Toyota Bandeirante (VTrOp - VTE)

História e Desenvolvimento.
A história da Toyota começa com Sakichi Toyoda, nascido em 1867 em Yamaguchi, na província de Shizuoka, em um Japão em transição para a modernidade sob o governo Meiji. Filho de um carpinteiro, Sakichi cresceu em uma vila rural assolada pela pobreza, mas desde jovem demonstrou um desejo ardente de contribuir para a sociedade. Inspirado pela Revolução Industrial e pela necessidade de melhorar a eficiência da indústria têxtil, ele dedicou-se ao desenvolvimento de teares automáticos. Em 1896, Sakichi criou o Toyoda Power Loom, o primeiro tear motorizado do Japão, feito de aço e madeira, que aumentava significativamente a produtividade e a qualidade dos tecidos. Em 1924, ele aperfeiçoou sua invenção com o Toyoda Model G Automatic Loom, equipado com o princípio de jidoka – a capacidade de uma máquina parar automaticamente ao detectar um problema, um conceito que mais tarde se tornaria um pilar do Sistema de Produção Toyota. Em 1926, Sakichi fundou a Toyoda Automatic Loom Works, que se tornou um sucesso internacional, atraindo a atenção da britânica Platt Brothers, que adquiriu os direitos de produção do Model G em 1929 por £100.000, um marco raro para a tecnologia japonesa da época. Esse capital foi crucial para financiar o sonho de seu filho, Kiichiro Toyoda, de ingressar na indústria automotiva, diversificando os negócios da família. Sakichi faleceu em 1930, aos 63 anos, deixando um legado de inovação e um espírito empreendedor que guiaria as futuras gerações. Kiichiro Toyoda, fascinado por automóveis desde a infância, herdou a paixão do pai pela engenhosidade e a visão de contribuir para a sociedade. Após estudar engenharia e viajar para a Europa e os Estados Unidos em 1929, onde observou a ascensão da indústria automotiva, Kiichiro decidiu que o Japão precisava de uma produção nacional de veículos. Com o apoio do governo japonês, que buscava reduzir a dependência de importações devido à guerra com a China, ele estabeleceu a Divisão de Produção Automotiva da Toyoda Automatic Loom Works em 1933. Em 1934, a divisão desenvolveu seu primeiro motor, o Type A, seguido pelo protótipo do carro de passeio Model A1 em 1935 e pelo caminhão G1 no mesmo ano. Em 1936, a produção do Model AA, um sedan inspirado em designs americanos, mas adaptado às necessidades japonesas, marcou o início da fabricação de automóveis. Para formalizar essa nova empreitada, a Toyota Motor Company foi fundada em 28 de agosto de 1937, com Kiichiro como presidente. A nova empresa enfrentou desafios iniciais, pois o mercado japonês era dominado pelas americanas Ford e General Motors, que montavam veículos localmente com peças importadas. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Toyota concentrou-se na produção de caminhões e ônibus para o Exército Imperial Japonês, enfrentando escassez de materiais que a forçaram a fabricar veículos simplificados, como caminhões com apenas um farol. 

Esta montadora seria responsável pelo desenvolvimento de uma respeitável linha de utilitários  para qualquer terreno, com sua gênese curiosamente ocorrendo durante a invasão das Filipinas pelas forças japonesas em dezembro de 1941. Entre abril e maio de 1942, a queda de Bataan e Corregidor selou a derrota das forças aliadas na região, forçando o general Douglas MacArthur a evacuar para a Austrália. Nesse processo, os norte-americanos abandonaram uma quantidade significativa de equipamentos, incluindo vários Jeeps Bantam Mark II e Willys MB, veículos utilitários leves que impressionaram os militares japoneses por sua agilidade e capacidade de operar em terrenos difíceis. Reconhecendo o valor estratégico de tais viaturas, o Exército Imperial Japonês enviou os Jeeps capturados ao seu centro de desenvolvimento militar no Japão para análise detalhada. A robustez e a versatilidade dos Jeeps inspiraram o comando japonês a encomendar um veículo semelhante, capaz de atender às necessidades das operações militares. A tarefa foi confiada à Toyota Motor Company, a  exigência era clara: o novo veículo deveria replicar as capacidades off-road do Jeep americano, mas sem imitar diretamente seu design externo. A Toyota abraçou o desafio  iniciando o desenvolvimento do protótipo Model AK ainda em 1941. Sob a pressão das demandas militares e das limitações impostas pela escassez de recursos  a empresa concluiu o projeto em 1942, dando origem ao AK10, formalmente designado pelo Exército Imperial Japonês como Yon-Shiki Kogata Kamotsu-Sha (Caminhão de Carga Compacto Tipo 4). Se tratava de um caminhão leve de ½ tonelada, com uma carroceria aberta montada sobre um chassi de caminhão, priorizando simplicidade e funcionalidade. Suas características incluíam uma grade frontal vertical, para-lamas dianteiros retos que se inclinavam para trás, faróis posicionados acima dos para-lamas e um para-brisa rebatível. Equipado com o motor Type C de quatro cilindros e 2.259 cm³, derivado do sedan Toyota Model AE, o AK10 contava com uma transmissão manual de três velocidades e uma caixa de transferência de duas velocidades, garantindo tração 4x4 essencial para operações em terrenos variados. A produção do AK10 foi extremamente restrita, com apenas algumas unidades fabricadas entre 1942 e 1944. Em abril de 1944, a Toyota completou seis protótipos, e a produção em série estava prestes a começar quando a derrota do Japão na Segunda Guerra Mundial, em agosto de 1945, interrompeu todos os planos. Embora o AK10 não tenha alcançado notoriedade durante a guerra, suas lições foram fundamentais para o desenvolvimento do Toyota "Jeep" BJ, lançado em 1951, que deu origem à icônica linha Land Cruiser. Em 1950, a Guerra da Coreia criou uma nova demanda por veículos utilitários leves, levando o governo dos Estados Unidos a encomendar à Toyota a produção de 100 unidades baseadas nas especificações do Willys Jeep. Esse pedido resultou no Jeep BJ, um veículo maior e mais potente, equipado com um motor de seis cilindros de 3,4 litros, que superava o Jeep americano em desempenho e durabilidade.
O sucesso do Toyota "Jeep" BJ, precursor do icônico Land Cruiser, marcou o início de uma trajetória de excelência da Toyota no segmento de veículos off-road. Em 1951, o BJ conquistou a atenção do Japão ao escalar o Monte Fuji, um feito inédito que demonstrou sua robustez e capacidade de superar terrenos desafiadores. Esse marco levou o governo japonês a encomendar cerca de 300 unidades para a Polícia Nacional Japonesa, consolidando a reputação da Toyota como uma força inovadora no mercado de utilitários 4x4. O legado desse veículo, que teve suas raízes no humilde Toyota AK10 da Segunda Guerra Mundial, ecoaria por décadas, alcançando mercados globais, incluindo o Brasil, onde o Toyota Bandeirante se tornaria um símbolo de durabilidade e versatilidade. Em 1954, a Toyota enfrentou um desafio legal imposto pela Willys, que detinha os direitos sobre a marca "Jeep" nos Estados Unidos. Para evitar conflitos e manter sua competitividade, a Toyota rebatizou o BJ como Land Cruiser, um nome estratégico que evocava robustez e capacidade off-road, posicionando-o como concorrente direto do Land Rover britânico. A escolha do nome também foi oportuna, já que a Studebaker havia descontinuado seu modelo Land Cruiser naquele ano, permitindo à Toyota apropriar-se da marca. No mesmo ano, o Land Cruiser foi aprimorado com a introdução de um novo motor de 3,9 litros, entregando 126 cavalos de potência, que reforçou seu desempenho em condições adversas. Paralelamente, a Toyota intensificava sua expansão global, identificando o Brasil como um mercado promissor. Em 1953, a empresa começou a comercializar seus veículos no país por meio da Alpagral Ltda, em São Paulo, importando e montando localmente os primeiros Land Cruisers. O sucesso inicial dessas operações levou à fundação, em 23 de janeiro de 1958, da Toyota do Brasil Indústria e Comércio Ltda, com um escritório no centro de São Paulo. Essa iniciativa marcou o compromisso da Toyota em estabelecer raízes no Brasil, preparando o terreno para atender diretamente às demandas do mercado nacional. Em novembro de 1958, a Toyota do Brasil deu um passo decisivo ao iniciar a montagem de veículos no regime CKD (Completely Knocked Down), começando pela linha Land Cruiser. O crescimento das vendas e a aceitação do público brasileiro incentivaram a empresa a investir em uma planta industrial mais robusta, inaugurada em novembro de 1962, em São Bernardo do Campo, São Paulo. Nessa nova fase, a Toyota substituiu o Land Cruiser pelo Toyota Bandeirante, um utilitário projetado para atender às necessidades específicas do mercado brasileiro. Disponível nas versões jipe, camioneta de carga e uso misto, o Bandeirante era equipado com um motor próprio de seis cilindros a gasolina, tração nas quatro rodas e uma construção robusta que prometia enfrentar os desafios das estradas e terrenos do país.

