Opel Blitz II Comercial (TNE Carga)


História e Desenvolvimento
Fundada em 21 de janeiro de 1862, por Adam Opel, na cidade de Rüsselsheim, no estado de Hesse, Alemanha, a Opel Automobile GmbH, conhecida simplesmente como Opel, nasceu com a missão de fabricar máquinas de costura para uso doméstico e industrial. O que começou como uma modesta iniciativa em um pequeno município alemão logo se transformaria em uma história de inovação, superação e excelência, que levaria a Opel a se tornar uma das maiores montadoras da Europa. Nos primeiros anos, a Opel concentrou-se na produção de máquinas de costura, alcançando um marco impressionante entre 1863 e 1911, com a fabricação e venda de um milhão de unidades. Durante esse período, a empresa também diversificou sua produção, incorporando bicicletas ao seu portfólio. Contudo, por volta de 1900, tornou-se evidente que o futuro da Opel não residiria no mercado de máquinas de costura, onde a produção alemã superava as possibilidades de vendas globais. Esse momento de reflexão marcou o início de uma ousada transição para o setor automotivo, uma decisão que redefiniria o legado da empresa. Em 1898, a Opel deu seus primeiros passos no mundo dos automóveis, iniciando o projeto e desenvolvimento de seus primeiros modelos de carros de passeio. Em 1899, a empresa lançou seu primeiro veículo, produzido na fábrica de Rüsselsheim. Apesar da ambição, o modelo inicial enfrentou desafios comerciais, com menos de cem unidades vendidas, refletindo a cautela do mercado em relação a uma marca ainda nova no setor automotivo. No entanto, a determinação da Opel em inovar abriu novas portas. Em 1901, a empresa firmou um acordo de licenciamento com a montadora francesa Automobiles Darracq France, iniciando a produção local de veículos sob a marca Opel-Darracq. Esses carros combinavam carrocerias alemãs com chassis franceses, equipados com motores rudimentares de dois cilindros. A parceria proporcionou uma valiosa troca de experiências, capacitando a Opel a desenvolver seu primeiro modelo original, apresentado ao público na edição de 1902 do Salão do Automóvel de Hamburgo. A produção em série desse modelo começou em 1906, marcando o início de uma nova era para a empresa. O sucesso comercial levou à dissolução da parceria com a Darracq em 1907, encerrando a marca Opel-Darracq e consolidando a independência da Opel no mercado automotivo. Em 1909, a Opel lançou o modelo 4/8 PS, carinhosamente conhecido como Doktorwagen (“Carro do Médico”). Esse veículo conquistou a admiração de profissionais, especialmente médicos, que precisavam percorrer longas distâncias em áreas rurais onde estradas pavimentadas eram raras. Com sua robustez e confiabilidade, o Doktorwagen tornou-se um símbolo de acessibilidade, sendo vendido por apenas 3.950 marcos alemães – cerca da metade do preço dos modelos de luxo da época. Essa inovação democratizou o acesso ao automóvel, aproximando a tecnologia da Opel das necessidades do cotidiano. 

Um revés significativo ocorreu em 1911, quando um incêndio devastou a fábrica de Rüsselsheim. Longe de se deixar abater, a Opel transformou a adversidade em oportunidade, reconstruindo uma nova instalação com máquinas e ferramentas modernas. Esse investimento em infraestrutura marcou um ponto de inflexão, impulsionando a empresa a novos patamares. Em 1913, a Opel Automobile GmbH consolidou-se como a maior montadora da Alemanha e uma das líderes na Europa, um testemunho de sua visão, resiliência e compromisso com a excelência. Com a entrada da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, a Opel, como outras indústrias do país, teve sua produção reorientada para suprir as necessidades das forças armadas. A fábrica em Rüsselsheim, modernizada após um incêndio devastador em 1911, estava equipada com maquinaria avançada, o que a posicionava como um ativo estratégico para o esforço de guerra. A empresa focou na fabricação de caminhões, essenciais para o transporte de tropas, suprimentos e equipamentos em um conflito marcado por frentes de batalha extensas e condições adversas. Um dos principais produtos da Opel durante o período foi um caminhão de três toneladas, projetado para atender às exigências logísticas do exército alemão. Pela primeira vez, a empresa adotou a padronização de peças, permitindo que componentes de um veículo fossem utilizados para reparar outro, uma inovação que aumentou a eficiência na manutenção em campo. Essa abordagem refletia não apenas a capacidade técnica da Opel, mas também sua adaptação às realidades da guerra, onde a rapidez na reparação de veículos era crucial para manter as operações militares. A mobilização para a guerra trouxe desafios significativos para a Opel. Cerca de 2.500 trabalhadores da empresa – uma parte substancial de sua força de trabalho – foram convocados para o serviço militar, deixando a fábrica com uma equipe reduzida. Para manter a produção, a Opel recorreu à mão de obra de mulheres e prisioneiros de guerra, uma prática comum na indústria alemã durante o conflito. Esses trabalhadores, muitos dos quais nunca haviam operado maquinaria industrial, foram essenciais para sustentar a linha de produção, enfrentando longas jornadas em um ambiente de incerteza e pressão. Sua dedicação, em meio às dificuldades impostas pela guerra, foi um testemunho do esforço coletivo para apoiar a nação em um momento crítico. A produção de caminhões pela Opel não apenas supriu as necessidades logísticas do exército, mas também simbolizou a resiliência de uma empresa que, em poucos anos, havia passado de máquinas de costura e bicicletas para um papel central na indústria automotiva. Os veículos fabricados em Rüsselsheim atravessaram campos de batalha, transportando suprimentos vitais e conectando linhas de frente, onde a mobilidade era muitas vezes a diferença entre o sucesso e o fracasso.
O término da Primeira Guerra Mundial, em novembro de 1918, marcou o início de um período desafiador para a Opel Automobile GmbH, então a maior montadora da Alemanha. Com a derrota do país e as imposições do Tratado de Versalhes, a indústria alemã enfrentou severas restrições, incluindo limitações na produção de bens estratégicos e uma economia abalada pela hiperinflação e pela crise social. Nesse contexto, a Opel, sediada em Rüsselsheim, demonstrou notável resiliência, reconstruindo suas operações e consolidando sua posição como uma força inovadora no setor automotivo europeu. Essa jornada de recuperação foi impulsionada pela determinação de seus trabalhadores e pela visão de seus líderes, que transformaram adversidades em oportunidades para um novo capítulo na história da empresa. Na década de 1920, a Opel lançou modelos que reforçaram sua reputação de inovação e acessibilidade. Um dos marcos foi o Opel 4/12 PS, conhecido como Laubfrosch (“rã verde”), introduzido em 1924. Inspirado em conceitos de produção em massa, esse carro compacto e econômico tornou-se um sucesso comercial, atraindo uma nova geração de consumidores que buscavam mobilidade acessível. O Laubfrosch foi um reflexo do compromisso da Opel em democratizar o automóvel, oferecendo um veículo confiável a um preço competitivo, em um momento em que a Alemanha lutava para se recuperar economicamente.  A empresa também investiu na modernização de suas instalações em Rüsselsheim, incorporando técnicas de produção inspiradas nos avanços da indústria americana, como a linha de montagem. Essa abordagem permitiu à Opel aumentar a eficiência e reduzir custos, consolidando sua posição como líder no mercado automotivo alemão. Em 1928, a Opel alcançou um feito notável, tornando-se a maior produtora de automóveis da Europa, com uma participação de mercado significativa e uma reputação de qualidade e inovação. Um marco crucial na trajetória pós-guerra da Opel foi sua aquisição pela General Motors (GM) em 1929. A parceria com a gigante americana trouxe recursos financeiros, acesso a novas tecnologias e uma visão estratégica que permitiram à Opel expandir suas operações e enfrentar a concorrência global. Sob a égide da GM, a Opel continuou a desenvolver veículos que combinavam engenharia alemã com inovações de produção em massa, mantendo sua identidade enquanto se adaptava às demandas de um mercado em rápida evolução. Essa colaboração também proporcionou estabilidade em um período de turbulência econômica, especialmente com a chegada da Grande Depressão. A Opel, apoiada pela GM, conseguiu manter suas operações e continuar inovando, lançando modelos como o Opel 1.2 Liter em 1931, que reforçava sua oferta de veículos econômicos e confiáveis para o público. Quando a Segunda Guerra Mundial eclodiu em 1939, a Opel Automobile GmbH, sediada em Rüsselsheim, Alemanha, era a maior montadora do país e uma das líderes da Europa, já sob o controle da General Motors (GM) desde 1929. Como uma das principais indústrias automotivas da Alemanha, a Opel foi rapidamente mobilizada para apoiar o esforço de guerra do regime nazista, redirecionando sua expertise em engenharia e produção para atender às demandas militares.  Com o início do conflito, a produção civil de automóveis foi suspensa, e as fábricas da Opel em Rüsselsheim e Brandeburgo foram reorientadas para a fabricação de veículos e equipamentos militares. A empresa concentrou-se na produção do Opel Blitz, um caminhão robusto que se tornou um pilar da logística militar alemã. 

