Krupp Flak 88 mm C/56 Modelo 18

Historia e Desenvolvimento.
Durante a Primeira Guerra Mundial, as armas antiaéreas eram, em sua maioria, adaptações de canhões de médio calibre, modificados para oferecer um amplo ângulo de ataque. Essas armas alcançaram certa eficácia contra os aviões lentos e vulneráveis da época, mas o rápido avanço da tecnologia aeronáutica no período pós-guerra transformou o cenário. As novas aeronaves, com maior velocidade e capacidade de operar em altitudes mais elevadas, tornaram obsoletas as defesas antiaéreas existentes, que careciam da cadência de tiro e do alcance necessários para neutralizar as ameaças emergentes. Esse desafio revelou a urgência de desenvolver uma nova geração de canhões antiaéreos capazes de enfrentar os aviões militares modernos em futuros conflitos. Nesse contexto, as nações vitoriosas da Primeira Guerra Mundial iniciaram esforços para criar sistemas antiaéreos mais eficazes, impulsionando inovações tecnológicas na área de defesa. Na Alemanha, porém, o Tratado de Versalhes, imposto em 1919, restringia severamente o desenvolvimento e a produção de armamentos em grande escala ou com capacidade ofensiva avançada. Apesar dessas limitações, a República de Weimar, movida pela necessidade de rearmamento, começou a explorar, de maneira sigilosa, alternativas para modernizar suas forças armadas. Foi nesse cenário que a empresa alemã Friedrich Krupp AG (Fundada em 1811), uma das líderes na indústria de defesa, uniu-se à sueca AB Bofors (Fundada em 1646), que detinha participação majoritária na Krupp, em um acordo de cooperação estratégica. Essa parceria visava contornar as restrições do Tratado de Versalhes (assinado com os aliados ocidentais em 28 de junho de 1919), permitindo o desenvolvimento de uma nova geração de canhões antiaéreos. O projeto, iniciado em 1926, buscava criar uma arma inovadora, com alta cadência de disparos, projéteis de alta velocidade e capacidade de atingir alvos em grandes altitudes. Um diferencial notável era a versatilidade da plataforma, projetada para ser utilizada tanto em funções antiaéreas quanto antitanque, reduzindo custos de produção e manutenção, observando a comunalidade também no quesito das munições. Desenvolvido do zero, o novo canhão rompeu com os conceitos tradicionais das armas antiaéreas da época, incorporando soluções pioneiras que garantiam eficiência e confiabilidade. A colaboração entre a Krupp e a Bofors resultou em um sistema que não apenas atendia às demandas militares do período, mas também estabelecia um novo padrão para a defesa antiaérea, marcando um avanço significativo na tecnologia de armamentos. Esse projeto reflete a determinação das nações em se adaptarem às rápidas mudanças do cenário militar, superando limitações impostas e pavimentando o caminho para inovações que moldariam os novos conflitos do século XX.

No início da produção do novo canhão antiaéreo, desenvolvido pela parceria entre a Friedrich Krupp AG e a AB Bofors, os protótipos foram inicialmente configurados com um calibre de 75 mm. Contudo, os militares alemães, buscando uma arma com maior potência e versatilidade, solicitaram um redesenho do projeto, resultando na adoção do calibre de 88 mm. Essa decisão marcou o nascimento do Flak 18 (Flugzeugabwehrkanone), um canhão antiaéreo que se tornaria um dos mais emblemáticos sistemas de defesa da história militar. Em abril de 1928, o primeiro protótipo do Flak 18 foi concluído, equipado com um cano de peça única com 56 calibres de comprimento, o que lhe conferiu a designação oficial de Modelo 18 L/56. Em maio do mesmo ano, as primeiras unidades começaram a ser integradas ao Exército Alemão (Reichswehr), ainda sob as restrições do Tratado de Versalhes. O Flak 18 foi projetado com uma base cruciforme fixa, permitindo um giro completo de 360º e uma elevação que variava de -3º a +85º. Essa configuração possibilitava atacar alvos tanto aéreos quanto terrestres, oferecendo flexibilidade única para a época. Em situações específicas, o canhão podia ser operado diretamente de sua base de transporte sobre rodas, embora com menor precisão. O diferencial mais notável do Flak 18 era seu sistema de carregamento semiautomático, uma inovação que simplificava a operação. Após cada disparo, o cartucho vazio era ejetado automaticamente, permitindo que o operador apenas inserisse um novo projétil na bandeja de alimentação, que então era carregado na câmara, rearmando a arma rapidamente. Esse mecanismo resultava em uma cadência de tiro impressionante, de 10 a 20 disparos por minuto, superando significativamente outros canhões antiaéreos da época. A versatilidade do Flak 18 era reforçada por sua capacidade de utilizar uma ampla gama de munições, incluindo projéteis altamente explosivos de 10,4 kg, ideais contra aeronaves e pessoal, e projéteis perfurantes de 9,2 kg, capazes de penetrar a blindagem de qualquer veículo em serviço na década de 1920. Com uma velocidade inicial de 820 metros por segundo, esses projéteis tornavam o Flak 18 uma ameaça formidável tanto no céu quanto em terra. O desenvolvimento do Flak 18 ocorreu em um período de tensões políticas e limitações impostas pelo Tratado de Versalhes, que restringia o armamento alemão. Contudo, o cenário político mudou drasticamente em fevereiro de 1933, com o incêndio do Reichstag, que foi explorado pelo chanceler Adolf Hitler como pretexto para consolidar o poder do Partido Nazista. Após a morte do presidente Paul von Hindenburg em 1934, Hitler assumiu o controle total do governo, iniciando um ambicioso programa de rearmamento das forças armadas alemãs.

A Guerra Civil Espanhola, desencadeada em julho de 1936 após um golpe militar contra a Segunda República Espanhola, dividiu o país entre republicanos (apoiados pela União Soviética e voluntários internacionais) e nacionalistas (apoiados pela Alemanha nazista e pela Itália fascista). Para Adolf Hitler, apoiar Franco era uma oportunidade estratégica: além de combater a influência comunista na Europa, a Espanha oferecia um campo de testes ideal para as táticas de Blitzkrieg e os equipamentos da Wehrmacht. A Legião Condor, formada em 1936 sob o comando do general Hugo Sperrle, era composta por cerca de 5.000 a 10.000 militares alemães ao longo do conflito, incluindo pilotos, artilheiros, mecânicos e pessoal de apoio logístico. Equipada com aeronaves como o Heinkel He 51, Junkers Ju 87 Stuka e Messerschmitt Bf 109, além de tanques Panzer I e baterias antiaéreas Flak 18, a unidade foi projetada para operar como uma força integrada, testando a coordenação entre aviação, artilharia e infantaria mecanizada. Em combate real neste conflito contra as forças republicanas, este canhão se mostraria como a melhor arma antiaérea disponível na época, provando também ser preciso e versátil como uma excelente arma anti-veículo e anti-bunker de longo alcance. A experiencia obtida durante este conflito regional, revelaria, no entanto, a ocorrência de vários problemas técnicos de pequena ordem, porém apresentariam grandes oportunidades de potenciais de melhoria de projeto. As lições da Guerra Civil Espanhola culminaram no desenvolvimento do Flak 36, introduzido em 1939. Essa versão aprimorada trouxe inovações que refletiam a experiência prática dos artilheiros. O cano, antes uma peça única no Flak 18, foi redesenhado em duas seções, facilitando a substituição de componentes desgastados e reduzindo o tempo de manutenção em campo. A nova base cruciforme, mais robusta e equipada com pneus duplos na frente e atrás, aumentava a estabilidade e permitia maior mobilidade, mesmo em operações de emergência. Notavelmente, o Flak 36 podia ser disparado diretamente da posição de transporte, após ser desacoplado do trator meia-lagarta SdKfz 7, em apenas dois minutos e meio – uma característica que o alinhava ao conceito de Blitzkrieg, exigindo respostas rápidas em cenários dinâmicos. A proteção dos artilheiros também foi priorizada com a introdução de um escudo blindado, que oferecia defesa limitada contra estilhaços e fogo leve. Esse acessório, retroinstalável no Flak 18, tornou-se uma marca visual do Flak 36, proporcionando um pequeno, mas vital, conforto às tripulações expostas ao perigo. Para os soldados, o escudo era um símbolo da atenção dada à sua segurança, mesmo em meio às demandas implacáveis do campo de batalha.