Em maio de 1962, o Bandeirante passou a ser fabricado no Brasil, abandonando o sistema CKD e adotando o motor Mercedes-Benz OM-314 de 3.784 cm³ e 85 cavalos, emprestado do caminhão MB L-608D. Essa escolha foi um diferencial mercadológico, garantindo economia de combustível e confiabilidade, características que conquistaram fazendeiros, empresas e órgãos públicos. A produção da carroceria foi inicialmente terceirizada para a Brasinca, com opções de teto de lona ou aço (disponível a partir de 1963) e a introdução da versão picape no mesmo ano. O slogan da marca, “O Toyota Bandeirante foi construído para durar longos anos produzindo lucros para seu proprietário”, refletia a promessa de durabilidade, reforçada por relatos de proprietários que afirmavam que o veículo podia rodar até um milhão de quilômetros sem necessidade de abrir o motor. O Bandeirante era equipado com uma transmissão mecânica de quatro marchas, uma caixa de transferência de duas velocidades e eixos flutuantes, todos produzidos na fábrica de São Bernardo do Campo. Essa política de verticalização, em que a Toyota fabricava localmente a maioria dos componentes, exceto o motor, demonstrava seu compromisso com a autossuficiência industrial. Ao longo das décadas, o Bandeirante recebeu melhorias graduais em acabamento e mecânica, mantendo-se fiel ao projeto original, cuja simplicidade e robustez garantiam sua popularidade. A demanda era tão alta que compradores enfrentavam meses de espera para adquirir o veículo. Na década de 1980, mudanças significativas foram introduzidas. A sincronização de todas as marchas melhorou a dirigibilidade, com uma segunda marcha mais longa e a primeira adaptada para uso urbano. A caixa de transferência foi reformulada, alinhando-se a padrões de concorrentes como a Willys. Em 1983, a Toyota lançou a versão cabine dupla (OJ55LP2BL), apelidada de Toyota Cabine Dupla, uma resposta às demandas de usuários que buscavam combinar a capacidade de transportar 1.100 kg de carga com espaço para até seis passageiros, sem sacrificar a tração 4x4. Com 5,30 metros de comprimento, entre-eixos de 3,36 metros e uma caçamba de 1,80 metro, o modelo oferecia ângulos de entrada e saída de 42 e 22 graus, ideais para o off-road. Seu interior funcional, com bancos revestidos em vinil e um painel simétrico, era complementado por alavancas para câmbio, tração 4x4 e freio de estacionamento, garantindo uma experiência de condução prática e memorável. O único concorrente direto na época era a Chevrolet 10 Cabine Dupla 4x4 Engesa, que, no entanto, não oferecia reduzida e era produzida apenas sob encomenda. O sucesso da cabine dupla ampliou a participação da Toyota no mercado, reforçando a versatilidade do Bandeirante, que já incluía cinco outras configurações: jipe curto com teto de lona ou aço, perua com teto de aço, e picapes curta e longa.
Em 1990, acompanhando a modernização da linha de caminhões Mercedes-Benz, o motor OM-314 foi substituído pelo OM-364 de 3.972 cm³, com 90 cavalos, maior torque em baixa rotação e menor consumo. O sistema de fixação do motor, captação de ar e escapamento foram redesenhados, e a linha Bandeirante adotou uma nova grade dianteira em plástico com faróis retangulares, atualizando sua estética. Em 1994, a Toyota voltou às suas origens, equipando o Bandeirante com um motor próprio importado, mais potente que o OM-364, entregando 96 cavalos a 3.400 rpm, contra 90 cavalos a 2.800 rpm do modelo anterior. Essa evolução reforçou o desempenho do veículo, mantendo sua reputação de confiabilidade.  O Toyota Bandeirante, um ícone da indústria automotiva brasileira, enfrentou, na década de 1990, os desafios de um mercado em transformação. Em 1996, para atender às normas mais rigorosas de emissão de gases poluentes, a Toyota introduziu ajustes significativos no modelo. O motor Toyota 14B, que equipava o Bandeirante, teve sua potência reduzida para 96 cavalos e torque de 24,4 mkgf, garantindo conformidade com as regulamentações ambientais. Além disso, os freios a tambor, considerados obsoletos, foram substituídos por discos ventilados, melhorando a segurança e o desempenho. Essas mudanças refletiam o compromisso da Toyota em manter o Bandeirante competitivo, mesmo diante de um cenário automotivo cada vez mais exigente. No entanto, o mercado brasileiro estava em plena abertura às importações, trazendo novos concorrentes que desafiavam a liderança da Toyota no segmento de utilitários off-road. A linha Defender da Land Rover, com seu design moderno e tecnologias avançadas, emergiu como uma ameaça significativa, atraindo consumidores que buscavam veículos mais contemporâneos. A Toyota, ciente dessas pressões, enfrentava também um obstáculo interno: o peso de quatro décadas de produção do Bandeirante sem alterações estruturais profundas. Apesar de sua reputação de robustez e durabilidade, o veículo começava a mostrar sinais de envelhecimento em um mercado que valorizava inovação e conforto. A introdução de uma nova legislação de emissão de poluentes, prevista para entrar em vigor em 2002, trouxe um desafio definitivo. O motor aspirado do Bandeirante, mesmo com os ajustes realizados, não atendia aos limites estabelecidos pelas novas normas. Adaptar o veículo às exigências ambientais demandaria investimentos significativos, incompatíveis com um modelo cuja arquitetura remontava aos anos 1950. Assim, em uma decisão que marcou o fim de uma era, a Toyota anunciou a descontinuação da linha Bandeirante para novembro de 2001, encerrando 43 anos de uma trajetória marcada por conquistas e lealdade. Ao longo de sua história no Brasil, a Toyota produziu 103.750 unidades do Bandeirante, sem contar os exemplares montados no regime CKD (Completely Knocked Down), que totalizaram menos de 1.000 veículos. Estima-se que, na época do encerramento da produção, cerca de 60% das unidades fabricadas ainda estavam em operação no país, um testemunho impressionante da resistência e durabilidade do Bandeirante.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
No final da década de 1950, o Exército Brasileiro enfrentava um desafio crítico para manter sua capacidade de mobilidade operacional. Sua frota de veículos militares com tração 4x4, composta por mais de 1.500 unidades dos modelos Dodge WC-51, WC-53, WC-54, WC-56 e WC-57, desempenhava funções essenciais, como transporte de tropas, atendimento médico em ambulâncias, comando e tração de artilharia leve. Esses veículos, adquiridos entre 1942 e 1945 por meio do programa Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), foram fundamentais durante e após a Segunda Guerra Mundial. Contudo, após mais de uma década de uso intensivo, a frota apresentava sinais de desgaste severo, agravados por dificuldades na manutenção e na obtenção de peças de reposição, que se tornavam cada vez mais escassas no mercado internacional. A produção desses modelos havia sido descontinuada nos Estados Unidos havia mais de 15 anos, comprometendo a operacionalidade de grande parte das viaturas e ameaçando a prontidão da Força Terrestre. A substituição dos Dodge WC por seus sucessores naturais, os modelos Dodge M37 e M43, revelou-se financeiramente inviável. O custo unitário elevado, multiplicado pela necessidade mínima de 1.000 unidades para renovar a frota, esbarrava nas limitações orçamentárias não apenas do Exército, mas de todas as Forças Armadas Brasileiras. Diante desse cenário, tornou-se evidente que a solução deveria ser adaptada à realidade financeira do país, levando o comando militar a voltar seus olhares para a indústria nacional, que começava a despontar como uma alternativa viável e estratégica. Na década de 1950, a Willys-Overland do Brasil (WOB) consolidava-se como a principal montadora de automóveis do país, conquistando a confiança do mercado e das instituições públicas. Sua reputação junto ao Exército Brasileiro era particularmente sólida, graças ao fornecimento de centenas de Jeeps CJ-5 ¼ ton, que substituíram com sucesso os jipes leves recebidos durante a Segunda Guerra Mundial. A experiência da Willys em produzir veículos robustos, confiáveis e adaptados às condições brasileiras fez da empresa uma candidata natural para atender à demanda do Exército por novos utilitários 4x4. Nesse contexto, o lançamento da Rural Willys reestilizada e, posteriormente, da Picape Willys despertou o interesse militar. Esses modelos, derivados do Jeep Willys, ofereciam uma combinação atraente de robustez, versatilidade e custo acessível, características ideais para complementar e substituir a frota envelhecida de Dodge WC. A Rural, com sua carroceria espaçosa e capacidade de operar em terrenos variados, e a Picape, projetada para transporte de carga, apresentavam-se como soluções práticas e econômicas, alinhadas às restrições orçamentárias do Exército. Essa percepção culminou na assinatura dos primeiros contratos de aquisição do Rural Willys-Overland F-85 Militar, uma versão adaptada às necessidades militares, marcando o início de uma parceria estratégica entre a Willys e as Forças Armadas Brasileiras.

No final da década de 1950, o Exército Brasileiro encontrou na Rural Willys-Overland F-85 Militar uma solução prática e acessível para renovar sua frota de utilitários 4x4, que enfrentava desafios de obsolescência e manutenção. Projetado para atender às demandas operacionais da Força Terrestre, o F-85 Militar preservava a essência do Jeep Willys: simplicidade, durabilidade e capacidade de operar em terrenos desafiadores. Equipado com tração 4x4, o veículo desempenhava funções vitais, como transporte de tropas, ligação entre unidades e suporte logístico, oferecendo uma alternativa confiável aos envelhecidos modelos Dodge WC. Sua construção robusta, com chassi reforçado e suspensão adaptada a condições adversas, garantia desempenho em selvas, campos e estradas precárias, enquanto o motor, derivado das versões civis da Willys, assegurava economia de combustível e facilidade de manutenção. Embora o F-85 atendesse às necessidades emergenciais do Exército com competência, apresentava uma limitação significativa: a ausência de um sistema de tração 4x4 otimizado, com reduzida, essencial para operações off-road em terrenos extremos. Essa lacuna expunha uma vulnerabilidade em cenários que exigiam maior mobilidade tática, levando o comando militar a buscar alternativas que complementassem a frota com maior eficiência. Nesse contexto, a indústria automotiva nacional voltou a oferecer uma solução promissora. Em 1962, a Toyota do Brasil Indústria e Comércio Ltda, consolidada em São Bernardo do Campo, São Paulo, lançou no mercado brasileiro a linha de utilitários leves Toyota Bandeirante, equipada com tração 4x4 e projetada para atender às demandas de robustez e versatilidade do país. Com versões que incluíam jipe curto, perua, picape curta e longa, o Bandeirante rapidamente conquistou a confiança de fazendeiros, empreiteiros e órgãos públicos, graças à sua durabilidade e capacidade de enfrentar os terrenos mais inóspitos do Brasil. O desempenho do Toyota Bandeirante chamou a atenção dos oficiais do comando do Exército Brasileiro, que enxergaram no utilitário um potencial aliado para modernizar a frota militar. Em resposta a uma consulta do Exército, a Toyota demonstrou agilidade e comprometimento, desenvolvendo uma versão militarizada do Bandeirante adaptada às necessidades específicas das Forças Armadas. As negociações avançaram rapidamente, culminando, em 1964, nos primeiros contratos de aquisição de unidades do jipe curto, disponível com teto de lona ou aço, seguidas por modelos perua com teto de aço e picapes de chassi curto e longo. Essas viaturas foram destinadas a missões de transporte de pessoal, com configurações de cabine simples e dupla, além de unidades adaptadas como ambulâncias, ampliando a versatilidade da frota militar.
O Toyota Bandeirante, com sua robustez e versatilidade, consolidou-se como um pilar essencial na modernização da frota de utilitários 4x4 das Forças Armadas Brasileiras a partir da década de 1960. Equipado com tração 4x4, caixa de transferência de duas velocidades e o confiável motor Mercedes-Benz OM-314 de 3.784 cm³ e 85 cavalos, o Bandeirante demonstrou eficiência em operações de campo, desempenhando funções como transporte de tropas, ligação entre unidades e suporte logístico. Apesar de seu desempenho exemplar, as versões militarizadas iniciais eram, em essência, veículos civis com adaptações limitadas, como pintura camuflada e suportes para equipamentos táticos. Essa característica gerava incertezas sobre sua adequação em cenários de conflagração real, onde maior blindagem, armamento integrado ou reforços estruturais poderiam ser necessários. Ainda assim, o Bandeirante representava um avanço significativo, unindo a experiência da Toyota em utilitários off-road com a necessidade do Exército Brasileiro por soluções acessíveis e confiáveis. Ao longo das décadas de 1970 e 1980, a Toyota expandiu seu alcance, fornecendo o Bandeirante não apenas ao Exército, mas também à Força Aérea Brasileira e à Marinha do Brasil. Na Aeronáutica, o modelo tornou-se o utilitário padrão, presente em grande número nas bases aéreas e sedes administrativas, destacando-se por sua durabilidade e facilidade de manutenção. Essa confiança nas capacidades do Bandeirante abriu caminho para o desenvolvimento de versões verdadeiramente militarizadas, atendendo às demandas cada vez mais específicas das Forças Armadas. Em 1985, o Exército Brasileiro e o Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha abriram uma concorrência para a aquisição de uma nova geração de jipes militares, exigindo que a proposta vencedora incluísse fabricação ou montagem no Brasil, reforçando a prioridade dada à indústria nacional. Entre as empresas participantes, destacou-se a proposta da Bernardini S.A. Indústria e Comércio, que apresentou o Jipe Xingu (inicialmente chamado de Projeto Vitória). Esse projeto consistia em uma versão militarizada do Toyota Bandeirante, adaptada para atender às especificações militares, com bitola alargada, três comprimentos de chassi e carroceria reforçada com chapas de aço mais espessas, atendendo a uma solicitação específica do Exército. As modificações do Jipe Xingu incluíam características típicas de veículos militares: guincho mecânico fabricado pela Biselli, acoplamento para reboque, para-brisa rebatível, barra de proteção (santo antônio), faróis militares e suspensão reforçada, garantindo maior resistência em operações off-road. Dois protótipos foram entregues em meados de 1985 e submetidos a um rigoroso programa de testes de campo, supervisionado por uma junta militar avaliadora. 

