Canhões Schneider - Cannet 75mm

História e Desenvolvimento.
Em 1836 os irmãos Schneider assumiram o controle da empresa Creusot na cidade de Saône-et-Loire, na França, sendo esta uma das mais importantes forjas da Europa, este movimento levaria a criação da Schneider, Fréres & Cie. uma empresa metalúrgica que alcançaria grande renome em âmbito mundial nos anos subsequentes se tornando das empresas de metal pesado mais importantes da Europa em fins do século XIX e início do século XX. O portfólio de Schneider, Fréres & Cie seria muito diversificado chegando a produzir desde itens mais simples para aplicações domésticas, até locomotivas a vapor com o modelo “Gironde” lançado em 1838 e empregado em grande escala pela empresa de transporte ferroviário Paris-Versailles Railway Company. Este mercado seria amplamente explorado levando a empresa a figurar entre os três maiores fabricantes franceses de implementos ferroviários. O próximo seguimento a ser explorado seria o de barcos a vapor fluviais e marítimo, edificando para isso uma nova fábrica na cidade de Châlon-sur-Saône. Curiosamente esta iniciativa levaria a necessidade maior infraestrutura de produção de grandes componentes levando a empresa a dominar a tecnologia de fabricação de armações de casco em metal, o que abriria mais um nicho de atuação passando a oferecer ao mercado estruturas metálicas de edifícios, guindastes, pontões de guindaste. Isto seria a base para o lançamento de uma divisão de construção civil, mais com foco em pontes, e no final do século XIX a empresa celebrou vários contratos, entre eles grandes obras no exterior como a construção de nove pontes em Tonkin, a construção e operação do porto de Rosário na Argentina, a reconstrução do porto de Montevidéu no Uruguai.

Nos últimos anos do século XIX , o avanço tecnológico na indústria de siderurgia com o emprego de materiais e ligas como aço, cromo e níquel, transformaria as grandes empresas deste segmento na Europa, entre elas com mais destaques as empresas Krupp, Schneider, Armstrong, Bethlehem, Firth, Holtzer, nos maiores fabricantes de armamentos na virada do século. O viés de produção militar da corporaçao Schneider - Creusot Fréres & Cie, surgiria após o termino da Guerra Franco-Alemã de 1870-1871, quando o herdeiro Henri Schneider decidiu se estabelecer neste segmento, criando linha de produção dedicadas ao desenvolvimento e fabricação uma ampla gama de canhões e morteiros. Em 1897, a Companhia comprou as “Oficinas de Artilharia do Mediterrâneo Forges”, localizadas em Le Havre, ao absorver toda a equipe projeto a empresa absorveria um amplo know how neste segmento principalmente na tecnologia do canhão sem recuo. Neste momento o principal trunfo da empresa era materializado na atuação do grande engenheiro Gustave Canet (colaborador original da Forges Mediterrâneo), que alçaria dentro da companhia  postos de destaque, como diretor de artilharia no Creusot e diretor honorário da Artilharia de Schneider, sendo o responsável principal pelo desenvolvimento do emblemática família de canhões Canet Schneider, produzida em uma variada gama de calibres, para as mais diversas aplicações em âmbito terrestre e naval.
No entanto a maior contribuição desta empresa francesa para a tecnologia da artilharia moderna, se daria na passagem do século XIX para o século XX com o desenvolvimento e produção do destacado modelo de canhão Schneider-Canet de 75 mm. Esta nova peça era totalmente construída em aço rápido, dispondo de tubo estriado com carregamento pela culatra, sistema de amortecimento de recuo composto por freio hidráulico (com efeitos amortecedor e recuperador, recolocando a peça em posição de tiro após o disparo). O conjunto destas inovações partiriam da engenhosa mente do engenheiro Gustave Canet (conceito que replicado rapidamente por outros fabricantes internacionais) permitiria a operação no sistema denominado como "tiro rápido" possibilitando que a peça efetuasse de 10 a 20 disparos por minuto (ou até 30 tiros se o conjunto fosse equipado com uma equipe mais experiente), contrastando muito com a falta de agilidade da antiga artilharia de reparo fixo, que permitia apenas um disparo a cada 10 minutos. O Schneider-Canet de 75 mm logo seria aprovado pelo comando Exército Frances, sendo celebrado um grande contrato de aquisição, visando iniciar um processo de substituição ou complementação dos antigos modelos como o Canet M890 de calibre de 100 mm, que fora introduzido a partir do ano de 1896. As primeiras peças de artilharia começariam a ser entregues a partir de 1906, com sua carteira de pedidos logo passando a receber inúmeros contratos de exportação, incluindo a Espanha que viria a ser um dos maiores usuários desta peça de artilharia na primeira década do novo século, passando inclusive a realizar a produção sob licença do conjunto e munições a partir de 1909.

