História e Desenvolvimento.
A North American Aircraft foi fundada em 6 de dezembro de 1928, em Los Angeles, Califórnia, por iniciativa do empresário Clement Melville Keys, figura influente no setor de transporte aéreo norte-americano. Em sua fase inicial, a empresa atuou sobretudo como uma holding corporativa, cujo propósito era facilitar a aquisição, reorganização e negociação de participações em companhias aéreas e em outras empresas vinculadas ao emergente mercado da aviação civil nos Estados Unidos. Era um período de intensa expansão do setor, marcado tanto por otimismo quanto por elevada especulação. Esse modelo de negócios, contudo, seria profundamente abalado a partir de 1934, quando a promulgação da controversa “Lei Federal do Correio Aéreo” (Air Mail Act) desencadeou uma crise institucional no sistema de contratos de correio aéreo. O novo marco regulatório provocou o colapso de várias holdings e conglomerados aeronáuticos, entre as quais a própria North American Aircraft. O impacto foi tão significativo que forçou a empresa a reavaliar completamente sua estratégia de atuação. Aproveitando a reputação acumulada no setor e sua rede de relacionamentos, a North American iniciou então uma nova etapa de sua trajetória, agora direcionada para a produção direta de aeronaves e componentes. Foi nesse contexto de reestruturação que James H. “Dutch” Kindelberger assumiu a liderança da companhia. Oriundo da Douglas Aircraft Company, Kindelberger trazia consigo vasta experiência em engenharia, organização industrial e gestão de programas aeronáuticos, além de contar com suporte financeiro proveniente de fundos ligados à Eastern Air Lines. Sua chegada marcaria profundamente o futuro da empresa. Em 1935, a General Motors Corporation adquiriu o controle acionário da North American Aviation — nome que passou a englobar a companhia — por meio de uma fusão com sua divisão aeronáutica, a General Aviation Manufacturing Corporation. Ainda naquele ano, buscando condições mais favoráveis para ensaios de voo e uma logística industrial mais eficiente, decidiu-se pela transferência da planta fabril de Dundalk, em Maryland, para Los Angeles. O clima ameno da Califórnia, que permitia operações de teste durante todo o ano, seria um fator estratégico para os projetos futuros. A partir dessa reorganização, a North American passou a concentrar seus esforços no desenvolvimento de aeronaves leves destinadas ao treinamento militar um nicho com menor concorrência e que oferecia oportunidades significativas à medida que o país começava a expandir suas capacidades aéreas em meio ao cenário internacional de crescente tensão pré-Segunda Guerra Mundial. Dessa orientação surgiram projetos fundamentais para a consolidação técnica da empresa, como o North American GA-16, voltado ao treinamento básico, e o GA-15, projetado para missões de observação e reconhecimento. Ambos os modelos derivavam de propostas originalmente elaboradas pela General Aviation Manufacturing Corporation e que, até então, permaneciam arquivadas. Retomados e aperfeiçoados sob a direção de Kindelberger, os protótipos realizaram seus primeiros voos em janeiro de 1935, sendo posteriormente submetidos a extensos programas de ensaios que culminaram em sua homologação ainda no mesmo ano. O desenvolvimento desses primeiros modelos seria o ponto de partida para a ascensão da North American como um dos mais importantes fornecedores de aeronaves militares das Forças Armadas dos Estados Unidos. Era apenas o início de uma trajetória que, nos anos seguintes, daria origem a ícones como o BT-9, o T-6 Texan, o B-25 Mitchell e, mais tarde, o lendário P-51 Mustang.