O desempenho promissor do Xingu resultou em contratos significativos: o Ministério da Marinha adquiriu 270 unidades, entregues a partir de 1988, que permaneceram em serviço no Corpo de Fuzileiros Navais até a primeira década do século XXI, sendo gradualmente substituídas pelos Agrale AM Marruá.  O Exército Brasileiro, por sua vez, contratou 300 unidades, das quais 60 foram configuradas com para-brisa basculante e recortado, além de suportes para peças de artilharia na traseira, destinadas a substituir os jipes Ford Kaiser M-151A1 e M-151C, equipados com canhões sem recuo M-40A1 Recoilless Rifle de 106 mm. O desempenho em campo do Jipe Xingu foi exemplar, conquistando a confiança das Forças Armadas e gerando novos contratos. A produção em escala proporcionou uma sobrevida à Bernardini, mas, infelizmente, não foi suficiente para sustentar sua operação industrial. Após a entrega final, a empresa enfrentou dificuldades financeiras e encerrou suas atividades em 2001, deixando um legado de inovação no setor de defesa brasileiro. Na década de 1990, o Exército Brasileiro ampliou o uso do Toyota Bandeirante, adotando a versão militar da OJ55LP2BL cabine dupla, fornecida nas configurações com cabine de aço ou para-brisa rebatível e cabine de lona. Essas viaturas foram destinadas principalmente aos Grupos de Exploradores dos Pelotões de Cavalaria Mecanizada e Pelotões de Exploradores, reforçando a mobilidade tática em operações de reconhecimento. A versatilidade da plataforma Bandeirante também permitiu o desenvolvimento de uma nova variante ambulância, baseada na picape de cabine longa, projetada para substituir as antigas Willys Ford F-81, em serviço desde a década de 1970. Essa versão, disponível em configurações básica VE Ambulância  e VE Ambulância  UTI móvel, começou a ser entregue em 1996, estendendo-se até 2000, e foi distribuída para quase todas as unidades operativas do Exército Brasileiro dispostas no território nacional, garantindo suporte médico em qualquer terreno. O Toyota Bandeirante cabine dupla teve sua prova de fogo em cenários reais durante a participação brasileira nas forças de paz da Organização das Nações Unidas (ONU). Na Primeira Missão de Verificação das Nações Unidas em Angola (UNAVEM I, 1989-1991) e na UNAVEM II (1991-1995), o veículo demonstrou sua confiabilidade em operações de patrulhamento e transporte. Durante a UNAVEM II, uma picape Toyota Bandeirante foi alvejada por disparos inimigos, um incidente que destacou sua resistência, mas também reforçou a necessidade de maior proteção em cenários de combate, um desafio que futuras viaturas militares, como o Agrale Marruá modificadas, buscariam endereçar.
O envelhecimento progressivo da frota de utilitários Toyota Bandeirante, somado à natural obsolescência e redução na oferta de peças de reposição  (devido  ao encerramento da produção pela Toyota em 2001), levou o Ministério do Exército  a iniciar um planejamento estratégico para a substituição gradual dessas viaturas. A prioridade foi a desativação das versões de cabine dupla com capota de lona, que apresentavam maior desgaste operacional. Nesse contexto, em 2002, foi firmado um contrato com a empresa inglesa Land Rover Group para a aquisição de 750 unidades do modelo Defender 93, destinadas à distribuição entre o Exército, a Marinha e a Força Aérea Brasileira. Esse acordo marcou o início do processo de substituição da icônica família Toyota Bandeirante, que por décadas foi um pilar da mobilidade tática das Forças Armadas. Apesar da introdução dos Land Rover Defender 93 , as versões utilitárias do Toyota Bandeirante continuaram desempenhando funções administrativas em diversas unidades militares. Além disso, muitas das ambulâncias Bandeirante, entregues ao Exército Brasileiro  na década de 1990, passaram por um rigoroso processo de revitalização no 4º Escalão de Manutenção. Esse programa envolveu reparos abrangentes, incluindo a revisão dos sistemas de motorização, embreagem, caixa de transmissão, freios, direção, suspensão e elétrica, além da manutenção do baú, funilaria e pintura. Essas intervenções permitiram estender significativamente a vida útil dessas viaturas, garantindo sua operação em missões de suporte médico com a confiabilidade característica da plataforma. Curiosamente, o ciclo de substituição das Forças Armadas brasileiras revela uma coincidência notável: tanto os Toyota Bandeirante quanto os Land Rover Defender, adquiridos para sucedê-los, estão programados para serem retirados de serviço em um mesmo horizonte temporal. Ambos serão substituídos, no curto prazo, pela família de veículos 4x4 Agrale AM Marruá, que representa a nova geração de viaturas táticas nacionais. Desenvolvido com foco na robustez e na adaptação às necessidades operacionais brasileiras, o Marruá consolida-se como a escolha estratégica para modernizar a frota militar, encerrando o legado de dois ícones que marcaram a história da defesa nacional.

Em escala.
Para representarmos a Viatura Operações -  Vtr Op Toyota Bandeirante Cabine Dupla, pertencente ao Exército Brasileiro, fizemos uso do modelo em die cast produzido pela Axio na escala 1/43 da coleção “Veículos de Serviço do Brasil Tempos” da Editora Altaya, procedendo a customização para a versão militar.  Empregamos decais confeccionados pela decais Eletric Products pertencentes ao set “Exército Brasileiro 1983 – 2003”.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático do Exército Brasileiro aplicado em a maioria de veículos militares a partir de 1983, porém ainda coexistia com este padrão o esquema de pintura em verde oliva principalmente na versão ambulância. Já carros participantes das operações internacionais UNAVEM I e II foram pintados no esquema das forças de paz das Nações Unidas (ONU). Já os veículos pertencentes ao Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira adotaram esquemas de pintura diferentes.



Bibliografia : 
Grandes Brasileiros: Toyota Bandeirante – Sergio Berezovsky Quatro Rodas
A origem do Toyota Bandeirante - https://www.noticiasautomotivas.com.br/toyota-bandeirante/
Veículos de Serviço do Brasil – Toyota Bandeirante – Editora Altaya
Lexicar Brasil – Toyota  www.lexicar.com.br

M-101 L/22 (M-2A1) 105 mm

História e Desenvolvimento.
O calibre 105 mm emergiu como um marco na artilharia de campanha no início do século XX, impulsionado pelas lições aprendidas durante a Primeira Guerra Mundial (1914–1918). Nesse conflito, os exércitos europeus, especialmente o alemão, demonstraram a superioridade de obuseiros de 105 mm, como o leichte Feldhaubitze 16 (leFH 16), que combinava alcance, potência de fogo e relativa mobilidade. Comparados aos canhões de 75 mm, como o francês Canon de 75 modèle 1897, amplamente utilizado pelos Aliados, os obuseiros de 105 mm ofereciam maior impacto e versatilidade, particularmente em combates de trincheiras e no apoio às tropas terrestres. A eficácia dessas armas em cenários de guerra moderna destacou a necessidade de modernização dos arsenais aliados, que ainda dependiam de equipamentos projetados no final do século XIX. Após o armistício de novembro de 1918, a Força Expedicionária Americana (AEF), que participou ativamente da guerra na Europa, capturou um pequeno lote de obuseiros alemães leFH 16. Essas peças foram enviadas aos Estados Unidos para análise detalhada pelo Departamento de Artilharia do Exército dos Estados Unidos (U.S. Army Artillery), responsável pelo desenvolvimento e operação dos sistemas de artilharia. A eficiência do leFH 16 em combate real, com sua capacidade de atingir alvos a distâncias maiores e com maior poder destrutivo, despertou o interesse dos militares norte-americanos, que reconheceram a obsolescência dos canhões de 75 mm em seus arsenais. Esse estudo marcou o início de um esforço sistemático para desenvolver uma nova geração de obuseiros de 105 mm, com o objetivo de substituir as peças de 75 mm e alinhar a artilharia norte-americana aos padrões modernos. Na década de 1920, o Exército dos Estados Unidos (US Army) lançou o projeto do obuseiro M-1920 Howitzer de 105 mm, um marco inicial na busca por maior potência e mobilidade. O M-1920 foi projetado para superar as limitações dos obuseiros de 75 mm, incorporando inovações como uma flecha retangular (testada na variante M-1925E) e modelos experimentais com duas flechas (T1 e T2), que buscavam melhorar a estabilidade e facilitar o transporte. Essas características refletiam a transição da artilharia hipomóvel, ainda predominante, para uma concepção mais adaptada às demandas de mobilidade em combates modernos. O comando do exército estabeleceu a ambiciosa meta de substituir rapidamente todas as peças de 75 mm pelo novo calibre 105 mm, inicialmente designado como M-1. No entanto, a Grande Depressão, desencadeada pela crise econômica de 1929, impôs severas restrições orçamentárias, limitando os recursos disponíveis para pesquisa, desenvolvimento e produção. A falta de financiamento inviabilizou a concretização do projeto M-1920, que foi abandonado no mesmo ano. Apesar desse revés, este programa lançou as bases para futuros desenvolvimentos, consolidando o calibre 105 mm como um padrão promissor para a artilharia de campanha.