O modelo Schneider 75mm 1906, representava mais moderna tecnologia de artilharia de campo de disparo rápido, sendo atestadamente superior aos seus concorrentes similares como o canhões Saint-Chamonds e  Krupps de 75 mm. Além disso peça era significativamente mais leve e o uso de mecanismos hidropneumáticos para absorver parte da energia do recuo e suavizar a transferência do momento linear, movendo o barril e seu trenó para um berço, podendo retornar a peça à sua posição inicial, mantendo a direção de disparo após o primeiro tiro enterrado o arado e, assim, eliminando a necessidade de redirecionar. Isso também permitiu que os dispositivos de mira fossem montados no berço, em vez de no tubo, com menos perturbação após o disparo, ambos permanecendo alinhados e facilitando o ajuste do objetivo. O novo material incorporou um barril de níquel-aço forjado e temperado, com um tubo interno e duas mangas, bengala e bumbum, acompanhados por um zuncho. A alma foi dextrosum listrada com 30 listras progressivas, da 1ª 20ª à 7ª. O fechamento foi sistema de parafusos com dois setores lisos e dois roscados e poderia ser aberto ou fechado com um único movimento, expulsando a baia automaticamente no final do movimento de abertura. O barril foi anexado a um trenó de aço no qual estavam os cinco cilindros que constituíam o freio e o recuperador. O freio era hidráulico e o recuperador hidropneumático. O trenó moveu-se sobre um berço de aço de cromo de níquel, absorvendo um pouco da energia do recuo e comunicando ao berço o momento linear de uma forma mais gradual. A arma poderia disparar três tipos diferentes de projéteis, todos pesando 6,5 kg: uma granada comum, uma granada de estilhaços e uma granada inovadora que apresentava uma quantidade maior de explosivos, sendo usada para atacar edifícios inimigos.
Seu baixo peso o tornou ideal para emprego como canhão de montanha, anteriormente a movimentação de peças de artilharia em regiões montanhosas constituía, desde sempre, grandes dificuldades aos homens da arma de artilharia, pois os conjuntos de grande calibre, habitualmente mais eficazes, eram pesadas demais para poderem ser propulsadas por animais. Os primeiros ensaios com a peça de 75 mm para esta missão tiveram início em 1909, sendo rapidamente aprovados e adotados para uso pelo Exército Frances, passando a substituir os canhões Schneider 65 mm modelo 1906. O batismo de fogo se daria em 1909 em mãos espanholas, quando da deflagração da Guerra Melilla ocorrida entre os meses de julho e dezembro, este seria o primeiro registro de uma longa carreira de empregos em conflitos militares no século XX. Os canhões Schneider 75 mm seriam exportados ou produzidos sob licença para a Espanha, Brasil, Polônia, Grécia, Brasil, Paraguai, Iugoslávia e Estados Unidos, obtendo largo emprego na Primeira Guerra Mundial, Guerra Civil Espanhola, Segunda Guerra Mundial e outros conflitos regionais de importância relevante.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
A adoção de modernos canhões no Exército Brasileiro tem início o princípio do século XX quando o Marechal Hermes da Fonseca, empreendeu uma ampla reforma estrutural na força militar terrestre, com o propósito de superar as deficiências técnicas e operacionais instaladas desde o fim da Guerra do Paraguai e evidenciadas por ocasião da Campanha de Canudos. A estagnação no Exército Brasileiro somente foi rompida com as transformações iniciadas pelos Ministros da Guerra marechais João Nepomuceno de Medeiros Mallet, Francisco de Paula Argolo e Hermes da Fonseca, entre os anos de 1900 e 1908. Com o apoio do Barão do Rio Branco, que intercedeu junto ao Presidente da República Afonso Pena, Hermes da Fonseca conseguiu promover um processo de revitalização do Exército, que incluía o sorteio militar, a aquisição de armamentos e a criação de novas unidades. A “Reforma Hermes”, como ficou conhecido esse processo de modernização, compreendeu a reestruturação da força terrestre, a reorganização do ensino militar, a criação e a regulamentação do Estado-Maior e a melhoria das defesas da barra do Rio de Janeiro, então Capital Federal. A partir de 1908, foi fixada uma nova organização de comando para o Exército Brasileiro, ficando o território nacional dividido em 21 regiões para alistamento militar e 13 para inspeção. Hermes da Fonseca era um grande admirador do Exército Prussiano e dizia publicamente que a força terrestre brasileira precisava atingir o nível dos germânicos, onde se destacava o Estado-Maior, criado por Helmuth von Moltke, e a tecnologia de ponta na produção de armamentos. Assim, motivado também pela inexistência de uma indústria bélica nacional, viajou para a Alemanha e França em agosto de 1908 em busca de material bélico moderno e de novos conhecimentos técnico-profissionais.