O desenvolvimento do Flak 37, introduzido pouco após o Flak 36, elevou ainda mais o desempenho da arma. Equipado com indicadores de mira avançados, integrados a um controlador central, o Flak 37 permitia o fogo coordenado de uma bateria de quatro canhões, maximizando a eficácia contra alvos aéreos em movimento rápido. Essa inovação exigia treinamento intensivo, mas recompensava as tripulações com uma precisão quase cirúrgica, transformando cada bateria em uma fortaleza antiaérea. A interoperabilidade de componentes críticos entre as versões Flak 18, 36 e 37 foi um marco logístico, garantindo que peças sobressalentes fossem compartilhadas, mantendo a operacionalidade mesmo em campanhas prolongadas. Já em 1939, o comando da Força Aérea Alemã (Luftwaffe) solicitaria o desenvolvimento de novas armas para a defesa antiaérea, principalmente para atuar contra bombardeiros de alta altitude. Neste momento a produção dos Flak 88 mm estava sob responsabilidade da empresa Rheinmetall AG, que rapidamente responderia a esta demanda com uma nova versão, que passava a apresentar canos e cartuchos mais longos. Seu protótipo designado como Flak 41 seria entregue para testes em março de 1941, disparando projeteis de 9,4 kg a uma velocidade de focinho de 1.000 m/s (3.280 pés/s), dando-lhe um teto efetivo de 11.300 metros (37.100 pés) e um máximo de 14.700 metros (48.200 pés). O grande êxito obtido pela Legião Condor na Guerra Civil Espanhola (1936 – 1939) onde sua utilidade como arma antitanque e peça de artilharia de campo excederia seu papel como arma antiaérea, seria novamente comprovado durante a batalha da França em 1940. Neste momento seu emprego seria devastador contra os carros de combate franceses Char B1 Bis e ingleses Matilda II. Neste momento seria introduzido no Exército Alemão (Wehrmacht) de canhões Flak 18 montados em veículos meia lagarta pesados Sd.Kfz. 8, recebendo nesta configuração a denominação de "Bunkerknacker". A capacidade da sua munição em penetrar mais de 84 mm de armadura a um alcance de 2 km, o tornaria uma arma antitanque incomparável durante os primeiros dias da guerra e ainda formidável contra todos, exceto os tanques mais pesados no final. Na campanha da Africa do Norte, as forças alemãs do Afrika Korps, sob o comando do general Erwin Rommel, os Flak 88 mm seriam empregados com maestria, quando Panzers em movimento de aparente retirada, atrairiam os carros de combate britânicos do Oitavo Exército Britânico para uma armadilha, sendo destruídos mais de duzentos e cinquenta tanques inimigos.  
A repetida perda de tanque de canhões Flak 88 mm bem-posicionados nas batalhas do Halfaya Pass lhes renderia o apelido de "Hellfire Pass" (Passe do Fogo do Inferno), criando assim um mito, que passaria a ser muito temido por seus adversários. Já durante a operação  Barbarossa, a invasão da União Soviética, os Flak 88 seriam largamente usados na frente oriental obtendo grande êxito na primeira fase da campanha. No entanto a introdução dos novos carros de combate T-34 e KV trariam os primeiros revezes em combate contra a blindagem dos tanques soviéticos, sendo eficientes contra estes somente a uma distância de 200 metros.  Os canhões Flak 88 teriam destacada participação no esforço de defesa antiaérea do Reich, com suas baterias estrategicamente posicionadas fazendo uso do sistema Kommandogerät, um computador de artilharia analógico.  Este permitia disparos extremamente precisos, levando em conta a distância entre as armas umas das outras e da tripulação de mira, anulando o deslocamento e apontando todas as armas no mesmo ponto. Isso permitiu que várias armas fossem apontadas precisamente para o mesmo alvo por uma única tripulação de comando de cinco homens, em vez de exigir tripulações treinadas em cada arma. Sistemas de mira por radar também foram desenvolvidos para complementar esses sistemas. A série de radares de Würzburg foi produzida aos milhares e amplamente utilizada. Ele permitia fogo de área geral sem linha de visão, mas tinha baixa precisão em comparação com os sistemas visuais. O intensificar da campanha de bombardeio estratégico aliado levaria a priorização da produção de armas antiaéreas comprometendo quase 45% do orçamento de defesa alemão. A Força Aérea Alemã (Luftwaffe) em agosto do ano de 1944, chegaria a dispor de mais de dez mil canhoes Flak 88 mm em serviço para a defesa antiaérea internamente no país. Além das forças armadas alemães os canhões Flak 88 seriam adquiridos novos de fábrica pela Itália, Espanha, Grécia, China Nacionalista, Brasil e Finlândia. Centenas de peças de artilharia desta família seria capturadas e empregadas pelas Forças Francesas Livres, Grécia, Iugoslávia e temporariamente pelo Exército dos Estados Unidos (US Army) pelos 79º e 244º Batalhões de Artilharia de Campanha, durante o auge de escassez de munição. Estas armas de artilharia antiaérea, ainda veriam combate real durante a Guerra do Vietnã, quando peças fornecidas pela Uniao Soviética a partir do ano de 1954, foram empregadas contra aeronaves norte-americanas no início daquele conflito. Registra-se que as últimas unidades destas armas foram retiradas do serviço militar ativo somente no ano de 1977. Entre 1933 e 1945 seriam produzidos 26.616  canhões Flak 88 mm dispostas em sete versões. 

Emprego no Exército Brasileiro.
No início do século XX, o Exército Brasileiro embarcou em um ambicioso projeto de modernização com a Reforma Hermes, iniciada em 1905, que marcou um divisor de águas na história militar do país. Esse programa, liderado por visionários como o Marechal Hermes da Fonseca, buscava alinhar a Força Terrestre aos melhores exércitos europeus, introduzindo armamentos modernos e reestruturando suas unidades. Contudo, o rápido avanço tecnológico pós-Primeira Guerra Mundial e a obsolescência dos equipamentos na década de 1930 colocaram o Brasil em uma posição vulnerável. Para os soldados e oficiais que serviam na época, a luta para superar essas deficiências era não apenas uma questão técnica, mas um compromisso com a defesa da soberania nacional, um espírito que ecoaria em iniciativas futuras, como a modernização do M108 no programa Força Terrestre 90 (FT-90). Lançada em 1905, a Reforma Hermes representou um marco na modernização do Exército Brasileiro. Com um investimento significativo, o programa trouxe grandes quantidades de armamentos modernos, incluindo canhões de campanha fabricados por empresas europeias como a francesa Schneider e a alemã Krupp. Esses equipamentos, que incluíam obuses e peças de artilharia de 75 mm e 105 mm, elevaram o Brasil a um patamar operacional comparável ao de potências europeias, como França e Alemanha. Para os artilheiros brasileiros, operar esses canhões era motivo de orgulho, exigindo treinamento rigoroso nos campos de prática do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Cada disparo, ecoando nos terrenos de treinamento, simbolizava a ambição de construir uma Força Terrestre robusta e respeitada. No entanto, o brilho desse avanço durou pouco. O término da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) acelerou o desenvolvimento tecnológico global, com novos tanques, aeronaves e peças de artilharia que rapidamente tornaram os equipamentos brasileiros obsoletos. Na década de 1930, o Exército Brasileiro enfrentava uma realidade preocupante: sua artilharia, outrora moderna, não acompanhava o ritmo das inovações. Relatórios confidenciais do Estado-Maior das Forças Armadas, elaborados com meticulosa análise, revelavam que vizinhos sul-americanos, como Argentina e Chile, possuíam arsenais mais avançados, tanto em quantidade quanto em qualidade, abrangendo forças aéreas, terrestres e navais. Em um cenário hipotético de conflito, o Brasil poderia resistir por apenas 30 dias antes de perder o controle de regiões estratégicas, como o Rio Grande do Sul, uma ameaça que pesava sobre os ombros dos militares brasileiros. Na segunda metade da década de 1930, o mundo vivia um clima de crescente tensão, com conflitos regionais, como a Guerra Civil Espanhola (1936-1939), destacando a importância de armamentos modernos, como o canhão Flak 18 alemão. No Brasil, a obsolescência da artilharia era uma das principais fraquezas, com canhões antigos, de baixa cadência de tiro e manutenção complexa, incapazes de competir com os equipamentos de seus vizinhos. Essa vulnerabilidade exigia uma resposta urgente, e os oficiais do Exército, cientes do dever de proteger a nação, mobilizaram-se para reverter o quadro. Em abril de 1936, o General Eurico Gaspar Dutra, então Ministro da Guerra, tomou uma decisão ousada: criou uma comissão de compras sediada na Europa, encarregada de identificar e adquirir equipamentos modernos para reequipar as Forças Armadas. Essa equipe, composta por oficiais experientes e engenheiros, enfrentou a complexa tarefa de avaliar fornecedores internacionais, como as empresas Schneider et Compagnie (França), Societa Giovanni Ansaldo & Compagnia (Itália), Friedrich Krupp AG e Rheinmetall AG (Alemanha). 

