Há mais de um século, os engenheiros alemães Gottlieb Daimler e Carl Benz desenvolveram, de forma concomitante, os primeiros automóveis motorizados funcionais do mundo. O pioneirismo desses inventores resultou em outras conquistas notáveis, como a criação do primeiro ônibus, do primeiro caminhão com motor a gasolina e do primeiro caminhão movido a diesel. Em abril de 1900, foi introduzido o motor "Daimler-Mercedes", um grupo propulsor que revolucionou a produção em série de automóveis comerciais devido à sua simplicidade, eficácia e baixo custo de produção e aquisição. Durante a Primeira Guerra Mundial, a empresa desempenhou um papel significativo no esforço de guerra alemão, fabricando uma ampla gama de produtos, incluindo veículos, componentes diversos e motores de aviação. Após o término do conflito, a economia alemã enfrentou severas dificuldades, marcadas por altas taxas de inflação e desemprego, que comprometeram a renda da população. Esse cenário impactou diretamente as vendas, especialmente de bens de luxo como automóveis de passageiros, exercendo forte pressão sobre a indústria automotiva alemã. Apenas marcas consolidadas, respaldadas por empresas financeiramente robustas, conseguiram sobreviver a esse período de instabilidade, enquanto muitas outras foram compelidas a formar cooperativas ou a se submeter a processos de fusão. Nos anos subsequentes, a produção automotiva recuperou-se de forma gradual. Buscando superar os desafios econômicos, as empresas Daimler-Motoren-Gesellschaft (DMG) e Benz & Cie decidiram unir forças em um acordo de administração conjunta e cooperação tecnológica. Esse compromisso, firmado entre seus acionistas e estipulado para vigorar até o ano 2000, previa a padronização de design, produção, compras, vendas e publicidade, com os modelos de automóveis sendo comercializados em conjunto, embora preservando as respectivas marcas originais. Pouco tempo depois, essa integração culminou na formação de uma identidade industrial e comercial única, dando origem à Daimler-Benz AG. O logotipo da empresa, a icônica estrela de três pontas, foi concebido por Gottlieb Daimler. Cada ponta simbolizava um elemento — ar, terra e mar —, representando a versatilidade dos motores desenvolvidos pela companhia, que se adaptavam aos três modais de transporte. Em meados da década de 1930, as vendas da Daimler-Benz AG foram significativamente impulsionadas por encomendas governamentais vinculadas ao ambicioso programa de rearmamento da Alemanha Nazista.
O portfólio original da empresa, até então centrado em automóveis e caminhões, foi ampliado para incluir a produção de motores aeronáuticos - navais, embarcações de pequeno porte, aeronaves e diversos componentes mecânicos, consolidando a montadora alemã como um fornecedor estratégico da máquina de guerra nazista. Ao término da Segunda Guerra Mundial, suas plantas industriais se encontravam inoperantes devido os incessantes bombardeios aliados, e logo seriam reconstruídas em cooperação com ingleses e norte-americanos, em um esforço para a recuperação econômica do país. Este movimento seria replicado em toda a infraestrutura alemã através do Plano Marshal a partir 1947, demandando neste contexto um grande mercado de veículos utilitários de todos os porte a serem empregados neste programa. Neste cenário a Daimler-Benz vislumbraria uma oportunidade única de mercado, e passaria a concentrar grande parte de seus recursos e esforços no segmento de caminhões de pequeno e médio porte. A empresa optaria por fazer uso de projeto desenvolvidos originalmente durante a década de 1930, que iriam obter grande sucesso comercial não só na Alemanha, mas também em toda a Europa, resultando em uma grande econômico para a montadora. Contudo, foi somente em meados da década de 1950 que a Daimler-Benz lançou um produto especificamente projetado para atender às demandas daquele mercado no momento de reconstruçao da Alemanha: o Mercedes-Benz MB L-319. O MB L-319 foi projetado com uma cabine avançada (cab-over-engine, ou COE), um conceito que maximizava o espaço para carga útil sem aumentar o comprimento total do chassi ou a distância entre eixos. Essa configuração permitia maior manobrabilidade em áreas urbanas e eficiência no transporte de mercadorias. O MB L-319 era oferecido em diversas configurações, incluindo caminhões de carga, furgões, chassis para ônibus e veículos especializados, o que o tornava extremamente versátil. O sucesso do MB L-319 no mercado Europeu deu origem à família de caminhões LP (Lastkraftwagen-Pulmann), que incluía modelos derivados com capacidades e configurações variadas, como: LP-315, LP-321, LP-326. LP-329 e LP-331 Esses modelos mantinham o conceito de cabine avançada e foram amplamente utilizados na Europa, especialmente na Alemanha, para transporte de mercadorias, serviços municipais e até como base para veículos de bombeiros e ambulâncias. A família Lastkraftwagen-Pulmann consolidou a reputação da Mercedes-Benz por produzir veículos duráveis e eficientes.