Após sua apresentação oficial, o North American GA-16 recebeu a designação militar “NA-18”, dando início a um rigoroso ciclo de ensaios em voo conduzido pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC). A instituição buscava, à época, modernizar sua frota de aeronaves de instrução, substituindo os modelos biplanos ainda em uso por um treinador monoplano mais alinhado às demandas da aviação militar em transformação. O NA-18 representava justamente essa transição. Construído com estrutura metálica revestida em tela aeronáutica e dotado de trem de pouso fixo, o modelo incorporava avanços importantes para sua categoria. Era impulsionado pelo confiável motor radial Wright R-975, capaz de desenvolver 400 hp, o que lhe conferia desempenho adequado às necessidades básicas de instrução. Contudo, os ensaios iniciais evidenciaram a necessidade de aperfeiçoamentos, resultando na reformulação do projeto e na criação da versão NA-19, posteriormente adotada oficialmente como BT-9 Advanced Trainer. Em outubro de 1935, o Exército dos Estados Unidos firmou o primeiro contrato de produção, encomendando quarenta e duas células, com entregas previstas para o início do ano seguinte. Pouco depois, um segundo lote foi contratado para a nova variante BT-9A, equipada com duas metralhadoras calibre .30 — uma instalada na asa direita e outra sincronizada com a hélice sob o capô — refletindo a crescente preocupação em treinar pilotos para o emprego de armamento aéreo. Ambos os lotes foram encaminhados aos principais centros de formação do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC)., onde passaram a integrar o currículo de instrução básica e avançada. O programa avançou rapidamente. O modelo BT-9B, que somou cento e dezessete unidades, foi seguido pelo BT-9C, com noventa e sete aeronaves que incorporavam melhorias significativas nos sistemas elétricos e de navegação. A experiência acumulada pelos instrutores e pelos próprios alunos consolidou a reputação do novo treinador, despertando o interesse da Aviação Naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy). A partir de negociações específicas, foi desenvolvida uma versão adaptada às necessidades navais. Seu protótipo, que voou pela primeira vez em maio de 1936, demonstrou desempenho satisfatório, resultando na encomenda de quarenta unidades designadas North American NJ-1. Apesar do sucesso obtido, tornava-se claro que a rápida evolução da aviação militar colocaria aqueles modelos em breve obsolescência. Aeronaves de combate emergiam com estruturas totalmente metálicas, trem de pouso retrátil e velocidades cada vez maiores. Para preparar seus futuros pilotos adequadamente, o USAAC reconhecia a necessidade de um treinador mais moderno, cuja performance se aproximasse das aeronaves de caça em desenvolvimento. Assim, estabeleceu-se o requisito de um sucessor dotado de superfícies metálicas e sistemas retráteis, abandonando definitivamente o tradicional revestimento em tela aeronáutica. Esse movimento marcaria o início de uma nova fase na história da North American Aviation, que ao longo dos anos seguintes consolidaria sua posição como um dos principais fabricantes de aviões militares dos Estados Unidos.
Diferentemente do processo anterior, o novo projeto evoluiu em meio a um ambiente internacional crescentemente instável. O agravamento das tensões políticas na Europa, que já prenunciava a possibilidade de uma corrida armamentista e de um conflito em larga escala, levou o governo dos Estados Unidos a adotar um ambicioso programa emergencial de rearmamento. Nesse cenário, o Corpo Aéreo do Exército (USAAC) lançou a concorrência oficialmente denominada USAAC Basic Combat (Treinador Combate Básico) um processo que atraiu amplo interesse da indústria aeronáutica, resultando na apresentação de mais de uma dezena de propostas. Entre elas, destacou-se a da North American Aviation, que submeteu à avaliação o projeto NA-26, uma evolução direta da aeronave NA-19 BT-9. Embora mantivesse a essência estrutural do treinador anterior, o NA-26 incorporava um conjunto de melhorias substanciais: fuselagem ampliada, asas redesenhadas, revestimento metálico integral em alumínio e a inclusão de trem de pouso retrátil, características que refletiam o avanço tecnológico característico da segunda metade da década de 1930. O modelo também recebeu novos sistemas de navegação e comunicação, além de ser equipado com o motor radial Pratt & Whitney R-985-25 Wasp Jr., capaz de desenvolver 450 hp, garantindo desempenho superior ao de seus predecessores. Após uma fase criteriosa de análises comparativas e ensaios em voo, o projeto da North American Aviation foi declarado vencedor da concorrência. Em abril de 1938, formalizou-se o contrato que previa a produção inicial de 251 aeronaves para o Corpo Aéreo do Exército (USAAC), das quais 36 seriam configuradas especificamente para instrução em voo por instrumentos. A nova aeronave recebeu a designação militar BC-1 (Basic Combat), e suas primeiras unidades foram entregues às escolas de formação de pilotos militares a partir de