Embraer AMX A-1A Falcão

História e Desenvolvimento.
A Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A (Embraer), constituída como uma estatal de capital misto em 19 de agosto de 1969, foi exigida com a missão de realizar a produção em série das primeiras aeronaves de transporte transportadas no Brasil: o Embraer EMB-110, em sua versão civil comercial, e o modelo militar C-95 Bandeirante. A primeira unidade de produção em série, registrada sob a matrícula FAB 2133, foi entregue à Força Aérea Brasileira (FAB) em 9 de fevereiro de 1973. Além de atender a uma significativa demanda militar, as versões civis do EMB-110, destinadas ao transporte regional, alcançaram expressiva notoriedade internacional ao conquistar numerosos contratos de exportação, suprindo as necessidades de dezenas de empresas de transporte aéreo. Esse sucesso comercial, aliado à sólida confiança corporativa da Embraer, levou sua diretoria a considerar a possibilidade de estabelecer negociações com empresas estrangeiras, evoluir para a viabilização de pesquisas conjuntas e para uma eventual transferência de tecnologia. O primeiro acordo prático nesse sentido foi concretizado no início da década de 1970, por meio de um contrato com a empresa italiana Aeronautica Macchi SpA. Esse acordo prévio a fabricação sob licença, no Brasil, de mais de cem unidades do avançado treinador Aermacchi MB-326GB. Embora não envolva transferência de tecnologia, a produção local desse modelo, redesenhado como Embraer AT-26 Xavante, proporcionou à Embraer o domínio de processos e conceitos relacionados à produção de aeronaves em jato de alto desempenho, estabelecendo as bases para avanços subsequentes em sua capacidade produtiva. Com o progresso bem sucedido da implementação do AT-26 Xavante na Força Aérea Brasileira (FAB), a diretoria da Embraer S/A passou a explorar novos nichos de mercado. Entre as propostas, destacou-se o desenvolvimento de uma versão monoplace do treinador, especializada em missões de ataque ao solo. Esse conceito, designado internamente como Programa "AX", foi compartilhado com o projetista-chefe Ermanno Bazzocchi, da Aeronáutica Macchi, que o considera operacionalmente viável. Assim, surgiu o projeto da primeira aeronave "ítalo-brasileira", provisoriamente chamada de Embraer EMB-330. Apesar de sua potencial promessa, a proposta não conseguiu conquistar o apoio do Ministério da Aeronáutica (MAer), que emitiu um parecer crítico sobre as capacidades da aeronave. Diante dessa infecção, a equipe de projetos prosseguiu com estudos para aprimorar o EMB-330, desenvolvendo novas variantes. Contudo, essas iniciativas não avançaram além da fase de concepção da aeronave, resultando na suspensão definitiva do programa.

O espírito de cooperação tecnológica e industrial entre Brasil e Itália foi retomado em 1978, a partir de uma oportunidade surgida durante uma visita de uma comitiva de oficiais e comandantes da Força Aérea Brasileira à Itália. Na ocasião, a diretoria da Aeronáutica Macchi SpA apresentou ao grupo um requisito da Força Aérea Italiana (Aeronautica Militare Italiana – AMI) para o desenvolvimento de uma aeronave subsônica de ataque a jato. Esse novo modelo visava substituir o Fiat G.91Y/R e o caça Lockheed F-104G/S Starfighter, usado em missões de ataque ao solo, apoio aéreo aproximado e ataque naval. Ao analisar as especificações propostas, constatou-se que elas eram bastante semelhantes às critérios previamente estabelecidos pelo Ministério da Aeronáutica (MAer) para o projeto "AX". Essa convergência de parâmetros operacionais abriu caminho para o desenvolvimento conjunto de uma nova aeronave de ataque. A proposta foi aprovada pelo Ministério da Defesa Italiano, e, para sua execução, foi formalizada uma parceria entre as empresas Aeritalia Aeronautica e Aeronautica Macchi SpA. Essa colaboração distribuída as condições tecnológicas e industriais permite a criação da aeronave subsônica de ataque italiana, designada como "AMX" (onde "A" representa Aeritalia, "M" refere-se a Macchi e "X" indica seu caráter experimental). As negociações entre os governos brasileiro e italiano foram iniciadas, resultando na inclusão da Embraer S/A no consórcio, com a responsabilidade por um quarto do programa de desenvolvimento e dos investimentos correspondentes. A empresa brasileira coube o projeto e a fabricação dos frascos das asas e da empenagem, bem como a realização dos testes de fadiga desses componentes estruturais. As empresas italianas, por sua vez, ficaram sobrecarregadas dos dois terços restantes, abrangendo a produção da fuselagem, os sistemas de bordo e a condução de testes estáticos e com armamentos. Apesar desses entendimentos iniciais, o processo foi temporariamente suspenso para ajustes contratuais, burocráticos e processuais, que exigiram cerca de seis meses adicionais, adiando o cronograma originalmente previsto. Em maio de 1980, durante a Feira Aeronáutica Internacional de Farnborough, na Inglaterra, o Ministério da Aeronáutica (MAer) reafirmou publicamente seu compromisso com o programa. O contrato oficial foi finalmente assinado entre os dois países em 27 de março de 1981, consolidando a participação da Embraer no desenvolvimento do AMX.
Após ajustes contratuais, a participação da Embraer S/A no programa AMX foi elevada para 30%, enquanto as empresas italianas passaram a responder por 70%. Nesse novo arranjo, coube à empresa brasileira o desenvolvimento e a fabricação das asas, tomadas de ar do motor, estabilizadores horizontais, pilones subalares (suportes para armamentos) e tanques de combustível. Além disso, o Brasil se integra ao projeto de trem de pouso, dos sistemas de navegação e ataque, dos comandos de voo e do controle de armamentos. A Embraer S/A também ficou responsável pela construção de dois protótipos para ensaios em voo e um para testes de fadiga, os quais foram utilizados em um amplo programa de testes prolongados em território nacional. O caça bombardeiro tático Internacional AMX foi projetado como uma aeronave monomotor e monoposto, especializada em missões de ataque, com ênfase em robustez e confiabilidade para operar em condições de alta exposição em ambientes hostis. Equipado com uma gama avançada de sistemas de computação, navegação e ataque, além de contramedidas eletrônicas, o AMX incorpora inovações tecnológicas significativas para a época, como o sistema de comandos de voo "Augmentation System" e a configuração HOTAS (Hands On Throttle And Stick) para navegação e ataque. Sua capacidade de longo alcance operacional, ampliável por reabastecimento em voo, era compatível com as dimensões continentais do Brasil. A primeira maquete do projeto foi concluída em 1982, e a construção de quatro protótipos – dois em cada país participante – teve início quatro anos depois. O primeiro protótipo italiano realizou seu voo inaugural em 15 de maio de 1984, pilotado pelo comandante Mario Quarantelli, chefe de testes da Aeronáutica Aeritalia. Tragicamente, um acidente ocorreu no quinto voo, resultando na morte do piloto, que, embora tenha conseguido ejetar-se, não resistiu aos ferimentos. O programa foi retomado em novembro do mesmo ano com o segundo protótipo italiano. No Brasil, o primeiro protótipo, projetado YA-1 FAB 4200, decolou em 16 de outubro de 1985 nas instalações da Embraer em São José dos Campos, sob o comando do piloto de ensaios Luiz Fernando Cabral. O segundo protótipo brasileiro realizou seu voo inicial em 16 de dezembro de 1986. Posteriormente, foi desenvolvida uma variante biposto, projetada à conversão operacional de pilotos para essa aeronave.

Em 1986, a primeira célula de produção em série do AMX foi entregue à Força Aérea Italiana (Aeronautica Militare Italiana – AMI), passando o modelo a equipar, ao longo dos anos subsequentes, seis grupos de ataque (Gruppo/Stormo). De maneira geral, as versões italiana e brasileira do AMX compartilharam um projeto básico convencional, caracterizado por uma asa alta com enflechamento de 27,5º no bordo de ataque. O sistema de comando de voo era híbrido: leme, spoilers, flaps e estabilizadores eram acionados por um sistema digital assistido por computador Fly-By-Wire (FBW) de dois canais, enquanto os ailerons e profundores operavam por um sistema hidráulico mecânico tradicional. Essa combinação tinha como objetivo principal aumentar a capacidade de sobrevivência da aeronave em combate, permitindo que o piloto retornasse à base com segurança, utilizando as superfícies de comando hidráulico-mecânico, caso o sistema FBW estivesse danificado. A estrutura das células era predominantemente composta por alumínio, com uso de aço em peças específicas e materiais compostos de fibra plástica reforçados em painéis de acesso, na estrutura da cauda, ​​nos ailerons e no duto de ar da turbina. O AMX contava ainda com um conjunto avançado de HUD (Head-Up Display) integrado ao sistema HOTAS (Hands On Throttle And Stick), otimizando a interface entre piloto e aeronave. Ao todo, a produção do monoposto alcançou 150 unidades, sendo 110 destinadas à Força Aérea Italiana e 45 à Força Aérea Brasileira (FAB), entregues entre 1989 e 1999. As diferenças fundamentais foram incorporadas às versões de cada país, refletindo suas respectivas demandas operacionais. A variante italiana foi projetada para missões de ataque no perfil “Lo-Lo-Lo” (voo baixo contínuo sobre o campo de batalha), enfrentando as sofisticadas defesas antiaéreas soviéticas, com um raio de ação limitado a 335 km. Já a versão brasileira foi configurada para operar em um cenário de defesa aérea menos avançado, adotando o perfil “Hi-Lo-Hi” (voo alto até a proximidade do alvo, com voo baixo apenas na fase de ataque). Para atender a uma autonomia mínima de 965 km, a variante brasileira exigiria dois tanques de combustível subalares adicionais de 1.100 litros, o que, por sua vez, reduziria sua capacidade de carga bélica útil.
Houve curiosidades significativas no que diz respeito à eletrônica embarcada entre as versões italiana e brasileira do AMX, com sistemas dos aviões italianos sendo fornecidos em um nível superior para atender às exigências e padrões da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Nesse contexto, o armamento orgânico também variava: a variante italiana foi equipada com o canhão rotativo norte-americano Gatling Vulcan M-61A1 de 20 mm, enquanto a versão brasileira incorporava dois canhões DEFA 554 de 30 mm. Esse projeto internacional culminou no desenvolvimento de uma comissão de ataque de excelência, fato comprovado em 1999, quando esquadrões italianos realizaram 252 missões de combate sobre o Kosovo, durante a Operação Forças Aliadas, sem perdas de registro. Em 2011, três aeronaves baseadas em Trapani, na Sicília, acumularam 500 horas de voo em missões na Líbia, entre abril e outubro, o serviço das forças da OTAN. Além de representar um avanço tecnológico expressivo para a Força Aérea Brasileira (FAB), o projeto AMX A-1 proporcionou à Embraer S/A uma oportunidade singular de aquisição de tecnologias avançadas em produção aeronáutica para aeronaves de grande desempenho. Esse aprendizado viabilizou, anos mais tarde, a capacitação da empresa para o desenvolvimento de aeronaves modernas de alto desempenho e elevada complexidade estrutural. Entre as competências adquiridas, destaca-se o domínio de tecnologias críticas, como o sistema de comando digital assistido por computador (Fly-By-Wire – FBW), entre outras. Pode-se afirmar, portanto, que os exitosos jatos comerciais regionais da família Embraer – incluindo os modelos ERJ-145, ERJ-135, ERJ-170 e ERJ-190, reconhecidos por seu sucesso no mercado – têm sua origem tecnológica diretamente vinculada ao legado do programa AMX International.