O caminhão Mercedes-Benz L-312 foi introduzido no mercado brasileiro em três variantes, seguindo a nomenclatura adotada na Alemanha, que permaneceu em vigor por quatro décadas, todas com uma distância entre eixos de 3,20 metros: o modelo básico L (Lastwagen, ou caminhão, em alemão), o basculante LK (Kipper) e o cavalo-mecânico LS (Sattelschlepper, ou reboque), sendo os dois últimos configurados com balanço traseiro reduzido. Adicionalmente, estavam disponíveis duas opções de encarroçamento: uma versão completa e outra sem cabine, composta apenas por capô e para-lamas, que serviu como base principal para a fabricação de lotações. Em 1960, a Mercedes-Benz do Brasil participou da primeira edição do Salão do Automóvel, consolidando sua presença no mercado nacional. No ano seguinte, a empresa iniciou suas exportações para o mercado latino-americano, com a comercialização de 550 unidades do ônibus modelo O-321 para a Argentina. A exemplo da matriz alemã, a subsidiária brasileira passou a produzir, a partir de 1957, os caminhões da família LP, incluindo os modelos LP-315, LP-321, LP-326, LP-329 e LP-331. Esses veículos foram adaptados para diversas aplicações, como transporte de carga, combustível, cisternas e configurações com caçambas basculantes. A simplicidade mecânica do modelo LP-321, equipado com o motor OM 321 de seis cilindros em linha, que desenvolvia 120 cv a 3.000 rpm, constituiu um diferencial competitivo significativo. Esse motor contava com um sistema de combustão de antecâmara em fluxo contínuo, que otimizava o aproveitamento do combustível, aliado a um regime térmico reduzido e à refrigeração do óleo do cárter, tecnologias que garantiam maior durabilidade. O trem de força incluía uma transmissão manual de cinco velocidades, todas sincronizadas, resultando em baixo consumo de combustível. Essa eficiência, combinada com a maior capacidade de carga útil do modelo, permitia às empresas operar com frotas menores para transportar o mesmo volume de mercadorias, conferindo uma vantagem expressiva sobre os concorrentes. O desempenho superior do LP-321 resultou em um sucesso comercial notável, com a venda recorde de 34.142 unidades entre 1958 e 1970. Outro aspecto distintivo do projeto era a distância entre eixos de 4,6 metros, que proporcionava uma distribuição uniforme do peso ao longo da carroceria. A Mercedes-Benz do Brasil oferecia uma caçamba padrão de 6,5 metros de comprimento, mas permitia customizações conforme as necessidades dos clientes, o que facilitava adaptações específicas e impulsionava ainda mais as vendas da linha LP (Lastkraftwagen-Pulmann) no país.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Exército Brasileiro experimentou um avanço significativo em sua capacidade de mobilização, impulsionado pelo recebimento de caminhões militares fornecidos pelos Estados Unidos sob a Lei de Empréstimos e Arrendamentos (Lend-Lease Act). No entanto, na década de 1950, a frota enfrentou desafios operacionais devido ao desgaste e à dificuldade de obtenção de peças de reposição. Este relatório analisa o impacto dessas questões, as soluções propostas pelo comando do Exército Brasileiro e os desafios associados à sua implementação. Com a adesão do Brasil ao esforço de guerra aliado em 1942, as Forças Armadas Brasileiras receberam, até o final de 1945, mais de 5.000 caminhões militares das séries GMC CCKW, Corbitt, Diamond e Studebaker US6G, fornecidos por meio do programa Lend-Lease Act. Esses veículos foram fundamentais para a mobilização de tropas e cargas durante o conflito. Contudo, no final da década de 1950, a operacionalidade da frota foi gravemente comprometida por dois fatores principais: Desgaste Natural: Resultante do uso intensivo durante e após a guerra; Dificuldade na Obtenção de Peças: A descontinuação da produção desses modelos nos Estados Unidos, há mais de uma década, dificultava a importação de componentes essenciais. Esse cenário gerou preocupação no comando do Exército Brasileiro, pois comprometia a capacidade operacional da Força Terrestre, exigindo soluções urgentes para restaurar sua prontidão logística. A solução ideal para manter a capacidade operacional envolvia a substituição da frota por um número equivalente de caminhões modernos com tração 4x4 e 6x6, sendo os modelos REO M-34 e M-35 os mais indicados devido à sua robustez e tecnologia avançada. No entanto, o elevado custo de aquisição de uma frota desse porte excedia as limitações orçamentárias do Exército Brasileiro na época, tornando essa opção inviável. Diante das