Disponível em várias configurações, como transporte de tropas, ambulâncias e veículos de carga, o Opel Blitz era valorizado por sua confiabilidade e capacidade de operar em terrenos difíceis, desempenhando um papel crucial no transporte de suprimentos e pessoal nas frentes de batalha. Além do Blitz, a Opel produziu componentes para outros equipamentos militares, incluindo peças para aviões e tanques. A fábrica de Rüsselsheim, modernizada após o incêndio de 1911, e a planta de Brandeburgo, inaugurada em 1935, operavam em alta capacidade para atender às exigências do exército alemão. A empresa também fabricou o Opel Maultier, uma variante adaptada para terrenos extremos, com esteiras traseiras que melhoravam a tração em condições como neve e lama, especialmente na Frente Oriental. O término da Segunda Guerra Mundial, em 1945, trouxe à Opel Automobile GmbH um cenário de desafios sem precedentes. A divisão da Alemanha colocou a fábrica de Brandeburgo, um dos principais centros de produção da empresa, na zona controlada pela União Soviética, além da Cortina de Ferro. As linhas de montagem remanescentes, ou o que sobrou delas, foram transferidas para o território soviético, onde passaram a produzir o Moskwitch, um veículo inspirado no popular Opel Kadett e em outros modelos pré-guerra. Em Rüsselsheim, coração industrial da Opel, 47% das instalações haviam sido devastadas pelos bombardeios aliados nos meses finais do conflito. Com determinação inabalável, a Opel, agora sob a gestão renovada da General Motors Corporation (GM), concentrou seus esforços na reconstrução da fábrica de Rüsselsheim. Esse processo foi marcado por dificuldades econômicas e logísticas, mas impulsionado pelo espírito resiliente de seus funcionários, muitos dos quais retornaram do conflito com o desejo de contribuir para a recuperação da Alemanha. Em 15 de julho de 1946, um marco histórico foi alcançado: o primeiro caminhão Opel Blitz do pós-guerra saiu da linha de produção, em uma cerimônia que contou com a presença do General Geoffrey Keyes, do Exército dos Estados Unidos (US Army), além de líderes locais e jornalistas. Esse momento simbolizou não apenas a retomada da produção, mas também a renovação da Opel como um pilar da indústria alemã. Nos primeiros anos do pós-guerra, a fábrica de Rüsselsheim diversificou sua produção, fabricando refrigeradores Frigidaire para atender às necessidades imediatas de um mercado em reconstrução. No entanto, o Opel Blitz permaneceu como o coração da identidade automotiva da empresa. Equipado com o confiável motor de seis cilindros a gasolina, originalmente utilizado na limusine militar Kapitän, o caminhão era sinônimo de durabilidade e funcionalidade, características essenciais em uma nação que demandava veículos robustos para reconstruir sua infraestrutura. No final da década de 1940, o departamento de projetos da Opel, sob a liderança da GM, começou a planejar um sucessor para o Opel Blitz, com o objetivo de atender à crescente demanda por caminhões e ônibus em uma Alemanha em recuperação. Lançado no final de 1951, o novo Blitz trouxe inovações modestas, mas significativas. O motor de seis cilindros em linha com válvulas laterais, embora considerado tecnologicamente ultrapassado, manteve-se como uma escolha confiável devido à sua robustez e funcionamento silencioso. Acoplado a uma caixa de câmbio de quatro velocidades, com a primeira marcha não sincronizada, e a uma tração traseira suspensa por molas multifolhas de desmultiplicação simples, o veículo foi projetado para atender às necessidades práticas do período. A inovação mais notável, embora discreta, foi a introdução de uma cabine monobloco em aço. Essa evolução substituiu as antigas carrocerias de chapa montadas sobre estruturas de madeira, que eram pesadas, frágeis e pouco rígidas. A nova cabine, mais leve e resistente, representou um avanço significativo em segurança e eficiência, refletindo o compromisso da Opel em adaptar-se às exigências de um mercado em transformação. Para os motoristas que conduziam o Blitz pelas estradas danificadas do pós-guerra, essa melhoria significava maior confiabilidade e conforto em suas jornadas diárias.
Na década de 1950, a Opel Automobile GmbH, sob a égide da General Motors, consolidou sua recuperação após os desafios do pós-Segunda Guerra Mundial, lançando o Opel Blitz II, um caminhão que combinava funcionalidade com um design moderno inspirado nos utilitários norte-americanos da Chevrolet. Com linhas que remetiam ao estilo aceito nos Estados Unidos, o Blitz II apresentava laterais pronunciadas, um capô arredondado com uma grade cromada de destaque, portas altas e um para-brisa chanfrado. Esses elementos conferiam ao veículo uma estética sofisticada, comparável aos modelos produzidos em cidades como Detroit e Chicago, tornando-o não apenas um utilitário, mas também um símbolo de inovação em uma Alemanha em reconstrução.  Como caminhão de tonelagem média, o Opel Blitz II ocupava um nicho semelhante ao do Citroën 23Ru no mercado francês, destacando-se por sua economia, confiabilidade e robustez. Ele se tornou o parceiro ideal de pedreiros, pequenos empresários da construção civil, criadores de gado, distribuidores de bebidas e fornecedores de combustível, que dependiam de sua versatilidade para enfrentar as demandas do dia a dia. Disponível em diversas configurações de carroceria, o Blitz II era onipresente, adaptando-se a diferentes necessidades com a mesma determinação que impulsionava a recuperação econômica do país. Em 1960, a terceira geração do Opel Blitz foi apresentada no Salão do Automóvel de Frankfurt, marcando um novo capítulo na evolução do veículo. A cabine semiavançada, inspirada nos furgões de entrega de leite norte-americanos, trouxe um design ainda mais moderno, com um capô curto inclinado, um amplo para-brisa panorâmico e um raio de giro reduzido que garantia excepcional manobrabilidade em ambientes urbanos. Essa configuração foi pensada para facilitar o trabalho de motoristas em cidades movimentadas, onde a agilidade era essencial. A Opel ofereceu uma gama de opções personalizáveis, quase “à la carte”, permitindo que os clientes escolhessem entre diferentes configurações de portas – batente ou corrediça para o motorista, lateral de batente único ou engastada, e traseira em uma ou duas partes, incluindo portas do tipo armário. A alavanca de câmbio, agora posicionada sob o volante, trouxe maior conforto ao motorista, simplificando o trabalho de distribuição e transporte urbano. O motor a gasolina General Motors de seis cilindros, com 2.695 cm³ e 70 cv a 3.600 rpm – o mesmo utilizado nos sedãs de luxo da marca –, oferecia um equilíbrio entre leveza e torque, embora seu consumo elevado fosse uma limitação em comparação com os motores a diesel, um mercado dominado pela Mercedes-Benz. Em maio de 1965, a Opel lançou a quarta geração do Blitz, respondendo às demandas do mercado com a introdução de uma opção de motor a diesel. Os clientes podiam escolher entre o motor a gasolina de seis cilindros, agora com 80 cv, ou o motor diesel XPD-90 de 2.100 cm³ e 60 cv, produzido pela Indenor (Grupo Peugeot). Embora menos potente, o motor diesel destacava-se por sua alta confiabilidade e baixo consumo, oferecendo economia significativa para os usuários diários. Essa inovação posicionou o Blitz como uma opção mais competitiva em mercados de exportação, onde a ausência de motores a diesel havia sido uma desvantagem. A partir de 1970, a última versão do Opel Blitz incorporou uma caixa de câmbio sincronizada de cinco marchas, permitindo melhor aproveitamento da potência do motor diesel. Produzido até 1975, o Blitz continuou a ser um símbolo de confiabilidade, atendendo às necessidades de trabalhadores que viam no veículo um parceiro indispensável para suas atividades. Em 1975, seu sucessor, desenvolvido pela Bedford, uma subsidiária britânica da General Motors, assumiu o nome Blitz e continuou a ser produzido na fábrica alemã, mantendo o legado de versatilidade e inovação.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
O término da Primeira Guerra Mundial, em 1918, marcou um ponto de inflexão na história militar global, consolidando o uso de veículos automotores como uma visão de futuro para os exércitos do mundo. No Brasil, essa transformação não passou despercebida. A jovem oficialidade do Exército Brasileiro, imbuída de um espírito de modernização, viu nos veículos motorizados uma oportunidade de fortalecer as capacidades operacionais, um fascínio compartilhado pelas Forças Públicas, hoje conhecidas como polícias militares. Esse movimento representou não apenas um avanço técnico, mas também um símbolo de progresso, conectando a determinação dos militares à promessa de um país em busca de inovação. No início da década de 1920, o Exército Brasileiro incorporou seus primeiros veículos automotores, com destaque para os caminhões Ford Modelo T. A escolha não foi casual: a Ford Motor Company, primeira montadora a se estabelecer no Brasil em 1919, trouxe consigo a produção em larga escala, tornando seus veículos acessíveis e amplamente disponíveis. Montados no país pelo sistema CKD (completely knocked down), no qual componentes eram importados e montados localmente, esses veículos eram, em essência, modelos civis adaptados para uso militar. Apesar de sua simplicidade, os Ford T representaram um marco, oferecendo mobilidade e versatilidade em um contexto onde cavalos e carroças ainda predominavam. A Ford não estava sozinha no mercado brasileiro. Ao seu lado, competiam montadoras norte-americanas e europeias, com destaque para a General Motors, conhecida no Brasil como Chevrolet. A Chevrolet rapidamente conquistou a liderança no segmento de caminhões e utilitários, graças à sua robustez e à capacidade de atender às demandas de um país em desenvolvimento. Esses veículos, inicialmente projetados para o mercado civil, foram adaptados para funções militares, pavimentando o caminho para uma nova era na logística do Exército Brasileiro. Em 1923, o Exército Brasileiro deu um passo significativo rumo à modernização com a criação do Serviço Central de Transportes (SCT), sediado no Rio de Janeiro, então Distrito Federal. Equipado com diversos modelos de caminhões e veículos adaptados para uso militar, o SCT foi uma iniciativa pioneira para a época. Os veículos eram adquiridos diretamente dos fabricantes, geralmente compostos apenas pelo chassi, motor e parte dianteira, sendo posteriormente customizados para atender às necessidades específicas do Exército. A unidade contava com um parque próprio para montagem e manutenção, uma estrutura impressionante que refletia o compromisso com a autonomia e a eficiência operacional. Esse processo de adaptação exigia não apenas habilidade técnica, mas também a dedicação de militares e trabalhadores que transformavam chassis básicos em veículos prontos para missões variadas. O SCT tornou-se um símbolo da capacidade do Exército Brasileiro de inovar, preparando o terreno para o uso crescente de veículos motorizados em operações militares.