Emprego na Força Aérea Brasileira.
A doutrina operacional da aviação de caça e ataque ao solo da Força Aérea Brasileira (FAB) foi inicialmente concebida e consolidada durante a campanha da Itália na Segunda Guerra Mundial. Nesse conflito, pilotos brasileiros, operando os robustos caças bombardeiros Republic P-47D Thunderbolt, realizaram mais de 2.546 surtidas de combate e ataque, estabelecendo as fundações de uma força de ataque moderna e eficaz. Nas décadas seguintes, essa tradição, forjada em combate, foi aprimorada com o uso de aeronaves adaptadas para missões de ataque, como as caças Gloster F-8 Meteor e os Lockheed AT-33. Contudo, a utilização de vetores não específicos para tais operações resultou em limitações que comprometeram os resultados operacionais. Os esforços do Ministério da Aeronáutica (MAer) para superar essas restrições culminaram no programa AMX, que se concretizou na introdução de aeronaves especializadas. Assim, no final da década de 1980, a incorporação de uma aeronave moderna projetada especificamente para missões de ataque ao solo gerou grandes expectativas junto os comandantes da  Força Aérea Brasileira (FAB). Para maximizar essa oportunidade, o Comando da Aeronáutica (COMAER) determinou a criação de uma nova unidade aérea de combate de primeira linha dedicada à operação do AMX. Esse processo resultou, em 22 de abril de 1988, na ativação do 1º/16º Grupo de Aviação (1º/16º GAv) – Esquadrão Adelphi, sediado na Base Aérea de Santa Cruz (BASC), no Rio de Janeiro. O nome de código “Adelphi” foi escolhido em homenagem aos veteranos do 1º Grupo de Aviação de Caça (1º GAvC) - Esquadrao Jambock, que perderam suas vidas em combate na Itália durante a Segunda Guerra Mundial. O Embraer Internacional AMX recebeu a designação oficial de A-1A na Força Aérea Brasileira (FAB) , e a célula operacional brasileira, registrada sob a matrícula FAB 5500, foi formalmente incorporada em 13 de outubro de 1989, durante uma cerimonia realizada no Rio de Janeiro. Na semana seguinte, teve início o programa de certificação operacional básica da nova aeronave, com este processo sendo concluído em julho de 1990, quando as operações aéreas foram finalmente iniciadas. A etapa subsequente envolveu um amplo programa de desenvolvimento de doutrina operacional e treinamento de pessoal envolvido, que se estendeu até agosto de 1990. Nesse momento, a unidade alcançou o status de plena operacionalidade, contando com pelo menos cinco aeronaves em atividade no 1º/16º GAv – Esquadrão Adelphi.

O 1º/16º Grupo de Aviação (1º/16º GAv) – Esquadrão Adelphi, recém-criado como esquadrão aerotático, tinha como missões prioritárias o ataque a alvos de superfície, a interdição do campo de batalha e o apoio aéreo aproximado, atuando em suporte às unidades de combate do Exército Brasileiro. Em caráter secundário, uma unidade também foi preparada para realizar bombardeios estratégicos. Com isso, a Força Aérea Brasileira (FAB) recuperou sua capacidade de ataque ao solo, perdida em meados da década de 1970 com a desativação dos últimos bimotores a projetar Douglas A-26B e A-26C Invader. Até então, essas tarefas eram desempenhadas de forma limitada por treinadores a jatos avançados adaptados para missões de ataque, como os norte-americanos Lockheed AT-33A, TF-33A e T-33A, seguidos posteriormente pelos Embraer AT-26 Xavante. O Embraer A-1A AMX destacou-se como a primeira aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) equipada com uma suíte completa de sistemas de autodefesa, tanto passivos quanto ativos, considerados de ponta para a época. Entre os recursos, incluía-se um sistema de alerta RWR (Radar Warning Receiver), que notificava os pilotos quando uma aeronave era rastreada por um radar hostil. Esse sistema operava em conjunto com lançadores de contramedidas chaff e flare, eficazes contra mísseis guiados por infravermelho ou radar, complementados por um pacote de contramedidas eletrônicas ativas (ECM – Active Electronic Counter Measures). Outra inovação do A-1A foi a presença de computadores de missão especializados para o lançamento de armamentos de ataque ao solo, utilizando os modos CCIP (Continuously Computed Impact Point – Ponto de Impacto Continuamente Computado) e CCRP (Continuously Computed Release Point – Ponto de Lançamento Continuamente Computado), otimizados para bombas não guiadas. Esse sistema conferia ao A-1A uma precisão significativamente superior em comparação aos caças-bombardeiros Northrop F-5E Tiger II e Embraer AT-26 Xavante. Adicionalmente, o Embraer A-1A apresentava uma baixa assinatura infravermelha e uma seção reduzida transversal ao radar, características que, aliadas aos sistemas eletrônicos de defesa passiva e ativa, asseguravam uma elevada capacidade de sobrevivência em ambientes hostis. Esses diferenciais consolidaram o modelo como um marco na modernização da capacidade de ataque ao solo da Força Aérea Brasileira (FAB).
A segunda unidade da Força Aérea Brasileira (FAB)  a incorporar o Embraer A-1A AMX foi o 3º/10º Grupo de Aviação (3º/10º GAv) – Esquadrão Centauro. Em 15 de janeiro de 1998, essa unidade recebeu suas duas primeiras células da versão monoposto. Assim como ocorreu com o 1º/16º Grupo de Aviação (1º/16º GAv), foi implementado um programa intensivo de introdução da aeronave, treinamento de tripulações e formação de equipes, culminando na declaração de operacionalidade da unidade no primeiro bimestre de 2000. Coube aos A-1A AMX do Esquadrão Centauro a realização da missão de maior duração já registrada por aeronaves de ataque da Força Aérea Brasileira (FAB) . Em maio de 2003, duas aeronaves decolaram da Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, e, com apenas três reabastecimentos em voo realizados pelo Boeing KC-137, sobrevoaram a região oeste do país, a fronteira norte, e pousaram na Base Aérea de Natal, percorrendo mais de 6.500 km. Essa operação apresentou a capacidade de ataque estratégico da Força Aérea Brasileira (FAB) , evidenciando sua possibilidade de atingir alvos em toda a América Latina. A terceira unidade recebeu o A-1A AMX foi o 1º/10º Grupo de Aviação (1º/10º GAv) – Esquadrão Poker, sediado em Santa Maria, no Rio Grande do Sul. A primeira aeronave foi entregue em março de 1999, e a dotação da unidade foi concluída no início de 2004, quando foi declarada operacional. Diferentemente das duas unidades anteriores, a missão prioritária do Esquadrão Poker era o reconhecimento tático do campo de batalha. Inicialmente, suas aeronaves foram equipadas com pods fotográficos nacionais Gespi e Vicon, dotados de capacidades de reconhecimento impasse e infravermelho. Posteriormente, foram adquiridos pods israelenses Recce Lite, mais avançados, projetados para reconhecimento exclusivo com múltiplos sensores. Além disso, o Esquadrão Poker também tinha como missão a supressão de defesas aéreas inimigas (Suppression of Enemy Air Defense – SEAD), com planos para o futuro emprego do míssil nacional antirradiação MAR-1, então em desenvolvimento. Contudo, esse projeto não avançou além da fase de protótipo, privando a Força Aérea Brasileira (FAB)  de um importante recurso dissuasório. De maneira peculiar, quando empregadas em missões de reconhecimento, as aeronaves do 1º/10º GAv – Esquadrão Poker utilizavam a designação e chamada de rádio RA-1.

O Embraer A-1A AMX tornou-se a primeira aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) a participar do exercício multinacional Red Flag, um dos maiores treinamentos anuais prolongados pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF). A participação foi atribuída ao 1º/16º Grupo de Aviação (1º/16º GAv) – Esquadrão Adelphi, que deslocou seis aeronaves, vinte e dois pilotos e sessenta e oito militares para o evento, programado para ocorrer entre 24 de setembro e 4 de outubro de 1998. Para atender às descrições operacionais desse exercício, a Força Aérea Brasileira (FAB) precisou adaptar o nível técnico de seus pilotos ao uso de novas ferramentas e fluxos de planejamento de missões. Até então, as técnicas e procedimentos da Força Aérea Brasileira (FAB) nesse âmbito foram moldados pela experiência adquirida durante a Segunda Guerra Mundial, contrastando com a doutrina norte-americana do "ataque por pacotes". Esse conceito, desenvolvido durante a Guerra do Vietnã na década de 1960, foi consolidado como padrão operacional nas décadas seguintes, sendo aplicado em diversas operações reais com forças aéreas de outros países, devido à diversidade de aeronaves pelas forças armadas dos Estados Unidos. O exercício multinacional Red Flag caracteriza-se por sua alta complexidade, exigindo interação fluida e transparente entre pilotos e aeronaves de diferentes esquadrões e forças aéreas. Nesse cenário, os Embraer A-1A AMX enfrentaram uma oposição robusta simulada, composta por caças norte-americanas de última geração, como o McDonnell Douglas F-15 Eagle, o General Dynamics F-16 Fighting Falcon e o Boeing F/A-18E Hornet, além de caças bombardeiros modernizados, como os Northrop F-5E Tiger III da Força Aérea Chilena. A defesa adversária foi complementada por sistemas eletrônicos que simulavam baterias antiaéreas de mísseis russos, incluindo os modelos SA-6, SA-3 e e franceses SAM Roland. Mesmo nesse ambiente altamente hostil, as aeronaves brasileiras realizaram com sucesso operações de infiltração em território inimigo, alcançando padrões operacionais elevados. Essa participação, combinada às capacidades do A-1A AMX, elevou a Força Aérea Brasileira (FAB) a um novo patamar em termos de doutrina de ataque tático, consolidando sua capacidade de operar em cenários complexos e integrados com forças aéreas internacionais.
Além de seu emprego em três grupos de aviação de ataque e rconhecimento tático, uma das células do Embraer A-1A AMX foi alocada junto ao Grupo de Ensaios em Voo (GEEV), sediado no Centro de Tecnologia da Aeronáutica (CTA) em São José dos Campos. Essa unidade utilizou uma aeronave para tarefas de ensaio e homologação de sistemas de armas. As aeronaves entregues à Força Aérea Brasileira (FAB) foram produzidas em três lotes diferentes, ou que foram entregues em uma frota com baixo nível de padronização em termos de sistemas e componentes. Esse cenário foi agravado por diversas modificações e aprimoramentos incorporados ao projeto ao longo dos anos, gerando desafios logísticos significativos. A gestão de estoques e a aquisição de peças de reposição foram substituídas, pois componentes teoricamente equivalentes são oferecidos em variações entre os lotes. Além disso, mais de duas décadas após a concepção do projeto, muitos desses componentes já apresentam certo grau de obsolescência. A combinação desses fatores – heterogeneidade e obsolescência – evidenciou a necessidade de um programa de atualização, padronização e revitalização das aeronaves remanescentes, mantendo um nível aceitável de operacionalidade. Esse conceito evoluiu para o Programa de Modernização do AMX, cujo objetivo era mitigar os problemas decorrentes da obsolescência de equipamentos fora de produção e uniformizar os sistemas aviônicos com aqueles utilizados na modernização dos Northrop F-5EM Tiger II e nos recém-introduzidos Embraer A-29 ALX. Este programa foi formalmente iniciado em 2003, com a Embraer – Empresa Brasileira de Aeronáutica SA sendo contratada como principal executora das atividades de modernização. No entanto, as negociações burocráticas no âmbito do governo federal atrasaram a implementação, exigindo uma renegociação com a empresa no final de 2006. Em 30 de maio de 2007, a primeira aeronave A-1A AMX, pertencente ao segundo lote de produção, pousou nas instalações da Embraer em Gavião Peixoto, São Paulo. Essa célula foi designada como base para o programa de modernização, marcando o encerramento do primeiro ciclo de vida operacional dessas aeronaves no Brasil e o início de uma nova fase de revitalização da aviação ataque brasileira.