Como resultado da viagem, foram adquiridos armamentos variados em grandes quantidades, como 400.000 fuzis Mauser calibre 7 mm para a infantaria e 10.000 lanças Ehradt, 20.000 espadas e 10.000 mosquetões para a cavalaria. A artilharia de campanha foi servida com baterias de canhões Krupp 75 mm Modelo 1908, seis de canhões Krupp 75 mm de montanha e cinco de obuses Krupp 105 mm,  destinados ao Exército brasileiro, além de várias peças de artilharia da Schneider-Canet do modelo C50 1902 de 150 mm “Tiro Rápido” destinadas Marinha do Brasil,  a fim de equipar os pontos de artilharia fixa de concreto na fortaleza de Copacabana no Rio de Janeiro e também na defesa do Porto de Santos, na cidade de Santos - SP, que passaria a ser equipada com seis peças deste modelo também em conjunto com quatro obuseiros Krupp 280mm C/16 modelo 1912. No entanto estes não seriam os primeiros canhões produzidos pela Schneider-Canet a entrarem em serviço no país, tendo em vista que desde a última década do século XIX o Exército Brasileiro já operava algumas baterias equipadas com os canhões Canet M890 1987 de calibre de 100 mm e M897 de 75 mm. Durante os anos vindouros a adoção destas novas peças de artilharia de origem alemã e francesa em muito iram modificar o patamar operacional das Forças Armadas Brasileiras, que seria posta a prova em uma série de eventos de revoltas ou insurreições regionais, como a “Guerra do Contestado” ocorrida  nos estados do Paraná e Santa Catarina durante o ano de 1912. Porém a Primeira Guerra Mundial iniciada em 1914 traria grande avanços, não só em tecnologia mas também na doutrina militar, o que rebaixaria o Exército Brasileiro a um patamar operacional inferior a realidade militar vigente no pós guerra a partir de 1918, suscitando assim uma necessidade de atualização  em termos tecnológicos e de doutrina operacional.
No intuito de reverter este cenário deficitário, o governo Brasileiro no segundo semestre do ano de 1918 iniciou tratativas junto ao governo francês a fim de estudar o desenvolvimento de consultoria e assessoria militar no intuito de modernizar as forças do Exército Brasileiro. As negociações para o contrato ocorreram em Paris, entre o adido militar brasileiro na França, coronel Malan d’Angrogne, e o ministro da Guerra francês, Georges Clemenceau. Já naquele momento o chefe designado, general Maurice Gamelin, se encontrava em missão de reconhecimento no Brasil. O contrato foi assinado poucos meses depois na capital francesa e ratificado logo em seguida no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, criando assim oficialmente a “Missão Militar Francesa”. Os termos do contrato estipulavam que oficiais franceses comandariam durante quatro anos as escolas de Estado-Maior (EEM), de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), de Intendência e Veterinária; e que o Brasil se comprometia a privilegiar a indústria francesa em suas compras de armas e equipamentos militares com a condição de que o material oferecido, o prazo de entrega e os preços fossem no mínimo equivalentes aos de outros países fornecedores. Para o Brasil, o contrato representou um grande passo na direção da profissionalização e modernização de seu Exército e contribuiu para fortalecer seu poder militar. A influência militar francesa concretizaria se, em 1921, com a adoção de novos regulamentos destinados à Direção e Emprego das Grandes Unidades, ao Exercício e Emprego da Artilharia e ao Serviço de Estado-Maior em Campanha.    