setembro do mesmo ano. O desempenho demonstrado pelo BC-1 rapidamente chamou atenção. Sua combinação de robustez estrutural, comandos harmoniosos e características de voo compatíveis com as exigências do treinamento avançado de combate tornou-o uma plataforma ideal para preparar pilotos destinados às futuras aeronaves de caça. Tais qualidades despertaram o interesse do Ministério do Ar Britânico, que, diante da iminente eclosão de um conflito europeu, conduzia um programa emergencial de reequipamento da Royal Air Force (RAF). Como resultado, foi firmado um pedido de exportação de 400 aeronaves, que receberam na Grã-Bretanha a designação Harvard Mk I. Pouco depois, a Marinha dos Estados Unidos (US Navy) também decidiu incorporar a nova plataforma de treinamento, adquirindo dezesseis unidades adaptadas para operações navais, designadas SNJ-1. Com isso, o BC-1 consolidou-se como um treinador militar de destaque internacional e estabeleceu as bases para aquela que se tornaria uma das mais bem-sucedidas famílias de aeronaves de instrução da história: a linhagem que culminaria no lendário North American T-6 Texan. A evolução do treinador da North American Aviation avançou significativamente com o surgimento da variante NA BC-1A, que incorporava os aprimoramentos introduzidos no SNJ-1, consolidando-se como a plataforma que daria origem à célebre família T-6. Este modelo marcou um ponto de maturidade técnica no programa, ao reunir melhorias de desempenho, refinamentos estruturais e atualizações operacionais demandadas durante a segunda metade da década de 1930 um período em que as forças armadas norte-americanas buscavam modernizar seus meios de instrução aeronáutica diante de um cenário internacional cada vez mais tenso. O Exército dos Estados Unidos (US Army) foi o primeiro a reconhecer o potencial da aeronave, firmando contrato para o fornecimento de 177 unidades do BC-1A. Pouco tempo depois, a Aviação Naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) aderiu ao programa, adquirindo 61 aeronaves, oficialmente designadas SNJ-2. Em paralelo, versões destinadas ao mercado externo foram desenvolvidas para atender as necessidades de treinamento da Força Aérea Real (RAF) e da Real Força Aérea Canadense (RCAF), recebendo a designação Harvard Mk. II. Ao todo, 1.173 exemplares foram empregados por forças britânicas, operando principalmente no Canadá e na Rodésia, no âmbito do ambicioso Empire Air Training Scheme, iniciativa que formou dezenas de milhares de tripulantes aliados às vésperas da Segunda Guerra Mundial. Nesse mesmo período, o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) promovia uma profunda reorganização institucional e doutrinária. Entre as áreas reformuladas, destacava-se o sistema de formação de pilotos militares um processo que passava a ser gradualmente padronizado e centralizado para atender à crescente demanda por aviadores. Como parte dessa reestruturação, a tradicional etapa de instrução conhecida como Basic Combat foi redefinida e renomeada como Advanced Trainer, refletindo melhor o nível de complexidade e as habilidades exigidas dos cadetes. Em decorrência dessas mudanças administrativas e curriculares, as aeronaves BC-1A passaram a ser oficialmente classificadas como AT-6, inaugurando uma nomenclatura que marcaria época. A difusão internacional do projeto também produziu desdobramentos notáveis. Na Austrália, a Commonwealth Aircraft Corporation fabricou sob licença uma variante local, batizada Wirraway. Embora concebida primariamente como aeronave de treinamento e cooperação geral, o Wirraway entrou em combate em situações emergenciais. Em um episódio singular registrado em 26 de dezembro de 1942, sobre a Nova Guiné, um Wirraway conseguiu abater um caça japonês — oficialmente identificado como um Mitsubishi A6M Zero, embora algumas versões sugiram tratar-se de um Kawasaki Ki-43 Oscar. Tal feito conferiu ao modelo o raro destaque de ser o único derivado da família de treinadores norte-americanos a obter uma vitória aérea confirmada. A evolução técnica prosseguiu com o desenvolvimento do AT-6A, designado SNJ-3 quando destinado à Marinha dos Estados Unidos. Entre suas melhorias constavam o novo leme de contorno triangular substituindo o tradicional formato arredondado e pontas de asas redesenhadas com extremidades retas, conferindo maior estabilidade e refinamento aerodinâmico. Equipado com o robusto motor radial Pratt & Whitney R-1340-49 Wasp, o modelo também podia receber armamento leve, consistindo em duas metralhadoras calibre .30 polegadas, uma fixa no lado direito da capota do motor e outra móvel na cabine traseira, ampliando sua utilidade como treinador avançado de combate. A produção alcançou números expressivos: 1.549 unidades do AT-6A e 270 exemplares do SNJ-3 foram entregues nos Estados Unidos. No Canadá, a Noorduyn Aviation fabricou sob licença 1.500 aeronaves AT-16 para as forças armadas americanas e outras 2.485 unidades Harvard Mk. IIB destinadas à RAF, consolidando a família como um dos mais difundidos e influentes treinadores militares do século XX.