Em escala.
Para representarmos o Embraer AMX A-1A “FAB 5518” empregamos o excelente kit em resina da escala 1/48 produzido Duarte Models, modelo este que apresenta um excelente nível de detalhamento e qualidade  compatível com  kits injetados. Utilizamos cabides subalares duplos em resina da confeccionados pela GIIC Models e bombas burras do tipo MK-83 e MK-82 pertencentes ao set "Aircraft Weapons A" da Hasegawa. Fizemos uso de decais confeccionados pela FCM Decals presente no antigo Set 48/08.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o primeiro padrão de pintura empregado pelos Embraer A-1A AMX no ano de 1997 pelo 1º/16º Grupo de Aviação - Esquadrão Adelphi, seguindo esta sistemática ao longo dos anos algumas alterações foram incluídas como marcações de alta visibilidade em preto nos bordos de ataque, permanecendo assim até 2003 quando todas as células passaram a ostentar a nova camuflagem tática padrão da Força Aérea Brasileira.


Bibliografia :
Revista ASAS nº 20  AMX na FAB – Claudio Luchesi e Carlos Felipe Operti
Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015 – Jackson Flores
História da Força Aérea Brasileira , Prof Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html

FNM & Alfa Romeo Série D (VTTNE)


História e Desenvolvimento.
A Alfa Romeo Automobiles S.p.A. foi fundada em 24 de junho de 1910, na cidade de Milão, Itália, sob o nome "Anonima Lombarda Fabbrica Automobili" (ALFA), onde "Anonima" indicava uma classificação legal para empresas fundadas por investidores anônimos. A empresa iniciou suas operações nas instalações da extinta montadora francesa Automobiles Darracq France, que havia encerrado suas atividades meses antes. O primeiro modelo produzido em série pela Alfa Romeo foi o 24 HP, lançado em 1910, projetado pelo engenheiro Giuseppe Merosi. Este veículo marcou o início da trajetória da empresa no mercado automotivo, com foco em qualidade e inovação. Em 1911, a montadoa estatal italiana ingressou no automobilismo, participando da competição Targa Florio com dois modelos de 24 HP, conduzidos por pilotos talentosos. O sucesso nas corridas contribuiu para a consolidação da marca como referência em carros esportivos, destacando-se pela performance e design. Em agosto de 1915, a empresa passou a ser dirigida pelo empresário napolitano Nicola Romeo, que reorientou a produção para atender às demandas do esforço de guerra italiano. Durante esse período, suas unidades fabris foram adaptadas para fabricar veículos e equipamentos militares, marcando uma diversificação temporária em seu portfólio. Na década de 1920, a Alfa Romeo enfrentou dificuldades financeiras e operacionais, culminando em uma profunda reestruturação. Em 1932, a empresa foi encampada pelo Instituto per la Ricostruzione Industriale (IRI), um grupo estatal italiano. Sob essa nova administração, a Alfa Romeo ampliou suas atividades, iniciando a produção de: Caminhões; Ônibus e Componentes militares. Após a Segunda Guerra Mundial, a Alfa Romeo concentrou-se na produção de carros populares para recuperar sua estabilidade financeira. O sucesso nesse segmento gerou recursos que permitiram o desenvolvimento de uma linha de veículos comerciais de pequena e média tonelagem. Durante o início da década de 1950, a empresa destacou-se no competitivo mercado de caminhões da Europa Ocidental, consolidando sua reputação pela qualidade e inovação. A trajetória da Alfa Romeo encontrou sinergia com a Fábrica Nacional de Motores (FNM), uma empresa estatal brasileira fundada em 13 de junho de 1942, na cidade de Duque de Caxias, Rio de Janeiro. A FNM foi criada com o objetivo de fabricar motores de aviação durante a Segunda Guerra Mundial. Com o fim do conflito em 1945, essa missão perdeu relevância, levando a FNM a redirecionar suas atividades. A colaboração entre a Alfa Romeo e a FNM, iniciada a médio prazo, permitiu a transferência de tecnologia e know-how italiano para a produção de veículos comerciais no Brasil. Essa parceria foi fundamental para a expansão da presença da Alfa Romeo no mercado brasileiro, especialmente no segmento de caminhões e ônibus.

O fim da Segunda Guerra Mundial em 1945 marcou o início de um período de incertezas para a Fábrica Nacional de Motores (FNM), estatal criada em 1942 para fabricar motores de aviação. A desmobilização das forças aliadas resultou na disponibilização de grande quantidade de material bélico, incluindo aeronaves, a preços simbólicos pelos Estados Unidos. Esse cenário eliminou as perspectivas de exportação de motores aeronáuticos, principal objetivo inicial da estatal, levando a uma crise prolongada caracterizada por: Falta de propósito claro para a continuidade das operações, e  necessidade de reorientação das linhas de produção para novos produtos. Diante da crise, a FNM buscou alternativas para suas linhas de produção, explorando diferentes projetos: Montagem de Jipes Willys-MB: Proposta para diversificar a produção com veículos leves. Caminhões Pesados Mack: Planejamento para a fabricação de caminhões de maior porte e por fim: Fornecimento de Tratores: Contrato com o Ministério da Agricultura para a produção de 10.000 tratores, denominados MSTM. Os projetos enfrentaram significativos atrasos devido a desentendimentos entre a diretoria da FNM e membros do governo, resultando no cancelamento das iniciativas. Essa falta de alinhamento comprometeu o cronograma e aprofundou as dificuldades da estatal. Em janeiro de 1949, a FNM assinou um contrato com a montadora italiana Isotta Fraschini para a fabricação de sua linha de caminhões no Brasil. Essa parceria representou um marco na redefinição dos rumos da empresa, embora tenha enfrentado desafios devido à situação financeira precária da Isotta Fraschini: A montadora italiana, conhecida pela produção de carros de luxo, saiu enfraquecida da Segunda Guerra Mundial, com um portfólio limitado a dois modelos de caminhões. Em concordata desde fevereiro de 1948, a Isotta Fraschini decretou falência em setembro de 1949, ameaçando a continuidade do projeto. Apesar das adversidades, o projeto avançou, resultando na produção do caminhão Isotta D.80, rebatizado como FNM D-7300. Este modelo tornou-se o primeiro caminhão fabricado no Brasil, com as seguintes características -  Especificações Técnicas: Capacidade de carga de  7 toneladas;  motor: Diesel com injeção direta, 6 cilindros, 7,3 litros e 100 cv de potência;  Transmissão: Caixa de cinco marchas e  Freios: Pneumáticos. Destacava-se a diferenciação, pois o   FNM D-7300 apresentava uma arquitetura distinta dos caminhões médios a gasolina predominantes no Brasil, majoritariamente importados dos Estados Unidos. Previa-se a produção de 200 caminhões, apresentando  mais de 30% de conteúdo nacional, refletindo esforços de nacionalização, com estes devendo ser entregues em até dois anos. 
Com a falência da montadora Isotta Fraschini em 1949, negociações entre os governos brasileiro e italiano redirecionaram a Fábrica Nacional de Motores (FNM) para uma nova parceria com a estatal italiana Alfa Romeo Automobiles S.p.A. Apesar de desafios administrativos e burocráticos iniciais, o acordo proporcionou bases sólidas para a produção de veículos comerciais no Brasil, consolidando o caminhão “Fenemê” como símbolo de desbravamento territorial e progresso industrial. O contrato firmado previa o fornecimento de chassis de caminhões e ônibus em lotes de 1.000 unidades cada, a serem montados no Brasil. A parceria visava combinar a expertise técnica da Alfa Romeo com a infraestrutura da estatal brasileira, promovendo a fabricação de veículos adaptados às necessidades do mercado brasileiro. A montagem dos veículos teve início em 1952, utilizando cabines importadas da Alfa Romeo. Embora a montadora italiana tenha desenvolvido um protótipo de cabine com linhas menos curvas, específico para a FNM, esse modelo não foi adotado. O primeiro caminhão produzido foi o FNM D-9500, com as seguintes especificações: Capacidade de Carga: 8,1 toneladas (ou 14,0 toneladas com reboque). Motor: Diesel com injeção direta, 130 cv. Transmissão: Oito marchas à frente e duas a ré. Eixo Traseiro: Dupla redução Freios: Pneumáticos. No primeiro ano de produção, todos os componentes do caminhão D-9500 eram 100% importados, refletindo a dependência inicial de tecnologia estrangeira. A partir de 1952, a FNM implementou um programa de nacionalização para aumentar o conteúdo local dos veículos, reduzindo custos e fortalecendo a indústria brasileira. O processo foi estruturado em etapas: 1953: Início da estampagem de uma nova cabine e utilização de componentes nacionais, como pneus e baterias. 1954: Incorporação de molas, radiador, rodas, tambores de freio, tanque de combustível e sistema de exaustão. Meta de 45% de conteúdo nacional, com projeção de alcançar 55% com a produção local de eixos e sistema de direção. 1955: Produção do primeiro chassi brasileiro, com a FNM superando a marca de 2.400 veículos fabricados. Em meados de 1956, a frota de caminhões FNM ultrapassou a soma das frotas de caminhões Mercedes-Benz e Volvo, que eram importados na época. Esse marco destacou a crescente aceitação do “Fenemê” no mercado brasileiro, impulsionada por sua robustez e adaptação às condições locais. No mesmo período, a montadora nacional lançou a cabine leito, equipada com espaço para dois pequenos beliches. Essa inovação foi particularmente vantajosa para viagens de longa distância pelo interior do Brasil, atendendo às necessidades de motoristas em rotas extensas. A parceria entre a FNM e a Alfa Romeo, iniciada em 1949, foi um marco na história da indústria automotiva brasileira, consolidando o caminhão “Fenemê” como símbolo de desenvolvimento e industrialização. A produção do FNM D-9500, aliada ao processo de nacionalização, permitiu à FNM superar desafios iniciais e alcançar liderança no mercado de caminhões no Brasil