Um edital detalhado foi elaborado, solicitando cotações, condições de pagamento e opções de financiamento, com foco em canhões de artilharia de campanha que atendessem às necessidades táticas do Brasil. Para viabilizar essas aquisições, o governo brasileiro alocou uma verba de 1,5 milhão de contos de réis, a ser desembolsada ao longo de dez anos, utilizando reservas financeiras estratégicas. As transações seriam realizadas em libra esterlina, a moeda de referência da época, garantindo acesso aos mercados internacionais. Um marco significativo foi a assinatura de um acordo comercial com a Alemanha, cuja indústria bélica, liderada por empresas como Krupp e Rheinmetall, despontava com tecnologia de ponta. Esse acordo permitia compras em marcos alemães de compensação, utilizando exportações brasileiras de produtos agrícolas, como café e algodão, para equilibrar a balança comercial. Para os negociadores brasileiros, cada contrato assinado era um passo rumo à autossuficiência militar, uma vitória silenciosa em um mundo à beira do conflito. Os canhões visados incluíam modelos de 75 mm e 105 mm, como os produzidos pela Krupp, que ofereciam maior alcance e precisão em comparação com os equipamentos obsoletos do Exército. A escolha de fornecedores alemães, que também produziam o Flak 18 testado na Guerra Civil Espanhola, refletia a confiança na qualidade e inovação da indústria germânica. Para os soldados que aguardavam a chegada desses armamentos, a expectativa era palpável: cada novo canhão prometia restaurar a capacidade de defesa do Brasil, especialmente no Sul, onde a proximidade com Argentina e Chile exigia prontidão. Dessa forma, em 19 de março de 1937, seria celebrado um contrato envolvendo a aquisição cem canhões de 75 mm C/26 e acessórios da Fried Krupp AG, para equipar as unidades de cavalaria que guarneciam as fronteiras do Sul e Oeste do Brasil. Eram peças de tração animal, pois existiam poucas estradas de rodagem, sendo o uso de veículos automotores predominante nos centros urbanos. O material militar seria recebido entre agosto de 1938 e fevereiro de 1939, com distribuição prevista para operação em vinte e cinco baterias de artilharia. Excetuando uma bateria que seria destinada à Escola Militar do Realengo na cidade do Rio de Janeiro, a fim realizar a instrução básica e elaboração de manuais de operação e manutenção. O restante seria distribuído em três divisões de cavalaria no Estado do Rio Grande do Sul e uma no Estado do Mato Grosso. Este primeiro movimento garantiria a retomada da capacidade mínima da artilharia de campanha do Exército Brasileiro, porém ainda havia necessidades a ser preenchidas principalmente no que tange a estruturação de um sistema básico de defesa antiaérea.  Em atendimento a estas demandas, em 25 de março de 1938, seriam assinados diversos contratos com a empresas alemães como a Daimler Benz, Kraus Maffei, Fried Krupp AG. AG Matra Werke, Bussing-NAG, Henschel & Sohn, Car Zeiss e Eletroacoustic GmBh, resultando na compra de uma quantidade substancial de material militar. O fornecedor principal nesta fase, novamente, seria a Fried Krupp AG, se destacando pelo volume de negócios celebrados com esta, assim por este motivo este acordo passaria a ser conhecido como “ O Grande Contrato Krupp¨. Nestes termos seriam adquiridos nada menos do que 1.180 peças, desde canhões de campanha de 75 mm, a até obuseiros de 150 mm, um substancial quantidade de munição e acessórios, incluindo 644 veículos automotores, 50 reboques-oficina, equipamentos para direção de tiro e de localização de som.  
O pacote global totalizaria um investimento de  8.281.383 milhões  de libras esterlinas, com um depósito inicial de 15% nesta moeda, e o restante em até 25 parcelas, em marcos de compensação (aliás, dependendo do material, a quitação deveria ser feita entre 8  e 15 parcelas).  Assim, o “Grande Contrato Krupp” previa a aquisição de material dedicado a defesa área, como equipamentos de comando e direção de tiro (Preditores) WIKOG 9SH, fabricados pela Carl Zeiss e destinados às baterias antiaéreas de 88 mm; equipamentos de localização de som ELASCOPORTHOGNOM, fabricados pela Electroacoustic GmbH, para as baterias antiaéreas, e que era utilizado previamente à adoção de radares móveis, visando direcionar a artilharia contra aviões inimigos, orientando pelo som.  O contrato contemplava também os desenhos, o ferramental e os direitos de produção de todos os componentes das munições empregadas pelas peças adquiridas, buscando tornar o país autossuficiente nisso, exceção feita à espoleta mecânica de duplo efeito, não cedida . Em setembro de 1939 a Alemanha invadiu a Polônia, iniciando a Segunda Guerra Mundial. Imediatamente, em apoio aos poloneses, a França e a Inglaterra declararam guerra contra a Alemanha. Embora o Brasil fosse neutro, suas encomendas foram prejudicadas pelo bloqueio naval imposto pela Royal Navy, impedindo que embarcações estrangeiras chegassem a portos alemães. A solução encontrada foi despachar o material a partir de Gênova, na Itália. A primeira remessa, composta de quatro canhões antiaéreos 88 mm junto com munição, foi embarcada num navio mercante de bandeira brasileira. Depois disso, e para evitar que o material completo fosse apreendido pelo bloqueio naval inglês, as remessas foram enviadas em partes, ou seja, os tubos dos canhões foram remetidos em um navio, e os reparos em outro, e em datas distintas. Com a ocupação alemã da França e a adesão da Itália ao Eixo, o bloqueio inglês se expandiu e alcançou o Mar Mediterrâneo. A comissão brasileira que recebia o material produzido em Essen, passou utilizar como local de embarque a cidade de Lisboa, em Portugal, país que permaneceu neutro até o final das hostilidades. m novembro de 1940, o mercante “Siqueira Campos” carregado de parte da encomenda, foi apresado por navios ingleses e escoltado até Gibraltar. O fato, conhecido como “Incidente do Siqueira Campos”, gerou forte reação antibritânica nos oficiais brasileiros, e o general Dutra e o chefe do Estado-Maior do Exército, general Pedro Aurélio de Góis Monteiro, solicitaram aos Estados Unidos que intercedessem na questão. O governo de Washington estava preocupado com a defesa do continente e buscava soluções para prover os países latinos com armamento, ao mesmo tempo em que enfrentava dificuldades para atender à sua própria demanda e ajudar aos que já combatiam o Eixo. Intervir a favor do Brasil iria resolver parcialmente, inclusive, a necessidade de armamento, para a defesa da costa nordestina contra uma eventual invasão alemã.  

Diante de um pedido pessoal do chefe do Estado-Maior do Departamento de Guerra dos Estados Unidos, o general George Marshall, os britânicos permitiram que a carga fosse embarcada em um mercante norte-americano, levada até Nova York e transferida para um navio brasileiro. O mesmo procedimento se deu no segundo semestre de 1941, com outra carga já a bordo do navio brasileiro “Bagé”.  Essas foram as últimas remessas que chegaram ao País, referentes ao “Grande Contrato Krupp”. Parte dos materiais, já aprovada e recebida pela comissão brasileira, estocadas em depósitos da Alemanha, França e Portugal aguardando um meio diplomático para ser remetida ao Brasil, acabaria sendo requisitada pelo Exército Alemão (Wehrmacht).Caso o Brasil tivesse recebido a totalidade da encomenda, teria se transformado, na ocasião, na nação latino-americana mais equipada em termos de artilharia. Especificamente em termos a estruturada de defesa antiaérea, seriam recebidos somente 28 peças do Flak 88 mm C/56 Modelo 18, 06 preditores Carl Zeiss WIKOG 9SH e 18 aparelhos de localização pelo som Electroacoustic GmbH ELASCOPORTHOGNOM. Embora a quantidade do material recebido fosse muito menor do que a encomendada, ainda foi possível organizar três regimentos: o 1º Grupo do 1º Regimento de Artilharia Antiaérea (1/1º RAAAé) no Rio de Janeiro - RJ, seria a primeira unidade a receber o material, em 04 de fevereiro de 1941, quando chegaram 12 peças para equipar três baterias, dois aparelhos de escuta ELASCOPORTHOGNOM, e uma bateria de projetor antiaéreo 60’’ SPERRY M-1939. Em outubro do mesmo ano, a unidade realizou o primeiro exercício de tiro real, utilizando alvos rebocáveis, bem como todos os equipamentos que equipavam as baterias, tais como telêmetros, preditores WIKOG 9SH, aparelhos para localização pelo som, projetores, dois tratores Sd.Kfz. 7. Durante 1943, o regimento foi reforçado por uma bateria de canhões automáticos antiaéreos de 37mm M-2A2, de origem norte-americana, 1º Grupo do 2º Regimento de Artilharia Antiaérea (I/2ºRAAAé) sediado na cidade de Osasco – SP, seria equipada com duas baterias de quatro 88 mm cada, e todos os equipamentos auxiliares, como dois tratores Sd.Kfz. 7 e por fim o 1°Grupo do 3° Regimento de Artilharia Antiaérea (I/3° RAAAé) sediando na cidade de Natal – RN, que receberia recebeu os oito 88mm restantes, perfazendo duas baterias e equipamentos acessórios e um trator meia-lagarta Sd.Kfz. 7. Sua missão era proteger a área de Natal (RN), tanto contra ataques aéreos à Base Aérea de Parnamirim, como para defesa do litoral. Assim, uma bateria seria estacionada ao largo daquela base aérea, apoiada por uma bateria de projetores SPERRY M-1939, e a outra foi para a região de Ponta de Santa Rita (Genipabu). Esta bateria seria acionada para um ataque real, no dia 18 de dezembro de 1942, as 7:00 horas da manhã, quando disparos foram efetuados contra a vela de um submarino não identificado, detectado a 2.600 metros da costa, não havendo registros oficiais sobre possíveis impactos. 
A partir de 1942, o Brasil, alinhado aos Aliados após a entrada na Segunda Guerra Mundial, recebeu uma quantidade significativa de material militar por meio do Lend-Lease Act. Entre os equipamentos estavam centenas de canhões antiaéreos modernos, incluindo os M2A2 de 37 mm, M3 de 76 mm e M1A3 de 90 mm, que fortaleceram a capacidade de defesa contra ameaças aéreas. Esses canhões, equipados com sistemas de mira avançados e alta cadência de tiro, representavam o ápice da tecnologia militar norte-americana, projetada para enfrentar os desafios de um conflito global. Para os artilheiros brasileiros, operar essas armas era uma tarefa de grande responsabilidade, exigindo treinamento intensivo em bases como a Vila Militar no Rio de Janeiro e adaptação a tecnologias mais sofisticadas do que os equipamentos até então em uso. No entanto, os canhões alemães Krupp Flak 88 mm C-56 Modelo 18, adquiridos em 1936 sob a liderança do General Eurico Gaspar Dutra, continuaram plenamente operacionais durante toda a Segunda Guerra Mundial. Inspirados no sucesso do Flak 18 na Guerra Civil Espanhola (1936-1939), esses canhões de 88 mm destacavam-se por sua versatilidade, precisão e potência, capazes de atingir alvos aéreos a até 14.860 metros e de atuar como armas antitanque e antibunker. Para as tripulações do 1º Regimento de Artilharia Antiaérea (1/1º RAAAé), sediado no Rio de Janeiro, o Flak 88 era um orgulho nacional, operado com perícia em exercícios que simulavam a defesa de cidades estratégicas contra ataques aéreos. Os Flak 88 mm C-56 Modelo 18 foram empregados em diversas unidades, incluindo o 1/1º RAAAé, o 1º Grupo do 2º Regimento de Artilharia Antiaérea (I/2º RAAAé) no arquipélago de Fernando de Noronha, e o 1º Grupo do 3º Regimento de Artilharia Antiaérea (I/3º RAAAé). Em Fernando de Noronha, os canhões protegiam uma posição estratégica no Atlântico, enfrentando o desafio de operar em um ambiente isolado, onde a manutenção dependia da engenhosidade dos mecânicos. Cada disparo, realizado em exercícios sob o sol tropical, reforçava o senso de dever dos artilheiros, que viam no Flak 88 um símbolo de resistência frente às ameaças da guerra. A substituição dos Flak 88 começou em novembro de 1954, quando o 1/1º RAAAé, redesignado como 1º Grupo de Canhões 90 Antiaéreos (1º G Can 90 AAé), adotou os canhões M1 (M-117) de 90 mm norte-americanos. Esses equipamentos, com sistemas de controle de tiro mais avançados, como preditores automáticos, ofereciam maior precisão contra aeronaves modernas. Em 1955, o I/2º RAAAé, transferido de Fernando de Noronha para Osasco (SP) e renomeado como 2º Grupo de Artilharia Antiaérea (2º GAAAé) “José Bonifácio e Fernando de Noronha”, com sede em Praia Grande (SP), também substituiu seus Flak 88 pelos M1. O último grupo a desativar os canhões alemães foi o I/3º RAAAé, em 1956, marcando o fim de uma era. A retirada do Flak 88 não se deu por deficiências operacionais, mas pela crescente escassez de munição de 88 mm, cuja produção havia sido descontinuada após a guerra. Em muitos aspectos, o Flak 88 superava seus equivalentes norte-americanos, especialmente em potência e versatilidade, uma qualidade que os artilheiros brasileiros admiravam. 