Os esforços para modernizar a artilharia foram retomados em 1932, em um contexto de crescente instabilidade global, com o fortalecimento de regimes autoritários na Europa e o início da militarização japonesa na Ásia. Uma versão modificada do obuseiro M-1 de 105 mm foi desenvolvida e submetida a testes extensivos. Esse modelo introduziu uma inovação significativa: a adoção de munição semifixa, que eliminava a necessidade de carregamento separado, aumentando a cadência de tiro e simplificando a operação em campo. Para acomodar essa mudança, foi necessário alterar o bloco de culatra, resultando na redesignação do projeto como obuseiro M-2 de 105 mm. A produção inicial de 48 unidades  foi contratada junto ao fabricante, mas as persistentes restrições orçamentárias, ainda reflexo da crise econômica, atrasaram as entregas até 1939. Nesse ano, o agravamento das tensões na Europa, marcado pela ascensão do Partido Nazista na Alemanha, incluindo anexação da Áustria (1938) e pela eclosão da Segunda Guerra Mundial em setembro de 1939, impulsionou um programa mais amplo de renovação da artilharia norte-americana. Os primeiros obuseiros deste tipo entregues, carregavam a influência de uma artilharia de campanha “hipomóvel” com sua plataforma de transporte M-1 foi projetada para ser tracionada por cavalos sendo equipado inclusive com rodas de madeira. No entanto, em 1940, essa plataforma foi substituída pela M-2T5, projetada para tração mecanizada por caminhões ou veículos utilitários 4x4, equipada com pneus e adaptada às exigências da guerra moderna. Melhorias adicionais, como a alteração do anel da culatra, foram implementadas em março de 1940, meses antes do início da produção em larga escala do modelo final, redesignado como M-2A1 105 mm.  Curiosamente a arma era pesada para o seu calibre, mas isso ocorreu porque o obuseiro foi projetado para ser durável e necessitar de pouca manutenção em campo. Assim, o tubo e a carruagem podem ter grande utilidade e permanecer funcionais sem se desgastar. O conjunto final de produção do obuseiro agora designado como M-2A1 de 105 mm montado sobre o carro de transporte M-2T5, teria sua montagem destinada aos arsenais de Rock Island Arsenal e US Springfield Armory.  As primeiras peças começaram a ser incorporadas em janeiro de 1941 sendo inicialmente destinados aos regimentos de artilharia baseados no continente, sendo depois entregues durante os primeiros anos do conflito a todos as unidades existentes nos mais variados teatros de operações durante a Segunda Guerra Mundial. 
Neste período o Exército dos Estados Unidos (US Army) implementou uma estrutura padronizada para seus regimentos de artilharia de campanha, visando otimizar o apoio de fogo às divisões de infantaria e blindados. A combinação de obuseiros de 155 mm e 105 mm refletia a necessidade de equilibrar alcance, poder de fogo e mobilidade, permitindo flexibilidade tática em diferentes cenários de combate. O obuseiro M-1 de 155 mm (mais tarde redesignado como M-114) era uma arma de maior calibre, projetada para alvos de maior distância e fortificações, enquanto o obuseiro M-2A1 de 105 mm (posteriormente M-101) era mais leve, móvel e ideal para apoio direto à infantaria. Desta maneira cada regimento  de artilharia passaria a ser constituído por um  Batalhão de Artilharia de 155 mm com doze canhões cada e por três Batalhões de Artilharia de 105 mm com doze armas cada também.  A proporção de três batalhões de 105 mm para um de 155 mm evidencia a necessidade de maior volume de fogo tático, mas a presença do M-1 de 155 mm reforça o papel crítico de ataques de maior impacto. Os regimentos de artilharia eram frequentemente subordinados a divisões de infantaria ou blindados, operando em coordenação com sistemas de comando e controle, como o Fire Direction Center (FDC), para direcionar o fogo com precisão. A padronização facilitava a logística, o treinamento e a interoperabilidade entre unidades. A combinação de obuseiros M-1 de 155 mm e M-2A1 de 105 mm permaneceu como base da artilharia de campanha dos EUA até a década de 1950, quando sistemas mais modernos, como o M-114 de 155 mm (evolução do M-1) e, posteriormente, o M-198 de 155 mm, começaram a substituir os equipamentos mais antigos. O primeiro uso significativo do M-2A1 em combate ocorreu durante a Campanha de Guadalcanal (agosto de 1942 – fevereiro de 1943), no teatro do Pacífico. Essa campanha, uma das primeiras ofensivas aliadas contra o Japão, envolveu intensos combates terrestres na ilha de Guadalcanal, nas Ilhas Salomão. O M-2A1, operado por unidades do Exército dos Estados Unidos (US Army) e do Corpo de Fuzileiros Navais (US Marine Corps), foi empregado para fornecer apoio de fogo contra posições japonesas entrincheiradas, demonstrando sua precisão e confiabilidade em terrenos acidentados e tropicais. Sua capacidade de disparar projéteis de 105 mm com alta cadência foi essencial para neutralizar bunkers e apoiar avanços das tropas aliadas, marcando seu batismo de fogo com sucesso. Após Guadalcanal, o M-2A1 foi amplamente utilizado, com destaque para a  Operação Tocha, a invasão aliada do Marrocos e da Argélia, o M-2A1 apoiou as forças terrestres contra as tropas do Eixo, destacando-se em batalhas como a de Kasserine Pass.

Após as vitórias aliadas no Norte da África em maio de 1943, os líderes aliados (principalmente Estados Unidos e Reino Unido) decidiram avançar contra o "ventre mole" do Eixo na Europa, começando pela Sicília. A Operação Husky foi planejada sob o comando do General Dwight D. Eisenhower, com o 15º Grupo de Exércitos Aliados, liderado pelo General britânico Harold Alexander, as principais forças terrestres incluíam o 8º Exército Britânico e o 7º Exército dos EUA, que participaria ativamente com seus regimentos de artilharia. Os desembarques seriam iniciados no dia 10 de julho, focando as  praias de Gela, Licata e Scoglitti, no sul da Sicília. A 1ª, 3ª e 45ª Divisões de Infantaria, apoiadas pela 2ª Divisão Blindada, enfrentaram resistência inicial, especialmente em Gela, onde a Divisão Hermann Göring lançou contra-ataques com tanques. Neste momento a  artilharia desempenhou um papel crítico em Gela, onde os obuseiros M-2A1 de 105 mm neutralizaram posições italianas e alemãs, enquanto os M-1 de 155 mm foram usados para conter os tanques alemães. A Operação Husky destacou a importância da coordenação entre artilharia, infantaria, blindados e apoio aéreo/naval. A mobilidade dos obuseiros M-2A1 e o poder de fogo dos M-1 de 155 mm provaram ser eficazes no terreno montanhoso da Sicília. Embora o M-2A1 já tivesse sido utilizado em combates anteriores, como na Campanha de Guadalcanal (1942–1943) e na Operação Tocha (1942), o Dia D representou um momento crítico de seu emprego em larga escala na Europa. Os batalhões de artilharia equipados com o M-2A1 forneceram fogo de supressão contra posições alemãs, como bunkers, ninhos de metralhadoras e baterias de artilharia costeira, ajudando a abrir caminho para os soldados que avançavam sob intenso fogo inimigo. Em Omaha Beach, onde a resistência alemã foi particularmente feroz, o apoio de fogo dos M-2A1, coordenado com barragens navais, foi crucial para neutralizar defesas e permitir a progressão das tropas para o interior. Os obuseiros M-2A1 foram desembarcados gradualmente nas praias, com algumas baterias entrando em ação nas primeiras horas do Dia D, após a estabilização inicial das cabeças de praia. Sua capacidade de disparar projéteis de alto explosivo a até 11,5 km, combinada com a precisão e a rápida cadência de tiro, tornou o M-2A1 indispensável para apoiar as operações de infantaria e blindados durante a expansão da cabeça de praia e os combates subsequentes em cidades como Carentan e Saint-Lô. O M-2A1 passou a  ser fornecido a todas as nações aliadas nos termos do Leand & Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos) durante o conflito, entre elas Canadá, Brasil, Australia e França Livre. Até o final da Segunda Guerra Mundial, 8.536 obuseiros M-2A1 de 105 mm foram produzidos em diversas versões chegando até a modelos autopropulsados como o Howitzer Motor Carriage T19 e T32 empregados em conjunto com os carros meia lagarta M-2A1 e M-3 Half Track e T-76 e T-88 montados nos chassis dos carros de combate M-24 Chaffe e M-18. 
Embora o M-2A1 já tivesse sido exaustivamente emprego durante a Segunda Guerra Mundial,  a Guerra da Coreia representou um novo capítulo em sua história, com desafios únicos devido ao terreno acidentado e ao clima rigoroso da península coreana. O obuseiro entrou em ação logo após a mobilização das forças da ONU, em julho de 1950, quando as tropas norte-americanas e sul-coreanas enfrentaram a ofensiva inicial norte-coreana. No início do conflito, o M-2A1 foi usado para conter o avanço das forças norte-coreanas, particularmente durante a defesa do Perímetro de Pusan (agosto–setembro de 1950). Nessa fase crítica, as baterias de M-2A1 forneceram fogo de supressão contra ataques de infantaria e blindados, ajudando a estabilizar a linha de defesa até a contraofensiva aliada, liderada pelo desembarque de Incheon em setembro de 1950. A mobilidade do M-2A1, tracionado por veículos como o caminhão GMC CCKW, permitiu reposicionamentos rápidos, essenciais em um conflito caracterizado por rápidas mudanças de frente. A entrada da China no conflito, em novembro de 1950, intensificou os combates, especialmente na Batalha do Reservatório de Chosin (novembro–dezembro de 1950). Nesse cenário, unidades do US Marine Corps, equipadas com o M2A1, enfrentaram condições extremas de inverno e ataques massivos das forças chinesas. O obuseiro foi crucial para fornecer fogo de cobertura durante a retirada estratégica das tropas aliadas, neutralizando posições inimigas em terrenos montanhosos e permitindo a evacuação de milhares de soldados. A precisão e a cadência de tiro do M-2A1 foram fundamentais para conter as ofensivas chinesas, salvando vidas em um dos momentos mais dramáticos do conflito. Durante a Primeira Guerra da Indochina, a França, buscando reestabelecer o controle sobre suas colônias após a Segunda Guerra Mundial, utilizou o M-2A1 como peça padrão de artilharia de campanha. Equipado com o M-2A1, o Exército Francês e as forças do Estado do Vietnã, um governo fantoche estabelecido pela França em 1949, empregaram o obuseiro em operações defensivas e ofensivas contra o Viet Minh. Sua produção foi oficialmente encerrada em setembro de 1953 com 10.202 unidades entregues, logo após o termino da Segunda Guerra Mundial, um grande número de obuseiros M2A1 105 mm foram classificados como “excedente de guerra”, passando a ser cedidos a nações alinhadas aos interesses norte-americanos como Argentina, África do Sul, Australia, Áustria, Arabia Saudita, Bahrein, Brasil, Bangladesh, Bélgica, Benin, Bolívia, Bósnia, Burkina Faso, Camarões, Canada, Chile, Chade, Colômbia, Croácia, Dinamarca, República Dominicana, Equador, Espanha, Etiópia, El Salvador, Filipinas, Gabão, Grécia, Guatemala, Honduras, Holanda, Indonésia, Ira, Iraque, Japão, Coréia do Sul, República Khmer, Vietnã do Sul, Laos, Líbano, Libéria, Lituânia, Macedônia, Malásia, Mauritânia, Madagascar, México, Marrocos, Moçambique, Myanmar, Nova Zelândia, Nicarágua, Noruega, Paquistão, Peru, Portugal, Rodésia, Ruanda, Senegal, Sudão, Tailândia, Togo, Tunísia, Turquia, Uruguai e Venezuela. Em 1962 sistema de designação de artilharia militar do Exército dos Estados Unidos (US Army) seria alterado com a designação do obuseiro M-2A1 105 mm, sendo modificada para M-101A1 105 mm.  Atualmente muitos exércitos ainda mantem os M2A1 – M101A1 em uso em suas unidades de linha de frente, com nações mais desenvolvidos os empregando apenas com armas cerimonias