Em 1957, a FNM introduziu o modelo D-11000, que manteve o mesmo desenho de cabine e carroceria do antecessor D-9500, mas trouxe melhorias significativas: Motor: Diesel de 6 cilindros, 11 litros, 150 cv, com bloco e três cabeçotes de alumínio. Capacidade de Carga: 9,1 toneladas (ou 18 toneladas com reboque). Opções de Configuração: Três distâncias entre eixos disponíveis. Nacionalização: Conteúdo local superior a 82%. Campanha Publicitária: Sob o slogan “Montanha comigo é festa!”, destacou o desempenho robusto em terrenos desafiadores. O D-11000 alcançou grande aceitação, com quase 4.000 unidades produzidas em 1958 na planta de Duque de Caxias, RJ, consolidando-se como um sucesso comercial. Uma falha crítica no processo de fundição do bloco do motor causou o vazamento de líquido de arrefecimento para o cárter, contaminando o óleo e podendo levar à falha total do motor. Popularmente chamada de “barriga d’água”, essa questão comprometeu temporariamente a reputação do modelo. A FNM respondeu rapidamente com uma campanha de substituição dos motores defeituosos, restaurando a confiança do mercado na robustez do D-11000. Os caminhões FNM D-11000 desempenharam um papel crucial em projetos de infraestrutura no Brasil, incluindo: Construção de Brasília, inaugurada em 1960. Abertura de rodovias estratégicas, como a Belém-Brasília e a Transamazônica. Essa participação reforçou a imagem do “Fenemê” como símbolo do progresso e da industrialização brasileira. Em 1960, a Fábrica Nacional de Motores (FNM)expandiu seu portfólio com a produção do automóvel 2000 JK, fabricado sob licença da Alfa Romeo. No mesmo ano, os caminhões D-11000 receberam uma reestilização, com mudanças no grupo óptico e melhorias no design. Em 1962, a FNM iniciou a usinagem local de motores, marcando um avanço tecnológico significativo e preparando a empresa para novos desenvolvimentos. Em 1964, a FNM introduziu a série de caminhões “V”, composta pelos modelos: V-6 (chassi curto);  V-5 (chassi médio); V-4 (chassi longo) e V-2 (chassi super longo). Estes apresentariam inovações, como  opção de direção assistida hidráulica, novos bancos e acabamento interior aprimorado, alcançariam ainda  97% de conteúdo local, refletindo o avanço da indústria nacional. Apesar dessas melhorias, os caminhões FNM começaram a perder competitividade frente a modelos mais modernos da Mercedes-Benz e Scania-Vabis, impactando diretamente suas vendas. Em 1967, as vendas da FNM caíram drasticamente, com apenas 1.000 caminhões comercializados, refletindo a defasagem tecnológica dos modelos. Em resposta, a FNM anunciou o desenvolvimento de uma cabine modernizada, designada comercialmente como “Futurama”, com produção planejada para o segundo semestre de 1968. No entanto, o  projeto não avançou além da fase de protótipo e foi cancelado. As atualizações introduzidas limitaram-se a um novo painel de instrumentos e à opção de um terceiro eixo de fábrica, insuficientes para reverter o declínio.
Durante o governo militar, a Fábrica Nacional de Motores (FNM) enfrentou um período de incertezas, com divisões entre as lideranças do regime: Uma parte de seus lideres defendia a recuperação da estatal para revitalizar suas operações, outra vertente, que prevaleceu, optou pela venda da empresa. Assim em 1967, a FNM foi colocada à venda, atraindo interesse de montadoras internacionais: As francesas Citroën e Renault, presentaram propostas de cooperação para a produção de carros de passeio e utilitários.  A italiana Alfa Romeo Automobiles S.p.A,  Ofereceu a proposta mais vantajosa, assumindo integralmente a operação da FNM em 1968. A aquisição pela Alfa Romeo surpreendeu o mercado, uma vez que a montadora italiana havia encerrado a produção de caminhões em sua terra natal em 1964. Em 1972, a FNM lançou seu último grande modelo de caminhão, utilizando uma cabine baseada no Alfa Romeo Mille (produzido entre 1958 e 1964). As principais características incluíam: Cabine: Fixada ao chassi com componentes elásticos, equipada com ventilação forçada e aquecimento. O ferramental de estampagem foi transferido da matriz italiana, reduzindo custos de produção. Modelos: FNM 180 com motor diesel  de 11 litros, 180 cv de potencia, disposta nas configurações de três opções de entre-eixos, com terceiro eixo opcional.  FNM 210 com motor diesel de 11 litros, 215 cv de potencia, disponível apenas como cavalo mecânico, com transmissão reduzida. Em 1973, a Fiat Automóveis adquiriu 43% das ações da Alfa Romeo na Itália, assumindo o controle acionário total três anos depois, em 1976. No Brasil, essa transição impactou diretamente a FNM: Em 1977, a razão social da operação brasileira foi alterada para Fiat Diesel S/A. A produção de caminhões continuou sob a nova administração, mantendo a herança da linha FNM-Alfa Romeo. A produção de caminhões na planta de Duque de Caxias continuou até 1985, quando a Fiat Diesel S/A encerrou a fabricação da linhagem iniciada pela FNM. Após 36 anos de operação e a produção de aproximadamente 78.000 caminhões, o último veículo da linha “FNM-Alfa-Fiat” deixou a linha de montagem, marcando o fim de uma era na indústria automotiva brasileira. A trajetória da FNM, com sua linhagem de caminhões “Fenemê”, permanece como um marco histórico da industrialização e do desenvolvimento do setor automotivo no Brasil.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante o inicio da Segunda Guerra Mundial, preocupado com a possibilidade de uma invasão do continente americano pelas forças do Eixo, o governo norte-americano sob a gestão do presidente Franklin D Roosevelt  incentivou a participação do Brasil no esforço de guerra aliado. Como contrapartida, o Brasil obteve acesso a vantagens estratégicas como : Acordos bilaterais de comércio: Fortalecimento das relações econômicas com os Estados Unidos. Acesso ao programa  Leand & Lease Bill Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos): Uma linha de crédito de US$ 100 milhões para aquisição de equipamentos militares modernos, incluindo armamentos, aeronaves, veículos blindados e carros de combate. Entre 1942 e 1945, o Exército Brasileiro recebeu mais de 5.000 caminhões militares de diversos modelos, como GMC CCKW, Diamond T, US White Corbitt Cargo, Ward La France, Chevrolet Série G, e Studebaker US6G. Esses veículos proporcionaram uma capacidade significativa de mobilização de tropas e cargas, modernizando as operações logísticas da  Força Terrestre. Na década de 1950, a frota de caminhões adquirida durante a guerra enfrentou sérios problemas operacionais, decorrentes de: Desgaste natural: O uso intensivo durante e após o conflito comprometeu a condição das viaturas. Dificuldade de manutenção: A produção dos modelos recebidos foi descontinuada nos Estados Unidos, dificultando a importação de peças de reposição essenciais. Essa situação gerou preocupações críticas no comando do Exército Brasileiro, pois a redução da capacidade de transporte ameaçava diretamente a prontidão operacional. A necessidade de soluções emergenciais tornou-se prioritária para manter a funcionalidade das forças terrestres. A aquisição de uma nova frota de caminhões militares, como os modelos REO M-34 e M-35 com tração 4x4 e 6x6, foi considerada a solução ideal para substituir os veículos obsoletos. No entanto, o alto custo de tal investimento estava fora do alcance orçamentário do Exército Brasileiro na época. Estudos mais realistas resultaram em três estratégias complementares: Aquisição limitada de caminhões modernos: Aquisição:  de um pequeno número de caminhões militares modernos como os norte-americanos REO M-34, visando atender às necessidades mais urgentes com equipamentos atualizados - Repotencialização de frotas existentes: Estudos para modernizar e remotorizar os caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G, prolongando sua vida útil por meio de reformas e atualizações -Adoção de caminhões comerciais militarizados: Utilização de veículos comerciais adaptados para cumprir missões secundárias, oferecendo uma solução econômica e imediata.