Em Escala.
Para recriar o Flak 88 mm C-56 Modelo 18 na escala 1:35 pertencente ao 1º Regimento de Artilharia Antiaérea (1/1º RAAAé), foi utilizado o kit da AFV Club, amplamente reconhecido por sua excepcional qualidade e detalhamento. Composto por peças em plástico, metal, borracha e componentes photo-etched (fotogravados), o modelo reproduz com precisão elementos como a base cruciforme, os pneus duplos e o cano de peça única, característicos da versão usada pelo Exército Brasileiro. Diferentemente das versões Flak 36 e 37, que incluíam um escudo blindado, o Flak 18 brasileiro não possuía essa proteção, exigindo que os modelistas descartem essa peça do kit para garantir autenticidade histórica.
O esquema de cores aplicado aos canhões Flak 88 mm C-56 Modelo 18 e outras peças de artilharia alemã no Brasil foi provavelmente inspirado no padrão da Wehrmacht no final da década de 1930, adaptado às necessidades operacionais do Exército Brasileiro. Na Alemanha, o Flak 18, amplamente utilizado na Guerra Civil Espanhola (1936-1939), era pintado em um tom monocromático de cinza-esverdeado, conhecido como Dunkelgrau (RAL 7021 ou aproximado ao Federal Standard FS 36081), que oferecia camuflagem eficaz em ambientes urbanos e rurais. No Brasil, esse padrão foi mantido ou adaptado para um verde-oliva fosco, similar ao FS 34079, usado em veículos militares brasileiros até 1982.



 Bibliografia: 

- 1º Grupo de Artilharia Antiaérea  https://www.1gaaae.eb.mil.br/2016-02-10-19-06-22 

- Flak de 88 mm 18/36/37/41 Wikipedia https://en.wikipedia.org/wiki/8.8_cm_Flak_18/36/37/41  

- Canhões antiaéreos Krupp 88 mm no EB – Helio Higuchi e Paulo R. Bastos Jr – Tecnologia & Defesa 

- O Nordeste na II Guerra Mundial - Editora Record, 1971 

- O Duplo Jogo de Vargas GAMBINI, Roberto - Editora Símbolo, 1977 

 

M-55M (CjM) 12,7 mm

História e Desenvolvimento.
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914–1918), o uso de metralhadoras automáticas tornou-se amplamente disseminado entre as forças beligerantes, transformando as dinâmicas dos combates. Essa nova realidade impulsionou o desenvolvimento de sistemas de blindagem mais robustos para veículos e aeronaves, tornando obsoletas muitas armas que utilizavam munição de fuzil. Diante desse cenário, tornou-se imperativa a criação de armamentos mais potentes para as forças de infantaria. Nesse contexto, o General John J. Pershing, comandante da Força Expedicionária Americana, solicitou ao Departamento de Armamentos do Exército dos Estados Unidos o desenvolvimento urgente de uma metralhadora de maior calibre. A especificação inicial exigia uma arma com calibre mínimo de 0,50 polegadas (12,7 mm) e velocidade de saída de pelo menos 2.700 pés por segundo (820 m/s). Em resposta, em julho de 1917, o renomado projetista John Moses Browning iniciou a reformulação da metralhadora M-1917 para operar com munições de maior calibre. Paralelamente, a Winchester Repeating Arms Company começou a desenvolver uma nova munição, inicialmente baseada em uma versão reforçada do cartucho .30-06, adaptada para uso antiveículos. Contudo, o General Pershing rejeitou a proposta inicial, insistindo em um cartucho sem aro. Em 15 de julho de 1918, o primeiro protótipo da nova metralhadora foi submetido a testes, mas os resultados foram insatisfatórios: a arma disparava menos de 500 tiros por minuto, com uma velocidade de saída de apenas 2.300 pés por segundo (700 m/s). Além disso, seu peso excessivo, dificuldade de controle e baixa cadência de tiro a tornavam inadequada para o combate antipessoal, além de insuficientemente poderosa contra blindagens leves. Enquanto o projeto avançava, em agosto de 1918, as forças aliadas capturaram um grande número de metralhadoras alemãs Mauser 1918 T-Gewehr e suas munições na Europa. A análise revelou que as munições alemãs de 13,2 mm alcançavam uma velocidade de saída de 2.700 pés por segundo (820 m/s), com projéteis de 800 gramas (53 gramas), capazes de penetrar blindagens de 25 mm a 230 metros de distância. Esses resultados levaram os projetistas norte-americanos a reavaliarem seus projetos. Como resultado, a Winchester Repeating Arms Company aprimorou sua munição de calibre .50 (12,7 mm), alcançando uma velocidade de saída de 2.750 pés por segundo (840 m/s). Apesar dos avanços, a versão final da metralhadora não foi concluída antes do armistício de 11 de novembro de 1918, que marcou o fim do conflito. Ainda assim, esses esforços estabeleceram as bases para o desenvolvimento de armamentos mais avançados nas décadas seguintes, refletindo a busca contínua por inovação em resposta às demandas do campo de batalha.