Fazendo uso do contrato de preferência de aquisição de material militar de origem francesa, o Governo Brasileiro a partir do ano de 1921, iniciou um amplo programa de aquisição bélico, com destaque para o reequipamento da artilharia de campanha, incluindo vários modelos fabricados pela empresa Schneider-Canet, entre eles mais unidades dos modelos C50 1902 de 150 mm (emprego terrestre e ferroviário), e os novos Schneider 75/28 modelo 1906 de 75mm  e C18 - 6 Modelo 1919 de 75 mm (canhão de montanha), com  dois estes últimos modelos, encomendados e recebidos durante o ano de 1923. Para o atendimento as necessidades do Exército Brasileiro que na época era em sua maioria hipomóvel, os canhões Schneider-Canet brasileiros foram recebidos com rodas de madeira, sendo destinados então a equipar as a equipar as unidades de cavalaria de fronteira. Em campo de batalha, uma bateria Schneider-Canet 75 era composta por quatro peças e igual número de carros de munição (cada arma podia carregar 38 munições na carroça de tração, sendo complementadas com mais sessenta unidades no carro de munição), mais um carro de apoio à bateria (com ferramentas) e um carro-forja, com a função de assegurar a manutenção das peças em campanha e os reparos nos carros de tração e de serviço. A bateria era operada por um efetivo de 3 oficiais, 10 sargentos, 121 praças, demandando 39 cavalos e 96 muares para a tração das peças e do pessoal. Os canhões de montanha, caracterizados por serem peças pequenas, leves e de fácil transporte, trouxeram diversos benefícios à artilharia, com o fator principal de seu rápido emprego em qualquer região brasileira.
Os canhões Schneider-Canet 75 mm, estiveram em ação em quase todos os grandes conflitos regionais ocorridos no país no início do século vinte incluindo as revoluções de 1930, e a Constitucionalista de 1932, onde foram empregados pelos lados em disputa. Curiosamente os canhões de 75 mm da Schneider (e também Krupp) foram empregados como arma orgânica nos seis trens blindados (TB) denominados TB-1 a TB-6, construídos na Oficinas Ferroviárias, sob a orientação da Escola Politécnica Paulista. Esta composição ferroviária blindada era composta locomotiva entre dois vagões, além de uma prancha à frente para verificar o estado da linha. Na frente do primeiro carro, ao centro, uma abertura maior dando saída à boca de uma peça Krupp ou Schneider de 75 mm, que se manobrava de dentro e ocupava toda a parte frontal do carro, permitindo apenas a circulação lateral. Durante a Segunda Guerra Mundial foram empregados em diversas manobras e exercícios de defesa equipando os regimentos de artilharia a cavalo. Com a ampliação da motorização do exército, a partir de 1954 estes canhões seriam modernizados nos arsenais de guerra no Rio de Janeiro (RJ) e General Câmara (RS) recebendo novas rodas com pneus no lugar das rodas de madeira passando permanecendo em operação até a primeira metade da década de 1960. Atualmente pelo menos três peças estão em exposição no Museu do Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, e mais quatro ainda em uso pelo Exército Brasileiro como armas cerimoniais em Curitiba, Paraná.

Em Escala.
Diversos modelos e versões dos canhões Schneider - Canet 75 mm foram empregados no Exército Brasileiro ao longo dos anos, e para podermos representar em escala, esta importante peça de artilharia fizemos uso da única opção disponível na escala 1/35 representando o modelo M897, o kit produzido pela empresa alemã Tom Modellbau apesar de antigo, apresenta nível de detalhamento e acabamento aceitável para a escala. Não fizemos o emprego de decais.

O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura que pode ter sido empregado nos canhões Schneider-Canet 75 e demais peças de artilharia de origem alemã recebidos pelo Brasil, se baseando no esquema adotado no exército francês em fins da década de 1920, as peças empregas pelas forças paulistas durante a Revolução Constitucionalista de 1932 receberam um padrão de camuflagem tático ao aplicado nos carros e trens blindados naquele conflito portando ainda algumas personalizações de marcação de unidades. Esta tonalidade de pintura representa também as peças preservadas atualmente no Museu do Forte de Copacabana. 


Bibliografia: 
- Schneider Frères et Compagnie - https://www.lesechos.fr
- Schneider-Canet - https://pt.wikipedia.org/wiki/Schneider-Canet
- Missão Militar Francesa por Rodrigo N. Araujo -  https://cpdoc.fgv.br/
- Arquivos do Museu Militar de Conde de Linhares – Rio de Janeiro
- Canhão de Montanha Schneider 75mm - http://www.cporpa.eb.mil.br/