais e alimentos). Sendo detentor ainda, de um vasto território continental com pontos estratégicos, extremamente propícios em seu litoral nordeste, para o estabelecimento de bases aérea e operações portuárias. Esta localização privilegiada, representava o ponto mais próximo entre o continente Americano e Africano, assim desta maneira a costa brasileira, seria fundamental como ponto de partida para o envio de tropas, veículos, suprimentos e aeronaves para emprego no teatro europeu. Como contrapartida no intuito de se promover a modernização das Forças Armadas Brasileiras, que neste período estavam a beira da obsolescência em materiais, quando de doutrina militar (pois havia grande influência francesa no meio militar brasileiro pois por muitos anos o pais ainda era signatárias da doutrina militar francesa que fora desenvolvida durante a Primeira Guerra Mundial. E neste contexto o país, passaria a ser agraciado com diversas contrapartidas comerciais e militares, e neste último aspecto sendo submetido a um completo processo de modernização não só em termos de doutrina operacional, mas também em termos de armamentos e equipamentos militares norte-americanos de última geração. A adesão do Brasil ao programa Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos), criaria ao país uma linha de crédito da ordem de US$ 100 milhões de dólares, destinados a aquisição de material bélico, proporcionando acesso a modernos armamentos, aeronaves, navios, veículos blindados e carros de combate. Estes materiais e equipamentos seriam vitais para que o país pudesse estar capacitado para fazer frente as ameaças do Eixo que se apresentavam no Atlântico Sul e no futuro front de batalha brasileiro nos campos da Itália.

No início de 1944 seria definido que o esforço de guerra brasileiro compreenderia além do envio de tropas, duas unidades de aviação, sendo uma delas dedicada a ligação e observação para atuação em apoio as unidades do Exército Brasileiro. Para atender a esta demanda seria criada em 20 de julho de 1944 a 1º ELO (Esquadrilha de Ligação e Observação) que tinha como objetivo apoiar a unidade de Artilharia Divisionária da Força Expedicionária Brasileira (FEB), atuando desta maneira em missões de ligação, observação e regulagem de tiro. A fim de atender a esta demanda seria criada em 20 de julho de 1944 a 1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO) que tinha como objetivo apoiar a unidade de Artilharia Divisionária da Força Expedicionária Brasileira (FEB). Para equipar esta nova unidade foi definido o fornecimento nos termos do Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos), dez células do modelo Piper L-4H-PI. Curiosamente o primeiro Grasshoper a ser recebido pela Força Aérea Brasileira, seria o segundo protótipo do YO-59 que foi designado como Piper L-4-PI, com esta aeronave sendo entregue em 1943 no Brasil para ser empregada como aeronave de instrução em solo na Escola Técnica de Aviação (ETAv). A 1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO) seria formada inicialmente com onze pilotos, sendo todos oficiais oriundos da reserva da Força Aérea Brasileira, os treinamentos para as missões de observação foram realizados em conjunto com oficiais do Exército Brasileiro no estande de tiro de Gericinó no Rio de Janeiro, onde foram praticados exercícios de observação durante a realização de tiros de artilharia. Vale citar como fato curioso que as aeronaves empregadas nesta fase eram os Fairchild PT-19 que não dispunham de cabine fechada nem de rádio, sendo este último equipamento vital para a realização das missões reais no teatro europeu.
Todo o contingente da 1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO), formado por trinta e cinco homens, embarcou para a Itália no dia 22 de setembro e 1944, foram transportados juntamente em navios de transporte de tropas militares da Marinha Americana (US Navy), juntamente com o 2º e 3º Escalões da Força Expedicionária Brasileira (FEB). A chegada na Itália no porto de Nápoles se daria em 06 de outubro do mesmo ano, empreendendo uma viagem terrestre até Livorno. As dez células brasileiras do modelo Piper L-4H Grasshoper foram recebidas desmontadas no campo aéreo San Rossere, perto da cidade de Pisa, e seriam logo montadas pelos mecânicos do esquadrão brasileiro, recebendo as matrículas de FAB 01 a 10, mantendo inicialmente as insígnias da Força Aérea Americana (USAF), posteriormente receberam os cocares da Força Aérea Brasileira (FAB) nas laterais mantendo as marcações americanas nas asas para facilitar a identificação das tropas aliadas. Deslocada para perto da frente de batalha, a 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO) realizaria a primeira missão real de guerra, decolando da pista de San Giorgio, perto de Pistóia em 13 de novembro de 1944. A partir daí a unidade começou a executar missões diárias em apoio as unidades de artilharia de campanha do Exército Brasileiro, realizando suas missões antes de depois dos ataques (para assim corrigir o direcionamento e posterior conferir a efetividade dos ataques). Apesar das terríveis condições climáticas adversas motivadas por um dos mais rigorosos invernos do século XX, que congelavam os motores em voo e acumulavam gelo nas pistas, não houve registros de acidentes operacionais, atestando o alto grau de profissionalismo dos militares brasileiros do esquadrão.