restrições financeiras, o comando do Exército elaborou três soluções complementares para enfrentar o problema: Aquisição Limitada de Caminhões Modernos: Compra de um pequeno número de caminhões REO M-34 e M-35 para atender às necessidades mais críticas, priorizando missões estratégicas. Repotencialização da Frota Existente: Estudos para a modernização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G, visando prolongar sua vida útil por meio de atualizações técnicas. Adoção de Caminhões Comerciais Militarizados: Incorporação de caminhões produzidos nacionalmente, adaptados para missões secundárias, como transporte de cargas leves e outras funções de apoio. A combinação dessas estratégias tinha o potencial de restaurar a operacionalidade da Força Terrestre de maneira sustentável e economicamente viável. Os estudos para a repotencialização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G foram minuciosamente analisados, mas não receberam recomendação para implementação. As principais razões incluíam: Alto Custo: O investimento necessário para modernizar a frota era elevado, especialmente considerando a necessidade de importar componentes ou desenvolver substitutos localmente. Falta de Capacidade Técnica: Naquela época, o Brasil carecia de um corpo técnico com a expertise necessária para executar um programa de repotencialização em escala, envolvendo reengenharia e adaptação de sistemas complexos. Esses fatores inviabilizaram a modernização da frota existente, direcionando o foco para as demais soluções propostas.
O cancelamento da repotencialização dos caminhões GMC CCKW e Studebaker US6G evidenciou a necessidade de soluções alternativas para restaurar a operacionalidade da frota do Exército Brasileiro. A adoção de caminhões comerciais militarizados foi identificada como uma abordagem viável, permitindo: Substituição em Missões Básicas: Utilização de veículos comerciais em tarefas de transporte básico, liberando os caminhões militares com tração 6x6 para operações táticas e estratégicas em ambientes fora de estrada. Otimização da Frota Existente: Concentração dos veículos militares remanescentes em melhor estado para missões críticas. Essa estratégia, já implementada desde a década de 1930 com caminhões comerciais de pequeno porte, beneficiava-se do baixo custo de aquisição e operação dos veículos produzidos localmente, alinhando-se às prioridades orçamentárias da Força Terrestre. Para atender à demanda por caminhões médios, o Ministério do Exército optou por veículos fabricados pela Fábrica Nacional de Motores (FNM), uma empresa estratégica no fortalecimento da indústria automotiva brasileira. Dois modelos foram selecionados: FNM D-9500: Caminhão médio com características adequadas para adaptação militar. FNM D-11000: Modelo destacado por sua robustez estrutural, capaz de atender, em teoria, aos parâmetros exigidos para o processo de militarização. A escolha dos caminhões FNM refletiu o compromisso do governo em fomentar a indústria nacional, aproveitando a capacidade produtiva local para suprir as necessidades do Exército. Apesar do avanço na substituição dos caminhões médios, a frota de caminhões leves permanecia obsoleta, composta majoritariamente por modelos como: Opel Blitz II Comercial; Chevrolet 157 Gigante 1937; General Motors G7106, G7107 e G-617M, recebidos entre 1935 e 1942. Esses veículos desempenhavam um papel central na estrutura de transporte do Exército Brasileiro, mas seu desgaste e a dificuldade de manutenção exigiam um programa urgente de renovação. A substituição dessa frota representava uma oportunidade significativa para as montadoras nacionais, incentivadas pelo Governo Federal por meio do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), instituído em 1956. O GEIA foi criado para promover o desenvolvimento da indústria automotiva brasileira, oferecendo incentivos fiscais e financeiros às montadoras que investissem na produção local. Esse programa alinhava-se aos objetivos do Exército Brasileiro, pois: Estimulava a fabricação de veículos robustos e acessíveis, adequados à militarização; Reduzia a dependência de importações, mitigando os problemas de fornecimento de peças observados com a frota legada da Segunda Guerra Mundial; Fortalecia a economia nacional, gerando empregos e capacidade industrial. A aquisição de caminhões FNM e a perspectiva de renovação da frota de caminhões leves foram, portanto, estratégias alinhadas aos objetivos do GEIA, promovendo a integração entre as necessidades militares e o desenvolvimento industrial.