Mesmo com esta pauta na mesa,  o Exército Brasileiro enfrentou desafios significativos para manter sua capacidade operacional devido à obsolescência de sua frota de caminhões militares. Assim para  recuperar a capacidade logística do Exército Brasileiro, três alternativas foram consideradas: aquisição de novos caminhões militares, repotencialização de veículos existentes, e adoção de caminhões comerciais militarizados. Contudo, os estudos para modernizar os caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G foram descartados devido a: Alto custo de implementação: Os investimentos necessários excediam as capacidades orçamentárias. Falta de expertise técnica: O Brasil não dispunha de experiência prévia em programas de modernização de tal escala. O cancelamento dessa iniciativa intensificou a necessidade de ampliar a aquisição de caminhões comerciais militarizados, que poderiam complementar a frota militar, composta majoritariamente por veículos 6x6 projetados para operações fora de estrada. A adoção de caminhões comerciais militarizados visava liberar a frota de caminhões norte-americanos para missões fora de estrada, destinando os novos veículos a funções secundárias, como transporte em ambientes urbanos e rodoviários.  Com o objetivo de fortalecer a jovem indústria automotiva brasileira, o Ministério do Exército optou pela aquisição de veículos produzidos localmente pela Fábrica Nacional de Motores (FNM). A FNM oferecia em seu portfólio comercial dois modelos de caminhões médios: o FNM D-9500 e o FNM D-11000. Dentre esses, o FNM D-11000 foi selecionado por sua robustez estrutural, considerada adequada para atender, em teoria, aos parâmetros exigidos para o processo de militarização. O FNM D-11000 foi projetado para operar em condições desafiadoras, transportando cargas pesadas em estradas mal pavimentadas e terrenos irregulares. Suas principais especificações incluíam:   Chassi Reforçado: Construído com sete travessas de reforço forjadas em aço de alta resistência, garantindo durabilidade e capacidade de suportar cargas elevadas. Capacidade de Carga: Até 9,1 toneladas (ou 18 toneladas com reboque). Configurações Disponíveis: Cavalo mecânico; Carga seca.; Baú ; Basculante e versões com chassi alongado, compatível com a adição de um terceiro eixo. Motor: Diesel de 6 cilindros, 11 litros, 150 cv. Transmissão: Oito marchas à frente e duas a ré. Freios: Pneumáticos. A robustez estrutural do FNM D-11000, aliada à sua versatilidade de configurações, tornou-o uma escolha viável para adaptação às necessidades militares. O veículo foi concebido para complementar a frota militar existente, permitindo o desempenho de funções logísticas em ambientes variados, especialmente em condições adversas de infraestrutura viária.
As primeiras unidades do modelo FNM D-11000 4x2 da versão carga foram entregues ao Exército Brasileiro a partir de 1957, sendo inicialmente semelhantes às versões comerciais, com modificações específicas para atender aos requisitos de militarização. As adaptações incluíram: Para-choques Reforçados: Projetados para maior resistência em operações militares. Grades de Proteção: Adicionadas para proteger componentes críticos como o conjunto ótico. Carroceria de Aço Padrão Militar: Substituiu a carroceria comercial, com design robusto. Coberta de Lona: Inspirada nos caminhões norte-americanos GMC CCKW 352–353 e Studebaker US6, oferecendo proteção contra intempéries e adequação a operações de campo. Essas modificações tornaram o FNM D-11000 uma viatura de transporte não especializado, capaz de atender às demandas logísticas em diversos cenários. O FNM D-11000 foi projetado para operar em condições desafiadoras, com especificações que o tornavam adequado para uso militar, especialmente em Batalhões Rodoviários (BRv) e Batalhões de Engenharia de Construção (BEc).  Nos anos seguintes, novos contratos foram celebrados com a FNM e, posteriormente, com a Alfa Romeo, após a aquisição da FNM pela montadora italiana em 1968. Esses contratos envolveram: Exército Brasileiro: Distribuição de caminhões FNM D-11000 e modelos Alfa Romeo para unidades em todo o território nacional, desempenhando funções logísticas em conjunto com os recém adquiridos Mercedes-Benz LP-321 e LP-331. Força Aérea Brasileira e Marinha do Brasil: Incorporação de unidades para atender a necessidades específicas de transporte e logística. Essa expansão marcou a transição gradual dos caminhões norte-americanos, como o GMC CCKW, GMC G717 e o Studebaker US6, para tarefas secundárias, com os novos modelos oferecendo maior disponibilidade, eficiência operacional e melhor relação custo-benefício em manutenção. A incorporação do FNM D-11000 e dos modelos subsequentes da Alfa Romeo representou um avanço significativo na capacidade de mobilidade do Exército Brasileiro. Os caminhões militarizados complementaram a frota existente, permitindo: Maior flexibilidade em operações urbanas e rodoviárias. Redução da sobrecarga sobre os veículos 6x6, reservados para missões fora de estrada. Melhoria na eficiência logística, com veículos mais modernos e adaptados às condições brasileiras. A adoção do FNM D-11000 pelo Exército Brasileiro, a partir de 1957, foi um marco na modernização da frota logística das Forças Armadas, alinhando-se ao objetivo de fomentar a indústria automotiva nacional. As adaptações para militarização, como carroceria de aço e sistema de freios avançado, garantiram a adequação do veículo às demandas operacionais. 

A ampliação dos contratos com a Fábrica Nacional de Motores (FNM), posteriormente assumida pela Alfa Romeo, envolveu o Exército Brasileiro, a Força Aérea Brasileira e a Marinha do Brasil. Essa iniciativa consolidou a transição para uma frota mais eficiente, fortalecendo a capacidade logística militar do país. Os contratos garantiram a entrega de caminhões e cavalos mecânicos adaptados às necessidades operacionais das Forças Armadas, com destaque para os modelos FNM D-9500 e D-11000. A partir de 1958, o Exército Brasileiro começou a incorporar cavalos mecânicos nas versões FNM D-9500 e D-11000, que não passaram por processos de militarização, sendo idênticos às versões comerciais. Esses veículos foram alocados aos Regimentos de Carro de Combate (RCC) e receberam a designação de Viatura Trator sob Rodas Cavalo Mecânico Emprego Geral (VTTNE) Os cavalos mecânicos operavam em conjunto com pranchas de transporte rodoviário produzidas nacionalmente, sendo utilizados para: Transporte de carros blindados, incluindo os modelos M-4 Sherman, M-3 Stuart e VBTP M-113, durante deslocamentos pelo interior do Brasil. Suporte logístico em operações que exigiam mobilidade de equipamentos pesados. A partir de 1962, o Ministério da Aeronáutica (MAer) adquiriu pelo menos 20 cavalos mecânicos do modelo FNM D-9500 para uso nos Parques de Material Aeronáutico (PAMA) distribuídos pelo país. Esses veículos, também sem militarização, foram destinados ao transporte de aeronaves de pequeno e médio porte, parcialmente desmontadas, em processos de manutenção ou descarga operacional. A trajetória da FNM foi marcada por mudanças significativas em sua estrutura acionária: 1968: A Fábrica Nacional de Motores (FNM) foi integralmente adquirida pela subsidiária brasileira da Alfa Romeo, e sua linha de caminhões passou a adotar a marca comercial Alfa Romeo. Os contratos com as Forças Armadas foram mantidos, com entregas realizadas conforme os cronogramas estabelecidos. 1976: A Fiat italiana assumiu o controle acionário da Alfa Romeo, e a operação brasileira foi redesignada como Fiat Diesel S/A. A continuidade dos contratos foi assegurada, garantindo o fornecimento ininterrupto de veículos. Ao longo dos anos seguintes, o Exército Brasileiro continuou a adquirir cavalos mecânicos FNM D-9500 e D-11000, expandindo suas aplicações para além do transporte de veículos blindados. As novas funções incluíram: Transporte de carga geral, utilizando carretas de madeira, baús de alumínio e carretas frigoríficas.Suporte logístico em diversas unidades, atendendo a necessidades de transporte rodoviário em ambientes urbanos e rurais.
Os caminhões FNM D-9500, D-11000 e os modelos subsequentes da Alfa Romeo em suas versões de Viatura de Transporte Não Especializado (VTNE) e Viatura Trator sob Rodas Cavalo Mecânico Emprego Geral (VTTNE). foram amplamente utilizados pelo Exército Brasileiro, especialmente em: Depósitos de Suprimentos: Para armazenamento e distribuição de materiais. Batalhões de Engenharia: Em operações de construção, infraestrutura e transporte de maquinas pesadas como motoniveladoras e tratores. Esses veículos desempenharam funções logísticas essenciais, contribuindo para a mobilidade e eficiência operacional das unidades militares. No final da década de 1970, a obsolescência dos primeiros lotes de caminhões FNM e Alfa Romeo tornou-se evidente, devido à ausência de melhorias técnicas significativas na linha de produtos da montadora. Essa defasagem tecnológica levou as Forças Armadas Brasileiras (Exército, Força Aérea e Marinha) a buscar alternativas mais modernas para atender às demandas logísticas. Os ramos das Forças Armadas intensificaram a aquisição de veículos militarizados, incluindo: Mercedes-Benz L-1111 e L-1213: Modelos robustos e tecnologicamente avançados;  Ford Série F-600: Amplamente utilizados em funções logísticas e  Chevrolet C-60 e D-60: Complementando a frota em diversas aplicações. Esses modelos assumiram funções logísticas primárias, substituindo grande parte da frota envelhecida de caminhões FNM e Alfa Romeo. Apesar da substituição, os caminhões FNM e Alfa Romeo em melhores condições de uso permaneceram em serviço, desempenhando papéis secundários em: Unidades de Apoio e Suprimentos: Especialmente nas organizações de Intendência e Logística do Exército Brasileiro. Operações de Baixa Exigência: Atividades que não demandavam tecnologia avançada. Algumas unidades continuaram ativas por décadas, demonstrando a durabilidade e confiabilidade desses veículos. A introdução de cavalos mecânicos mais modernos e com maior capacidade de carga, produzidos pela Mercedes-Benz do Brasil e Scania-Vabis do Brasil, marcou o fim das aquisições de novos cavalos mecânicos FNM e Alfa Romeo, redesignados como Fiat Modelo 130 após a aquisição da Alfa Romeo pela Fiat em 1976. Esses novos modelos superaram os antecessores em desempenho e eficiência, encerrando a demanda por unidades adicionais da linha FNM/Alfa Romeo. Os caminhões FNM e Alfa Romeo desempenharam um papel crucial na logística do Exército Brasileiro, especialmente em Depósitos de Suprimentos e Batalhões de Engenharia. No entanto, a obsolescência tecnológica no final da década de 1970 levou à substituição por modelos mais modernos, como os Mercedes-Benz, Ford e Chevrolet. Apesar disso, a durabilidade dos caminhões FNM e Alfa Romeo permitiu sua utilização contínua em funções de apoio por décadas, enquanto a concorrência de cavalos mecânicos mais avançados marcou o declínio das aquisições da linha Fiat Modelo 130. 

Em Escala.
Para representarmos o FNM D-11000 Trator sob rodas Cavalo Mecânico Emprego Geral (VTTNE) empregado pelo Exército Brasileiro, empregamos por base, o modelo em die cast produzido pela Axio para a Editora Altaya na escala 1/43. Fizemos toda a customização do modelo original para a versão pretendida de cavalo mecânico, já a carreta friorifica foi toda construída em scratch build em madeira, metal e plasticard , fazendo uso de rodas em resina. Empregamos decais confeccionados pela decais Eletric Products pertencentes ao set "Exército Brasileiro 1942 - 1982".
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático do Exército Brasileiro aplicado em todos seus veículos militares desde a Segunda Guerra Mundial até a o final do ano de 1982. Não existem registros que comprovem  a aplicação neste modelo do esquema de camuflagem tático de duas cores adotado a partir de 1983 para os veículos de transporte da Força Terrestre. Empregamos tintas e vernizes produzidos pela Tom Colors.