Embora concebido essencialmente como treinador avançado, destinado à formação de pilotos militares nas fases mais complexas do currículo de voo, o North American AT-6, em suas diversas derivações, acabou por desempenhar papéis operacionais durante a Segunda Guerra Mundial. O episódio mais célebre e historicamente reconhecido ocorreu em 26 de dezembro de 1942, na região montanhosa da Nova Guiné, quando um CAC Wirraway versão australiana produzida sob licença do AT-6 alcançou aquela que seria considerada a primeira, e virtualmente única, vitória aérea obtida por um derivado direto da família T-6. O Wirraway, pilotado pelo Suboficial John S. “Jack” Archer, do Esquadrão Nº 4 da Royal Australian Air Force (RAAF), encontrava-se em missão de reconhecimento armado quando foi subitamente surpreendido por uma aeronave japonesa. O inimigo, tradicionalmente identificado como um Mitsubishi A6M Zero, realizava patrulha sobre posições aliadas. Embora algumas fontes posteriores sugiram que a aeronave abatida poderia ter sido um Kawasaki Ki-43 Oscar, o feito permanece indiscutível como a única vitória aérea confirmada obtida por um treinador derivado do AT-6/T-6 em combate real. Contudo, esse episódio não representa um emprego isolado. Durante os períodos iniciais da guerra no Pacífico especialmente nos ataques japoneses contra bases aliadas nas Filipinas, Malásia e Indonésia aeronaves de treinamento avançado, incluindo variantes do T-6, foram utilizadas improvisadamente em tarefas de observação, ligação, evacuação e até ações de ataque leve, em um esforço desesperado para compensar a escassez de aeronaves de primeira linha. A variante AT-6B foi equipada com o motor radial Pratt & Whitney R-1340-AN-1, estabelecido como padrão para as versões posteriores. Destinada principalmente ao treinamento de metralhadores, esta versão possuía o assento traseiro configurado em posição invertida, voltado para trás. A produção majoritária ocorreu nas instalações da North American Aviation em Dallas, Texas, o que conferiu à série o nome “Texan”. A versão AT-6C, também designada SNJ-4 para a Aviação Naval dos Estados Unidos e Harvard Mk. IIA para a Força Aérea Real (RAF), representou um marco na produção em larga escala. Foram fabricadas 2.970 unidades do AT-6C, 2.400 do SNJ-4 e 726 do Harvard Mk. IIA. Uma subvariante, a SNJ-4C, com 85 unidades produzidas, foi equipada com um gancho de parada, possibilitando operações em porta-aviões. A variante AT-6D, correspondente à SNJ-5 para a Marinha americana e Harvard Mk. III para as forças britânicas, introduziu melhorias significativas no sistema elétrico. A produção totalizou 3.713 unidades do AT-6D, 1.357 do SNJ-5 e 915 do Harvard Mk. III. Similarmente à SNJ-4C, a subvariante SNJ-5C, com 80 unidades fabricadas, foi adaptada para uso em porta-aviões. Já a variante AT-6F, também conhecida como SNJ-6, eliminou as provisões para armamento, reforçando sua função exclusiva de treinamento. A hélice desta versão incluía um cubo, frequentemente removido em serviço devido a complicações de manutenção. Na década de 1950, a empresa canadense Canada Car and Foundry desenvolveu a variante Harvard 4, designada T-6J. Esta versão foi amplamente empregada por forças aéreas de nações como Canadá, França, Itália, Bélgica e Alemanha, consolidando a versatilidade da plataforma T-6.Emprego na Força Aérea Brasileira.