A primeira grande demonstração do potencial dos veículos automotores no Exército Brasileiro ocorreu durante a Revolução de 1924, particularmente na frente do Paraná. Sob o comando do General Cândido Mariano da Silva Rondon, um líder visionário, diversos veículos – tanto civis quanto militares – foram empregados em funções estratégicas. De ambulâncias que transportavam feridos, garantindo cuidados médicos em meio ao conflito, a pequenos caminhões que moviam tropas rapidamente, esses veículos provaram sua importância em um cenário de combate. A mobilidade proporcionada pelos automotores não apenas aumentou a eficiência operacional, mas também trouxe um novo nível de agilidade às forças brasileiras, marcando um divisor de águas na história militar do país. Para os soldados que operavam esses veículos e para os feridos que dependiam de sua chegada, os caminhões representavam mais do que máquinas – eram instrumentos de esperança e sobrevivência. O General Rondon, com sua visão estratégica, reconheceu o valor dessa tecnologia, utilizando-a para fortalecer a capacidade de resposta de suas tropas e consolidar o papel dos veículos no futuro do Exército Brasileiro. Na década de 1930, o Exército Brasileiro consolidou sua trajetória de modernização, incorporando uma ampla gama de veículos militares e militarizados, tanto sobre rodas quanto sobre lagartas, provenientes de marcas renomadas como Ford, Chevrolet, Dodge, International, Thornycroft, Commer, Somua, Henschel e Krupp. Essa diversidade refletia a busca por soluções que atendessem às crescentes demandas logísticas e operacionais de uma força armada em transformação. Contudo, em meio à multiplicidade de fornecedores, emergiu uma preferência clara por caminhões leves e médios produzidos ou montados localmente, utilizando o sistema completely knocked down (CKD), no qual componentes importados eram montados no Brasil. Essa abordagem não apenas fortalecia a indústria nacional, mas também garantia maior acessibilidade e manutenção dos veículos, fundamentais para as operações militares. Em 27 de setembro de 1937, o Exército Brasileiro formalizou sua estratégia de aquisição de veículos por meio do “Aviso 658”, uma normativa que estipulava a compra exclusiva de modelos fabricados por quatro montadoras: Ford Motor Company, General Motors Corporation (Chevrolet), Dodge Motor Company e Commer Motors. Essa decisão visava padronizar a frota, reduzindo custos de manutenção e simplificando a logística de suprimentos. A medida refletia o compromisso com a eficiência operacional, mas também a visão de uma instituição que reconhecia a importância de alinhar-se às capacidades industriais disponíveis no país. Nesse contexto, a General Motors Corporation, popularmente conhecida no Brasil como Chevrolet, começou a ganhar destaque nas fileiras do Exército Brasileiro, rivalizando em igualdade com a Ford do Brasil S/A. A preferência por essas marcas era impulsionada não apenas pela qualidade de seus veículos, mas também pela infraestrutura de montagem e suporte que ambas ofereciam no Brasil, garantindo prontidão e confiabilidade em um cenário de recursos limitados.
Entre os primeiros veículos da nova geração adquiridos pelo Exército estavam os caminhões leves Chevrolet Modelos 112 e 137, apelidados de Tigre e Comercial. Esses modelos, robustos para a época, conquistaram espaço devido à sua versatilidade e à capacidade de operar em diferentes condições. Outro veículo amplamente adotado foi a picape Chevrolet 1941, disponível em versões com cabine aberta, ideal para o transporte de pessoal, ou cabine fechada, voltada para cargas. Apesar de sua popularidade, esses modelos apresentavam limitações em termos de capacidade de carga, não atendendo plenamente às necessidades operacionais do Exército Brasileiro, que exigia veículos mais robustos para suportar as demandas de transporte militar. A solução para esse desafio veio com a introdução do Chevrolet 157 Gigante 937, um caminhão com capacidade de transporte de 1,5 tonelada. Esse modelo representou um avanço significativo em relação aos seus predecessores, oferecendo maior robustez e eficiência. Para os militares que dependiam desses veículos em missões de transporte de tropas, suprimentos ou equipamentos, o Gigante era mais do que um caminhão – era um aliado confiável, capaz de enfrentar as estradas precárias e os desafios logísticos de um país em desenvolvimento. A adesão do Brasil ao programa Lend-Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos) em 1941 marcou um momento decisivo para as Forças Armadas Brasileiras, particularmente para o Exército Brasileiro. Por meio desse acordo, o país recebeu milhares de caminhões militares com tração 6x6 e 4x4, incluindo centenas de modelos fabricados pela General Motors Corporation, como os GMC G7106, G7107, G-617M, G-506, G-085 M-6 e G-620, além de veículos produzidos pela Ford e Dodge. Esses caminhões representaram um salto significativo na capacidade de mobilização das forças brasileiras, permitindo que os antigos Chevrolet 157 Gigante 937, já obsoletos para as demandas táticas, fossem realocados para funções administrativas e de apoio secundário. Para os militares que operavam esses novos veículos, eles eram mais do que máquinas – eram instrumentos de prontidão e soberania, fortalecendo a presença do Exército em um período de tensões globais. Com o término da Segunda Guerra Mundial em 1945, o Exército Brasileiro enfrentou a necessidade de redefinir suas prioridades. A experiência adquirida durante o conflito, incluindo a participação da Força Expedicionária Brasileira (FEB) na Itália, destacou a importância da mobilidade e da logística eficiente. Nesse contexto, foi iniciado um movimento de profunda reorganização da frota de caminhões de transporte, com um novo foco em missões de transporte leve voltadas para a integração territorial do Brasil. Essas missões, essenciais para conectar regiões remotas e consolidar a presença militar no vasto território nacional, demandavam veículos com tração 4x4, que ofereciam o melhor equilíbrio entre custo, benefício e versatilidade.

No entanto, no início da década de 1950, grande parte da frota de caminhões militares  de pequeno porte recebida durante a guerra estava comprometida ou fora de serviço. A dificuldade de acesso a peças de reposição, agravada pelas limitações logísticas do pós-guerra, reduziu significativamente a operacionalidade desses veículos. A aquisição de novos caminhões militares importados, embora desejável, foi descartada devido a restrições orçamentárias. Diante desse desafio, o Exército Brasileiro optou por uma solução pragmática: a compra de caminhões comerciais, que combinavam menor custo de operação e manutenção com a robustez necessária para atender às demandas militares. Nesse cenário, a General Motors do Brasil S/A emergiu como uma parceira estratégica. Na década de 1950, a empresa experimentava um crescimento acelerado no mercado civil de caminhões e utilitários, consolidando sua liderança graças à qualidade de seus produtos e à escala de produção. Essa posição permitia à General Motors oferecer preços competitivos e condições vantajosas, especialmente em sua linha de caminhões leves e médios, que se mostravam ideais para as necessidades do Exército Brasileiro. A confiabilidade dos veículos Chevrolet, já testada no mercado civil, inspirava confiança nos militares, que viam nesses caminhões uma solução prática para superar os desafios logísticos do período. Nesse contexto, o governo brasileiro abriu uma concorrência para a aquisição de um grande lote de caminhões comerciais com tração 4x2, visando substituir a frota combalida e atender às demandas de transporte leve em missões de integração territorial e apoio logístico. A concorrência atraiu propostas de três grandes montadoras estabelecidas no Brasil: Ford Motor Company Brasil Ltda, Dodge Motors do Brasil S/A e General Motors do Brasil S/A. A General Motors destacou-se ao oferecer o Opel Blitz II, um caminhão de porte médio que já era amplamente reconhecido no mercado civil como uma ferramenta profissional indispensável. Compacto, mas com boa capacidade de carga, o Blitz II era o favorito de profissionais autônomos e pequenas empresas do setor de construção, transporte e distribuição, que valorizavam sua robustez sem os elevados custos operacionais associados a veículos maiores. Sua versatilidade e confiabilidade também o tornavam uma escolha consolidada em governos estaduais, onde era empregado pelos Corpos de Bombeiros como veículo de intervenção rápida. A proposta da General Motors trouxe uma vantagem competitiva decisiva: o Opel Blitz II era oferecido a um preço extremamente acessível, combinado com níveis comprovados de durabilidade e eficiência. Essa combinação de custo-benefício, aliada à reputação do veículo no mercado civil, posicionou o Blitz II como a solução ideal para as necessidades do Exército Brasileiro. Para os militares responsáveis pela escolha, o caminhão representava mais do que um veículo – era uma promessa de renovação, capaz de atender às exigências logísticas com praticidade e economia.
Após uma avaliação rigorosa, o Opel Blitz II foi declarado vencedor da concorrência, marcando um marco significativo na modernização do Exército Brasileiro. Em meados de 1951, o Ministério do Exército formalizou um contrato com a General Motors do Brasil para a aquisição inicial de pelo menos 300 caminhões. Por se tratar da versão comercial básica, sem adaptações específicas para uso militar, as entregas foram iniciadas imediatamente, com os primeiros veículos chegando às unidades operativas ainda no mesmo ano. Essa rapidez na implementação refletiu a eficiência da General Motors e a urgência do Exército em revitalizar sua frota. Neste período, a incorporação de uma nova frota de caminhões Opel Blitz II ao Exército Brasileiro marcou um passo significativo na modernização de suas unidades, especialmente os Regimentos de Cavalaria, que, a partir de 1969, seriam redesignados como Regimentos de Cavalaria Mecanizados, refletindo a extinção definitiva da tração hipomóvel no Brasil. Em serviço receberiam as designações de  "TNE Auto Caminhão Carga 4x2" e TNE Caminhão Carga 1/ ¾ Ton 4x2.  Concentrados principalmente nas regiões Sul e Sudeste, esse processo de mecanização representou não apenas uma evolução tecnológica, mas também um símbolo de progresso, conectando a determinação dos militares à missão de fortalecer a mobilidade e a eficiência operacional em um país de vastas dimensões.  Apesar de sua robustez e versatilidade, a capacidade de transporte do Blitz II era limitada devido ao seu porte médio, permitindo o carregamento de apenas seis soldados de infantaria totalmente equipados ou equipes de apoio com armamentos pesados, como morteiros de 81 mm, metralhadoras Browning M-2 calibre .50 de fabricação norte-americana ou as antigas metralhadoras dinamarquesas Madsen 7 mm montadas em tripé. Mesmo com essa restrição, o Blitz II provou ser um aliado confiável, demonstrando notável desempenho em terrenos variados e consolidando sua reputação como um veículo resistente e adaptável. A versatilidade do Opel Blitz II brilhou especialmente durante treinamentos operacionais de grande relevância, como a manobra “A Grande Marcha de 1960”. Nesse evento, os caminhões prestaram suporte logístico essencial ao Décimo Esquadrão Independente de Cavalaria de Guarapuava, que percorreu cerca de 400 km a cavalo até Londrina, no norte do Paraná, para participar do desfile de Sete de Setembro. Embora o Opel Blitz II tenha desempenhado seu papel com distinção, sua capacidade limitada de transporte tornou-se um obstáculo à medida que as demandas operacionais do Exército Brasileiro evoluíam. A partir da primeira metade da década de 1960, os caminhões começaram a ser complementados e gradualmente substituídos por novos modelos produzidos localmente pela General Motors do Brasil, como o Chevrolet Brasil 6500, e, posteriormente, pela família Chevrolet C-60 e D-60. Esses veículos, projetados para atender às necessidades de transporte militar com maior capacidade e eficiência, marcaram o próximo capítulo na mecanização das forças armadas.

Em Escala 
Para representarmos o Opel Blitz II Comercial  TNE Carga "EB21-3412 empregado pelo Exército Brasileiro usamos o modelo em die cast produzido pela Axio para a Editora Altaya na escala 1/43. Assim como a versão militarizada apresenta mínimas diferenças em relação a versão civil, procedemos uma leve conversão em scratch e incluímos como detalhamento itens em resina para representar a carga , para se obter a configuração empregada pelo Exército Brasileiro. A identificação visual do “EB21-3412” foi recriada com a aplicação de decais de alta qualidade, produzidos pela Eletric Products e pertencentes ao conjunto “Exército Brasileiro 1942-1982”
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático do Exército Brasileiro aplicado em todos seus veículos militares desde a Segunda Guerra Mundial até  o final do ano de 1982, pequenas alterações seriam relacionadas apenas as marcações de identificação. Os Opel Blitz II Comercial  TNE Carga, manteriam este padrão até sua retirada do serviço ativo.  Na recriação desse padrão para fins de modelismo ou restauração, foram utilizadas tintas de alta qualidade produzidas pela Tom Colors, conhecidas por sua precisão e fidelidade às especificações originais. 