Consciente da oportunidade apresentada pelo mercado MILITAR brasileiro, a diretoria da montadora brasileira intensificou as negociações para a comercialização de seus caminhões, destacando como principal diferencial a excelência tecnológica de seus motores diesel. Essa tecnologia proporcionava significativa economia no consumo de combustível e nos custos de manutenção, posicionando os caminhões Mercedes-Benz como superiores em relação aos concorrentes da época (Ford F-600 e Chevrolet C-60) que estavam operando principalmente no Exército Brasileiro. Os esforços de negociação, fundamentados nas qualidades técnicas dos produtos, culminaram em êxito com a assinatura, em maio de 1959, do primeiro contrato de aquisição com o Ministério do Exército. Esse acordo consagrou a Mercedes-Benz do Brasil S.A. como fornecedora oficial de caminhões para a Força Terrestre. O contrato inicial estipulava a aquisição de 380 viaturas dos modelos MB LP-321 e MB LP-331, ambos com tração 4x2. O objetivo era otimizar a logística militar, reduzindo a dependência de caminhões puramente militares com tração 6x6, como os REO M3-4 recebidos em 1958, liberando estes para se focarem no transporte fora de estrada. Por se tratarem de caminhões comerciais adaptados, o cronograma de entrega foi extremamente célere, com as primeiras unidades sendo entregues às unidades operativas do Exército Brasileiro a partir de maio de 1960. As versões militarizadas dos caminhões LP-321 e LP-331 apresentavam diferenças visuais sutis em relação aos modelos comerciais. As modificações mais evidentes incluíam para-choques reforçados, guinchos mecânicos dianteiro e traseiro com capacidade para tração de cargas leves, grades de proteção para faróis e lanternas, gancho de reboque e uma carroceria de aço equipada com cobertura de lona no padrão militar, semelhante aos modelos GMC CCKW 352, 353 e Studebaker US6G. Em operações secundárias, como transporte de cargas e tropas, esses veículos demonstraram excelente desempenho, atribuído à confiabilidade do conjunto mecânico e à robustez estrutural. Os resultados positivos dessa primeira experiência abriram caminho para a formalização de um novo contrato em 1961. Essa encomenda abrangia caminhões com carrocerias especializadas, destinadas a funções específicas, como transporte de animais, cisternas de água potável, tanques de combustível, veículos de socorro e furgões, ampliando a versatilidade da frota militar. Logo em seguida novos contratos seriam firmados não só pelo Exército Brasileiro, mas também pela Força Aérea Brasileira e Marinha do Brasil, envolvendo os primeiros caminhões com tração 6X2, incluindo uma versão de veículo misto para transporte e de cargas pesadas. Neste pacote seriam recebidos os primeiros modelos especializados na versão “Munk”, com a viatura sendo equipada com um guindaste articulado com capacidade para erguer até quinze toneladas, sendo o primeiro caminhão nacional deste tipo a ser adquirido pelas Forças Armadas Brasileiras.


Em Escala.
Para representarmos o Mercedes Benz LP-331 VTNE Carga Emprego Geral Comercial Munck 15 toneladas 4x2 “EB51-128”, fizemos uso do modelo em die cast produzido pela Axio para a Editora Altaya, na escala 1/43. Para compormos o veículo empregado pelo Exército Brasileiro, desmontamos todo o veículo retirando o baú de carga, substituindo por uma carroceria confeccionada em scratch, como o sistema de guincho tipo Munk. Já na parte frontal do veículo aumentamos a distância entre o para choque e a cabine para a inclusão das grades proteção de lentes para os faróis e gancho mecânico de reboque. Fizemos a aplicação de decais confeccionados pela decais Eletric Products pertencentes ao set "Exército Brasileiro 1942/1982".
OO esquema de cores (FS) descrito neste relatório representa o padrão tático militar adotado pelo Exército Brasileiro para todos os seus veículos militares desde a Segunda Guerra Mundial até o final de 1982. A partir de 1983, os veículos militares remanescentes do Exército Brasileiro passaram a adotar um novo esquema de camuflagem técnica de dois tons. Os veículos utilizados pela Marinha do Brasil não seguiam o padrão tático do Exército Brasileiro, adotando esquemas de pintura distintos, adaptados às suas missões específicas e aos ambientes operacionais em que atuavam. Essas variações garantiam a adequação dos veículos às necessidades de cada ramo, como maior visibilidade em operações aéreas ou resistência a condições marítimas. Para a aplicação dos esquemas de pintura, foram empregadas tintas e vernizes de alta qualidade produzidos pela Tom Colors.
Bibliografia :
- Caminhões Brasileiros de Outros Tempos – MB LP-321/331 , Editora Altaya
- História da Mercedes Benz do Brasil -https://www.forummercedes.com.br/
- Veículos Militares Brasileiros – Roberto Pereira de Andrade e José S Fernandes
- Manual Técnico – Exército Brasileiro 1976