Bibliografia : 
- Caminhões Brasileiros de Outros Tempos – FMN , editora Altaya
- Alfa Romeu - https://en.wikipedia.org/wiki/Alfa_Romeo
- Veículos Militares Brasileiros – Roberto Pereira de Andrade e José S Fernandes 
- Manual Técnico – Exército Brasileiro 1976
- FNM - www.lexicar.com.br
- Caminhões FNM no Exército - Expedito Carlos S Bastos

Ford F-600 (M1958-1969) VTNE - VTE

História e Desenvolvimento.
A Ford Motor Company, uma das mais icônicas e prestigiadas montadoras norte-americanas, foi fundada em 16 de junho de 1903, em modestas instalações situadas no subúrbio de Detroit, no estado de Michigan. Liderada pelo engenheiro e visionário Henry Ford, a empresa teve início com um investimento inicial de US$ 28.000, aportados por doze investidores, entre os quais se destacavam os irmãos John e Horace Dodge, que posteriormente deixariam a companhia para fundar a Dodge Motors Company. Este documento apresenta uma análise formal e estruturada da trajetória inicial da Ford, seu impacto na indústria automotiva e o legado de suas inovações. Nos primeiros anos de operação, a Ford Motor Company produzia veículos de forma quase artesanal em sua fábrica localizada na Avenida Mack, em Detroit. Pequenos grupos de dois ou três trabalhadores montavam cada automóvel, utilizando componentes majoritariamente fornecidos por terceiros. Apesar da escala limitada, os produtos da Ford rapidamente conquistaram a confiança dos consumidores norte-americanos, posicionando a empresa como líder no segmento de carros de passeio. Esse sucesso inicial gerou recursos que viabilizaram a expansão da companhia e o aprimoramento de seus processos industriais. Com o crescimento da demanda, a Ford optou por internalizar a fabricação de componentes críticos, adotando o conceito de integração vertical. Essa estratégia, inovadora para a época, permitiu maior controle sobre a qualidade e os custos de produção, consolidando a eficiência operacional da empresa. A integração vertical tornou-se um modelo funcional e amplamente adotado, contribuindo para a escalabilidade da Ford e sua capacidade de atender a um mercado em rápida expansão. Em 1908, Henry Ford lançou o Ford Modelo T, equipado com o primeiro motor de cabeça de cilindro removível, um marco técnico que elevou os padrões da indústria. Contudo, foi em 1914 que a Ford revolucionou a manufatura com a introdução da linha de montagem contínua, um sistema que implementou a produção em série de forma prática e eficiente. Esse método, conhecido como “Fordismo”, baseava-se na padronização de processos, na verticalização da produção e no aperfeiçoamento contínuo, encapsulado no célebre lema de Henry Ford: “Você pode comprar um Ford de qualquer cor, contanto que seja preto.” Desde seus primeiros anos, a Ford Motor Company demonstrou uma visão estratégica voltada para o mercado internacional. Em 1904, a empresa estabeleceu sua primeira linha de montagem no exterior, no Canadá, para a produção do Modelo C. Essa iniciativa marcou o início de uma política de parcerias globais, que facilitavam a fabricação local e a adaptação dos veículos às necessidades de diferentes mercados. O impacto do Fordismo transcendeu a indústria automotiva, influenciando métodos de produção em diversos setores. A combinação de eficiência, padronização e acessibilidade introduzida por Henry Ford redefiniu os paradigmas da manufatura moderna, estabelecendo um modelo que seria adotado mundialmente. Além disso, a Ford Motor Company consolidou-se como uma das pioneiras na democratização do automóvel, transformando-o de um artigo de luxo em um bem acessível a milhões de pessoas.

A expansão da Ford na América Latina teve início na Argentina, onde, em 1913, foi estabelecida uma filial. Contudo, a montagem de veículos nesse país só foi iniciada em 1921. No Brasil, a produção de automóveis Ford começou de forma pioneira em 1918, por meio de uma iniciativa do industrial baiano Antônio Navarro Lucas. Licenciado pela Ford, Lucas passou a montar, em Salvador, Bahia, dez unidades mensais do Modelo T, marcando o Brasil como o primeiro país latino-americano a fabricar veículos da montadora. Reconhecendo o potencial do mercado brasileiro, a diretoria da Ford Motor Company decidiu, em 24 de abril de 1919, criar uma filial no país. Já no início de maio do mesmo ano, foi instalada, na Rua Florêncio de Abreu, no centro de São Paulo, uma unidade que combinava um escritório administrativo e uma linha de montagem para a produção do Modelo T. Essa instalação tornou-se a primeira indústria automobilística do Brasil, um marco histórico para o setor. O Ford Modelo T destacou-se no Brasil por sua robustez, facilidade de condução e manutenção, características que o tornaram o automóvel mais popular do país na época. Com apenas 20 cavalos de potência, seu projeto simples e funcional permitia sua desmontagem para transporte em caixotes, sendo remontado em galpões próximos a portos ou estações ferroviárias, especialmente em regiões com infraestrutura rodoviária limitada. Essa versatilidade contribuiu para sua ampla aceitação no mercado brasileiro. A crescente demanda por veículos Ford no Brasil impulsionou a expansão das operações em São Paulo. Até 1921, a Ford mudou suas instalações duas vezes, ainda no centro da cidade, até se estabelecer na Rua Sólon, no bairro do Bom Retiro. Nesse endereço, a produção alcançou a capacidade de 40 unidades diárias. Em 1923, a mesma unidade montou o primeiro caminhão fabricado no Brasil, ampliando o portfólio da empresa. Durante a Segunda Guerra Mundial, a Ford priorizou a produção de veículos e componentes para uso militar. Com o fim do conflito, a montadora acelerou sua produção, atingindo, em 1948, uma cadência de 50 a 60 veículos leves por dia. Nesse período, a fábrica passou a montar uma gama diversificada de produtos, incluindo automóveis Ford, Mercury e Lincoln (de origem norte-americana), Anglia e Prefect (de origem britânica), além de veículos comerciais leves, ônibus e caminhões médios e pesados das marcas Ford e Thames. Aproximadamente 1.200 componentes já eram produzidos localmente, por meio da Ford e de cerca de cem fornecedores nacionais, enquanto cabines e carrocerias continuavam a ser importadas e montadas no Brasil. Ao completar 30 anos de operações no Brasil, em abril de 1949, a Ford já havia montado mais de 200 mil veículos. Em 1953, a empresa inaugurou uma moderna fábrica no bairro do Ipiranga, em São Paulo, com capacidade para produzir 125 veículos por dia. Essa unidade representou um salto em termos de infraestrutura e eficiência produtiva. Nesse contexto, o governo federal começou a considerar políticas de incentivo à nacionalização da indústria automotiva, embora planos concretos só fossem formalizados em 1956, com a criação do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA).
Com a criação do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA) em maio de 1956, o Brasil estabeleceu diretrizes para a nacionalização da indústria automotiva, exigindo que as montadoras desenvolvessem planos para a fabricação de veículos com crescente conteúdo local. A Ford do Brasil S/A, alinhada a essas metas, submeteu seu plano ao GEIA próximo ao prazo limite, consolidando um marco na história da indústria automotiva nacional. Este documento apresenta uma análise formal e estruturada do processo de nacionalização da Ford no Brasil, destacando a produção inicial, os avanços industriais e o cumprimento das exigências do GEIA. Em conformidade com as regulamentações do GEIA, a Ford do Brasil apresentou, no final de 1956, um plano para a fabricação de veículos completos, abrangendo três categorias: um caminhão médio, um caminhão leve e uma picape. O projeto previa uma capacidade máxima de 30.000 unidades anuais até 1960, com a produção de mais de 8.000 caminhões já em 1957. O plano estipulava um aumento progressivo no índice de nacionalização, partindo de aproximadamente 40% (em peso) em 1957 para 90% em 1960. Após a aprovação do GEIA, a Ford já contava com a estampagem local de quase todos os componentes das cabines, terceirizando itens como caçambas de picapes, fornecidas pela Máquinas Piratininga, e adquirindo centenas de outros componentes de fabricantes nacionais. Em 26 de agosto de 1957, a linha de montagem da fábrica do Ipiranga, em São Paulo, produziu o primeiro caminhão Ford fabricado no Brasil, o modelo F-600, com cerca de 40% de conteúdo nacional (em peso). O F-600 era um caminhão médio, com capacidade de 6,5 toneladas e entre-eixos de 4,37 metros, projetado em uma arquitetura convencional de influência norte-americana. Equipado com um motor V8 a gasolina (4,5 litros, 161 cv), cabine recuada, caixa de quatro marchas e diferencial de duas velocidades com reduzida de comando elétrico, o modelo refletia características técnicas robustas para a época. Dois meses após o lançamento do F-600, em outubro de 1957, a Ford apresentou a picape F-100, projetada para transportar 930 kg. A F-100 compartilhava o mesmo motor V8 e a cabine do F-600, mas contava com uma caixa de três marchas, com a primeira não sincronizada. Ambos os modelos, F-600 e F-100, eram baseados em projetos descontinuados nos Estados Unidos, combinando elementos de design de 1953 (capô, para-lamas e cabine) com a grade frontal de 1956. No primeiro ano de produção, foram fabricados 3.454 veículos, dos quais 576 eram picapes F-100. Para cumprir as metas de nacionalização, a Ford implementou significativos investimentos em infraestrutura e capacitação técnica. Foram criados os Departamentos de Engenharia do Produto e de Ensaios e Pesquisa, instalados nas antigas instalações do Bom Retiro, em São Paulo. Além disso, a empresa construiu uma fundição de motores em Osasco, São Paulo, e ampliou as linhas de usinagem, montagem de motores e estamparia na fábrica do Ipiranga. Essas três novas instalações foram inauguradas em novembro de 1958, marcando um avanço crucial na capacidade produtiva e na integração de componentes nacionais.