Bibliografia :

- Caminhões Brasileiros de Outros Tempos - Opel Blitz II - Editora Ataya
- Opel Blitz II Wikipedia - https://en.wikipedia.org/wiki/Opel_Blitz
- A Grande Marcha de 1960 -  Jose M. Gracia Araujo - https://dirceupato.blogspot.com/
- Veículos Militares  do Brasil – EB e CFN https://www.facebook.com/groups/blindadosbrasil

Toyota Bandeirante emprego militar


História e Desenvolvimento.
A história do desenvolvimento desta família de carros para qualquer terreno tem início em 1941 durante a Segunda Guerra Mundial, quando as Filipinas foram invadidas pelas tropas do Exército Imperial do Japão. O país havia sido apoiado e defendido pelos Estados Unidos, mas quando os japoneses chegaram lá, encontraram veículos militares americanos de diversos modelos e um deles chamou a atenção, um jeep Bantam Mark II. Imediatamente, os oficiais enviaram o modelo ao Japão para que pudesse ser fabricado algo parecido, deste processo surgiria do centro de desenvolvimento do Exército Imperial um protótipo denominado AK10. Após testes promissores foi decido iniciar a produção em larga escala, ficando a Toyota responsável pela manufatura. Mas a engenharia reversa do Bantam Mark II lançou as bases para um futuro modelo. A guerra acabou, o Japão perdeu e com a derrota, o AK10 entrou num limbo de cinco anos. No início da década seguinte os Estados Unidos iniciaram o programa de reconstrução do parque industrial do Japão, fomentando diversos setores entre este o automotivo, e a Toyota receberia um contrato para a produção de 100 unidades de um projeto da Willys, passando a ser denominado localmente como projeto BJ “Jeep” que rapidamente evoluiu em volume e características, sendo um veículo maior que o modelo americano e mais capaz. Em 1951, o Toyota BJ “Jeep” logrou subir o Monte Fuji indo aonde nenhum carro esteve antes, o que chamou a atenção do governo japonês, que decidiu encomendar quase 300 unidades para a força nacional de polícia. Mas, em 1954, a Toyota já começava a incomodar a indústria automotiva americana e uma demanda da Willys fez com que a japonesa fosse proibida de vender seu modelo BJ como um “Jeep”, agora marca que estava sob a companhia dos EUA. Assim, ela simplesmente mudou o nome do produto para Land Cruiser. O nome foi uma decisão da Toyota para não desmerecer seu produto diante do Land Rover britânico e como a Studebaker havia encerrado naquele ano seu modelo Land Cruiser, a japonesa estrategicamente decidiu encampar esta marca. No mesmo ano, melhorias seriam incorporadas como o novo motor, de 3.9 litros com 126 cavalos. As famosas séries do BJ começaram, porém, em 1955.

Neste mesmo período a montadora focava sua expansão mundial, e entre seus principais mercados estava o Brasil, com a empresa japonesa passando a comercializar através de seu representante comercial Alpagral Ltda em São Paulo, carros importados e montados localmente. Logo o sucesso comercial conquistado levaria a empresa japonesa em 23 de janeiro de 1958 a inaugurar um escritório no centro da cidade de São Paulo, com o nome de Toyota do Brasil Indústria e Comércio Ltda. Esta iniciativa visava assim preparar as bases para o atendimento direto do promissor mercado nacional. Onze meses depois, a empresa inicia as suas atividades como montadora de veículos, operando no regime de CKD (Completely Knocked Down) a linha de utilitários Land Cruiser. A expansão das vendas no mercado nacional levaria a inauguração de uma planta industrial maior, agora na cidade de São Bernardo do Campo, em novembro de 1962. Nesta oportunidade a Toyota substitui a linha Land Cruiser pelo Bandeirante que também estava sendo montado no sistema CKD, este novo utilitário estava equipado com um motor próprio seis-cilindros a gasolina, sendo disponibilizado com tração nas quatro rodas e disponível nas versões jipe e camioneta de carga e de uso misto. Em maio de 1962 a linha Bandeirante passaria a ser fabricada no Brasil, abandonando o sistema CKD, passando a adotar o excelente motor Mercedes Benz OM-314 de 3.784 cm3 com 85 cv, que era emprestado do caminhão MB L-608D, esta decisão se materializaria no grande diferencial mercadológico do veículo. Nesta fase a produção da carroceria era terceirizada, ficando a cargo da  Brasinca, o teto de era oferecido como item opcional, assim como a capota de aço, vendida a partir de 1963, mesmo ano quem que seria iniciada a produção da versão picape. 

A robustez e promessa de durabilidade do veículo da montadora japonesa se refletia em seu slogan de marca “O Toyota Bandeirante foi construído para durar longos anos produzindo lucros para seu proprietário.” Esta frase, que constava do manual do proprietário, não chegou a ser desmentida pelos donos do carro, que tinha fama de poder rodar um milhão de quilômetros sem abrir o motor. Completando o conjunto motriz, havia uma transmissão mecânica de quatro marchas, uma caixa de transferência de duas velocidades, que tal como os eixos flutuantes também eram produzidos na fábrica em São Bernardo do Campo. Tal característica denotava a política de verticalização da montadora, que a exceção do motor, os principais componentes eram quase integralmente eram de produção própria. Ao longo dos anos seguintes toda a família Toyota Bandeirante foi submetida a melhorias em termos de acabamento e conjunto mecânico. As mudanças mais impactantes começaram a surgir na década de 1980 com a introdução da sincronização de todas as marchas, passando a dispor de uma segunda mais longa, para assim a primeira passou a ser incorporada no uso urbano do utilitário, que ganhou também uma caixa de transferência, à semelhança do concorrente Willys. Fora isto a família seguia fiel ao projeto original, este conservadorismo pode ser explicado por sua boa aceitação no mercado – pretendentes chegavam a enfrentar meses de fila. Algumas poucas concessões foram opções de chassis mais longos, além de leves alterações, tanto estéticas como mecânicas. Mas nada que mudasse significativamente sua síntese. A próxima evolução surgiria em 1983 com o lançamento da versão cabine dupla, complementando assim o catálogo composto por cinco outros utilitários, incluindo o jipe curto com teto de lona ou aço, a perua com teto de aço e as picapes curta e longa. Seu nascimento era uma resposta aos usuários que desejavam aliar a capacidade de transportar 1.100 kg de carga e até seis pessoas, sem abrir mão da robustez e mobilidade proporcionada pela tração total.

Na época do lançamento, não havia concorrente senão a picape Chevrolet 10 Cabine Dupla com tração 4X4 Engesa. Ainda assim, o modelo era desprovido de reduzida e oferecido apenas sob encomenda. Seu nome oficial de batismo era OJ55LP2BL, mas era conhecida como Toyota Cabine Dupla. Possuía um comprimento de 5,30 metros e o entre eixos de 3,36 metros que revelavam sua origem, a picape longa de quem emprestava o chassi, com pequenas alterações. A cabine lembrava o jipe teto de aço encurtado e a caçamba exclusiva desta versão tinha 1,80 metro de comprimento, 73 cm a menos que a picape longa. Os ângulos de entrada e saída ficavam em 42 e 22 graus respectivamente, suficientes no fora de estrada. O interior era dominado por bancos tipo 1/3 e 2/3 na dianteira e inteiriço na traseira, ambos revestidos com vinil. O painel simétrico apresentava porta luvas em formato idêntico ao quadro de instrumentos, já a posição de dirigir era memorável, com controles bem-posicionados. O túnel central acomodava um trio de alavancas de mudanças, da tração 4x4 combinada com reduzida e freio de estacionamento. Novamente o sucesso seria imediato, com a empresa ampliando sua participação de mercado neste segmento. Seguindo a modernização da linha de caminhões Mercedes-Benz, em 1990 o OM314 cedeu lugar ao novo OM364 de 3.972 cm3, com a potência saltando para 90 cv, oferecendo um torque máximo em menor rotação e consumo reduzido. A fixação do motor, bem como a captação de ar e o sistema de escape foram redesenhados. Nesta mesma ocasião a família passou adotar uma nova grade dianteira em plástico com faróis retangulares. Em 1994, o Bandeirante voltou às origens e recebeu um motor Toyota importado, uma evolução em relação ao OM-364, adotado desde o fim da década de 80. Mais potente que o Mercedes-Benz (96 cavalos a 3400 rpm, ante 90 cavalos a 2800 rpm).

Em 1996, para atender a limites mais restritos de emissão de gases, o motor Toyota 14B teve sua potência reduzida para 96 cv e torque de 24,4 mkgf. Em substituição aos antiquados tambores, os freios ganharam discos ventilados. A essa altura o mercado já estava abrindo as importações, e novos modelos importados começaram a ameaçar a liderança da Toyota neste segmento. A principal preocupação da montadora era a linha Defender da Land Rover. Com a nova legislação de emissão de poluentes que passaria a vigorar a partir de 2002, verificou se que o motor aspirado do Bandeirante não mais se enquadrava nos limites previstos. Além disso, o peso de quatro décadas no mercado sem alterações significativas já se fazia sentir. Com isso o final da linha de utilitários da Toyota foi anunciado para novembro de 2001. Em 43 anos foram produzidas 103.750 unidades, sem contar os Toyota que foram montados em sistema CKD, que não somaram 1.000 exemplares. Nesta mesma época estimava-se que 60% dos veículos produzidos ainda continuavam em operação no país, prova indiscutível de sua resistência e durabilidade.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Próximo ao final da década de 1950 o Exército Brasileiro dispunha de uma grande frota de veículos militares com tração 4X4 em suas fileiras, sendo composta por mais de 1.500 carros dispostos entre os modelos da família Dodge WC-51, WC-53, WC-54, WC-56 e WC-57, destinados a missões de transporte, ambulância, carro comando e tração de peças de artilharia leve. Estes recebimentos eram frutos dos termos do programa Leand & Lease Act Bill (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), sendo disponibilizados entre os anos de 1942 e 1945. Apesar se ser uma formidável frota em termos numéricos, sua operacionalidade estava seriamente afetada, pois uma parte significativa se encontrava indisponível por problemas de manutenção, muitos dos quais ocasionadas por problemas no fluxo de aquisição de peças de reposição, que cada mais rareavam no mercado internacional, devido ao fato de que em seu país de origem sua produção havia sido descontinuada há mais de 15 anos. Este cenário comprometia em muito a capacidade de mobilidade da força terrestre do exército, e alguma solução deveria ser alcançada em um curto prazo de tempo, buscando assim evitar um colapso que se tornava cada vez mais evidente. Neste contexto a aquisição dos sucessores naturais dos modelos em uso os novos Dodge M37 e M43 se mostrava inviável em termos de recursos financeiros necessários, tendo em vista seu alto custo unitário de aquisição multiplicado por no mínimo 1.000 unidades (necessidade mínima para substituição dos antigos Dodge WC-51, WC-53, WC-54, WC-56 e WC-57). Assim este vestuoso orçamento esbarra na dura realidade orçamentária não só do Exército Brasileiro, mas também das demais forças armadas nacionais.

A solução então deveria ser customizada a realidade orçamentaria, fazendo assim os olhares se voltarem para indústria nacional, e nesta época a Willys Overland do Brasil (WOB) já estava consolidada como a principal montadora de automóveis brasileira, gozando ainda de grande confiança junto ao Exército Brasileiro, por fornecer centenas de Jeeps 1/4 Ton CJ-5, que vieram a substituir carros similares recebidos durante a década de 1940. Neste contexto o lançamento da Rural reestilizada e posteriormente da nova picape Willys despertariam o interesse do exército, criando assim uma opção de baixo custo para substituir e complementar sua frota de utilitários, resultando assim nos primeiros de contratos de aquisição do Rural Willys-Overland F-85 Militar. Apesar de atenderam a contento as necessidades emergências os novos utilitários em uso apresentavam como deficiência a ausência de um efetivo sistema de tração 4X4, dispositivo este essencial para operação em ambiente fora de estrada. Esta lacuna seria preenchida também pela indústria nacional, pois neste ano a Toyota do Brasil Indústria e Comércio Ltda lançava no mercado brasileiro, sua linha de utilitários leves com tração 4x4. Esta nova família denominada Toyota Bandeirante atraiu o interesse dos oficiais do comando do Exército Brasileiro, gerando a montadora uma consulta para o desenvolvimento de uma versão militarizada, demanda que foi prontamente atendida pela empresa. Assim entendimentos foram feitos culminando em 1964 nos primeiros contratos de aquisição do jipe curto com teto de lona ou aço, sendo seguidos por unidades dos modelos perua com teto de aço e as picapes com chassis curto e longo destinadas a missões de transporte de pessoal (cabine simples e dupla) e ambulância. Apesar de se mostrarem eficientes em campo anda eram essencialmente veículos civis dotadas com poucas modificações militares o que poderia gerar dúvidas quando de sua efetivamente em um possível cenário de conflagração real.