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
No início da Segunda Guerra Mundial, o governo norte-americano passou a considerar com extrema preocupação a possibilidade de uma invasão do continente americano pelas forças do Eixo (Alemanha, Itália e Japão). Essa ameaça tornou-se ainda mais evidente após a capitulação da França, em junho de 1940, pois, a partir desse momento, a Alemanha Nazista poderia estabelecer bases operacionais nas Ilhas Canárias, em Dacar e em outras colônias francesas, criando um ponto estratégico para uma eventual incursão militar no continente. Nesse contexto, o Brasil foi identificado como o local mais provável para o lançamento de uma ofensiva, devido à sua proximidade com o continente africano, que à época também figurava nos planos de expansão territorial alemã. Além disso, as conquistas japonesas no Sudeste Asiático e no Pacífico Sul transformaram o Brasil no principal fornecedor de látex para os Aliados, matéria-prima essencial para a produção de borracha, um insumo de extrema importância para a indústria bélica. Além dessas possíveis ameaças, a posição geográfica do litoral brasileiro mostrava-se estrategicamente vantajosa para o estabelecimento de bases aéreas e portos militares na região Nordeste, sobretudo na cidade de Recife, que se destacava como o ponto mais próximo entre os continentes americano e africano. Dessa forma, essa localidade poderia ser utilizada como uma ponte logística para o envio de tropas, suprimentos e aeronaves destinadas aos teatros de operações europeu e norte-africano. Diante desse cenário, observou-se, em um curto espaço de tempo, um movimento de aproximação política e econômica entre o Brasil e os Estados Unidos, resultando em investimentos estratégicos e acordos de cooperação militar. Entre essas iniciativas, destacou-se a adesão do Brasil ao programa de ajuda militar denominado Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), cujo principal objetivo era promover a modernização das Forças Armadas Brasileiras. Os termos desse acordo garantiram ao Brasil uma linha inicial de crédito de US$ 100 milhões, destinada à aquisição de material bélico, possibilitando ao país o acesso a armamentos modernos, aeronaves, veículos blindados e carros de combate. Esses recursos revelaram-se essenciais para que o país pudesse enfrentar as ameaças impostas pelos ataques de submarinos alemães, que intensificavam os riscos à navegação civil, impactando o comércio exterior brasileiro com os Estados Unidos, responsável pelo transporte diário de matérias-primas destinadas à indústria de guerra norte-americana. A participação brasileira no esforço de guerra aliado logo se ampliaria. A participação brasileira no esforço de guerra aliado logo se ampliaria. O então presidente Getúlio Vargas declarou que o Brasil não se limitaria ao fornecimento de materiais estratégicos e sinalizou a possibilidade de uma participação mais ativa de suas forças,  envolvendo o possível envio de tropas brasileiras para algum teatro de operações de relevância

Na década de 1940, a artilharia de campanha do Exército Brasileiro enfrentava desafios significativos, equipada majoritariamente com armamentos ultrapassados, como os canhões alemães Krupp 75 mm Modelo 1908 e franceses Schneider-Canet 75 mm, projetados para tração hipomóvel e fabricados no início do século XX. Esses equipamentos, embora robustos para sua época, não atendiam às exigências do combate moderno. A entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial, ao lado dos Aliados, marcou o início de uma transformação profunda, impulsionada pelo programa norte-americano Lend-Lease Act. A partir de meados de 1942, navios de transporte começaram a desembarcar no porto do Rio de Janeiro, trazendo uma gama de equipamentos modernos, incluindo armas de infantaria, canhões antitanque de 37 mm e obuseiros de 105 mm e 155 mm. Essa incorporação representou um salto qualitativo para a artilharia brasileira, dotando-a de maior potência de fogo e precisão. O compromisso do Brasil com o esforço de guerra aliado foi formalizado em  Em 9 de agosto de 1943, por meio da Portaria Ministerial nº 4.744, publicada em boletim reservado no dia 13 do mesmo mês, foi criada a Força Expedicionária Brasileira (FEB). Estruturada como a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE), sob o comando do General de Divisão João Batista Mascarenhas de Morais, a FEB incluía, além da divisão principal, diversos órgãos não-divisionários essenciais para sua operação. devendo ao todo ser composta por 25.000 soldados.  A composição da Força Expedicionária Brasileira (FEB) contemplava quatro grupos de artilharia (três equipados com obuses de 105 mm e um com 155 mm), uma esquadrilha de aviação da Força Aérea Brasileira para ligação e observação, um batalhão de engenharia, um batalhão de saúde, um esquadrão de reconhecimento e uma companhia de comunicações. A força contava ainda com um comando próprio, um comando de quartel-general, um destacamento de saúde, uma companhia de manutenção, uma companhia de intendência, um pelotão de sepultamento, um pelotão de polícia e, simbolicamente, uma banda de música.  Após desembarcar em Nápoles e realizar treinamento com instrutores americanos, a artilharia da Força Expedicionária Brasileira (FEB) foi posicionada para apoiar as operações do V Exército dos Estados Unidos  contra as linhas defensivas alemãs, como a Linha Gustav e a Linha Gótica. O batismo de fogo ocorreria no dia 16 de setembro de 1944, no sopé do Monte Bastione, ao norte da cidade italiana de Lucca, na Toscana, um vento gelado já prenunciava os rigores do inverno próximo. Precisamente às 14 horas e 22 minutos foi lançado contra o inimigo nazista o primeiro tiro jamais disparado pela artilharia brasileira fora do continente sul-americano, atingindo com precisão o objetivo previsto: Massarosa.  Ao longo da campanha, os M-2A1 105 mm foram usados para bombardear posições alemãs, neutralizar contra-ataques e proteger flancos aliados, demonstrando precisão e confiabilidade em combates prolongados.
Durante a guerra mais obuseiros deste modelo seriam recebidos no Brasil , passando a dotar pelo menos mais grupo de Artilharia Divisionária constituída por três grupos de M-2A1 105 mm e um de M-1 155 mm todos sediados no Rio de Janeiro. Com o fim do conflito, em maio de 1945, os M-2A1 e outros equipamentos utilizados pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) foram transferidos ao Comando de Material do Exército dos Estados Unidos, sediado em Roma. Nesse processo, os itens em melhores condições foram cuidadosamente selecionados, acondicionados e enviados ao Brasil por via marítima, logo após serem recebidos no pais, seriam distribuídos aos Grupos de Artilharia de Campanha do Exército Brasileiro.  Na década de 1970, o Brasil intensificou seus esforços para modernizar suas Forças Armadas, consolidando parcerias estratégicas iniciadas durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945) por meio do programa Leand & Lease Bill Act. Um marco significativo nesse processo foi o Acordo de Assistência Militar Brasil-Estados Unidos, firmado em 1952, que facilitou a transferência de equipamentos militares americanos para o Exército Brasileiro e o Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) da Marinha do Brasil. Nesse contexto, a partir do início da década de 1970, o Brasil recebeu pelo menos 160 obuseiros M-101A1 de 105 mm, oriundos dos estoques do Exército dos Estados Unidos (US Army). Desses, pelo menos 12 unidades foram destinadas ao Batalhão de Artilharia do Corpo de Fuzileiros Navais, fortalecendo a capacidade de apoio de fogo das operações anfíbias e terrestres da Marinha. Este obuseiros foram organizados em baterias, geralmente com quatro peças cada, tracionadas por veículos como caminhões Mercedes-Benz LAK 1418 VTNE, compatíveis com as demandas logísticas das operações anfíbias. A leveza relativa do M101A1, comparada a obuseiros mais pesados, permitia seu transporte em embarcações de desembarque e sua rápida  implantação em praias ou terrenos acidentados, características essenciais para as missões do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN). Totalizando 320 peças o M-2A1 - M-101A1 Howitzer 105 mm ou como é oficialmente designado como M-101AR, atualmente ainda é um dos principais armamentos da Artilharia de Campanha Leve do Exército Brasileiro e do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha, principalmente devido a sua fácil locomoção no terreno e sua ótima eficácia durante o combate. É amplamente usada em disparos indiretos contra pessoal e material, podendo realizar tiros mergulhantes e verticais. Esse obuseiro pode utilizar também vários tipos e quantidades de cargas propulsoras, permitindo que o alcance possa variar dentro da mesma elevação de tiro, consoante as cargas escolhidas, baseado através das sete cargas existentes em que são utilizadas para devidos fins, com grande parte das munições sendo produzidas nacionalmente pela Indústria de Material Bélico do Brasil (IMBEL) como: Tiro 105 mm AE (Alto Explosivo): Usado contra pessoal e material leve, com alta capacidade de fragmentação. E Tiro 105 mm Slv (Salva): Utilizado para efeitos psicológicos ou cerimônias. O obuseiro utiliza sete cargas propulsoras (cargas 1 a 7), que permitem ajustar o alcance dentro da mesma elevação do cano.

Na década de 1980, a Artilharia de Campanha Leve do Exército Brasileiro (EB) e o Batalhão de Artilharia do Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) iniciaram um processo de modernização com a incorporação de obuseiros de 105 mm de fabricação estrangeira. Essa iniciativa visava suprir as deficiências operacionais causadas pelo desgaste dos obuseiros M101A1 (designados no Brasil como M-101AR) e recompor a capacidade de combate das unidades de artilharia. Seria selecionados dois modelos : BAE L118 Light Gun (1980): De fabricação britânica, com este modelo se destacando pela sua leveza, mobilidade e precisão, sendo ideal para operações em terrenos variados, incluindo áreas de selva e montanha. E o  M-56 Oto Melara (1985): De origem italiana, com este obuseiro trazendo maior robustez e capacidade de integração com sistemas modernos de pontaria, complementando as necessidades operacionais das forças brasileiras. A introdução desses obuseiros proporcionou um reforço significativo às unidades de artilharia, especialmente porque muitos M-101AR estavam fora de serviço devido ao desgaste natural e à quebra de componentes críticos, resultando em unidades com capacidade de combate incompleta. Por volta de 2015, os obuseiros M-101AR, que totalizavam 211 peças no inventário do Exército Brasileiro, haviam acumulado mais de 70 anos de serviço. Apesar de sua confiabilidade e versatilidade, o desgaste acumulado e a obsolescência tecnológica geraram a necessidade urgente de substituição ou revitalização. Esses obuseiros, embora eficazes em operações de baixa intensidade, apresentavam limitações em alcance, precisão e integração com tecnologias modernas, quando comparados a sistemas mais recentes. Este cenário culminaria no ano de 2018 na elaboração do Programa de Artilharia de Campo do Programa Estratégico do Exército para ‘Obtenção de Capacidade Operacional Plena’, o esforço é planejado para reestruturar o portfólio de artilharia de campo e fornecer tropas terrestres com poder de fogo adequado e preciso até 2031. Neste contexto, o acervo de peças de artilharia envolvia um total de 211 obuseiros M-101AR , 60 Oto Melara M-56  e 40 L-118 Light Gun, este plano tinha por objetivo colocar em campo um único sistema, buscando assim aprimorar o treinamento, a operação e a logística, além de fornecer maior mobilidade e poder de fogo às unidades de artilharia de campo. Infelizmente este programa não se materializaria nos anos seguintes muito em função de restrições orçamentarias. Na ausência da realização deste programa os olhos do Exército se voltaram para a implementação de um programa de revitalização dos M-101 AR, com este programa sendo incluído no PIT 2020, ficando sobre os auspícios do Arsenal de Guerra General Câmara (AGGC) a implementação deste. Infelizmente os efeitos correlatos a pandemia de Covid-19 ocasionar a elevação dos custos de insumos e matéria prima, algumas empresas tiveram dificuldades em entregar itens de produção nos prazos requeridos. Somente em abril de 2021 os primeiros seis obuseiros revitalizados por meio de manutenção de 3º e de 4º escalões, na oficina de armamento pesado da unidade foram entregues aos grupos de Artilharia de Campanha.
Os obuseiros M-101AR de 105 mm, com uma média de 75 anos de uso, têm sido um pilar da Artilharia de Campanha Leve do Exército Brasileiro (EB). Apesar dos esforços de revitalização conduzidos pelo Arsenal de Guerra General Câmara (AGGC) a partir de 2020, a obsolescência tecnológica e o desgaste natural tornam inadiável sua substituição. Em 2021, o Exército Brasileiro deu passos concretos para modernizar sua artilharia rebocada, com a criação de um grupo de estudo e a aprovação de uma diretriz para avaliar a aquisição de novos obuseiros. Embora programas de revitalização, como o incluído no Plano de Intenções Técnicas (PIT) 2020, tenham prolongado sua vida útil, os desafios associados à manutenção de equipamentos com mais de sete décadas de uso exigem uma solução definitiva. A substituição visa garantir maior mobilidade, precisão e integração com tecnologias modernas, alinhando a artilharia brasileira aos padrões contemporâneos. Em 2021, o Subprograma Sistema de Artilharia de Campanha (SPrg SAC), inserido no Programa Estratégico do Exército para Obtenção de Capacidade Operacional Plena (Prg EE OCOP), criou um grupo de estudo para avaliar a viabilidade de aquisição de novos obuseiros. O objetivo era identificar um sistema que pudesse substituir os M-101AR, otimizando o treinamento, a logística e o poder de fogo das unidades de artilharia de campanha. Em 30 de abril de 2021, foi publicada no Boletim do Exército nº 17/2021 a Portaria EME/C Ex nº 379, que aprovou a diretriz de início do projeto de modernização da artilharia rebocada do Exército Brasileiro. E programa envolve a constituição de um estudo de viabilidade referente a  aquisição e revitalização de 86 obuseiros M-119A2, de 105mm, dos estoques do Departamento de Defesa do governo dos Estados Unidos (DoD), junto a materiais para a sua operação, através do “Foreign Military Sales” (FMS). De acordo com a diretriz do Subprograma Sistema de Artilharia de Campanha (SPrg SAC), caso a aquisição se efetive, o recebimento deverá ocorrer em um período de até sete anos a partir da assinatura do contrato.  Porém, segundo informou o tenente-coronel Nei Altieri Pereira dos Santos, diretor do Arsenal de Guerra General Câmara (AGGC), o arsenal manterá a capacidade operacional dos M-101 AR 105 mm durante todo esse tempo. Disparando deste os campos da Itália em 1944, enfim os veteranos obuseiros de 105 mm terão comprido sua missão.