Em 1959, os modelos F-600 e F-100 receberam atualizações de design, com a introdução de um novo painel, volante em formato “cálice” e para-brisas panorâmicos, elementos adotados nos Estados Unidos em 1956. A picape F-100 ganhou uma caçamba modernizada, com para-lamas integrados, alinhada a projetos recentes da matriz norte-americana. A inauguração da fábrica de motores em Osasco impulsionou o índice de nacionalização, refletido simbolicamente na adoção de emblemas nas cores verde e amarela em todos os modelos, celebrando o avanço na produção local. Em junho de 1959, a Ford do Brasil lançou o caminhão leve F-350, projetado para uma capacidade de 2,7 toneladas e com entre-eixos de 3,30 metros. Equipado com a mesma mecânica dos modelos F-600 e F-100, o F-350 destacou-se como o único veículo brasileiro em sua categoria por muitos anos, atendendo às necessidades de transporte leve no mercado nacional. Em 1960, a Ford introduziu a versão F-600-148″, uma variante do caminhão médio F-600 com entre-eixos reduzido (3,77 metros), otimizada para carrocerias basculantes ou configurações com quinta roda, capaz de tracionar até 12 toneladas. Essa adaptação reforçou a versatilidade do modelo, atendendo a diferentes aplicações no setor de transporte. Em 1961, respondendo à crescente preferência por motores diesel no transporte de cargas no Brasil, a Ford lançou o F-600 Diesel. Equipado com um motor Perkins de seis cilindros e 125 cv, o modelo exigiu poucas modificações em relação à versão a gasolina, incluindo apenas o reforço da suspensão dianteira e a substituição do logotipo “V8” na grade por um que indicava o uso de diesel. Essa transição marcou um passo significativo na adequação da Ford às realidades do mercado brasileiro. Em abril de 1962, a Ford atualizou o design de sua linha de veículos comerciais, adotando o estilo do modelo norte-americano de 1960. Denominada Super Ford, a nova série não apresentou mudanças mecânicas significativas, mas trouxe uma estética modernizada, alinhada às tendências globais da montadora. Em maio de 1968, a Ford renovou sua linha de veículos comerciais, introduzindo novas carrocerias com faróis retangulares para todos os modelos. O F-600 Diesel passou a contar com um motor Perkins aprimorado, de seis cilindros, sete mancais, camisas removíveis e bomba injetora rotativa, entregando 142 cv. Essas melhorias reforçaram a eficiência e a confiabilidade dos veículos, consolidando a posição da Ford no mercado de transporte. Em julho de 1970, a Ford anunciou os primeiros lançamentos para 1971, trazendo faróis redondos para todos os modelos de caminhões. A picape F-100 recebeu atualizações nos freios, na suspensão (sistema Twin-I-Bean) e na relação de transmissão. O F-350 passou a contar com freios assistidos, enquanto o F-600 ganhou, como opcional, um tanque de combustível de maior capacidade e uma caixa de cinco marchas sincronizadas, ampliando sua versatilidade e desempenho. Em 1976, a Ford lançou o caminhão diesel F-7000, que compartilhava a mesma capacidade e elementos mecânicos do F-600 Diesel, mas era equipado com um motor diesel de dois tempos Detroit, de quatro cilindros em linha, injeção direta e 145 cv, cuja produção havia iniciado recentemente no Brasil. Essa inovação destacou a capacidade da Ford de integrar tecnologias avançadas à sua linha de produtos.
Em 1977, a Ford expandiu ainda mais sua oferta de caminhões: Fevereiro: Lançamento do FT-7000, equipado com um terceiro eixo de fábrica (fabricado pela Hendrickson e montado pela Ford), otimizado para aplicações específicas. Julho: Introdução dos modelos semipesados F-8000 e FT-8000, além do primeiro caminhão pesado da marca, o cavalo mecânico F-8500, projetado para tracionar 30,5 toneladas. Esses três modelos eram equipados com um motor Detroit de seis cilindros em V, 202 cv, filtro de ar externo montado sobre o para-lama direito, freios pneumáticos, freio de estacionamento com trava de mola, embreagem dupla e direção hidráulica opcional. Todos compartilhavam a mesma cabine derivada dos caminhões médios, garantindo consistência no design. No início da década de 1980, a Ford do Brasil revisou a nomenclatura de sua linha de caminhões, introduzindo os modelos médios F-11000, F-12000 e F-13000, com capacidades de carga líquida entre 6,5 e 9 toneladas, e os semipesados F-19000 e F-21000, equipados com terceiro eixo (tandem ou balancim) e capacidades de 13 e 15 toneladas, respectivamente. Esses modelos incorporaram avanços técnicos significativos, incluindo: Motores: Novo motor MWM de seis cilindros, com a opção do motor Perkins para os modelos médios. Transmissão: Caixa de cinco marchas (primeira não sincronizada) com redução de acionamento elétrico ou pneumático no diferencial. Freios: Sistema pneumático, exceto no F-11000, que utilizava freios hidráulicos a vácuo. Outras melhorias: Suspensão revisada, sistema elétrico de 12 volts, tanque de combustível cilíndrico de maior capacidade, além de direção hidráulica e rodas raiadas como opcionais em alguns modelos. Essas inovações reforçaram a competitividade dos caminhões Ford no mercado brasileiro. Diante do acirramento da concorrência no setor de caminhões, a Ford do Brasil planejou a produção local da moderna linha europeia Ford Cargo, lançada no mercado brasileiro em abril de 1985. Projetada com design avançado e tecnologia alinhada aos padrões internacionais, a linha Cargo representou um marco na estratégia da montadora, ampliando sua oferta de veículos médios e pesados e consolidando sua posição no segmento de transporte de cargas. Em 1992, buscando prolongar a relevância de sua tradicional linha F, a Ford do Brasil realizou uma modernização significativa nas cabines desses caminhões. Essa atualização, que incluiu um redesign marcante, levou os veículos a serem popularmente conhecidos como “Sapão” devido ao formato distintivo das novas cabines. A reformulação estética e funcional visava manter a competitividade da linha F frente aos concorrentes e à crescente adoção da linha Cargo. Em 1998, a Ford do Brasil promoveu a última atualização das cabines da Série F, introduzindo o modelo F-16000 como uma nova variante. Apesar desses esforços, a linha F começou a perder espaço no portfólio da montadora. Nos anos subsequentes, a produção foi gradualmente restrita aos modelos leves, enquanto os caminhões médios da Ford passaram a ser representados exclusivamente pela linha Ford Cargo, que se consolidou como a principal oferta da empresa no segmento.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Exército Brasileiro experimentou um avanço significativo em sua capacidade de mobilização, impulsionado pelo recebimento de caminhões militares fornecidos pelos Estados Unidos sob a Lei de Empréstimos e Arrendamentos (Lend-Lease Act). No entanto, na década de 1950, a frota enfrentou desafios operacionais devido ao desgaste e à dificuldade de obtenção de peças de reposição. Este relatório analisa o impacto dessas questões, as soluções propostas pelo comando do Exército Brasileiro e os desafios associados à sua implementação. Com a adesão do Brasil ao esforço de guerra aliado em 1942, as Forças Armadas Brasileiras receberam, até o final de 1945, mais de 5.000 caminhões militares das séries GMC CCKW, Corbitt, Diamond e Studebaker US6G, fornecidos por meio do programa Lend-Lease Act. Esses veículos foram fundamentais para a mobilização de tropas e cargas durante o conflito. Contudo, no final da década de 1950, a operacionalidade da frota foi gravemente comprometida por dois fatores principais: Desgaste Natural: Resultante do uso intensivo durante e após a guerra; Dificuldade na Obtenção de Peças: A descontinuação da produção desses modelos nos Estados Unidos, há mais de uma década, dificultava a importação de componentes essenciais. Esse cenário gerou preocupação no comando do Exército Brasileiro, pois comprometia a capacidade operacional da Força Terrestre, exigindo soluções urgentes para restaurar sua prontidão logística. A solução ideal para manter a capacidade operacional envolvia a substituição da frota por um número equivalente de caminhões modernos com tração 4x4 e 6x6, sendo os modelos REO M-34 e M-35 os mais indicados devido à sua robustez e tecnologia avançada. No entanto, o elevado custo de aquisição de uma frota desse porte excedia as limitações orçamentárias do Exército Brasileiro na época, tornando essa opção inviável. Diante das restrições financeiras, o comando do Exército elaborou três soluções complementares para enfrentar o problema: Aquisição Limitada de Caminhões Modernos: Compra de um pequeno número de caminhões REO M-34 e M-35 para atender às necessidades mais críticas, priorizando missões estratégicas. Repotencialização da Frota Existente: Estudos para a modernização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G, visando prolongar sua vida útil por meio de atualizações técnicas. Adoção de Caminhões Comerciais Militarizados: Incorporação de caminhões produzidos nacionalmente, adaptados para missões secundárias, como transporte de cargas leves e outras funções de apoio. A combinação dessas estratégias tinha o potencial de restaurar a operacionalidade da Força Terrestre de maneira sustentável e economicamente viável. Os estudos para a repotencialização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G foram minuciosamente analisados, mas não receberam recomendação para implementação. As principais razões incluíam: Alto Custo: O investimento necessário para modernizar a frota era elevado, especialmente considerando a necessidade de importar componentes ou desenvolver substitutos localmente. Falta de Capacidade Técnica: Naquela época, o Brasil carecia de um corpo técnico com a expertise necessária para executar um programa de repotencialização em escala, envolvendo reengenharia e adaptação de sistemas complexos. Esses fatores inviabilizaram a modernização da frota existente, direcionando o foco para as demais soluções propostas.