No início da Segunda Guerra Mundial, o governo dos Estados Unidos passou a encarar com crescente apreensão a possibilidade de uma incursão militar das potências do Eixo Alemanha, Itália e Japão contra o continente americano. Essa preocupação adquiriu contornos ainda mais graves após a capitulação da França, em junho de 1940, evento que alterou profundamente o equilíbrio estratégico no Atlântico. A partir desse momento, a Alemanha nazista passou a dispor da potencialidade de estabelecer bases operacionais em territórios até então sob domínio francês, como as Ilhas Canárias, Dacar e outras possessões coloniais, criando condições favoráveis para uma projeção de poder em direção às Américas. Nesse novo cenário geopolítico, o Brasil passou a ser identificado pelos estrategistas norte-americanos como um dos pontos mais vulneráveis e, ao mesmo tempo, mais relevantes para uma eventual ofensiva inimiga. Sua posição geográfica, particularmente a proximidade do Nordeste brasileiro em relação à costa africana, conferia-lhe importância singular no contexto de uma guerra de alcance global, sobretudo considerando que o continente africano também figurava entre os objetivos estratégicos do expansionismo alemão. Paralelamente, o avanço japonês no Sudeste Asiático e no Pacífico Sul comprometeu severamente o acesso dos Aliados às tradicionais fontes de látex, elevando o Brasil à condição de principal fornecedor dessa matéria-prima essencial para a produção de borracha, insumo crítico para a indústria bélica, especialmente na fabricação de pneus, vedações e componentes militares. Além das ameaças diretas e indiretas, a configuração geográfica do litoral brasileiro apresentava vantagens estratégicas decisivas para o esforço de guerra aliado. A região Nordeste, em especial a cidade de Recife, destacava-se como o ponto de menor distância entre os continentes americano e africano, tornando-se local ideal para a instalação de bases aéreas e portos militares. A partir dessas estruturas, seria possível estabelecer uma ponte logística para o deslocamento de tropas, suprimentos e aeronaves destinados aos teatros de operações europeu e norte-africano, fortalecendo de forma significativa a capacidade operacional dos Aliados. Diante desse quadro, consolidou-se, em curto espaço de tempo, um processo de aproximação política, econômica e militar entre o Brasil e os Estados Unidos. Essa convergência resultou em investimentos estratégicos e na celebração de acordos de cooperação bilateral, entre os quais se destacou a adesão brasileira ao programa de assistência militar conhecido como Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos). O acordo assegurou ao Brasil uma linha inicial de crédito da ordem de US$ 100 milhões, destinada à aquisição de material bélico moderno, incluindo aeronaves, armamentos, veículos blindados e carros de combate. Esses recursos mostraram-se fundamentais para que o país pudesse responder de maneira mais eficaz às ameaças representadas pelos ataques de submarinos alemães e italianos, que colocavam em risco a navegação mercante ao longo da costa brasileira e afetavam diretamente o fluxo de matérias-primas estratégicas destinadas à indústria de guerra norte-americana. Nesse contexto, o programa de reequipamento da recém-criada Força Aérea Brasileira (FAB), instituída oficialmente em 1941, revelou-se de importância capital para a adequação de suas capacidades operacionais e doutrinárias às exigências impostas pelo conflito.
Até então, a Aeronáutica havia herdado da Aviação Militar do Exército Brasileiro e da Aviação Naval da Marinha do Brasil uma frota composta, em sua maioria, por aeronaves já obsoletas, inadequadas para enfrentar ameaças modernas, em especial a guerra submarina conduzida por unidades italianas e alemãs no litoral nacional. Àquela altura, os meios mais avançados disponíveis à FAB restringiam-se a um número reduzido de aeronaves North American NA BT-13 e NA-72, complementadas pelos antiquados biplanos Vought V-65B Corsair, cujas limitações técnicas evidenciavam a urgência de uma profunda modernização da aviação militar brasileira. Essas aeronaves, embora empregadas em missões de presença e patrulha costeira, revelavam limitações expressivas quando submetidas às exigências de operações eficazes contra ameaças navais inimigas. Tal realidade evidenciou, de forma inequívoca, a necessidade urgente de modernização da frota da Aeronáutica, com o objetivo de ampliar sua capacidade operacional e adequá-la aos desafios impostos pelo conflito em curso. A partir do final de 1941, essa demanda começou a ser gradualmente atendida por meio do programa de assistência militar promovido pelos Estados Unidos, no âmbito dos acordos de cooperação firmados entre os dois países. Nesse contexto, foram transferidas as primeiras aeronaves destinadas à Força Aérea Brasileira (FAB), entre as quais se destacaram dez unidades do North American AT-6B Texan. Inicialmente registradas sob as matrículas FAB 01 a FAB 10, essas aeronaves foram posteriormente redesignadas como FAB 1223 a FAB 1342, de acordo com a padronização adotada pela FAB. Após o recebimento do material e a capacitação das tripulações brasileiras, os AT-6B foram alocados à Base Aérea de Fortaleza, onde passaram a integrar o Agrupamento de Aviões de Adaptação (AAA). O AAA, operando sob a supervisão direta de militares do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), desempenhou papel central na etapa final da formação dos pilotos brasileiros. Os aviadores, que haviam concluído a fase de instrução básica em aeronaves Fairchild PT-19, eram então submetidos a um programa avançado de treinamento, conduzido por instrutores norte-americanos. Esse programa contemplava a assimilação de táticas e doutrinas de combate aéreo modernas, com ênfase particular na guerra aeronaval, considerada prioritária diante da crescente atividade de submarinos alemães e italianos no Atlântico Sul, responsáveis por ataques sistemáticos a comboios de navios mercantes em rota para os Estados Unidos. Entretanto, a intensificação dessas ações inimigas, aliada aos atrasos na entrega de aeronaves especificamente projetadas para missões de patrulha marítima e guerra antissubmarino (ASW), impôs ao Agrupamento de Aviões de Adaptação a necessidade de adaptar suas operações. Nesse cenário emergencial, os AT-6B Texan, originalmente concebidos para o treinamento avançado, foram temporariamente desviados de sua função principal e empregados como plataformas de patrulha e apoio, suprindo, ainda que de forma limitada, a carência de meios especializados. Assim, essas aeronaves passaram a cumprir missões operacionais ao longo do litoral brasileiro, contribuindo para a vigilância costeira e para a dissuasão de ameaças submarinas. A partir de janeiro de 1943, iniciou-se o recebimento de novas unidades da família AT-6, agora nas versões modernizadas AT-6C e AT-6D. A incorporação dessas aeronaves, intensificada a partir do mês seguinte, possibilitou uma significativa reorganização estrutural e operacional no âmbito do comando da FAB.