Em Escala.
A representação do obuseiro M-101A1 L/22 de 105 mm foi realizada com o excepcional kit da Testors-Italeri na escala 1/35, reconhecido por sua qualidade superior e alto nível de detalhamento. Produzido pela Italeri, uma renomada fabricante italiana de modelos em escala, e distribuído pela Testors, este kit destaca-se pela precisão na reprodução das características do M-101A1, incluindo todas as partes móveis do obuseiro, como o tubo, a culatra e a carruagem M-2 T5. O modelo também inclui acessórios realistas, como caixas de munição e uma equipe de operação, composta por figuras. Para retratar a versão do M101A1 AR utilizada pelo Exército Brasileiro, o kit não exige modificações, sendo possível montá-lo direto da caixa.
Quando as primeiras unidades do M-2A1 (M-101A1) AR foram recebidas pela Força Expedicionária Brasileira (FEB) em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial, elas seguiam o padrão de pintura Federal Standard (FS) do Exército dos Estados Unidos, caracterizado por um esquema monocromático em verde oliva (FS 34087), projetado para camuflagem em ambientes temperados, como os da Itália. Esse padrão foi mantido no pós-guerra, mas, a partir de 1983, o Exército Brasileiro adotou um esquema tático de camuflagem em dois tons, refletindo a necessidade de adaptar os obuseiros a diferentes cenários operacionais, incluindo áreas de selva, cerrados e ambientes urbanos.  Já os M-101 empregados pelo Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil (CFN) empregam outro padrão de pintura.  Empregamos tintas e vernizes  fabricados pela Tom Colors.



Bibliografia: 
- M101A1 – M2A1 105 mm Howitzer Wilipedia - https://en.wikipedia.org/wiki/M101_howitzer
- Artilharia de Campanha no Exército Brasileiro – Cezar Carriel Benetti - http://www.ecsbdefesa.com.br/fts/ACEB.pdf
- Exército mantém os M101A operacionais – Paulo Roberto Bastos Jr - https://tecnodefesa.com.br/
- Exército busca substitutos para os M101 AR  – Luiz Padilha - http:// www.defesaaereanaval.com.br

Schneider - Cannet 75 mm

História e Desenvolvimento.
Em 1836, os irmãos Adolphe Schneider (1802-1845) e Joseph-Eugène Schneider (1805-1875), originários de uma família lorraine, fundaram a Schneider, Frères & Cie., uma sociedade em comandita por ações, na cidade de Le Creusot, na Borgonha, França. A empresa nasceu com a aquisição das forjas e fundições locais, que estavam em falência, em parceria com o banqueiro François-Alexandre Seillière e Louis Boigues, proprietário das Forges de Fourchambault. A escolha de Le Creusot foi estratégica, uma vez que a região dispunha de minas de carvão e minério de ferro em um perímetro próximo, além de acesso ao Canal du Centre, que facilitava o transporte de matérias-primas e produtos acabados. Este contexto, aliado ao início da Revolução Industrial na França e ao surgimento das ferrovias, ofereceu um cenário promissor para o desenvolvimento industrial. Os irmãos Schneider, apesar de não possuírem formação técnica formal, demonstraram visão empreendedora e conhecimento financeiro, adquiridos em parte por meio de cursos no Conservatoire des Arts et Métiers em Paris. Adolphe assumiu a gestão administrativa e comercial, enquanto Eugène focava nos aspectos técnicos e operacionais, estabelecendo uma divisão de papéis que impulsionou o crescimento inicial da empresa. A Schneider, Frères & Cie. foi criada com a ambição de modernizar a indústria metalúrgica francesa, aproveitando as inovações britânicas, como a produção de aço e a construção de locomotivas. A partir de 1837, a empresa iniciou um processo de modernização dos equipamentos industriais, com a introdução de altos-fornos alimentados a coque, fornos de pudlagem mecanizados e o uso do marteau-pilon (martelo-pilão), inventado pelo engenheiro François Bourdon. Em 1838, a Schneider, Frères & Cie. produziu a primeira locomotiva a vapor fabricada na França, batizada de La Gironde, destinada à Compagnie du Chemin de Fer Paris–Versailles. Este feito colocou a empresa em competição direta com as indústrias britânicas, consolidando sua reputação no setor ferroviário. Além de locomotivas, a empresa fabricava trilhos, pontes metálicas e estruturas para estações de trem, atendendo à crescente demanda por infraestrutura ferroviária na França e no exterior, incluindo Itália, Espanha e o Império Russo. A empresa também investiu na integração vertical, controlando desde a extração de minério e carvão até a produção de produtos acabados. Foram adquiridas minas de carvão no bassin de Blanzy e de minério de ferro na Nièvre e na vallée de la Dheune, garantindo a segurança no fornecimento de matérias-primas. A criação de ateliers de mecânica e montagem em Le Creusot, apoiados por escritórios de projetos internos, permitiu à empresa desenvolver suas próprias máquinas-ferramentas, uma inovação que a destacou como pioneira na França.

Em 1845, a trajetória da empresa sofreu um revés com a morte acidental de Adolphe Schneider, vítima de um acidente a cavalo. Eugène assumiu sozinho a liderança, renomeando a empresa para Schneider & Cie.. Apesar da perda, Eugène demonstrou habilidade em manter o crescimento da companhia, expandindo suas operações e consolidando sua influência econômica e política. Sob a liderança de Eugène Schneider, a Schneider & Cie. tornou-se um dos principais grupos industriais da França no século XIX. A empresa diversificou sua produção, entrando nos setores de armamentos, construção naval e engenharia pesada. Após a derrota francesa na Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), o governo francês solicitou a retomada da produção de armamentos, já que os canhões de aço prussianos haviam se mostrado superiores. A Schneider & Cie. respondeu com a fabricação de canhões, blindagens e novos tipos de aço, como o aço ao níquel, utilizado em armamentos e navios. A empresa também se destacou na construção naval, produzindo navios de guerra e componentes para estaleiros, como os Forges et Chantiers de la Gironde, controlados pelo grupo entre 1882 e 1927. No setor ferroviário, a Schneider & Cie. exportava locomotivas para mercados internacionais, incluindo a Rússia, onde participou da construção da Ferrovia Transiberiana. Em 1876, a aquisição de um marteau-pilon de 100 toneladas reforçou a capacidade da empresa de produzir peças de grande porte, como eixos para navios e canhões.Eugène Schneider implementou uma política paternalista em Le Creusot, construindo moradias, escolas, hospitais e igrejas para os trabalhadores, que chegaram a 10.000 no auge do século XIX. Essa abordagem, embora visasse melhorar as condições de vida, também buscava manter o controle social, evitando a disseminação de ideias socialistas e greves. A influência política da família Schneider era igualmente notável: Eugène foi ministro da Agricultura e Comércio (1851), deputado, prefeito de Le Creusot e presidente do Corps Législatif, transformando a cidade em um feudo industrial e político. Em 1856, os habitantes de Le Creusot chegaram a propor renomear a cidade como Schneiderville, um testemunho do impacto da família na região. Após a morte de Eugène Schneider em 1875, seu filho Henri Schneider (1840-1898) assumiu a liderança da empresa. Henri continuou a modernização tecnológica, adotando processos como os convertidores Bessemer e os fornos Martin para a produção de aço. Sob sua gestão, a Schneider & Cie. intensificou a exportação de armamentos, aproveitando a Lei de 1884, que autorizava a venda de equipamentos militares para o exterior. Canhões como o Longtom (brevet Canet Schneider) foram fornecidos a exércitos estrangeiros, incluindo o do Transvaal, e demonstraram superioridade em conflitos contra os britânicos.
Após a derrota francesa na Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), que revelou a superioridade dos canhões de aço prussianos, a França buscou modernizar seu arsenal militar. Nesse contexto, a Schneider, Frères & Cie., sob a liderança de Henri Schneider, filho de um dos fundadores, Eugène Schneider, identificou uma oportunidade estratégica ao investir no setor de armamentos. A partir da década de 1870, a empresa, sediada em Le Creusot, na Borgonha, reorientou parte de suas operações para o desenvolvimento e fabricação de uma ampla gama de canhões e morteiros, marcando o início de sua trajetória como uma das principais fabricantes de artilharia da Europa. Este movimento foi impulsionado pela necessidade de fortalecer a defesa nacional em um período de tensões geopolíticas e avanços tecnológicos na metalurgia e na engenharia. A Schneider & Cie., já reconhecida por sua expertise em siderurgia, ferrovias e construção naval, aproveitou sua capacidade industrial para atender às demandas do Exército Francês (Armée de Terre). A decisão de Henri Schneider de diversificar as atividades da empresa reflete a visão de consolidar a Schneider & Cie. como um pilar da indústria de defesa francesa, em um momento em que a Revolução Industrial transformava a produção militar em escala global. Em 1897, a Schneider & Cie. deu um passo decisivo para consolidar sua posição no setor de artilharia ao adquirir as Forges et Chantiers de la Méditerranée, localizadas em Le Havre, na Normandia. Essa aquisição trouxe à empresa uma equipe altamente qualificada de engenheiros e projetistas, além de tecnologias avançadas, especialmente no desenvolvimento de canhões sem recuo. A integração do conhecimento técnico das Forges du Méditerranée permitiu à Schneider & Cie. absorver rapidamente um know-how especializado, posicionando-a como uma das líderes no mercado de armamentos. Um dos principais protagonistas dessa fase foi o engenheiro Gustave Canet, originalmente ligado às Forges du Méditerranée. Canet, cuja genialidade técnica foi reconhecida internacionalmente, tornou-se uma figura central na Schneider & Cie., ocupando cargos como diretor de artilharia em Le Creusot e, posteriormente, diretor honorário da divisão de artilharia. Sob sua liderança, a empresa desenvolveu a emblemática família de canhões Canet-Schneider, produzida em diversos calibres para aplicações terrestres e navais. Esses canhões combinaram inovações em materiais, como o aço de alta resistência, com designs avançados, garantindo precisão e confiabilidade.