O cancelamento da repotencialização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G evidenciou a necessidade de soluções alternativas para restaurar a operacionalidade da frota do Exército Brasileiro. A adoção de caminhões comerciais militarizados foi identificada como uma abordagem viável, permitindo:
Substituição em Missões Básicas: Utilização de veículos comerciais em tarefas de transporte básico, liberando os caminhões militares com tração 6x6 para operações táticas e estratégicas em ambientes fora de estrada. Otimização da Frota Existente: Concentração dos veículos militares remanescentes em melhor estado para missões críticas. Essa estratégia, já implementada desde a década de 1930 com caminhões comerciais de pequeno porte, beneficiava-se do baixo custo de aquisição e operação dos veículos produzidos localmente, alinhando-se às prioridades orçamentárias da Força Terrestre. Para atender à demanda por caminhões médios, o Ministério do Exército optou por veículos fabricados pela Fábrica Nacional de Motores (FNM), uma empresa estratégica no fortalecimento da indústria automotiva brasileira. Dois modelos foram selecionados: FNM D-9500: Caminhão médio com características adequadas para adaptação militar. FNM D-11000: Modelo destacado por sua robustez estrutural, capaz de atender, em teoria, aos parâmetros exigidos para o processo de militarização. A escolha dos caminhões FNM refletiu o compromisso do governo em fomentar a indústria nacional, aproveitando a capacidade produtiva local para suprir as necessidades do Exército. Apesar do avanço na substituição dos caminhões médios, a frota de caminhões leves permanecia obsoleta, composta majoritariamente por modelos como: Opel Blitz II ComercialChevrolet 157 Gigante 1937General Motors G7106, G7107 e G-617M, recebidos entre 1935 e 1942. Esses veículos desempenhavam um papel central na estrutura de transporte do Exército Brasileiro, mas seu desgaste e a dificuldade de manutenção exigiam um programa urgente de renovação. A substituição dessa frota representava uma oportunidade significativa para as montadoras nacionais, incentivadas pelo Governo Federal por meio do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), instituído em 1956. O GEIA foi criado para promover o desenvolvimento da indústria automotiva brasileira, oferecendo incentivos fiscais e financeiros às montadoras que investissem na produção local. Esse programa alinhava-se aos objetivos do Exército Brasileiro, pois: Estimulava a fabricação de veículos robustos e acessíveis, adequados à militarização; Reduzia a dependência de importações, mitigando os problemas de fornecimento de peças observados com a frota legada da Segunda Guerra Mundial; Fortalecia a economia nacional, gerando empregos e capacidade industrial. A aquisição de caminhões FNM e a perspectiva de renovação da frota de caminhões leves foram, portanto, estratégias alinhadas aos objetivos do GEIA, promovendo a integração entre as necessidades militares e o desenvolvimento industrial.
A Ford Motors do Brasil estabeleceu-se como a primeira montadora a fornecer veículos para uso militar no Brasil, iniciando sua parceria com o Exército Brasileiro na década de 1920. Os caminhões Ford T, incorporados nesse período, desempenharam um papel central na expansão das fronteiras nacionais, particularmente em missões lideradas pelo Marechal Cândido Rondon. A associação da Ford com essas operações, amplamente explorada em sua comunicação institucional, reforçou sua reputação como fornecedora confiável. Ao longo dos anos, diversos modelos foram integrados à frota do Exército Brasileiro, incluindo: Ford Models 1938/1940/1941; Ford G-540 2G8T/G8T; Ford G-622; Ford G-917; Ford FK G-700 e Ford YBH2. Essa trajetória consolidou a Ford como uma candidata natural para atender às demandas de renovação da frota militar na década de 1950, abrangendo não apenas o Exército, mas também a Força Aérea Brasileira e a Marinha do Brasil. Na década de 1950, a Ford lançou no mercado comercial brasileiro o Ford F-600, seu primeiro caminhão produzido nacionalmente. Esse modelo, comparável ao concorrente Chevrolet Brasil 6500, apresentava características que o tornavam adequado à militarização, incluindo robustez estrutural e versatilidade para adaptações. O F-600 foi projetado para atender às necessidades de transporte em diversas condições, posicionando a Ford como uma forte concorrente no mercado militar.  Buscando capitalizar a demanda por caminhões militarizados, a Ford apresentou ao Exército Brasileiro protótipos do Ford F-600 equipados com carrocerias e acessórios militares, disponíveis nas configurações de tração 4x2 e 6x2. Esses veículos foram submetidos a avaliações técnicas para verificar sua adequação às missões militares. Apesar do potencial demonstrado, o Exército Brasileiro optou por não realizar aquisições imediatas, priorizando a versão militarizada do Chevrolet Brasil 6500, que melhor atendia às suas especificações naquele momento. Em meados de 1958, o Ministério da Aeronáutica (MAer) formalizou o primeiro contrato para a aquisição de caminhões Ford F-600 militarizados. O acordo envolveu a compra de duas dezenas de unidades configuradas com carroceria do tipo “Espinha de Peixe”, projetada especificamente para o transporte de tropas de choque. Esses veículos foram destinados às unidades da Polícia da Aeronáutica (PA), demonstrando a versatilidade do F-600 em aplicações militares especializadas. A participação da Ford no fornecimento de caminhões militarizados reforçou sua posição como uma montadora estratégica para as Forças Armadas Brasileiras. Embora o Exército Brasileiro tenha optado pelo Chevrolet Brasil 6500, o contrato com o Ministério da Aeronáutica destacou a capacidade da Ford de atender às demandas específicas de diferentes ramos militares. O Ford F-600, com sua robustez e adaptabilidade, contribuiu para a modernização parcial da frota da Força Aérea Brasileira, consolidando a presença da montadora no mercado militar.

No final da década de 1950, a Ford Motors do Brasil S/A consolidou sua posição como fornecedora de veículos militarizados para as Forças Armadas Brasileiras, com destaque para o caminhão Ford F-600. A versão carroceria “Espinha de Peixe”, projetada para o transporte de tropas de choque, foi adquirida por diversos governos estaduais logo após sua introdução. Esses veículos foram destinados aos batalhões de choque das Polícias Militares, demonstrando a versatilidade do modelo em aplicações de segurança pública e sua adequação a operações especializadas.  No final de 1959, a Ford Motors do Brasil S/A obteve êxito na venda de um grande lote de caminhões Ford F-600 com tração 4x2, ligeiramente militarizados, para o Exército Brasileiro. Esses veículos incorporaram um nível de militarização mais avançado em comparação aos protótipos testados em 1958, incluindo: Para-choques reforçados; Grade de proteção frontal para faróis e lanternas; Guincho mecânico frontal com capacidade de tração média; Gancho para reboque; Carroceria de aço, produzida pela empresa paulista Bisseli Ltda., com cobertura de lona no padrão militar, inspirada nos caminhões Studebaker US6G e GMC CCKW 352/353 6x6. A utilização de componentes compartilhados com a linha comercial básica do F-600 permitiu uma produção acelerada, atendendo rapidamente às demandas do Exército Brasileiro. As entregas das primeiras unidades tiveram início em fevereiro de 1960. Os caminhões Ford F-600 militarizados demonstraram excelente desempenho em operações regulares, destacando-se pela robustez e confiabilidade. Esse sucesso motivou o Ministério do Exército a celebrar novos contratos de aquisição, abrangendo duas versões adicionais: Tração 6x2: Projetada para maior capacidade de carga em terrenos variados; Carroceria “Espinha de Peixe”: Configurada para o transporte de tropas de choque, destinada aos batalhões da Polícia do Exército (P.E.). Ambas as versões apresentaram desempenho operacional satisfatório, consolidando a confiança do Exército Brasileiro na família F-600. O desempenho positivo dos caminhões Ford F-600 levou o Exército Brasileiro a selecioná-los como uma das principais plataformas para a instalação do sistema de “Tração Total” desenvolvido pela Engesa S/A. Esse sistema, que incluía configurações de tração 4x4 e 6x6, conferiu aos F-600 capacidades off-road avançadas, tornando-os o esteio da frota de transporte militar para todo terreno do Exército Brasileiro nas décadas seguintes. A integração do sistema “Tração Total” ampliou significativamente a versatilidade e a eficácia dos veículos em operações táticas e logísticas. A introdução da versão militarizada do Ford F-600, com destaque para a carroceria “Espinha de Peixe” e as configurações de tração 4x2 e 6x2, marcou um avanço significativo na capacidade logística do Exército Brasileiro a partir de 1959. O desempenho operacional excepcional desses caminhões, aliado à integração do sistema “Tração Total” da Engesa, consolidou o F-600 como uma plataforma essencial para o transporte militar em terrenos desafiadores.
Uma significativa parcela da frota de caminhões Ford F-600, originalmente equipada com tração 4x2, foi convertida para tração 4x4 ou 6x6 pela Engesa S/A. Essa modernização marcou a primeira aplicação do sistema patenteado “Tração Total” no modelo F-600, conferindo aos caminhões capacidades off-road avançadas. A conversão permitiu que os veículos fossem utilizados em missões táticas em terrenos desafiadores, ampliando sua versatilidade operacional no Exército Brasileiro. Paralelamente à conversão da tração, o motor original Ford Y-Block V8 a gasolina, de 292 polegadas cúbicas (4,8 litros), foi substituído pelo motor a diesel MWM D-229-6, de 6 cilindros em linha e 5,9 litros. Essa mudança visava melhorar a eficiência energética e a durabilidade dos caminhões, alinhando-se às preferências das Forças Armadas Brasileiras por motores a diesel, mais adequados para operações prolongadas. Nos anos seguintes, as Forças Armadas Brasileiras adquiriram um grande número de caminhões Ford F-600 com nível reduzido de militarização, configurados com diversas carrocerias para atender a múltiplas funções operacionais, incluindo: Carga seca (versões comercial e militar); Cisterna de combustível; Cisterna de água; Bombeiro; Basculante; Oficina; Baú de carga; Frigorífico; Posto de comando e Socorro mecânico com guincho. A carroceria de socorro mecânico foi produzida pela empresa paulista Bisseli Viaturas e Equipamentos Ltda., destacando a colaboração com fornecedores locais para atender às especificações militares. Essas versões do F-600 tornaram-se amplamente utilizadas nas unidades militares brasileiras, integrando-se ao cotidiano operacional. Apesar do sucesso inicial, a Ford Motors do Brasil enfrentou desafios que comprometeram sua posição como principal fornecedora de caminhões militares. A estagnação do projeto da família F-600, aliada à decisão estratégica da diretoria administrativa e comercial de priorizar a nova linha de caminhões Ford Cargo, resultou na perda de competitividade no mercado militar. Essa mudança de foco limitou os investimentos em atualizações do F-600, reduzindo sua relevância frente às demandas das Forças Armadas. A lacuna deixada pela Ford foi rapidamente ocupada pela Mercedes-Benz do Brasil, que se posicionou como a principal fornecedora de caminhões militares no país. A Ford passou a conquistar apenas contratos menores, envolvendo modelos como F-6000, F-12000, F-14000 e Cargo, nas décadas seguintes. A Mercedes-Benz, com sua oferta de veículos mais modernos e adaptados às necessidades militares, consolidou sua liderança no mercado.

Em Escala.
Para a representação do Ford F-600 Série I na configuração “Espinha de Peixe”, foi selecionado um modelo artesanal de alta qualidade, produzido pela Fusaro Trucks na escala 1/43. Construído com uma combinação de resina, metal e madeira, esse modelo destaca-se pela precisão nos detalhes e pela fidelidade ao design original do veículo, servindo como base ideal para a customização necessária à réplica militar. O modelo foi enriquecido com itens adicionais para refletir as características específicas da viatura utilizada pela Polícia do Exército Brasileiro, incluindo: Itens de Carga: Confeccionados em resina, representando os equipamentos típicos transportados na carroceria “Espinha de Peixe”; Detalhamentos em Scratch Build: Elementos personalizados, construídos manualmente, para aprimorar a autenticidade e a precisão da réplica, como acessórios militares e acabamentos específicos. A finalização do modelo  envolveu a aplicação de decais produzidos pela Eletric Products, pertencentes ao conjunto “Exército Brasileiro 1942-1982”.
O esquema de cores (FS) descrito neste relatório representa o padrão tático militar adotado pelo Exército Brasileiro para todos os seus veículos militares desde a Segunda Guerra Mundial até o final de 1982. A partir de 1983, os veículos militares remanescentes do Exército Brasileiro passaram a adotar um novo esquema de camuflagem técnica de dois tons. Os veículos utilizados pela Força Aérea Brasileira e pela Marinha do Brasil não seguiam o padrão tático do Exército Brasileiro, adotando esquemas de pintura distintos, adaptados às suas missões específicas e aos ambientes operacionais em que atuavam. Essas variações garantiam a adequação dos veículos às necessidades de cada ramo, como maior visibilidade em operações aéreas ou resistência a condições marítimas. Para a aplicação dos esquemas de pintura, foram empregadas tintas e vernizes de alta qualidade produzidos pela Tom Colors. 

Bibliografia :
- Ford do Brasil Lexicar - www.lexicar.com.br/ford
- História da Ford no Brasil - www.ford.com.br
- General Motors do Brasil – www.generalmotors.com.br 
- Motorização no Exército Brasileiro 1906 a 1941 - Expedito Carlos Stephani Bastos