Durante a campanha na Itália, os Piper L-4H da Força Aérea Brasileira (FAB) operariam desde Livorno, Pisa, Pistóia, Suviana e Porreta Teme, totalizando 684 missões reais realizadas pelos onze pilotos em companhia, de onze oficiais observadores do Exército Brasileiro e esporadicamente em conjunto com quatro  oficiais ingleses do Exército Real (Royal Army). Apesar da alta concentração de fogo antiaéreo alemão nestas regiões, felizmente nenhuma aeronave seria abatida durante o conflito.  Após o termino das hostilidades no teatro europeu, estasaeronaves foram mantidas  em  frenética operação, realizando em proveito das unidades da Força Expedicionária Brasileira (FEB), missões de transporte, ligação e correio aéreo, operando inicialmente a partir de 04 maio em Piacenza, na semana seguinte operando a partir de   Portalberta  (próximo a Milão), finalmente a partir de 12 de junho em Bergamo. Dois dias depois, a 1º Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO) seria extinta pelo boletim da Artilharia Divisionária do Exército Brasileiro. Como resultado desta medida seu pessoal se reuniu junto aos efetivos do 1º Grupo de Aviação de Caça – Esquadrão Senta a Puá a fim retornarem ao Brasil no navio de transporte USS General M.C. Meigs (AP-116) que deixou o porto de Nápoles no dia 6 de junho em direção ao Brasil. Aparentemente, os dez Piper L-4H Grasshoper seriam desmontados, encaixotados e  transportados posteriormente por um outro navio da Marinha Americana (US Navy), ao chegarem em seu destino final o porto do Rio de Janeiro, seriam recolhidos ao Depósito Central de Armamentos do Exército Brasileiro, onde ali permaneceriam estocados.
Por sua vez o Piper L-4-PI, que já se encontrava no Brasil foi transferido para a Escola de Especialistas da Aeronáutica (EEAer), quando da extinção do Escola Técnica e Aviação (ETAv). Apesar de ser destinado a instrução em solo, existem evidências de que aquela aeronave foi mantida constantemente em condições de voo. Quantos aos aviões “italianos” os mesmos foram posteriormente “descobertos” estocados nas instalações do Depósito Central de Armamentos do Exército Brasileiro, sendo remontados entre os anos de 1954 e 1955, recebendo os cocares e matriculas da arma terrestre, operando de forma efêmera e sendo logo transferidos a Força Aérea Brasileira. A reativação da 1ª Esquadrilha de Ligação e Observação (1º ELO) em 12 de dezembro de 1955, determinaria a distribuição dos três primeiros Piper L-4H Grasshoper para esta unidade. Nos dois anos seguintes mais células foram entregues, sendo a dotação da unidade complementada em abril de 1957 pelo pipler L-4 que pertencia a Escola de Especialistas da Aeronáutica (EEAer). No entanto a aquisição de aeronaves mais modernas determinaria a obsolescência dos Piper L-4H Grasshoper nas tarefas e ligação e observação, assim desta maneira em 1958, as células remanescentes foram recolhidas ao Parque de Aeronáutica dos Afonsos (PqAerAF) e excluídas da carga do Ministério da Aeronáutica (MAer) em 1959, com pelo menos nove aeronaves entregue ao Departamento de Aviação Civil (DAC).

Em Escala.
Para representarmos o Piper L-4H "FAB 09", fizemos uso kit do fabricante Hobbycraft (o modelo mais próximo seria o Smer) na escala 1/48, sendo necessário alterar a disposição das janelas laterais traseiras e também o teto, processo este facilmente executável pois as duas metades da fuselagem são injetadas em plástico transparente, bastando conformar as mesmas com fita adesiva. Os decais foram obtidos do set, presente no livro " Força Aérea Brasileira, na Segunda Guerra Mundial " de Luciano B. Monteiro & Sandro Dinarte, Editora Adler.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura empregado e todas as aeronaves Piper L-4H Grasshoper em serviço na Força Aérea American (USAF) a durante a Segunda Guerra Mundial, durante este período as aeronaves operaram com marcações brasileiras e americanas, no pós-guerra este padrão foi acrescido das cores nacionais na cauda tanto na Força Aérea Brasileira quanto no Exército Brasileiro sendo este mantido até o final de sua carreira operacional no final da década de 1950.


Bibliografia :

- Piper J-3 Cub   Wikipédia - http://en.wikipedia.org/wiki/Piper_J-3_Cub
- História da Força Aérea Brasileira por :  Prof. Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html
- Os Olhos dos Pracinhas, por Ricardo Bonalume Neto - Revista Força Aérea nº 03
- Olho Nele - 2º Ten QOCon His Daniel Evangelista Gonçalves
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 - 2015  por Jackson Flores Junior