Ao longo dos anos seguintes a montadora japonesa, passou a fornecer as mesmas versões para a Força Aérea Braseira e Marinha do Brasil, ao longo das décadas de 1970 e 1980, na aeronáutica o modelo chegou a ser utilitário padrão presente em maior número em todas as bases aéreas e sedes administrativas. A primeira versão verdadeiramente militar surgiria a partir de 1985, quando o Exército Brasileiro e o Corpo de Fuzileiros Navais na Marinha do Brasil abriram uma concorrência prevendo a aquisição de uma grande quantidade de jipes militares, entre os parâmetros apresentados deste programa rezava a obrigatoriedade de a proposta vencedora contemplar a fabricação ou montagem no país. Dentre as empresas licitantes desatacava-se a proposta apresentada pela empresa Bernardini S.A. Indústria e Comércio denominados projeto “Jipe Xingu” (inicialmente chamado de projeto Vitoria), na prática se tratava apenas de uma versão militarizada do Toyota Bandeirante, com bitola alargada e três comprimentos de chassi. Como observação do ponto de vista estrutural sua lataria era mais grossa, a pedido do exército a Toyota estampou chapas com um material reforçado. As alterações eram as usuais para o tipo de veículo: guincho mecânico produzido pela Biselli, acoplamento para reboque, para-brisa rebatível, santo antônio, faróis militares e suspensão reforçada. Dois protótipos foram entregues em meados do mesmo ano sendo submetidos a um extenso programa de testes de campo, com seu desempenho sendo considerado promissor pela junta militar avaliadora, gerando assim com o Ministério da Marinha um contrato prevendo a compra de 270 unidades que passaram a ser entregue no início do ano de 1988, com uma grande parte desta frota se mantendo em atividade no Corpo de Fuzileiros Navais até a primeira década do século XXI, passando a ser  gradativamente substituídos pelos novos Agrale Marruá militarizados. 

O contrato celebrado com o Exército Brasileiro, previa a aquisição de 300 carros com 60 destes equipados com para-brisa, basculante e recortado e suportes para fixação de peça de artilharia na parte traseira, versão está produzida com a finalidade de substituir os antigos jipes M-151A1 e M-151C Ford Kaiser Mutt empregados como canhoneiros, armados com canhões sem recuo modelo M-40A1 de 106 mm. O desempenho em campo do novo modelo foi exemplar conquistando novos contratos e a produção em escala desses carros deu uma sobrevida à Bernardini, mas não foi suficiente para sustentar seu parque industrial e logo após a entrega final a empresa infelizmente fecharia as portas em 2001. Na década de 1990 o Exército passaria a operar o modelo militar da versão OJ55LP2BL cabine dupla, sendo entregues tanto na configuração com cabine em aço, quanto com para-brisa rebatível e cabine em lona.  Estes primeiramente destinados a equipar os Grupos de Exploradores dos Pelotões de Cavalaria Mecanizado e Pelotões de Exploradores. Neste período também consultas foram feitas junto a Toyota para o desenvolvimento de uma versão ambulância para emprego em qualquer terreno, nascendo assim com base na versão picape cabine longa uma nova versão militar que tinha por principal finalidade substituir as antigas ambulâncias Willys Ford F81 que se encontravam em serviço desde a década de 1970. As primeiras entregas desta nova variante que além de contar com a versão básica também compreendia uma versão melhor equipada destinada a missões de UTI móvel começaram em 1996 se estendendo até o ano 2000, sendo distribuídas a quase todas as unidades de batalha do Exército Brasileiro no território nacional. A versão cabine dupla foi empregada em um cenário real de combate durante a participação brasileira nas forças de paz da ONU durante a Primeira Missão de Verificação das Nações Unidas em Angola – UNAVEM I entre 1989 e 1991 e posteriormente na UNAVEM II entre 1991 e 1995, nesta segunda fase durante um confronto uma picape Bandeirante foi alvejada por disparos inimigos.

O envelhecimento e obsolescência da frota aliados ao fato do encerramento da produção da linha de utilitários da Toyota em 2001, levou o Ministério da Defesa a considerar opções para a gradativa substituição desta família de utilitários, priorizando a retirada em serviço das versões de cabine dupla com capota de lona. Assim em 2002 seria celebrado junto a empresa inglesa Land Rover a compra de 750 unidades da versão Defender para distribuição entre as três forças armadas brasileiras, iniciando assim o processo de desativação da família Toyota.  No entanto as versões utilitárias continuam em operação realizando atividades administrativas e muitas das unidades da versão ambulância recebidas na década de 1990 foram submetidas a um processo de revitalização em nível de 4º Escalão da Viatura e de seus componentes e acessórios, envolvendo manutenções nos sistemas de motorização e periféricos, embreagem, caixa de transmissão, freios, direção, suspensão, elétrico, manutenção do baú e funilaria e pintura, permitindo estender sua vida útil. Curioso é observar que todos os veículos remanescentes serão substituídos no curto prazo pela família de veículos 4x4 Agrale Marruá, incluindo os Defender que apesar de serem adquiridos para sucederem aos Toyota Bandeirantes acabarão sendo tirados de serviço no mesmo período que seu antecessor

Em escala.
Para representarmos a Viatura Operações -  Vtr OpToyota Bandeirante Cabine Dupla, pertencente ao Exército Brasileiro, fizemos uso do modelo em die cast produzido pela Axio na escala 1/43 da coleção “Veículos de Serviço do Brasil Tempos” da Editora Altaya, procedendo a customização para a versão militar.  Empregamos decais confeccionados pela decais Eletric Products pertencentes ao set “Exército Brasileiro 1983 – 2003”.

O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático do Exército Brasileiro aplicado em a maioria de veículos militares a partir de 1983, porém ainda coexistia com este padrão o esquema de pintura em verde oliva principalmente na versão ambulância. Já carros participantes das operações internacionais UNAVEM I e II foram pintados no esquema das forças de paz das Nações Unidas (ONU). Já os veículos pertencentes ao Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil e da Força Aérea Brasileira adotaram esquemas de pintura diferentes.

Bibliografia :

- Grandes Brasileiros: Toyota Bandeirante – Sergio Berezovsky Quatro Rodas

- A origem do Toyota Bandeirante - https://www.noticiasautomotivas.com.br/toyota-bandeirante/

- Veículos de Serviço do Brasil – Toyota Bandeirante – Editora Altaya

- Lexicar Brasil – Toyota  www.lexicar.com.br

- Toyota do Brasil – www.toyota.com.br

M-101 AR 105 mm Howitzer no Brasil

História e Desenvolvimento.
Após a Primeira Guerra Mundial, o Departamento de Artilharia do Exército dos Estados Unidos (US Army) capturou e estudou diversos modelos de obuseiros alemães de calibre 105 mm, este interesse seria motivado por demonstrarem grande eficácia quando empregados em situação de combate real. Deste estudo surgiriam as bases para o desenvolvimento de uma nova gama de peças de artilharia na década seguinte, entre estes  estava o projeto do obuseiro M1920 Howtizer de 105 mm, seriam também desenvolvidos projetos de obuseiro em que possuía uma flecha com formato retangular (M1925E) e dois outros projetos com duas flechas (T1 e T2), representando uma grande evolução quando comparados aos obuseiros de 75 mm em uso nos seus regimentos de artilharia de campo. Este fator motivou o comando do Exército Norte Americano a estabelecer a ousada pretensão de substituir em um curtíssimo prazo as antigas peças de 75 mm pelas novas de 105 mm, mas a falta de alocação adequada de recursos muito em função da crise econômica de 1929, impediria a concretização deste projeto, sendo o mesmo completamente abandonado neste ano. Porém uma versão modificada do obuseiro M1 de 105 mm foi testada em 1932, que usava munição semi-fixa em vez de munição de carregamento separado. Como esse desenvolvimento exigia um bloco de culatra diferente, a nova peça foi designada como o obuseiro M2 de 105 mm, sendo contratada a produção de 48 peças, porém restrições orçamentarias levaram ao atraso das entregas, com as primeiras peças sendo entregues somente em 1939. Estas entregas seriam favorecidas em função do um amplo processo de renovação da artilharia de campanha do Exército Americano (US Army), iniciado em meados desta mesma década, motivado em muito pelo agravar das tensões políticas na Europa a partir do ano de 1936 com a ascensão do partido nazista na Alemanha. Este programa resultaria também do desenvolvimento do obuseiro Howtizer M1 com calibre de 155 mm, que em conjunto com o M2 de 105 mm seriam as peças padrão de artilharia de campo dos aliados na Segunda Guerra Mundial.