Com o término da Primeira Guerra Mundial (1914–1918), diversos projetos militares foram cancelados ou interrompidos. Contudo, devido à sua relevância estratégica, o desenvolvimento de uma nova metralhadora pesada prosseguiu, culminando, em 1921, na criação da metralhadora M-1921 Browning, refrigerada a água. Essa arma automática foi projetada para uso por forças de infantaria e como sistema de autodefesa em aeronaves, sendo testada extensivamente entre 1921 e 1937. A M-1921 apresentava um cano leve e alimentação de munição pelo lado esquerdo, o que facilitava sua operação e recarga. Uma variante mais pesada foi considerada para autodefesa em veículos terrestres. Apesar de suas qualidades, os testes revelaram limitações significativas, especialmente para uso em aeronaves e defesa antiaérea, levantando questionamentos sobre sua adequação a essas funções. Em novembro de 1926, o renomado projetista John Moses Browning faleceu, interrompendo temporariamente o projeto. No ano seguinte, a companhia S.H. Green assumiu a liderança, dedicando-se a solucionar os problemas de projeto da M-1921 para atender às exigências das Forças Armadas dos Estados Unidos. Esses esforços resultaram na metralhadora M-2 Browning, lançada em 1933 e produzida por empresas como Colt's Manufacturing Company, General Dynamics, U.S. Ordnance, Ohio Ordnance Works Inc. e FN Herstal (Fabrique Nationale). A M-2 podia ser configurada em até sete variantes especializadas, todas utilizando o calibre .50. Ao longo da década de 1930, a M-2 passou por atualizações significativas, com destaque para a substituição do sistema de refrigeração a água por um sistema a ar, tornando-a mais prática e versátil. Durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945), a M-2 Browning consolidou-se como a principal metralhadora pesada das forças aliadas, sendo amplamente empregada em infantaria, aeronaves, tanques, caminhões, veículos de reconhecimento e embarcações navais. Sua eficácia em combates antiaéreos de baixa altitude e como arma de autodefesa eO sucesso operacional da M-2 inspirou iniciativas para aumentar sua capacidade de fogo. Em 1942, o Exército dos Estados Unidos lançou uma concorrência para o desenvolvimento de um sistema de armas composto por duas ou mais metralhadoras M-2 calibre .50, acopladas a uma torre elétrica com rotação de 360º, projetada para fácil instalação e operação em veículos automotores. Empresas como Bendix Corporation, Martin Aircraft Company e W.L. Maxson Corporation apresentaram propostas, marcando um novo capítulo na evolução dessa icônica arma, que continuou a desempenhar um papel crucial no fortalecimento das capacidades militares aliadas.m veículos blindados foi notável, destacando-se pela robustez e confiabilidade. 
Dentre as propostas submetidas ao Exército dos Estados Unidos (US Army), a da W.L. Maxson Corporation foi escolhida, resultando no desenvolvimento do sistema M-33. Projetado para ser instalado inicialmente nos veículos meia-lagarta White M-2, o M-33 proporcionava às unidades de infantaria uma defesa antiaérea autopropulsada de baixa altitude. Curiosamente, a Maxson não obteve o contrato de produção, que foi atribuído às empresas Kimberly-Clark e Landers, Frary & Clark Company. Contudo, a Maxson ficou responsável pela fabricação dos inversores de velocidade variável para as torres. Entre 1942 e 1943, foram entregues 2.160 sistemas M-33 ao Exército dos Estados Unidos (US Army). O desempenho operacional do M-33, integrado aos veículos meia-lagarta M-13 Multiple Gun Motor Carriage (designação dos White M-2 equipados com a torre), revelou-se insuficiente. A concentração de fogo não atendia às necessidades de saturação do espaço aéreo de baixa altitude, evidenciando a necessidade de melhorias. Liderada pelo engenheiro William Leslie Maxson, a equipe da W.L. Maxson Corporation retornou ao desenvolvimento, criando o sistema M-45 Quadmount. O M-45 Quadmount foi um avanço significativo, equipado com quatro metralhadoras M-2 Browning calibre .50, montadas em uma torre elétrica com rotação de 360º. Operado por dois carregadores e um artilheiro, o sistema permitia elevação angular de -10 a +90 graus e era alimentado por duas baterias recarregáveis de 6 volts. Para evitar superaquecimento, a prática operacional alternava disparos entre os pares superior e inferior de metralhadoras, permitindo que um par resfriasse enquanto o outro era utilizado. Cada arma possuía um conjunto de armazenamento com 200 munições, garantindo maior autonomia em combate. Os protótipos do M-45 foram submetidos a testes rigorosos, demonstrando excelente desempenho. O quarteto de metralhadoras proporcionava o poder de fogo desejado, resultando na aprovação para produção, novamente conduzida pelas empresas Kimberly-Clark e Landers, Frary & Clark Company. O sistema teve seu batismo de fogo durante a Operação Husky, a Invasão da Sicília, em julho de 1943. Ao longo da campanha no teatro europeu, o M-45 Quadmount consolidou-se como uma das principais armas dos batalhões de artilharia antiaérea, ao lado do canhão de 37 mm. Os batalhões equipados com o M-45 ofereciam uma defesa aérea indispensável para unidades maiores, especialmente artilharia de campanha. Sua capacidade de dissuasão contra ataques de baixa altitude, como as corridas de strafing por aeronaves inimigas, era notável. O quarteto de metralhadoras M2HB de "cano pesado" podia ser ajustado para convergir em um único ponto a distâncias variáveis, proporcionando precisão e flexibilidade em combate. A combinação de potência, mobilidade e versatilidade fez do M-45 Quadmount um marco na história da artilharia antiaérea, reforçando a proteção das forças aliadas durante a Segunda Guerra Mundial.

Durante a Segunda Guerra Mundial (1939–1945), o sistema M-45 Quadmount destacou-se tanto como arma antiaérea quanto terrestre, especialmente durante a Batalha do Bulge (1944–1945). Apesar da supremacia aérea alcançada pelos Aliados após a invasão da Normandia, em junho de 1944, os ataques alemães em baixa altitude continuavam a representar uma ameaça. Montados nos veículos meia-lagarta M13 e M15 Multiple Gun Motor Carriage, os M-45 ofereceram proteção eficaz às forças terrestres aliadas, garantindo segurança contra investidas aéreas inimigas. A partir do final de 1944, a Marinha dos Estados Unidos (US Navy) também empregou o M-45 em resposta aos ataques suicidas “Kamikaze” da Marinha Imperial Japonesa. Porta-aviões da classe Essex, como o CV-16 Lexington, receberam seis conjuntos do M-45 para testes operacionais a partir de maio de 1945. Contudo, o sistema mostrou-se ineficaz contra as altas velocidades das aeronaves japonesas de mergulho, limitando seu impacto nesse contexto. Na Segunda Guerra Mundial, o M-45 foi integrado a dois sistemas principais: o M-16 Multiple Gun Motor Carriage, montado nos veículos meia-lagarta White M-2 e M-5, e o M-51 Multiple Machine Gun Carriage, acoplado ao trailer M-17. Quando instalado no reboque M-20, o conjunto foi designado M-55 Machine Gun Trailer Mount. No entanto, o M-55 não concluiu os testes antes do fim das hostilidades na Europa, em maio de 1945. No teatro do Pacífico, os M-51 foram gradualmente substituídos pelo M-55 ao final do conflito. De forma experimental, em 1942, o M-45 foi testado em um tanque leve M-3 Stuart, substituindo a torre original de canhão de 37 mm. Esse projeto, porém, foi descontinuado devido à priorização de outras iniciativas militares. Durante a Guerra da Coreia (1950–1953), o M-55 Machine Gun Trailer Mount e o M-16 Multiple Gun Motor Carriage foram amplamente utilizados, especialmente em combates terrestres. As lições aprendidas nesse conflito levaram à conversão de mais de 1.200 veículos meia-lagarta White M-3 para a versão M-16A1, equipada com a torre M-45. Esses veículos eram identificados pela ausência de blindagem rebatível e da porta traseira no compartimento da tripulação, frequentemente equipados com um para-choque dianteiro de rolo em vez do guincho padrão dos M-16. Em 1954, cerca de 700 unidades do M-16A1 receberam modificações adicionais, incluindo a reinstalação da porta traseira e a fixação da blindagem dobrável na posição elevada. Essa variante foi designada M-16A2 Multiple Gun Motor Carriage, aprimorando a funcionalidade e a proteção da tripulação. O M-45 Quadmount demonstrou versatilidade e robustez em diversos cenários de combate, tanto na Segunda Guerra Mundial quanto na Guerra da Coreia. Sua capacidade de adaptação a diferentes plataformas e papéis – desde a defesa antiaérea até o apoio terrestre – consolidou sua importância nas operações militares aliadas. As evoluções e modificações aplicadas ao longo dos anos refletem o compromisso contínuo em aprimorar as capacidades defensivas das forças armadas, deixando um legado duradouro na história da artilharia.
Durante a Guerra da Coreia (1950–1953), tornou-se evidente que o sistema M-45 Quadmount era ineficaz contra os modernos aviões a jato, característicos da “Era do Jato”. Como resultado, seu uso foi redirecionado para o combate terrestre, com ênfase em alvos de infantaria no período pós-guerra. Nesse contexto, pelo menos sessenta conjuntos do M-45 foram cedidos à França, destinados ao Corpo Expedicionário do Extremo Oriente da União Francesa. Montados em caminhões militares, esses sistemas desempenharam um papel significativo na Batalha de Dien Bien Phu, no Vietnã, entre 13 de março e 7 de maio de 1954, enfrentando as forças revolucionárias comunistas do Viet Minh.s, com pelo menos seis M-55 Machine Gun Trailer Mount em serviço no Exército do Paraguai.  A partir de meados da década de 1960, diversos conjuntos do M-55 Machine Gun Trailer Mount foram revisados e modernizados. As atualizações incluíram a instalação de geradores elétricos mais potentes, permitindo sua adaptação para montagem na traseira de caminhões Reo M-35 e Diamond T M-54. Esses sistemas modernizados foram empregados durante a campanha norte-americana no Vietnã, demonstrando sua versatilidade em cenários de combate terrestre. Entre 1943 e 1944, foram produzidos 13.070 conjuntos M-45 Quadmount, muitos dos quais foram armazenados como reserva estratégica na década de 1950. Posteriormente, esses sistemas foram incorporados a programas de assistência militar dos Estados Unidos, sendo fornecidos a nações alinhadas com os objetivos geopolíticos norte-americanos, incluindo França, Brasil, Colômbia, Coreia do Sul, Argentina, Venezuela, Cuba, Vietnã do Sul, Holanda, Bélgica, Taiwan, Bolívia, Israel e Paquistão. Essa distribuição reforçou a cooperação militar com aliados estratégicos em diferentes regiões do mundo. Atualmente, o M-45 Quadmount permanece em serviço em algumas forças armadas. No Exército da Colômbia, o sistema é utilizado em veículos blindados sobre rodas Ford M-8 Greyhound repotencializados. Já no Exército do Paraguai, pelo menos seis unidades do M-55 Machine Gun Trailer Mount continuam operacionais, evidenciando a longevidade e a adaptabilidade desses sistemas em contextos modernos.