A maior contribuição da Schneider & Cie. para a história da artilharia moderna ocorreu na transição do século XIX para o século XX, com o desenvolvimento do canhão Schneider-Canet de 75 mm, introduzido em 1906. Este modelo revolucionou a artilharia de campanha ao incorporar tecnologias inovadoras que o tornaram um marco na evolução das armas de fogo rápido. Projetado por Gustave Canet, o canhão foi construído inteiramente em aço rápido, com um tubo estriado e carregamento pela culatra, características que garantiam maior eficiência e velocidade de disparo. O Schneider-Canet de 75 mm destacou-se por seu sistema de amortecimento de recuo, composto por um freio hidráulico e um recuperador hidropneumático, que recolocava a peça automaticamente na posição de tiro após cada disparo. Essa inovação, concebida por Canet, permitiu a operação no modo de tiro rápido, com uma cadência de 10 a 20 disparos por minuto — ou até 30 disparos com uma equipe altamente treinada. Em comparação, os canhões de reparo fixo da época, como o Canet M-890 de 100 mm (introduzido em 1896), permitiam apenas um disparo a cada 10 minutos, evidenciando a superioridade do novo modelo. O sistema de recuo do Schneider-Canet de 75 mm utilizava mecanismos hidropneumáticos que absorviam a energia do disparo, movendo o barril e seu trenó sobre um berço de aço cromo-níquel. Após o disparo, o canhão retornava à posição inicial sem necessidade de realinhamento, mantendo a direção de tiro precisa. Os dispositivos de mira, montados diretamente no berço, permaneciam alinhados, facilitando ajustes rápidos e aumentando a eficiência operacional. O canhão possuía um barril de aço-níquel forjado e temperado, com um tubo interno, duas mangas e uma abraçadeira de ferro, além de uma alma raiada com 30 estrias progressivas, que conferiam maior velocidade inicial ao projétil. O sistema de fechamento da culatra, com parafusos de dois setores lisos e dois roscados, permitia abertura e fechamento rápidos, com ejeção automática da baia. O Schneider-Canet de 75 mm podia disparar três tipos de projéteis, todos com 6,5 kg: granadas comuns, granadas de estilhaços e uma granada de alto explosivo, ideal para atacar fortificações. Essas características tornaram o canhão significativamente mais leve, preciso e eficiente em comparação com concorrentes, como os modelos franceses Saint-Chamond e alemães Krupp de 75 mm. O Schneider-Canet de 75 mm foi rapidamente adotado pelo Exército Francês, que celebrou um grande contrato de aquisição em 1906 para substituir e complementar modelos obsoletos, como o Canet M-890 de 100 mm. 
As primeiras unidades começaram a ser entregues no mesmo ano, marcando o início de um processo de modernização da artilharia francesa. O sucesso do canhão não se limitou à França: sua reputação atraiu contratos de exportação para diversos países, com destaque para a Espanha, que se tornou um dos maiores usuários do modelo na primeira década do século XX. A partir de 1909, a Espanha passou a produzir o canhão e suas munições sob licença, consolidando a influência da Schneider & Cie. no mercado internacional. O Schneider-Canet de 75 mm foi amplamente reconhecido como o ápice da tecnologia de artilharia de campanha de tiro rápido em sua época. Sua superioridade técnica, aliada à capacidade de produção em escala da Schneider & Cie., garantiu sua adoção em diversos exércitos e sua utilização em conflitos do início do século XX, incluindo a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), onde demonstrou eficácia em operações de campo. Seu baixo peso total, acabaria o tornando ideal para o emprego como canhão de montanha, até então a movimentação e operação de peças de artilharia em regiões montanhosas representava desde sempre grandes dificuldades aos homens da arma de artilharia. As peças de grande calibre, habitualmente mais eficazes, eram pesadas demais para poderem tracionadas por animais, limitando assim o poder ofensivo neste tipo de campo de batalha. Assim os primeiros exercícios com os canhões Schneider Canner 75 mm, teriam início em regiões de relevo irregular a partir de meados do ano de 1909, e seus promissores resultados levariam a imediata aprovação e consequente celebração de grandes contratos e produção. Sua incorporação pelo Exército Frances (Armée de Terre), levaria a gradual substituição dos canhões Schneider 65 mm modelo 1906.  O modelo logo conquistaria diversos contratos de exportação, com seu batismo de fogo ocorrendo em 1909, sendo empregados pelo Exército Espanhol (Ejército de Tierra) durante a Guerra Melilla deflagrada entre os meses de julho e dezembro. Este seria o primeiro registro de uma longa carreira de empregos em conflitos militares no século XX, com destaque na Primeira Guerra Mundial, Guerra Civil Espanhola, Segunda Guerra Mundial e outros conflitos regionais de importância relevante. Os canhões Schneider Cannet 75 mm além da Espanha, seriam exportados para o Brasil, Polônia, Grécia, Brasil, Paraguai, Iugoslávia e Estados Unidos, com muitos destes se mantendo em emprego até meados da década de 1960. 

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
A artilharia brasileira, enraizada nas lutas coloniais e consolidada após a Independência de 1822, é um pilar da história militar do país, marcada por momentos de bravura, inovação e resiliência. As origens da artilharia brasileira remontam ao período colonial, quando brasileiros se mobilizaram em conflitos como as Batalhas de Guararapes, enfrentando forças holandesas em Pernambuco com táticas rudimentares, mas corajosas. Após a Independência, em 1822, a artilharia de campanha começou a se estruturar como uma arma organizada, ganhando prestígio no Império do Brasil. Diferentemente da infantaria e da cavalaria, que exigiam menos anos de formação, a artilharia demandava treinamento completo na Academia Militar do Império, refletindo sua complexidade técnica. Os artilheiros, muitas vezes jovens oficiais, dedicavam-se a dominar cálculos balísticos e manobras táticas, forjando uma tradição de excelência que marcaria gerações. O auge desse período foi a Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870), onde a artilharia brasileira, sob o comando do Marechal Emílio Luís Mallet, se destacou na Batalha de Tuiuti (1866), a maior batalha campal da América do Sul. Apelidada de “Artilharia Revólver” por sua precisão e rapidez, a força brasileira, protegida por um fosso tático inovador, resistiu a ataques paraguaios com uma determinação eternizada na frase de Mallet: “Eles que venham! Por aqui não passam!”. Nascido na França em 1801 e naturalizado brasileiro, Mallet comandou com destreza, sendo promovido a brigadeiro por mérito e agraciado com o título de Barão de Itapevi em 1878, ascendendo a marechal em 1885. Sua liderança transformou a artilharia em um símbolo de orgulho nacional, inspirando gerações de artilheiros. A influência da Friedrich Krupp AG no Brasil começou em 1872, com a aquisição dos primeiros canhões de campanha de 75 mm, destinados aos Regimentos de Artilharia a Cavalo. Essas peças, fabricadas em Essen, Alemanha, representavam o auge da tecnologia bélica, superando os canhões franceses La Hitte, que até então equipavam o arsenal brasileiro. Na década de 1880, o Exército Imperial recebeu mais três dezenas de canhões Krupp 75 mm Modelo 1895, recomendados pelo Conde d’Eu, Comandante Geral da Artilharia e presidente da Comissão de Melhoramento de Material do Exército. Como genro do Imperador Dom Pedro II, o Conde d’Eu desempenhava um papel central como conselheiro militar, defendendo a superioridade dos canhões alemães, que alcançavam até 12.000 metros, uma melhoria significativa em relação aos modelos anteriores. A adoção em larga escala dos canhões Krupp marcou uma virada na modernização do Exército Brasileiro, recuperando o potencial militar após anos de estagnação. Para os artilheiros, operar essas armas era um desafio que exigia precisão e treinamento. Em exercícios nos campos de treinamento do Rio de Janeiro, equipes de cinco a sete homens carregavam projéteis de 6,5 kg, ajustavam sistemas de mira e disparavam sob o calor carioca, fortalecendo a camaradagem. Ironicamente, os canhões recomendados pelo Conde d’Eu foram usados contra uma rebelião monarquista na Guerra de Canudos (1896-1897), onde provaram sua eficácia em combates reais, apesar das condições adversas do sertão baiano.

No início do século XX, o Exército Brasileiro enfrentava desafios significativos decorrentes da obsolescência de seus armamentos e doutrinas militares. As limitações técnicas haviam sido expostas durante a Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870), o maior conflito da América do Sul, e confirmadas na Campanha de Canudos (1896-1897), que revelou a inadequação do arsenal brasileiro frente às demandas de combates modernos. Os canhões Krupp de 75 mm, adquiridos em 1872 e 1895, embora inovadores em sua época, já não acompanhavam os avanços tecnológicos da artilharia global, como os sistemas de recuo hidropneumático e a maior mobilidade exigida pelas táticas contemporâneas. Este cenário refletia não apenas a ausência de uma indústria bélica nacional, mas também a dependência de importações e a necessidade urgente de modernização para alinhar o Brasil às potências militares da época. A transformação do Exército Brasileiro ganhou impulso com a liderança de figuras visionárias, como os Marechais João Nepomuceno de Medeiros Mallet, Francisco de Paula Argolo e, sobretudo, Hermes da Fonseca, que, com o apoio do Barão do Rio Branco, então Ministro das Relações Exteriores, impulsionaram a chamada Reforma Hermes (1900-1908). Este processo de reestruturação, conduzido durante o governo de Rodrigues Alves e intensificado sob a presidência de Afonso Pena, buscava reposicionar o Exército como uma força moderna, capaz de responder aos desafios estratégicos do novo século. Inspirado pelo modelo do Exército Prussiano, particularmente pelo sistema de Estado-Maior desenvolvido por Helmuth von Moltke, Hermes da Fonseca defendia a necessidade de equipar o Brasil com armamentos de ponta e adotar uma organização militar baseada na disciplina, na eficiência e na inovação tecnológica. A Reforma Hermes incluiu a reorganização territorial do país, com a divisão em 21 regiões para alistamento militar e 13 para inspeção, além da criação e regulamentação do Estado-Maior do Exército, um órgão central para planejamento estratégico e coordenação operacional. Essas medidas visavam não apenas modernizar a estrutura militar, mas também fortalecer a soberania nacional em um contexto de crescente influência geopolítica do Brasil na América do Sul. Reconhecendo a inexistência de uma indústria bélica nacional capaz de suprir as necessidades do Exército, Hermes da Fonseca organizou, em agosto de 1908, uma missão militar à Europa, com destino à Alemanha e à França, dois dos principais centros de tecnologia militar da época. A missão, composta por oficiais de alto escalão, tinha como objetivo identificar fornecedores de armamentos modernos e estabelecer parcerias para a transferência de conhecimentos técnicos e profissionais, essenciais para a capacitação do Exército Brasileiro. Os resultados dessa missão foram expressivos, culminando na aquisição de um vasto arsenal de equipamentos destinados a renovar as capacidades da infantaria, cavalaria e artilharia. Para a infantaria, foram adquiridos 400.000 fuzis Mauser de calibre 7 mm, fabricados na Alemanha, reconhecidos por sua precisão e confiabilidade. A cavalaria foi equipada com 10.000 lanças Ehrhardt, 20.000 espadas e 10.000 mosquetões, adaptados às táticas de combate montado. 
A artilharia de campanha recebeu duas baterias de canhões Krupp 75 mm Modelo 1908, seis baterias de canhões Krupp 75 mm de montanha, projetados para mobilidade em terrenos acidentados, e cinco baterias de obuses Krupp 105 mm, ideais para fogo de apoio. A Marinha do Brasil também foi beneficiada com a aquisição de peças de artilharia de costa Schneider-Canet C-50 1902 de 150 mm, conhecidas pelo sistema de tiro rápido, que combinava carregamento pela culatra e mecanismos de recuo hidropneumático. Essas peças foram instaladas em fortificações estratégicas, como a Fortaleza de Copacabana, no Rio de Janeiro, então Capital Federal, e em seis conjuntos destinados às defesas costeiras de Santos, no litoral de São Paulo. Em Santos, os canhões Schneider-Canet operavam em conjunto com quatro obuses Krupp 280 mm C-16 Modelo 1912, formando um sistema robusto de defesa costeira. Embora as aquisições de 1908 representassem um marco na modernização militar, os canhões Schneider-Canet já integravam o arsenal brasileiro desde o final do século XIX. Durante a década de 1890, o Exército Brasileiro havia incorporado baterias equipadas com os canhões Canet M-890 de 100 mm e Canet M-897 de 75 mm, fabricados pela Schneider & Cie. em Le Creusot, França. Esses modelos, embora menos avançados que o Schneider-Canet de 75 mm introduzido em 1906, já demonstravam a qualidade técnica da empresa francesa, conhecida por sua liderança em artilharia de tiro rápido. A presença desses canhões no Brasil evidenciava a confiança do Exército nas tecnologias da Schneider & Cie., reforçada pelas novas aquisições no início do século XX. Durante os anos vindouros a adoção destas novas peças de artilharia de origem alemã e francesa em muito iram modificar o patamar operacional brasileiro, sendo postos a prova em uma série de eventos de revoltas ou insurreições regionais, como a “Guerra do Contestado” ocorrida nos estados do Paraná e Santa Catarina durante o ano de 1912.  Apesar destes significativos avanços, o eclodir da Primeira Guerra Mundial em 1914, traria grandes avanços não só em tecnologia de armas, mas também na doutrina militar, elevando os patamares da guerra moderna. Esta nova realidade rapidamente relegaria o Exército Brasileiro a patamar operacional inferior ao vigente a partir do ano de 1918, suscitando assim a necessidade de um novo ciclo de atualização.  As preocupações em torno da obsolescência doutrinariam e de material das Forças Armadas Brasileiras, eram fundamentadas principalmente pelo rápido desenvolvimento econômico e militar da Argentina, que passava a representar a principal hipotética ameaça ao pais. Assim com o objetivo de reverter este cenário crítico a partir do segundo semestre de 1918, o governo brasileiro passaria a buscar alternativas para a implementação deste novo ciclo de desenvolvimento militar. Neste intuito seriam conduzidos diálogos junto ao governo francês a fim de estudar a contratação de uma assessoria militar que pudesse conduzir este processo. Estas negociações já em um estágio avançado ocorreriam em Paris, entre o adido militar brasileiro na França, coronel Malan d’Angrogne, e o ministro da Guerra francês, Georges Clemenceau. Paralelamente seria enviado ao Brasil o general Maurice Gamelin, em uma missão de levantamento de perspectivas sobre o real cenário das Forças Armadas Brasileiras, visando assim melhor embasar a proposta francesa. 