Os quarenta e oito obuseiros M2 de 105 mm entregues a partir do início do ano de 1939, foram concebidas originalmente 7 anos antes e carregavam a influência de uma artilharia de campanha “hipomóvel” com sua plataforma M1 foi projetada para ser tracionada por cavalos sendo equipado inclusive com rodas de madeira. Porém está logo seria substituída pelo modelo M2 T5 própria para ser rebocada por caminhões ou veículos utilitários médios com tração 4X4, passando a dispor de pneus, com este equipamento sendo padronizado a partir de fevereiro de 1940. Novas melhorias seriam adicionadas ao projeto, entre as mais relevantes destaca-se a alteração do anel da culatra, que passou a ser implementada no projeto em março do mesmo ano, meses antes do início da produção em larga escala. Curiosamente a arma era pesada para o seu calibre, mas isso ocorreu porque a arma foi projetada para ser durável. Assim, o tubo e a carruagem podem ter grande utilidade e permanecer funcionais sem se desgastar. O conjunto final de produção do obuseiro agora designado como M2A1 de 105 mm montado sobre o carro de transporte M2 T5, teria sua montagem destinada aos arsenais de Rock Island Arsenal e US Springfield Armory. As primeiras peças começaram a ser incorporadas em janeiro de 1941 aos primeiros regimentos de artilharia baseados no continente, sendo depois entregues durante os primeiros anos do conflito a todos as unidades existentes nos mais variados teatros de operações durante a Segunda Guerra Mundial. Estes regimentos passaram a ser padronizados e constituídos de um batalhão de artilharia de equipados com os M1 de 155 mm e três batalhões de artilharia equipados com os M2A1 de 105 mm. Ambos os batalhões de 155 mm e 105 mm possuíam doze canhões cada, divididos em três baterias de quatro canhões. Isso deu a cada regimento um total de doze obuses de 155 mm e trinta e seis obuses de 105 mm, isto evidenciava a importância que os obuses M1 de 155 mm representavam no conjunto total.
Seu batismo de fogo junto ocorreu durante a Operação Tocha que foi iniciada em 8 de novembro de 1942, quando os exércitos aliados desembarcaram no norte da África, e rapidamente ganhou a reputação de ser confiável e eficiente, e a partir daí seria empregado em todos os fronts de batalha durante a Segunda Guerra Mundial. Passou a ser fornecido a todas as nações aliadas nos termos do Leand & Lease Act (Lei de Empréstimos e Arrendamentos) durante o conflito, entre elas Canadá, Brasil, Australia e França Livre. Até o final da Segunda Guerra Mundial, 8.536 obuseiros M2A1 de 105 mm foram produzidos em diversas versões chegando até a modelos autopropulsados como o Howitzer Motor Carriage T19 e T32 empregados em conjunto com os carros meia lagarta M2A1 e M3 Half Track e T76 e T88 montados nos chassis dos carros de combate M24 Chaffe e M18. Os M2A1 Howtizer voltariam a ativa no Exército Norte Americano durante a Guerra da Coreia (1950-1953), quando novamente formaram o sustentáculo da artilharia de campanha daquele exército, participando ativamente de todos os embates daquele conflito. A França e o Estado do Vietnã usaram howitzers M2A1 105 mm, durante a Primeira Guerra da Indochina, assim como as forças de guerrilha Viet Minh contra as quais lutaram, que foram fornecidas com pelo menos 24 pela República Popular da China, juntamente com outras peças de artilharia e morteiros norte-americanas anteriormente operadas pelas forças nacionalistas chinesas (os militares kuomintang) e tropas americanas lutando na Coreia. Em 1962 sistema de designação de artilharia militar do Exército dos Estados Unidos (US Army) seria alterado com a designação do obuseiro M2A1 105 mm, sendo alterada para M101A1 105 mm. 
Sua produção foi oficialmente encerrada em setembro de 1953 com 10.202 unidades entregues, logo após o termino da Segunda Guerra Mundial, um grande número de obuseiros M2A1 105 mm foram classificados como “excedente de guerra”, passando a ser cedidos a nações alinhadas aos interesses norte-americanos como Argentina, África do Sul, Australia, Áustria, Arabia Saudita, Bahrein, Brasil, Bangladesh, Bélgica, Benin, Bolívia, Bósnia, Burkina Faso, Camarões, Canada, Chile, Chade, Colômbia, Croácia, Dinamarca, República Dominicana, Equador, Espanha, Etiópia, El Salvador, Filipinas, Gabão, Grécia, Guatemala, Honduras, Holanda, Indonésia, Ira, Iraque, Japão, Coréia do Sul, República Khmer, Vietnã do Sul, Laos, Líbano, Libéria, Lituânia, Macedônia, Malásia, Mauritânia, Madagascar, México, Marrocos, Moçambique, Myanmar, Nova Zelândia, Nicarágua, Noruega, Paquistão, Peru, Portugal, Rodésia, Ruanda, Senegal, Sudão, Tailândia, Togo, Tunísia, Turquia, Uruguai e Venezuela. Atualmente muitos exércitos ainda mantem os M2A1 – M101A1 em uso em suas unidades de linha de frente, com nações mais desenvolvidos os empregando apenas com armas cerimonias

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o Brasil passaria a representar no cenario global, uma posição de destaque estratégica dentro do contexto do conflito, representando um importante fornecedor de matérias primas estratégicas (borracha, metais e alimentos). Sendo detentor ainda, de um vasto território continental com pontos estratégicos, extremamente propícios em seu litoral nordeste, para o estabelecimento de bases aérea e operações portuárias. Esta localização privilegiada, representava o ponto mais próximo entre o continente Americano e Africano, assim desta maneira a costa brasileira, seria fundamental como ponto de partida para o envio de tropas, veículos, suprimentos e aeronaves para emprego no teatro europeu. E neste contexto o país, passaria a ser agraciado com diversas contrapartidas comerciais e militares, e neste último aspecto sendo submetido a um completo processo de modernização não só em termos de doutrina operacional, mas também em termos de armamentos e equipamentos militares norte-americanos de última geração. A adesão do Brasil ao programa Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos), criaria ao país uma linha de crédito da ordem de cem milhões de dólares, destinados a aquisição de material bélico, proporcionando acesso a modernos armamentos, aeronaves, navios, veículos blindados e carros de combate. Este vasto programa de reequipamento visava proporcionar ao país, as condições básicas para o estabelecimento de um plano defesa territorial continental e ultramar eficiente. Entre estes equipamentos estavam os primeiros canhões modernos a serem recebidos em grande número variando de calibres de 37 mm a 305 mm, representando um grande avanço para a artilharia do Exército Brasileiro.

Dentre os equipamentos destinados a compor o regimento de artilharia da Força Expedicionária Brasileira estavam 12 canhões M-2A1 Howitzer 105 mm que seriam entregues no front italiano para o emprego do Exército Brasileiro, pela Artilharia Divisionária da FEB. Este grupo seria composto por quatro batalhões de obuseiros (Grupos de Obuses), sendo três deles com 12 obuseiros M-2A1 105 mm cada, e um Batalhão de Artilharia (IV) com 12 obuseiros M-1 155mm. O batismo de fogo ocorreria no dia 16 de setembro de 1944, no sopé do Monte Bastione, ao norte da cidade italiana de Lucca, na Toscana, um vento gelado já prenunciava os rigores do inverno próximo. Precisamente às 14 horas e 22 minutos foi lançado contra o inimigo nazista o primeiro tiro jamais disparado pela artilharia brasileira fora do continente sul-americano, atingindo com precisão o objetivo previsto: Massarosa. Durante todo o avanço das tropas da Força Expedicionária Brasileira na Itália os M-2A1 Howitzer 105 mm estiveram sempre presentes, tendo fundamental papel na campanha. Durante a guerra mais unidades seriam recebidas, passando a dotar pelo menos mais grupo de Artilharia Divisionária constituída por três grupos de M-2A1 105 mm e um de M-1 155 mm sendo sediados no Rio de Janeiro. Adoção destes novos canhões possibilitaria um avanço na doutrina operacional da artilharia existente até então no Exército Brasileiro que na época estava equipado com antigos canhões de 75 mm de origem alemã oriundos de tecnologia da Primeira Guerra Mundial, entre os avanços destacavam se o aumento do calibre, emprego de trajetórias curvas e o fato de serem auto rebocados.
Ao término do conflito todos os doze M-2A1 Howitzer 105 mm foram despachados ao Brasil, juntamente com os demais carros e equipamentos empregados pela Força Expedicionária Brasileira na Itália, sendo incorporados aos Grupos de Artilharia de Campanha do Exército, se somando as peças entregues diretamente no Brasil durante o transcorrer da Segunda Guerra Mundial. A partir do início da década de 1970 dentro dos auspícios do programa de Acordo de Assistência Militar Brasil Estados Unidos seriam recebidos pelo menos 160 conjuntos, M-101A1 105 mm oriundos dos estoques dos Exército Norte Americano (US Army). Neste pacote estavam pelo menos 12 unidades destinadas a equipar o Batalhão de Artilharia do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil (CFN). Totalizando 320 peças o M-2A1 - M-101A1 Howitzer 105 mm ou como é oficialmente designado como M-101AR, é um dos principais armamentos da Artilharia de Campanha Leve do Exército Brasileiro e do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha, principalmente devido a sua fácil locomoção no terreno e sua ótima eficácia durante o combate. É amplamente usada em disparos indiretos contra pessoal e material, podendo realizar tiros mergulhantes e verticais. Esse obuseiro pode utilizar também vários tipos e quantidades de cargas propulsoras, permitindo que o alcance possa variar dentro da mesma elevação de tiro, consoante as cargas escolhidas, baseado através das sete cargas existentes em que são utilizadas para devidos fins, com grande parte das munições sendo produzidas nacionalmente pela Indústria de Material Bélico do Brasil (IMBEL),  como a de Tiro 105 mm AE, tiro 155mm AE M107 e tiro de Salva 105 Slv.

No início da década de 1980 a arma de Artilharia de Campanha Leve do Exército Brasileiro e o Batalhão de Artilharia do Corpo de Fuzileiros Navais, passaram a incorporar novos obuseiros de 105 mm, agora de fabricação inglesa do modelo L118 Light Gun (em 1980) e italianos M-56 Oto Melara (em 1985). Estes novos obuseiros vieram proporcionar um alento pois além de serem armas de concepção mais moderna vieram a recomplementar a dotação, tendo em vista que muitos dos M-101 AR estavam fora de uso devido a problemas de desgaste e quebra de componentes críticos, deixando muitas unidades desfalcadas de sua equipagem completa de combate. Por volta do ano de 2015 muitos dos M-101 AR contavam já com mais de 70 anos de bons serviços prestados ao Exército Brasileiro, gerando assim uma demanda a curto e médio prazo para sua efetiva substituição. Este cenário culminaria no ano de 2018 na elaboração do Programa de Artilharia de Campo do Programa Estratégico do Exército para ‘Obtenção de Capacidade Operacional Plena’, o esforço é planejado para reestruturar o portfólio de artilharia de campo e fornecer tropas terrestres com poder de fogo adequado e preciso até 2031. Neste contexto, o acervo de peças de artilharia envolvia um total de 211 obuseiros M-101AR , 60 Oto Melara M-56  e 40 L-118 Light Gun, este plano tinha por objetivo colocar em campo um único sistema, buscando assim aprimorar o treinamento, a operação e a logística, além de fornecer maior mobilidade e poder de fogo às unidades de artilharia de campo. Infelizmente este programa não se materializaria nos anos seguintes muito em função de restrições orçamentarias. Na ausência da realização deste programa os olhos do Exército se voltaram para a implementação de um programa de revitalização dos M-101 AR, com este programa sendo incluído no PIT 2020, ficando sobre os auspícios do Arsenal de Guerra General Câmara (AGGC) a implementação deste. Infelizmente os efeitos correlatos a pandemia de Covid-19 ocasionar a elevação dos custos de insumos e matéria prima, algumas empresas tiveram dificuldades em entregar itens de produção nos prazos requeridos. Somente em abril de 2021 os primeiros seis obuseiros revitalizados por meio de manutenção de 3º e de 4º escalões, na oficina de armamento pesado da unidade foram entregues aos grupos de Artilharia de Campanha.
Apesar de conceder uma sobre vida, o fato de os obuseiros M-101 AR 105 mm possuírem, em média, cerca de 75 anos de uso, se torna inadiável mais uma vez sua substituição, assim em 2021 o  Subprograma Sistema de Artilharia de Campanha (SPrg SAC) criou um grupo de estudo para verificar a viabilidade da aquisição. Em 30 de abril de 2021, foi publicado no Boletim do Exército nº 17/2021 a portaria EME/C Ex nº 379, aprovou a diretriz de início do projeto de modernização da Artilharia rebocada da Força Terrestre (Exército Brasileiro), constituindo uma equipe para estudar a viabilidade da aquisição e revitalização de 86 obuseiros M-119A2, de 105mm, dos estoques do Departamento de Defesa do governo dos Estados Unidos (DoD), junto a materiais para a sua operação, através do “Foreign Military Sales” (FMS). De acordo com a diretriz do Subprograma Sistema de Artilharia de Campanha (SPrg SAC), caso a aquisição se efetive, o recebimento deverá ocorrer em um período de até sete anos a partir da assinatura do contrato.  Porém, segundo informou o tenente-coronel Nei Altieri Pereira dos Santos, diretor do Arsenal de Guerra General Câmara (AGGC), o arsenal manterá a capacidade operacional dos M-101 AR 105 mm durante todo esse tempo. Disparando deste os campos da Itália em 1944, enfim os veteranos obuseiros de 105 mm terão comprido sua missão.