Emprego no Exército Brasileiro.
A estruturação do sistema de defesa antiaéreo no Brasil tem início no dia 04 de outubro 1940 com a criação do 1º Regimento de Artilharia Antiaérea (I/1º RAAAé) na cidade do Rio de Janeiro, se confundindo com a evolução da defesa antiaérea no país. Esta organização militar seria estabelecida com o principal objetivo de operacionalizar o emprego dos canhões alemães Flak Krupp 88 mm C/56 Modelo 18 e seus respectivos equipamentos de comando e direção de tiro (preditores) WIKOG 9SH fabricados pela Carl Zeiss e sistemas de localização de som Elascoporthognom, pertencentes ao “Grande Contrato Krupp” firmado no ano de 1938. O 1º Grupo do 1º Regimento de Artilharia Antiaérea (1/1º RAAAé) iniciaria sua operação de fato e direito em fevereiro de 1941, quando foram efetivamente recebidos seus primeiros equipamentos de origem alemã.  Neste momento o intensificar das operações alemães no teatro europeu e no norte da África, levariam a o governo dos Estados Unidos a passar a considerar com extrema preocupação uma possível ameaça de invasão no continente americano por parte das forças do Eixo (Alemanha – Itália – Japão). Quando a França capitulou em junho de 1940, o perigo nazista a América se tornaria claro se este país estabelecer bases operacionais nas ilhas Canárias, Dacar e outras colônias francesas. Neste contexto o Brasil seria o local mais provável de invasão ao continente pelas potencias do Eixo, principalmente devido a sua proximidade com o continente africano que neste momento também passava a figurar nos planos de expansão territorial do governo alemão. Além disso, as conquistas japonesas no sudeste asiático e no Pacífico Sul tornavam o Brasil o principal fornecedor de látex para os aliados, matéria prima para a produção de borracha, um item de extrema importância na indústria de guerra. Além destas possíveis ameaças, geograficamente o litoral do mais se mostrava estratégico para o estabelecimento de bases aéreas e operação de portos na região nordeste, isto se dava, pois, esta região representava para translado aéreo, o ponto mais próximo entre os continentes americano e africano. Assim a costa brasileira seria fundamental no envio de tropas, veículos, suprimentos e aeronaves para emprego nos teatros de operações europeu e norte africano. Este cenário demandaria logo sem seguida a um movimento de maior aproximação política e econômica entre o Brasil e os Estados Unidos, resultando em uma série de investimentos e acordo de colaboração. Entre estes estava a adesão do país ao programa de ajuda militar denominado como Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos), que tinha como principal objetivo promover a modernização das Forças Armadas Brasileiras, proporcionando ao pais, uma   linha inicial de crédito ao país da ordem de US$ 100 milhões de dólares, para a aquisição de material bélico, proporcionando ao país acesso a modernos armamentos, aeronaves, veículos blindados, carros de combate em material de artilharia de campo e antiaérea.  

Como parte do programa Leand & Lease Bill Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos), o Exército Brasileiro foi contemplado com um conjunto significativo de equipamentos de artilharia, fortalecendo sua capacidade defensiva durante a Segunda Guerra Mundial. No âmbito da artilharia de campanha, foram recebidos canhões anticarro e antitanque M-1 de 57 mm e M-3 de 37 mm, além de obuseiros de campo M-1 Pack Howitzer de 75 mm, M-2 de 105 mm e M-1 de 155 mm. Para a defesa antiaérea, o Brasil adquiriu um número limitado, porém crucial, de canhões M-2A2 AA de 37 mm, M-3 AA de 76 mm e M-1A3 AA de 90 mm. Embora a quantidade de canhões antiaéreos recebidos fosse inferior às necessidades nacionais, sua chegada foi extremamente bem-vinda, preenchendo a lacuna deixada pelo recebimento de apenas 28 unidades dos canhões alemães Flak Krupp 88 mm C/56 Modelo 18, adquiridos anteriormente. Esses novos equipamentos permitiram equipar integralmente os 1º, 2º e 3º Regimentos de Artilharia Antiaérea (RAAAé), que foram estrategicamente posicionados para proteger pontos vitais do litoral brasileiro, incluindo uma bateria operacional na ilha de Fernando de Noronha. A defesa antiaérea de média altitude foi estruturada em torno dos canhões M-2A2 AA de 37 mm, cujas unidades operadoras passaram a ser designadas como Grupos de Artilharia Antiaérea 40 mm (Gcan40 AAe). Para a proteção contra ameaças em baixa altitude, o Brasil contava com algumas dezenas de canhões duplos Oerlikon de 20 mm, complementados por metralhadoras dinamarquesas Madsen de 30 mm e centenas de metralhadoras norte-americanas M-50 Browning M-1921 e Browning M-2 calibre .50. Estas últimas, frequentemente montadas em veículos blindados, desempenhavam funções de autodefesa. Embora o sistema M-55 Machine Gun Trailer Mount fizesse parte do portfólio do programa Leand & Lease Bill Act, ele não foi incluído no pacote negociado com o Brasil. Essa decisão pode ser atribuída à avaliação de que o risco de ataques aéreos de baixa altitude no território continental brasileiro era mínimo. Da mesma forma, em 1944, esses sistemas antiaéreos não foram fornecidos à Força Expedicionária Brasileira (FEB) que atuava no front italiano. Nesse período, a ameaça de ataques aéreos terrestres pela Luftwaffe (Força Aérea Alemã) já havia diminuído significativamente, tornando desnecessário o uso desses equipamentos no teatro de operações italiano. A incorporação desses armamentos, embora limitada em quantidade, representou um avanço significativo na modernização das Forças Armadas Brasileiras. A alocação estratégica dos regimentos de artilharia antiaérea e o uso de equipamentos modernos fortaleceram a capacidade de defesa do litoral brasileiro, protegendo áreas de importância estratégica durante a Segunda Guerra Mundial.
Logo após o período pós-guerra, por volta de meados do ano de 1948, seriam recebidos no país os primeiros conjuntos de metralhadores antiaéreas M-55 Machine Gun Trailer Mount, com pelo menos vinte destas peças usadas (mas em bom estado) sendo cedidas pelo governo norte-americano. Estes passariam a dotar os Grupos de Artilharia Antiaérea 40 mm (Gcan40 AAe). Em 1952, seria assinado na capital federal no Rio de Janeiro, o Acordo Militar Brasil-Estados Unidos, que concederia as Forças Armadas Brasileiras acesso ao Programa de Assistência Militar (MAP - Military Assistance Program), facilitando e simplificando o recebimento de material militar norte-americano. A partir deste momento seriam fornecidos ao país, uma grande quantidade de veículos e armamentos, entre eles setenta conjuntos do sistema de metralhadoras antiaéreas M-55 Machine Gun Trailer Mount. Neste momento iniciara-se o emprego deste sistema de armas como defesa de ponto para as tropas de infantaria com este equipamento passando a operar embarcado na traseira de caminhões GMC CCKW 352 B2 6X6, assim pela primeira vez o Exército Brasileiro passaria a contar para suas forças de infantaria com um sistema de proteção mínimo contra a ameaças de ataque aéreo a baixa altitude. A incorporação dos sistemas M-55 e a adesão ao Programa de Assistência Militar representaram marcos importantes na modernização da defesa antiaérea brasileira no período pós-guerra. A adaptação desses equipamentos para uso em caminhões e os estudos para conversão de veículos blindados demonstraram o compromisso do Exército Brasileiro em aprimorar sua capacidade de resposta a ameaças aéreas e terrestres. Uma nova possível aplicação para os M-55 no Exército surgiria no ano de 1969, quando uma delegação israelense esteve em visita ao 1º Batalhão de Carros de Combate Leve (BCCL), o objetivo desta comitiva era o de buscar no mercado internacional a aquisição de veículos blindados antigos, visando assim transformá-los em veículos especializados ou de serviço. Durante esta reunião o comandante da unidade o Coronel Oscar de Abreu Paiva demonstraria grande interesse neste processo, tendo em vista os inúmeros comentários positivos preferidos pelos militares israelenses sobre estas conversões. Com base neste conceito, seriam conduzidos estudos visando a conversão de uma parcela da frota de carros de combate leve M-3 e M-3A1 Stuart em veículos antiaéreos autopropulsados, a exemplo de estudos similares conduzidos nos Estados Unidos durante a Segunda Guerra Mundial, para o desenvolvimento de uma plataforma semelhante.