A distribuição dos AT-6 foi ampliada, passando a contemplar não apenas as bases do Norte e Nordeste, mas também unidades localizadas nas regiões Sul e Sudeste do país. Nesse novo arranjo, as aeronaves AT-6B, AT-6C e NA-72 passaram a equipar o Grupamento do Curso de Formação de Oficiais da Reserva (CPOR), sediado na Base Aérea do Galeão, no Rio de Janeiro. Nessa unidade, os AT-6 desempenharam papel fundamental no treinamento avançado e na conversão de pilotos destinados à operação dos caças-bombardeiros Curtiss P-40 Warhawk, que à época constituíam o principal vetor de defesa aérea do Brasil. Até novembro de 1943, a FAB havia recebido um total de setenta aeronaves da versão AT-6C, registradas sob as matrículas FAB 1233 a FAB 1302, consolidando definitivamente o AT-6 como a espinha dorsal da formação avançada de pilotos militares brasileiros durante o conflito. Entre o final de 1944 e o ano de 1945, a Força Aérea Brasileira (FAB) recebeu um total de quarenta e cinco unidades do North American AT-6D, reforçando de maneira significativa sua frota destinada à instrução avançada de pilotos militares. Grande parte dessas aeronaves foi destinada aos Cursos de Formação de Oficiais da Reserva (CPOR), sediados na Base Aérea de Cumbica, em Guarulhos, no estado de São Paulo, com o propósito de ampliar e consolidar a capacitação de novos aviadores em um período ainda marcado pelas exigências operacionais da guerra. Com o término do conflito, encontravam-se disponíveis aproximadamente cento e vinte aeronaves da família AT-6 em condições operacionais. Todavia, a maioria dessas células apresentava elevado grau de desgaste estrutural, consequência direta da intensa utilização ao longo dos anos de guerra. Tal situação passou a representar um risco concreto para a continuidade e a segurança do processo de formação de pilotos militares brasileiros no médio prazo. Paralelamente, a crescente demanda por instrução aérea evidenciava a necessidade de ampliar e recompor a frota dedicada a essa atividade essencial. Diante desse cenário, o Ministério da Aeronáutica (MAer) adotou, entre 1946 e 1951, um conjunto de medidas estratégicas voltadas à manutenção e à expansão da capacidade de treinamento. A primeira delas consistiu na produção sob licença de oitenta e uma aeronaves na Fábrica de Aviões de Lagoa Santa, em Minas Gerais, representando um passo relevante para o fortalecimento da indústria aeronáutica nacional. Em paralelo, o Brasil recorreu à aquisição de células usadas, porém em bom estado de conservação, por meio do American Republics Project (ARP), programa norte-americano destinado à transferência de material aeronáutico para países aliados do hemisfério ocidental. Por fim, em 1951, foi implementado um programa de revitalização e modernização de vinte e oito aeronaves dos modelos AT-6B e AT-6C, que passaram a ser atualizadas ao padrão T-6G, com os trabalhos conduzidos nas instalações do Parque de Material Aeronáutico de Lagoa Santa (PAMA-LS). Já em meados da década de 1960, a Força Aérea Brasileira (FAB) mantinha em seu sistema de instrução uma combinação de aeronaves Fokker T-21 e North American T-6, cabendo aos primeiros a formação básica e aos segundos o estágio avançado do treinamento. Contudo, tornava-se cada vez mais evidente o envelhecimento e a progressiva obsolescência desse conjunto de aeronaves, o que impunha, a médio prazo, a necessidade de sua substituição por vetores mais modernos e compatíveis com as novas exigências operacionais e doutrinárias.