Em Escala.
Para representarmos o M101A1 AR Howitzer de 105 mm fizemos uso do excelente kit da Testors - Italeri na escala 1/35, modelo que prima pela qualidade e detalhamento possibilitando apresentar todas as partes móveis do obuseiro, além de contar com as caixas de munição e equipe de operação. Para se representar a versão usada pelo Exército Brasileiro, não há necessidade de se realizar nenhuma alteração, bastando montar o modelo direto da caixa.

Empregamos tintas fabricadas pela Tom Colors, para compor o esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o segundo padrão de pintura empregado desde o recebimento das primeiras peças em 1944, seguindo o esquema tático de camuflagem em dois tons adotado a partir de 1983 pelo Exército Brasileiro, já as peças empregadas pelo Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha do Brasil (CFN) empregam outro padrão de pintura.

Bibliografia: 

- M101A1 – M2A1 105 mm Howitzer Wilipedia - https://en.wikipedia.org/wiki/M101_howitzer

- Artilharia de Campanha no Exército Brasileiro – Cezar Carriel Benetti - http://www.ecsbdefesa.com.br/fts/ACEB.pdf

- Exército mantém os M101A operacionais – Paulo Roberto Bastos Jr - https://tecnodefesa.com.br/

- Exército busca substitutos para os M101 AR  – Luiz Padilha - http:// www.defesaaereanaval.com.br

Canhões Schneider - Cannet 75 mm

História e Desenvolvimento.
Em 1836, os irmãos visionários Joseph Eugene e Adolphe Schneider, assumiriam o controle da empresa Creusot na cidade de Saône-et-Loire, na França, sendo esta considerada naquele período, uma das mais importantes forjas do continente. Este movimento levaria a criação da Schneider, Fréres & Cie. uma empresa metalúrgica que alcançaria grande renome em âmbito mundial nos anos subsequentes se tornando das empresas de metal pesado mais importantes da Europa em fins do século XIX e início do século XX. O portfólio de Schneider, Fréres & Cie seria muito diversificado chegando a produzir desde itens mais simples para aplicações domésticas, até locomotivas a vapor como o modelo “Gironde” lançado em 1838 e empregado em grande escala pela empresa de transporte ferroviário nacional Paris-Versailles Railway Company.  Este mercado seria amplamente trabalhado, levando a empresa a figurar entre os três maiores fabricantes franceses de implementos ferroviários. O próximo seguimento a ser explorado seria o de barcos a vapor para emprego fluvial e marítimo, levando a necessidade de se construir uma nova planta industrial na cidade litorânea de  Châlon-sur-Saône. Curiosamente esta iniciativa levaria a necessidade maior infraestrutura de produção de grandes componentes levando a empresa a dominar a tecnologia de fabricação de armações de casco em metal, o que abriria mais um importante nicho de atuação passando a oferecer ao mercado estruturas metálicas de edifícios, guindastes, pontões de guindaste.  Isto construiria as bases para o lançamento de uma divisão de construção civil, com foco em projetos de pontes e viadutos. Ao final do século XIX a empresa lograria êxito na celebração de contratos de grande vulto, entre estas grandes obras no exterior como a construção de nove pontes em Tonkin no Vietnã, a construção e operação do porto de Rosário na Argentina, e a reconstrução do porto de Montevidéu no Uruguai. 

Nos últimos anos do século XIX , o avanço tecnológico observado na indústria de siderurgia internacional, envolvendo o emprego de materiais e ligas complexas compostas de aço, cromo e níquel, transformaria profundamente os processos de produção das grandes siderurgias deste segmento na Europa. Entre estas apresentando maior destaque os impactos junto aos processos de produção de empresas como Friedrich Krupp AG, Schneider Fréres & Cie , Armstrong AG, Bethlehem Steel, Firth, Holtzer AG Group, posicionado estas organizações entre os maiores fabricantes de armamentos na virada do século. O representativo viés de produção militar da corporação Schneider - Creusot Fréres & Cie, surgiria após o término da Guerra Franco-Alemã (1870-1871), quando o herdeiro do conglomerado Henri Schneider decidiria se estabelecer neste segmento, criando linha de produção dedicadas ao desenvolvimento e fabricação uma ampla gama de canhões e morteiros. Em 1897, a empresa procederia a aquisição das “Oficinas de Artilharia do Mediterrâneo Forges”, localizadas na cidade Le Havre no interior da França. Ao incorporar aos seus quadros toda a equipe de engenheiros e projetistas o grupo absorveria um amplo know how neste segmento de construção, se destacando principalmente a tecnologia de produção de canhões sem recuo. Neste momento o principal trunfo da corporação era proporcionado pela atuação do inovador engenheiro Gustave Canet (colaborador original da Forges Mediterrâneo), que ao longo dos anos alçaria postos de destaque na corporação, como diretor de artilharia no Creusot e diretor honorário da Artilharia de Schneider. Ele seria o principal responsável pelo desenvolvimento da emblemática família de canhões Canet Schneider, produzida em uma variada gama de calibres, para as mais diversas aplicações em âmbito terrestre e naval.   
No entanto a maior contribuição desta empresa francesa para o desenvolvimento tecnologia da artilharia moderna, se daria na passagem do século XIX para o século XX, com o desenvolvimento e produção do famoso modelo de canhão, o  Schneider-Canet de 75 mm. Esta nova peça seria totalmente construída em aço rápido, dispondo de tubo estriado com carregamento pela culatra, sistema de amortecimento de recuo composto por freio hidráulico (com efeitos amortecedor e recuperador, recolocando a peça em posição de tiro após o disparo). O conjunto destas inovações partiriam da engenhosa mente do engenheiro Gustave Canet (conceito que replicado rapidamente por outros fabricantes internacionais), que  permitiria a operação no sistema denominado como "tiro rápido" possibilitando que a peça efetuasse de dez a vinte disparos por minuto (ou até trinta tiros se o conjunto fosse equipado com uma equipe mais experiente), contrastando muito com a falta de agilidade da antiga artilharia de reparo fixo, que permitia apenas um disparo a cada dez minutos. O  canhão Schneider-Canet de 75 mm logo seria aprovado pelo comando Exército Francês (Armée de Terre), sendo celebrado um grande contrato de aquisição, visando iniciar um processo de substituição ou complementação dos antigos modelos como o Canet M-890 de calibre de 100 mm, que fora introduzido na força terreste partir do ano de 1896. As primeiras peças de artilharia  desta nova família começariam a ser entregues a partir de 1906, com sua carteira de pedidos logo passando a receber inúmeros contratos de exportação, incluindo a Espanha que viria a ser um dos maiores usuários desta peça de artilharia na primeira década do novo século, passando inclusive a realizar a produção sob licença do conjunto e  de suas munições a partir de 1909.

O modelo Schneider 75 mm 1906, representaria naquele momento o ápice da tecnologia de artilharia de campo de disparo rápido, sendo comprovadamente muito superior aos modelos similares, como seus concorrentes, como os canhões franceses Saint-Chamonds e alemães Krupp de 75 mm.  Além disso esta peça de artilharia era significativamente mais leve e de operação mais precisa graças ao emprego de variados mecanismos hidropneumáticos, que eram empregados para absorver parte da energia do recuo, suavizando a transferência do momento linear, movendo o barril e seu trenó para um berço. Desta maneira a peça poderia retornar a sua posição inicial, mantendo a direção de disparo após o primeiro tiro enterrado o arado e, assim, eliminando a necessidade de redirecionamento. Isso também permitiria que os dispositivos de mira fossem montados no berço, em vez de no tubo, garantindo assim menor perturbação após o disparo, com ambos permanecendo alinhados, facilitando o ajuste do objetivo. Sua construção incorporaria um barril de níquel aço forjado e temperado, com um tubo interno e duas mangas, bengala e suporte acompanhados por uma abraçadeira de ferro. A alma do canhão raiada seria composta por trinta listras progressivas, garantindo maior velocidade de saída. O fechamento seria composto com um sistema de parafusos envolvendo dois setores lisos e dois roscados, que poderia ser aberto ou fechado com um único movimento, expulsando a baia automaticamente no final do movimento de abertura. O barril seria acoplado a um trenó de aço no qual estavam os cinco cilindros que constituíam o freio e o recuperador. Seu freio era do tipo hidráulico e o recuperador hidropneumático. O trenó movia-se sobre um berço de aço de cromo de níquel, absorvendo um pouco da energia do recuo e comunicando ao berço o momento linear de uma forma mais gradual. A arma poderia disparar três tipos diferentes de projéteis, todos pesando 6,5 kg: uma granada comum, uma granada de estilhaços e uma granada inovadora que apresentava uma quantidade maior de explosivos, sendo usada para atacar edifícios e fortificações inimigas. 
Seu baixo peso total, acabaria o tornando ideal para o emprego como canhão de montanha, até então a movimentação e operação de peças de artilharia em regiões montanhosas representava desde sempre grandes dificuldades aos homens da arma de artilharia. As peças de grande calibre, habitualmente mais eficazes, eram pesadas demais para poderem tracionadas por animais, limitando assim o poder ofensivo neste tipo de campo de batalha. Assim os primeiros exercícios com os canhões Schneider Canner 75 mm, teriam início em regiões de relevo irregular a partir de meados do ano de 1909, e seus promissores resultados levariam a imediata aprovação e consequente celebração de grandes contratos e produção. Sua incorporação pelo Exército Frances (Armée de Terre), levaria a gradual substituição dos canhões Schneider 65 mm modelo 1906.  O modelo logo conquistaria diversos contratos de exportação, com seu batismo de fogo ocorrendo em 1909, sendo empregados pelo Exército Espanhol (Ejército de Tierra) durante a Guerra Melilla deflagrada entre os meses de julho e dezembro. Este seria o primeiro registro de uma longa carreira de empregos em conflitos militares no século XX, com destaque na Primeira Guerra Mundial, Guerra Civil Espanhola, Segunda Guerra Mundial e outros conflitos regionais de importância relevante. Os canhões Schneider Cannet 75 mm além da Espanha, seriam exportados para o Brasil, Polônia, Grécia, Brasil, Paraguai, Iugoslávia e Estados Unidos, com muitos destes se mantendo em emprego até meados da década de 1960. 