Após ser elaborado o projeto conceitual, seria escolhido o carro M-3 Stuart “EB11-487” como veículo protótipo, tendo este sua torre do canho de 37 mm removida, recebendo em seu lugar, um  sistema de reparo de metralhadoras antiaéreas quadruplo calibre .50 do modelo M-45 Quadmount que seria fornecida em regime de comodato pelo 5º Grupamento de Artilharia Antiaérea 90mm (Gcan90 AAe).Todo este processo de conversão seria executado nas oficinas do 1º Batalhão de Carros de Combate Leve (BCCL), contando com o apoio da equipe técnica do Parque Regional de Motomecanização da Terceira Região Militar de Santa Maria (PqRMM/3). Esta viatura seria submetida a testes e campo, com os seus resultados se mostrando extremamente positivos do funcionamento dos sistemas elétricos e mecânicos, validando assim seu conceito técnico operacional desta conversão, evoluindo então para os testes de tiro real. Infelizmente não se sabe por quais motivos, o comando do Exército Brasileiro, não demonstraria neste momento o devido interesse, levando assim ao cancelamento do projeto, sendo o veículo restaurado a sua condição original e seu conjunto M-45 Quadmount sendo devolvido ao seu grupamento de origem. Em fins da década de 1970, apesar da idade e relativa ineficiência contra aeronaves de alta performance, o sistema M-55 Machine Gun Trailer Mount ainda podia ser empregado com sucesso contra aeronaves de asas rotativas e alvos de infantaria, este cenário levaria o comando do Exército Brasileiro a estudar um possível processo de repotenciamento deste sistema visando assim estender a vida útil destes sistemas de armas. Uma proposta seria apresentada pela empresa carioca Lysam Indústria e Comércio de Máquinas e Equipamentos Ltda, envolvendo além de uma completa revisão a troca de seu sistema elétrico original, adotando um modelo mais moderno carregado por um motor a gasolina Montgomery M-226 ou M-252 de 5 cv ou 6 cv (3,73 ou 4,47kW). A proposta agradaria os militares do Exército Brasileiro, sendo contratada a produção de um protótipo para fins de avaliação com este sendo concluído em meados do ano seguinte. Embora mantivesse capacidades e desempenho semelhantes por manter como seu armamento orgânico as quatro metralhadoras Browning M-2 calibre .50, sua velocidade de travessia seria melhorada, com sua capacidade de elevação aumentando para mais de 90° por segundo, para assim poder engajar alvos de travessia rápida. 
Na década de 1970, o Exército Brasileiro intensificava o desenvolvimento de uma família de veículos blindados, com destaque para os carros de combate leve MB-1 (X-1A Pioneiro e X1-A2 Carcará). Nesse contexto, surgiu a iniciativa de criar uma viatura antiaérea autopropulsada para equipar as unidades de Artilharia Antiaérea das Brigadas Blindadas. O projeto, designado M.01.15, foi conduzido pelo Centro de Tecnologia do Exército (CETEX) em parceria com a empresa Bernardini S/A. Para o protótipo, foi selecionado um carro de combate leve X-1A Pioneiro, que passou por modificações mecânicas para integrar o conjunto quádruplo de metralhadoras M-55M. Concluída, a viatura recebeu a designação de Viatura de Combate Antiaérea XM3D1 (VBC AAe) e foi submetida a um rigoroso programa de testes, com o objetivo de avaliar sua eficácia operacional. Paralelamente, foi planejada a construção de um segundo protótipo, sob o projeto M.01.27, que seria equipado com um canhão Bofors L/60 de 40 mm e receberia a designação XM3E1. No entanto, essa configuração foi cancelada, e a viatura acabou sendo equipada com o mesmo conjunto M-55M do protótipo anterior. Os testes realizados com a XM3D1 revelaram limitações significativas, especialmente a baixa cadência de fogo e o alcance restrito das metralhadoras Browning M-2 calibre .50. Esses fatores foram determinantes para a decisão de não adotar a viatura, levando ao cancelamento definitivo do projeto M.01.15. Apesar do esforço investido, as restrições técnicas inviabilizaram a integração da XM3D1 às operações das Brigadas Blindadas. Enquanto o projeto da viatura antiaérea autopropulsada não prosperou, os conjuntos de metralhadoras M-55M, montados em caminhões Ford-Engesa F-600, continuaram em operação junto aos Grupos de Artilharia Antiaérea (GAAAe). Esses sistemas permaneceram em serviço até o início da década de 1990, quando foram gradualmente desativados. As metralhadoras Browning M-2 e outros componentes foram sucateados, marcando o fim de uma era para esse equipamento no Exército Brasileiro. Atualmente, algumas unidades do sistema M-55M foram preservadas como parte do patrimônio histórico militar brasileiro. Um exemplo notável encontra-se no acervo do Museu do Comando Militar do Sul, localizado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Essas relíquias representam não apenas a história da artilharia antiaérea brasileira, mas também o empenho do Exército em buscar soluções inovadoras para fortalecer sua capacidade defensiva, mesmo diante de desafios técnicos e logísticos.

Em Escala.
Para representarmos o sistema de metralhadoras antiaéreas M-55 Machine Gun Trailer Mount , fizemos uso do excelente kit na escala 1/35 produzido pela Dragon Models. Como optamos pela versão original não modernizada, não é necessário proceder nenhuma mudança, com o modelo podendo ser montado direto da caixa. Usamos decais originais fornecidos com o modelo.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático do Exército dos Estados Unidos (US Army) durante a Segunda Guerra Mundial com os quais este sistema de defesa antiaérea foram recebidos a partir de 1948. Durante toda sua carreira no Brasil os M-55 Machine Gun Trailer Mount fizeram uso desde esquema de pintura.



Bibliografia :
- O Stuart no Brasil – Helio Higuchi, Reginaldo Bachi e Paulo R. Bastos Jr.
- M-45 Quadmount - https://en.wikipedia.org/wiki/M45_Quadmount 
- M2- Browning - https://en.wikipedia.org/wiki/M2_Browning
- Blindados no Brasil Volume I, por Expedito Carlos S. Bastos

Willys Série CJ (VTrOp-VTNE)

História e Desenvolvimento.
No final da década de 1920, o comando do Exército dos Estados Unidos (US Army) intensificou esforços para transformar sua estrutura operacional, buscando acelerar a transição de uma força terrestre predominantemente hipomóvel, dependente de tração animal, para uma força mecanizada, capaz de atender às demandas de um cenário bélico moderno. Esse processo foi impulsionado pelos avanços tecnológicos da pujante indústria automotiva norte-americana, que oferecia soluções inovadoras para mobilidade e logística militar. O programa de mecanização abrangia o desenvolvimento de uma ampla gama de veículos, incluindo caminhões de carga, transportes de pessoal e, de forma prioritária, um veículo utilitário leve com tração integral 4x4. Este veículo deveria operar em ambientes fora de estrada, superar obstáculos com facilidade e transportar até quatro soldados totalmente equipados, garantindo agilidade e versatilidade em operações táticas.  Contudo, restrições orçamentárias impostas pela Grande Depressão adiaram essa fase, interrompendo temporariamente o progresso do programa. O projeto foi retomado no final de 1936, quando o cenário econômico começou a se estabilizar e o Exército priorizou novamente a modernização. Após uma concorrência aberta, a Bantam Car Company, sediada na Pensilvânia, foi selecionada para desenvolver e produzir o lote pré-série. No final da década de 1930, a Bantam Car Company, sediada em Butler, Pensilvânia, produziu os primeiros setenta veículos utilitários leves com tração nas quatro rodas, que dariam origem à icônica família Jeep, reconhecida como uma das mais célebres linhas de veículos militares da história. Esses primeiros modelos, utilizados inicialmente pelas forças de infantaria do Exército dos Estados Unidos, destacaram-se por sua excepcional mobilidade, desempenhando com êxito uma ampla variedade de missões operacionais. Esse desempenho motivou a decisão de adotar o veículo em larga escala nas Forças Armadas norte-americanas, levando à abertura de um processo licitatório para o desenvolvimento de uma versão aprimorada, destinada à produção em grande quantidade. Em 1941, após um processo de avaliação e contratação marcado por debates, a produção do Jeep foi iniciada nas fábricas da American Bantam Company, Ford Motor Company e Willys-Overland Company. As primeiras unidades começaram a ser entregues ao Exército a partir de março de 1942. Os soldados, encantados com a versatilidade do veículo, passaram a chamá-lo de “GP” (sigla para General Purpose, ou “Propósito Geral”), cuja pronúncia em inglês lembrava a palavra “jeep”. Curiosamente, o termo “jeep” também evocava um personagem querido da cultura popular: Eugene, o animal de estimação de Olívia Palito, namorada do marinheiro Popeye, nos quadrinhos e desenhos animados dos anos 1930. Eugene era conhecido por seus poderes extraordinários, como superforça e a habilidade de caminhar por paredes e tetos. Inspirados por essa associação, os militares começaram a chamar seus veículos de “Jeep”, uma alusão às suas capacidades impressionantes. A expressão “Hey, he’s a real Jeep!” (“Ei, ele é um verdadeiro Jeep!”) tornou-se comum para descrever pessoas com habilidades físicas notáveis, consolidando o nome como um símbolo de robustez e versatilidade. Durante toda a Segunda Guerra Mundial, a produção desta versátil família de utilitários leves superaria mais de meio milhão de carros, destes 363.000 produzidas pela Willys Overland Co. e cerca de 280.000 entregues pela Ford Motors Company. O modelo seria ainda um dos principais expoentes do Programa Lend & Lease Act Bill (Lei de Empréstimos e Arrendamentos), com mais de 51.000 unidades fornecidas somente para a União Soviética, além de milhares mais para os países aliados.  