Nesse contexto, em 1966, foi definida a aquisição do Aerotec T-23 Uirapuru, de fabricação nacional, para atender às demandas do treinamento básico. Para o estágio avançado, a opção recaiu sobre os então modernos jatos Cessna T-37C, cujas primeiras unidades começaram a ser recebidas a partir de 1967 pelo Destacamento Precursor da Academia da Força Aérea (DPEAer), sediado em Pirassununga, no interior do estado de São Paulo. Durante um breve período de transição, os T-37C operaram em conjunto com os últimos North American T-6D e T-6G ainda em serviço. No ano seguinte, o T-6 foi finalmente retirado das atividades regulares de instrução de voo. As aeronaves remanescentes passaram por revisões e foram redistribuídas para diversas bases aéreas do país, onde continuaram a operar em funções administrativas, de ligação e orgânicas. Contudo, esse afastamento da instrução não representaria o encerramento definitivo da trajetória operacional dessas robustas e consagradas aeronaves no Brasil. Após os acontecimentos políticos de 31 de março de 1964, a Força Aérea Brasileira (FAB) passou a reavaliar seus conceitos operacionais e a buscar meios adequados para o cumprimento de missões relacionadas à segurança interna e à manutenção da ordem, em consonância com as diretrizes do novo governo. Nesse contexto, identificou-se a necessidade de dispor de capacidades aéreas voltadas ao reconhecimento, à presença dissuasória e ao eventual emprego armado em regiões remotas do território nacional, onde se registravam atividades consideradas potencialmente hostis ao regime então estabelecido. Áreas do interior do país, como Xambioá, no então norte de Goiás (atual Tocantins), Marabá, no Pará, e Registro, no interior de São Paulo, passaram a ser observadas com atenção estratégica, por sua geografia favorável à atuação de grupos irregulares e pela limitada presença do Estado. Diante desse cenário, ainda em 1964, a FAB instituiu as Esquadrilhas de Reconhecimento e Ataque (ERA), inicialmente designadas ERA 10, ERA 20 e ERA 30, sediadas, respectivamente, nas Bases Aéreas de Santa Cruz (RJ), São Paulo (SP) e Canoas (RS). Essas unidades foram estabelecidas de maneira não formalizada nos moldes tradicionais, valendo-se de aeronaves North American T-6 provenientes das Esquadrilhas de Adestramento existentes nessas bases. Tal iniciativa apoiava-se na experiência anteriormente adquirida, especialmente nas Bases Aéreas de Natal e Canoas, onde já haviam sido realizados ensaios e adaptações para o emprego do T-6 em missões armadas, incluindo a instalação de metralhadoras de calibre .30 polegadas e o emprego de bombas de uso geral. Além da formação específica dos pilotos designados para essas missões, as aeronaves passaram a ser empregadas de forma intensiva em uma ampla gama de operações, que incluíam repressão ao contrabando, patrulhamento de fronteiras, reconhecimento visual e fotográfico, monitoramento de pistas de pouso clandestinas, operações de erradicação de plantações ilícitas, patrulhamento rural para prevenção de crimes, bem como ações de contraguerrilha, destacando-se as operações conduzidas na Serra do Caparaó. Ao longo desse período, os T-6 foram operados por diversas esquadrilhas, entre as quais se destacaram a ERA 21 – Gerimun, ERA 31 – Águia, ERA 32 – Carcará, ERA 41 – Vampiros, ERA 42 – Caracará, ERA 51 – Falcão e ERA 61 – Gorila. Essas unidades atuaram de forma integrada em diferentes regiões do país.