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
A adoção e incorporação de modernos canhões de artilharia de campo no Exército Brasileiro teve seu início nos primeiros anos do século XX, quando o Marechal Hermes da Fonseca, empreenderia uma série de estudos visando realizar uma ampla reforma estrutural na força militar terrestre. Esta iniciativa teria o propósito de superar as deficiências técnicas e operacionais observadas desde o fim da Guerra do Paraguai (1864-1870) e evidenciadas por ocasião da Guerra de Canudos (1896-1897). Porém os resultados concretos que levariam ao rompimento da estagnação da doutrina operacional do Exército Brasileiro, seriam obtidos com as transformações iniciadas pelos Ministros da Guerra Marechais João Nepomuceno de Medeiros Mallet, Francisco de Paula Argolo e Hermes da Fonseca, entre os anos de 1900 e 1908. Com o apoio do Barão do Rio Branco, que intercederia junto ao Presidente da República Afonso Pena, o Marechal Hermes da Fonseca conseguiria obter os recursos financeiros necessários a implementação de um ambicioso processo de modernização da Força Terrestre, envolvendo prioritariamente a aquisição de armamentos e criação de novas unidades operativas.  Este programa que seria popularmente conhecido como a “Reforma Hermes”, compreenderia a restruturação orgânica do Exército Brasileiro, a reorganização do ensino militar, a criação e regulamentação do Estado-Maior Assim a partir de 1908, seria determinada uma nova organização de comando para o Exército Brasileiro, ficando o território nacional dividido em vinte e uma regiões para alistamento militar e treze para inspeção. O Marechal Hermes da Fonseca era um grande admirador do Exército Prussiano e dizia publicamente que a força terrestre brasileira precisava atingir o nível dos germânicos, onde se destacava o Estado-Maior, criado por Helmuth von Moltke, e a tecnologia de ponta na produção de armamentos.  Assim, em agosto de 1908, motivado também pela inexistência de uma indústria bélica nacional, comporia uma missão militar que viajaria para Alemanha e França em busca de fornecedores de material bélico moderno e de parcerias para o acesso a conhecimentos técnico profissionais. 

Como resultado prático desta viagem, seriam adquiridos armamentos variados em grandes quantidades, como 400.000 fuzis alemães Mauser calibre 7 mm para a infantaria e 10.000 lanças Ehradt, 20.000 espadas e 10.000 mosquetões para a cavalaria. A artilharia de campanha do Exército Brasileiro seria servida com duas baterias de canhões Krupp 75 mm Modelo 1908, seis de canhões Krupp 75 mm de montanha e cinco de obuses Krupp 105 mm. Também seriam comprados um grande número de peças de artilharia de costa do modelo Schneider-Canet do modelo C-50 1902 de 150 mm “Tiro Rápido” destinadas Marinha do Brasil. Estes armamentos seriam destinados a equipar os pontos de artilharia fixa de concreto edificados especialmente na fortaleza de Copacabana no Rio de Janeiro (então Capital Federal). Um total de seis conjuntos destes canhões seriam ainda adquiridos a fim de compor as defesas de ponto de Santos no litoral de São Paulo, operando em conjunto com quatro obuseiros Krupp 280 mm C-16 modelo 1912. No entanto estes não seriam os primeiros canhões produzidos pela Schneider-Canet a entrarem em serviço no país, tendo em vista que desde a última década do século XIX o Exército Brasileiro já operava algumas baterias equipadas com os canhões Canet M-890  de calibre de 100 mm e M-897 de 75 mm. Durante os anos vindouros a adoção destas novas peças de artilharia de origem alemã e francesa em muito iram modificar o patamar operacional brasileiro, sendo postos a prova em uma série de eventos de revoltas ou insurreições regionais, como a “Guerra do Contestado” ocorrida nos estados do Paraná e Santa Catarina durante o ano de 1912.  Apesar destes significativos avanços, o eclodir da Primeira Guerra Mundial em 1914, traria grandes avanços não só em tecnologia de armas, mas também na doutrina militar, elevando os patamares da guerra moderna. Esta nova realidade rapidamente relegaria o Exército Brasileiro a patamar operacional inferior ao vigente a partir do ano de 1918, suscitando assim a necessidade de um novo ciclo de atualização.    
As preocupações em torno da obsolescência doutrinariam e de material das Forças Armadas Brasileiras, eram fundamentadas principalmente pelo rápido desenvolvimento econômico e militar da Argentina, que passava a representar a principal hipotética ameaça ao pais. Assim com o objetivo de reverter este cenário crítico a partir do segundo semestre de 1918, o governo brasileiro passaria a buscar alternativas para a implementação deste novo ciclo de desenvolvimento militar. Neste intuito seriam conduzidos diálogos junto ao governo francês a fim de estudar a contratação de uma assessoria militar que pudesse conduzir este processo. Estas negociações já em um estágio avançado ocorreriam em Paris, entre o adido militar brasileiro na França, coronel Malan d’Angrogne, e o ministro da Guerra francês, Georges Clemenceau. Paralelamente seria enviado ao Brasil o general Maurice Gamelin, em uma missão de levantamento de perspectivas sobre o real cenário das Forças Armadas Brasileiras, visando assim melhor embasar a proposta francesa. O contrato seria assinado poucos meses depois na capital francesa, sendo ratificado logo em seguida no Rio de Janeiro, então Distrito Federal, criando assim oficialmente a “Missão Militar Francesa”. Os termos do contrato estipulavam que oficiais franceses comandariam durante quatro anos as escolas de Estado-Maior (EEM), de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO), de Intendência e Veterinária. Em contrapartida o Brasil se comprometeria a privilegiar a indústria francesa em seus processos de aquisição de armas e equipamentos militares, desde que as condições comerciais e prazos de entrega fossem no mínimo equivalentes as propostas apresentadas por empresa de outros países. Para o Brasil, este contrato representaria um grande passo na direção da profissionalização e modernização de suas forças armadas, novamente equalizando a balança militar na América do Sul. Este processo começaria a ser consolidado a partir de meados de 1921, com a adoção de novos regulamentos destinados à Direção e Emprego das Grandes Unidades, ao Exercício e Emprego da Artilharia e ao Serviço de Estado-Maior em Campanha.

As primeiras percepções levantadas pelos comandantes da “Missão Militar Francesa” apontavam a necessidade modernização de uma série equipamento e armas, sendo listadas as prioridades e as quantidade mínimas que deveriam ser incorporadas. Uma concorrência internacional seria aberta e atendendo ao preceito estabelecido anteriormente, as propostas apresentadas pela indústria militar francesa seriam preferenciadas. Em termos da arma de artilharia de campanha seriam adquiridos um grande número de canhões, incluindo vários modelos fabricados pela empresa Schneider - Creusot Fréres & Cie, entre estes os modelos C-50 1902 de 150 mm (emprego terrestre e ferroviário), Schneider 75/28 modelo 1906 de 75 mm e C-18 - 6 Modelo 1919 de 75 mm (canhão de montanha), com dois estes últimos modelos, encomendados e recebidos durante o ano de 1923. Para o atendimento as necessidades do Exército Brasileiro que na época era em sua maioria hipomóvel, os canhões de campanha Schneider-Canet seriam recebidos com rodas de madeira, sendo destinados então a equipar as a equipar as unidades de cavalaria de fronteira. Seguindo os padrões franceses as unidades de cavalaria seriam compostas por baterias com quatro canhões de 75 mm, quatro carros de munição (cada arma podia carregar trinta e oito munições na carroça de tração, sendo complementadas com mais sessenta unidades no carro de munição), um carro de apoio (com ferramental) e por fim um carro forja, com a função de assegurar a manutenção das peças em campanha e os reparos nos carros de tração e de serviço. Estas baterias seriam operadas por um efetivo de três oficiais, dez sargentos e cento e vinte e um praças, demandando trinta e nove cavalos e noventa e seis muares para a tração das peças e do pessoal. Os canhões de montanha Schneider-Canet 75 mm, caracterizados por serem peças pequenas, leves e de fácil transporte, trouxeram diversos benefícios à artilharia de campanha, com o fator principal de seu rápido emprego em qualquer região brasileira. 
Os canhões Schneider-Canet 75 mm, estiveram presentes ação real, em quase todos os grandes conflitos regionais ocorridos no país no início do século XX, incluindo a Revolução de 1930 e a Revolução Constitucionalista de 1932, nesta última sendo empregados pelos lados em conflagração. Curiosamente os canhões Schneider - Cannet de 75 mm (e também Krupp) seriam empregados como arma orgânica em seis trens blindados (TB) denominados TB-1 a TB-6, construídos na Oficinas Ferroviárias de São Paulo, sob a orientação da Escola Politécnica Paulista. Esta composição ferroviária blindada era composta locomotiva entre dois vagões, além de uma prancha à frente para verificar o estado da linha. Na frente do primeiro carro, ao centro, uma abertura maior dando saída à boca de uma peça Krupp ou Schneider de 75 mm, que se manobrava de dentro e ocupava toda a parte frontal do carro, permitindo apenas a circulação lateral. Durante a Segunda Guerra Mundial estes canhões seriam empregados em diversas manobras e exercícios de defesa equipando os regimentos de artilharia a cavalo. Com a ampliação da motorização do Exército Brasileiro, a partir de 1954 estes canhões seriam modernizados nos arsenais de guerra no Rio de Janeiro (AGRJ) e General Câmara (AGRS) recebendo novas rodas com pneus no lugar das rodas de madeira passando permanecendo em operação até a primeira metade da década de 1960. Atualmente pelo menos três destas peças de artilharia se encontram em exposição no Museu do Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, e mais quatro ainda em uso pelo Exército Brasileiro como armas cerimoniais em Curitiba, Paraná. 

Em Escala.
Diversos modelos e versões dos canhões Schneider - Canet 75 mm foram empregados no Exército Brasileiro ao longo dos anos, e para podermos representar em escala, esta importante peça de artilharia fizemos uso da única opção disponível na escala 1/35 representando o modelo M-897. Este kit foi produzido pela empresa alemã Tom Modellbau, porém apesar de antigo, apresenta nível de detalhamento e acabamento aceitável para a escala. Não fizemos o emprego de decais.


O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura que pode ter sido empregado nos canhões Schneider-Canet 75 e demais peças de artilharia de origem alemã recebidos pelo Brasil, se baseando no esquema adotado no Exército Francês (Armée de Terre) em fins da década de 1920. As peças empregas pelas forças paulistas durante a Revolução Constitucionalista de 1932 receberiam um padrão de camuflagem tático aplicado a todos os  carros e trens blindados naquele conflito portando ainda algumas personalizações de marcação de unidades. Esta tonalidade de pintura representa também as peças preservadas atualmente no Museu do Forte de Copacabana. 



Bibliografia: 
- Schneider Frères et Compagnie - https://www.lesechos.fr
- Schneider-Canet - https://pt.wikipedia.org/wiki/Schneider-Canet
- Missão Militar Francesa por Rodrigo N. Araujo -  https://cpdoc.fgv.br/
- Arquivos do Museu Militar de Conde de Linhares – Rio de Janeiro
- Canhão de Montanha Schneider 75mm - http://www.cporpa.eb.mil.br/