O contrato seria assinado poucos meses depois na capital francesa, sendo ratificado logo em seguida no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, criando assim oficialmente a “Missão Militar Francesa”. Os termos do contrato estipulavam que oficiais franceses comandariam durante quatro anos as escolas de Estado-Maior (EEM), de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), de Intendência e Veterinária. Em contrapartida o Brasil se comprometeria a privilegiar a indústria francesa em seus processos de aquisição de armas e equipamentos militares, desde que as condições comerciais e prazos de entrega fossem no mínimo equivalentes as propostas apresentadas por empresa de outros países. Para o Brasil, este contrato representaria um grande passo na direção da profissionalização e modernização de suas forças armadas, novamente equalizando a balança militar na América do Sul. Este processo começaria a ser consolidado a partir de meados de 1921, com a adoção de novos regulamentos destinados à Direção e Emprego das Grandes Unidades, ao Exercício e Emprego da Artilharia e ao Serviço de Estado-Maior em Campanha. As primeiras percepções levantadas pelos comandantes da “Missão Militar Francesa” apontavam a necessidade modernização de uma série equipamento e armas, sendo listadas as prioridades e as quantidade mínimas que deveriam ser incorporadas. Uma concorrência internacional seria aberta e atendendo ao preceito estabelecido anteriormente, as propostas apresentadas pela indústria militar francesa seriam preferenciadas. Em termos da arma de artilharia de campanha seriam adquiridos um grande número de canhões, incluindo vários modelos fabricados pela empresa Schneider - Creusot Fréres & Cie, entre estes os modelos C-50 1902 de 150 mm (emprego terrestre e ferroviário), Schneider 75/28 modelo 1906 de 75 mm e C-18 - 6 Modelo 1919 de 75 mm (canhão de montanha), com dois estes últimos modelos, encomendados e recebidos durante o ano de 1923. Para o atendimento as necessidades do Exército Brasileiro que na época era em sua maioria hipomóvel, os canhões de campanha Schneider-Canet seriam recebidos com rodas de madeira, sendo destinados então a equipar as a equipar as unidades de cavalaria de fronteira. Seguindo os padrões franceses as unidades de cavalaria seriam compostas por baterias com quatro canhões de 75 mm, quatro carros de munição (cada arma podia carregar trinta e oito munições na carroça de tração, sendo complementadas com mais sessenta unidades no carro de munição), um carro de apoio (com ferramental) e por fim um carro forja, com a função de assegurar a manutenção das peças em campanha e os reparos nos carros de tração e de serviço. Estas baterias seriam operadas por um efetivo de três oficiais, dez sargentos e cento e vinte e um praças, demandando trinta e nove cavalos e noventa e seis muares para a tração das peças e do pessoal. Os canhões de montanha Schneider-Canet 75 mm, caracterizados por serem peças pequenas, leves e de fácil transporte, trouxeram diversos benefícios à artilharia de campanha, com o fator principal de seu rápido emprego em qualquer região brasileira. 
Os canhões Schneider-Canet de 75 mm foram amplamente utilizados em quase todos os grandes conflitos internos do Brasil no início do século XX, desempenhando papéis cruciais em momentos de instabilidade política e social. Durante a Revolução de 1930, que culminou na ascensão de Getúlio Vargas ao poder, essas peças de artilharia foram empregadas por forças governistas e oposicionistas, demonstrando sua confiabilidade em operações de campanha. Na Revolução Constitucionalista de 1932, um dos mais significativos conflitos civis da história brasileira, os Schneider-Canet de 75 mm foram utilizados por ambos os lados — as tropas paulistas, que buscavam a redemocratização do país, e as forças federais leais ao governo Vargas. A presença dessas armas em combates urbanos e rurais, especialmente nas frentes de batalha no interior de São Paulo, evidenciou sua importância estratégica, com sua mobilidade e precisão permitindo apoio efetivo às tropas em movimento. A utilização simultânea por forças opostas destacou a disseminação dessas peças no arsenal brasileiro e sua relevância como armamento padrão da época. Um dos usos mais peculiares dos canhões Schneider-Canet de 75 mm (e também dos Krupp de mesmo calibre) ocorreu durante a Revolução Constitucionalista de 1932, quando foram integrados como armamento orgânico em seis trens blindados, denominados TB-1 a TB-6. Esses trens foram construídos nas Oficinas Ferroviárias de São Paulo, sob a supervisão técnica da prestigiada Escola Politécnica Paulista, em um esforço de engenharia que combinou criatividade e recursos locais. Cada trem blindado era composto por uma locomotiva posicionada entre dois vagões blindados, com uma prancha à frente para inspecionar a integridade dos trilhos, uma precaução contra sabotagens. No vagão frontal, uma abertura central abrigava um canhão Schneider-Canet ou Krupp de 75 mm, operado internamente e ocupando toda a parte dianteira do carro, com espaço apenas para circulação lateral. Essa configuração permitia ao canhão disparar diretamente contra alvos à frente, oferecendo proteção às tropas e apoio de fogo em operações ao longo das ferrovias, que eram cruciais para a logística e mobilidade durante o conflito. Com o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os canhões Schneider-Canet de 75 mm continuaram a desempenhar um papel relevante no Exército Brasileiro. A partir de 1954, com a crescente motorização do Exército Brasileiro, os canhões Schneider-Canet passaram por um processo de modernização nos Arsenais de Guerra do Rio de Janeiro (AGRJ) e de General Câmara (AGRS), no Rio Grande do Sul. As rodas de madeira originais, inadequadas para o transporte em veículos motorizados, foram substituídas por rodas com pneus, aumentando a mobilidade e a compatibilidade com as novas demandas logísticas. Essa atualização permitiu que os canhões permanecessem em serviço operacional até meados da década de 1960, quando foram gradualmente substituídos por armamentos mais modernos, como os obuses M-101 de 105 mm, adquiridos dos Estados Unidos.

Em Escala.
Para recriar o canhão Schneider-Canet 75 mm M-897 em escala, a única opção disponível no mercado na escala 1/35 é o kit produzido pela empresa alemã Tom Modellbau. Apesar de ser um kit mais antigo, ele oferece um nível de detalhamento e acabamento aceitável para os padrões da escala 1/35, permitindo aos modelistas capturar as características essenciais desta peça histórica. O kit reproduz com fidelidade os elementos distintivos do M-897, como o tubo estriado, o sistema de recuo hidropneumático, o berço de aço cromo-níquel e a estrutura do freio e recuperador, que garantiam a funcionalidade de tiro rápido. Embora não seja um modelo recente, o kit da Tom Modellbau atende às expectativas de entusiastas que buscam representar com precisão o armamento utilizado pelo Exército Brasileiro. Na montagem do modelo, optou-se por não utilizar decais, uma escolha que reflete a intenção de manter a representação focada na autenticidade estrutural e estética do canhão, sem a necessidade de marcações adicionais. 
O esquema de pintura aplicado aos canhões Schneider-Canet de 75 mm no Brasil, inspirado no padrão francês da década de 1920, utilizava tons que favoreciam a integração visual com o ambiente e a proteção contra corrosão. Embora registros precisos do sistema Federal Standard (FS) para o período sejam limitados. Durante a Revolução Constitucionalista de 1932, as forças paulistas adaptaram o padrão de pintura dos canhões Schneider-Canet e Krupp de 75 mm para atender às demandas táticas do conflito. As peças empregadas em carros e trens blindados, como os TB-1 a TB-6 construídos nas Oficinas Ferroviárias de São Paulo, receberam um esquema de camuflagem específico, projetado para operações em terrenos variados do interior paulista. As peças Schneider-Canet de 75 mm preservadas no Museu Histórico do Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, refletem o esquema de cores adotado pelo Exército Brasileiro na década de 1920, com ênfase no verde-oliva escuro (FS 34087) e detalhes em cinza escuro (FS 36081) e preto fosco (FS 37038).

Bibliografia: 
- Schneider Frères et Compagnie - https://www.lesechos.fr
- Schneider-Canet - https://pt.wikipedia.org/wiki/Schneider-Canet
- Missão Militar Francesa por Rodrigo N. Araujo -  https://cpdoc.fgv.br/
- Arquivos do Museu Militar de Conde de Linhares – Rio de Janeiro
- Canhão de Montanha Schneider 75mm - http://www.cporpa.eb.mil.br/