Um dos episódios dessa atuação conjunta foi a “Operação Xavante”, realizada entre 1º e 10 de dezembro de 1967, no então Estado de Mato Grosso. A operação abrangeu a região compreendida entre Campo Grande, Corumbá, Aquidauana e Forte Coimbra, contando com a participação coordenada de meios das forças armadas, em uma ação de caráter interforças voltada ao reconhecimento e ao controle territorial. Em 1970, as ERA´s foram formalmente reorganizadas e elevadas à condição de Esquadrões de Reconhecimento e Ataque, absorvendo o efetivo humano e o material das unidades precursoras. Nessa nova estrutura, os esquadrões mantiveram como principal vetor os T-6, aos quais coube a missão de formar os pilotos operacionais. Esse processo envolvia não apenas a transição operacional para o T-6 uma vez que os aviadores egressos da Academia já realizavam sua formação inicial em aeronaves a jato T-37C mas também a capacitação no emprego do T-6 como aeronave de combate. As instruções contemplavam técnicas de bombardeio em picado, bombardeio nivelado e em voo rasante, lançamento de foguetes e emprego de metralhadoras. Os Esquadrões de Reconhecimento e Ataque (ERA) eram caracterizados por sua capacidade de operar em quaisquer pontos do território nacional. Um exemplo significativo de sua atuação foi a participação do 1º ERA, juntamente com o 2º ERA, na Operação “PAPAGAIO”. Esta operação foi realizada nas cidades de Marabá e Xambioá, ambas localizadas no Estado do Pará, entre os dias 18 de setembro e 8 de outubro de 1972. O objetivo da operação consistiu no emprego efetivo das aeronaves dos 1º e 2º ERA contra forças guerrilheiras do Partido Comunista do Brasil que buscavam estabelecer um país comunista independente vinculado à União Soviética. A operação contou ainda com a participação de outras unidades, além de forças do Exército Brasileiro e da Marinha do Brasil. As aeronaves dos ERA´s executaram missões reais de bombardeio, reconhecimento e ataque, culminando com a total derrocada e aniquilação do movimento guerrilheiro. Os esquadrões 1º ERA – Falcão, 2º ERA – Fênix e 3º ERA – Águia eram equipados com aeronaves North American T-6. Em 1972, essa organização evoluiu para a formação dos Esquadrões Mistos de Reconhecimento e Ataque (EMRA), que integravam tanto aeronaves quanto pessoal dos esquadrões de reconhecimento e ataque (ERA), esquadrilhas de ligação e observação, além de alguns Grupos de Aviação (GAv). A missão desses novos esquadrões consistia na realização de operações específicas de cooperação para a manutenção da segurança interna, utilizando tanto aviões quanto helicópteros, da qual deriva a designação “Misto”. Essas unidades operavam conjuntamente com aeronaves North American T-6D/G, Cessna L-19A/E Bird Dog e helicópteros Bell UH-1D Huey e Bell OH-4 Jet Ranger. Os esquadrões 1º EMRA – Falcão, 2º EMRA – Poti, 3º EMRA – Águia, 4º EMRA – Dragão e 5º EMRA – Pantera se tornaram as últimas unidades aéreas a operar a versão armada dos T-6D/G. Apesar de sua robustez e confiabilidade, evidenciava-se que o veterano T-6 já estava completamente superado, motivo pelo qual o planejamento do Ministério da Aeronáutica (MAer) previu sua substituição total até o ano de 1975. A nova frota contemplaria o jato AT-26 para missões de ataque e o monomotor AT-25 para tarefas de observação. Assim, em 22 de agosto de 1973, iniciou-se um processo gradual de desativação das aeronaves, o qual foi dividido em quatro fases distintas, programadas para ocorrer entre 1º de outubro de 1973 e 31 de dezembro de 1975. Esse cronograma foi cumprido, e, à medida que as células atingiam o término de suas revisões, eram automaticamente desativadas, passando a ser armazenadas no Parque da Aeronáutica de Lagoa Santa para aguardar seu destino.
Em Escala.
Para representarmos o North American AT-6D " FAB 1665" quando em uso pela esquadrilha ERA 31 – Águia, empregamos o kit embalado pela HTC Modelismo que foi fabricado pela Academy na escala 1/48, modelo que apresenta bom nível de injeção e baixo relevo, apenas adicionamos ao modelo os cabides e as bombas de 50 kg oriundos de outros modelos . Fizemos uso de decais confeccionados pela FCM Decais originais do modelo.
O padrão de pintura descrito a seguir refere-se a uma das configurações utilizadas durante a operação da aeronave T-6 como aeronave de ataque. Um aspecto notável relacionado aos AT-6 destinados às unidades de Reconhecimento e Ataque é a sua camuflagem, oficialmente especificada pela Ordem Técnica do Ministério da Aeronáutica (OTMA). Essa norma determinava o uso de dois tons de verde nas superfícies superiores da aeronave e cinza nas superfícies inferiores, conforme ilustrado no diagrama correspondente. Contudo, destaca-se que, apesar de nunca ter sido autorizada uma camuflagem com tons de verde e terra nas superfícies superiores, todas as Esquadrilhas de Reconhecimento e Ataque, com exceção de uma, adotaram essa configuração, desviando-se do padrão estabelecido pela OTMA.
Bibliografia :
Revista ASAS nº 60 " North American T-6 na FAB ( 1942 - 1963 ) - Aparecido Camazano Alamino
Revista ASAS nº 61 " North American T-6 na FAB ( 1964 - 1976 ) - Aparecido Camazano Alamino
Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015 – Jackson Flores
História da Força Aérea Brasileria , Prof Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html