O término da Segunda Guerra Mundial em agosto de 1945, levaria a uma desmobilização quase que imediata dos esforços de produção industrial militar dos Estados Unidos. Desta maneira, todas as indústrias de defesa norte-americanas, seriam profundamente afetadas por cancelamentos nos contratos de produção. Entre estas empresas estava a Willys Overland Company, que neste momento dedicava quase que a totalidade das linhas de produção e ferramental para a produção da família Jeep. No final da década de 1940, a Willys-Overland Company, reconhecendo a necessidade de reorientar estrategicamente seu portfólio automotivo, voltou suas atenções para o mercado civil. Essa mudança foi impulsionada por uma significativa vantagem de marketing: a Ford Motor Company, sua concorrente, estava judicialmente impedida de utilizar a marca “Jeep”. Assim, a empresa consolidou sua posição ao capitalizar a popularidade do nome que se tornara sinônimo de robustez e versatilidade. Assim a Willys-Overland lançou as bases para a versão civil de seu icônico veículo militar, o Willys MB, dando origem ao Willys CJ-2 (Civil Jeep). Foram produzidos quarenta exemplares pré-série, mas a fabricação em escala industrial teve início apenas em julho de 1945, com o modelo aprimorado CJ-2A. Embora baseado no design do Willys MB, o CJ-2A foi adaptado para o uso civil, com modificações significativas na carroceria e na construção. Equipado com o confiável motor Willys Go-Devil de quatro cilindros, o modelo apresentava carburador e sistema de ignição distintos, além de eliminar características exclusivamente militares, garantindo maior apelo ao público não militar. Em 1949, a montadora introduziu o CJ-3A, que permaneceu em produção até 1953, quando foi substituído pelo CJ-3B. O CJ-3A era movido pelo motor L-134 Go-Devil de 60 cavalos, combinado com uma transmissão T-90, caixa de transferência Dana 18, eixo dianteiro Dana 25 e eixo traseiro Dana 41 ou 44. Esse modelo consolidou a reputação da Willys no mercado civil, oferecendo durabilidade e desempenho em diversas condições. Paralelamente, em 1950, a Willys-Overland lançou o M-38 (ou MC), uma versão militar evoluída baseada no CJ-3A, projetada para atender às demandas específicas das Forças Armadas.  A suspensão e o chassi do M-38 eram mais robustos que os do CJ-3A, com um eixo traseiro totalmente flutuante, faróis salientes protegidos por grades, luzes blackout e uma saída de ar na base do para-brisa. O M-38 foi projetado para máxima funcionalidade em operações militares.  A suspensão e o chassi do M-38 eram mais robustos que os do CJ-3A, com um eixo traseiro totalmente flutuante, faróis salientes protegidos por grades, luzes blackout e uma saída de ar na base do para-brisa. O M-38 foi projetado para máxima funcionalidade em operações militares. Não possuía degrau externo, o que aumentava a distância do solo e facilitava o embarque. Entre os acessórios disponíveis estavam guinchos hidráulicos Ramsey, equipamentos para travessia de rios e sistemas de respiração especiais para operações em terrenos alagados. Algumas unidades raras do M-38 foram equipadas com lâminas hidráulicas para nivelamento leve de solo, enquanto modelos destinados a climas extremos de inverno incluíam uma carroceria metálica com capota rígida. O painel de instrumentos, mantendo a simplicidade característica dos modelos Jeep, agrupava os instrumentos no centro, com iluminação externa, placas de dados à direita e um porta-luvas na extremidade.
No imediato pós-Segunda Guerra Mundial, o Brasil testemunhou os primeiros esforços para a fabricação local dos utilitários jipes, veículos que já haviam conquistado renome global por sua robustez e versatilidade. Em um contexto de reconstrução econômica, a Fábrica Nacional de Motores (FNM) avaliou, em 1946, a possibilidade de produzir esses veículos, buscando aproveitar suas amplas instalações industriais, que, à época, permaneciam subutilizadas. Embora essa iniciativa não tenha avançado, ela marcou o início de um interesse crescente pela produção automotiva no país. Em 1947, a concessionária Gastal Veículos Ltda., sediada no Rio de Janeiro, deu um passo significativo ao iniciar a importação de jipes no regime SKD (Semi Knocked Down, ou parcialmente desmontados). Esses veículos eram montados nas oficinas da empresa, localizadas no bairro da Tijuca. Até 1950, mais de duzentos jipes haviam sido montados, o que levou à transferência da linha de montagem para novas instalações em Nova Iguaçu, também no Rio de Janeiro. Essa operação continuou até 1954, quando a Willys-Overland do Brasil S/A assumiu a liderança na produção nacional desses veículos. Em 1954, a montadora inaugurou sua primeira fábrica no país, localizada em São Bernardo do Campo, São Paulo. A planta, concluída no segundo semestre de 1953, enfrentou atrasos em sua ativação devido a entraves burocráticos relacionados à importação de componentes no regime CKD (Completely Knocked Down, ou totalmente desmontados). Inicialmente, a produção utilizava 100% de peças importadas dos Estados Unidos, mas, uma vez iniciada, em 1954, a fábrica rapidamente ampliou sua capacidade. Em setembro de 1955, a Willys-Overland lançou no mercado brasileiro uma versão modernizada do Jeep, inspirada no modelo civil M-38, conhecido como CJ-5 e rebatizado como “Universal”. Esse novo modelo trouxe inovações significativas, como uma carroceria mais contemporânea, para-brisa ampliado, bancos mais confortáveis, chassi reforçado, suspensão aprimorada e um motor de quatro cilindros com 75 cavalos de potência. Essas melhorias tornaram o Jeep Universal não apenas um veículo funcional, mas também um símbolo de inovação e adaptação às necessidades do consumidor brasileiro. Entre fevereiro e dezembro de 1955, cerca de seis mil veículos foram montados, incorporando, a partir desse período, 30% de componentes nacionais, um marco na nacionalização da indústria automotiva. A Willys-Overland foi a segunda empresa estrangeira, após a General Motors, a responder ao convite do CEIMA (Comissão Executiva da Indústria Mecânica Automotiva), órgão precursor do GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística), para estabelecer a produção de veículos no Brasil. Esse convite visava atrair grandes fabricantes globais, fortalecendo a indústria nacional. A construção da fábrica foi financiada majoritariamente por recursos brasileiros, provenientes de um fundo reunido por um grupo de empresários locais e por subscrição popular.

A participação da Willys-Overland Company dos Estados Unidos na formação da Willys-Overland do Brasil limitou-se a 30% do capital, integralizado por meio de matrizes e máquinas usadas importadas. Esse modelo de financiamento destacou o protagonismo e o espírito empreendedor dos brasileiros, que, por meio de recursos próprios e subscrição popular, demonstraram um firme compromisso com o desenvolvimento da indústria automotiva nacional. A iniciativa refletiu a determinação de construir uma base industrial robusta, capaz de atender às necessidades de um país em transformação. O Jeep, com seu caráter essencialmente utilitário, foi projetado para atender às demandas de um Brasil predominantemente rural, onde estradas pavimentadas eram escassas. Equipado com uma tomada de força para acoplamento de implementos agrícolas e de construção, o veículo se destacava por sua tração integral 4x4 temporária, acionada por uma caixa de transferência de duas velocidades. O sistema, operado por duas alavancas no assoalho — uma para engatar a tração dianteira auxiliar e outra para a marcha reduzida —, conferia ao Jeep uma capacidade excepcional de enfrentar terrenos desafiadores. Essa versatilidade foi um dos pilares de seu sucesso comercial, conquistando agricultores, construtores e outros profissionais que dependiam de um veículo confiável e robusto. Em alinhamento com as diretrizes do GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística), a Willys-Overland do Brasil ampliou sua fábrica em São Bernardo do Campo, São Paulo, em agosto de 1956. A expansão incluiu a instalação de uma linha de usinagem e montagem de motores, inaugurada em março de 1958. Inicialmente, o motor Hurricane, importado dos Estados Unidos, foi substituído pelo Willys BF-161, também de origem norte-americana. No mesmo ano, a empresa alcançou um marco significativo ao produzir o primeiro motor Willys brasileiro, com seu bloco fundido em uma nova planta industrial em Taubaté, São Paulo. Esse motor a gasolina, de seis cilindros em V, com 2,6 litros e 90 cavalos de potência, apresentava válvulas de admissão no cabeçote e de escapamento no bloco, entregando um torque máximo de 18,67 kgfm a 2.000 rpm. A combinação de desempenho robusto e consumo moderado consolidou sua aceitação no mercado. A Willys-Overland continuou a investir na nacionalização de componentes, expandindo seu parque industrial com uma linha de prensas e uma unidade dedicada à produção de eixos e transmissões. Até o final da década de 1950, a empresa alcançou um índice de nacionalização de aproximadamente 40% (e quase 50% em peso bruto), um feito notável que reforçou sua posição como líder na indústria automotiva latino-americana.
No cenário rural do Brasil da década de 1950, caracterizado pela escassez de estradas pavimentadas, o Jeep encontrou um mercado excepcionalmente receptivo, onde sua robustez e capacidade off-road se destacavam. As vendas do modelo refletiram esse sucesso: 9.139 unidades em 1957, 13.177 em 1958 e 15.721 em 1959. Junto com seus derivados, como a perua Rural, o Jeep representava 15% da produção total de veículos no Brasil, englobando automóveis, caminhões e ônibus. Esse desempenho consolidou a Willys-Overland do Brasil como a maior indústria automobilística da América Latina, posição que manteve até 1961, quando foi superada pela Volkswagen do Brasil S/A. Nesse período de ascensão, a Willys-Overland do Brasil lançou o Jeep Universal 101, nomeado em referência à distância de 101 polegadas (2,56 metros) entre os eixos. Inspirado no modelo norte-americano CJ-6, o Universal 101 oferecia opções de carroceria com duas ou quatro portas, conquistando o carinhoso apelido de “Bernardão” entre os brasileiros. Diferenciando-se do CJ-5, o modelo incorporava rodas de 15 polegadas com calotas da perua Rural e estava disponível com tração traseira 4x2, além da tradicional tração integral 4x4. Essas características ampliavam sua versatilidade, atendendo tanto às necessidades rurais quanto urbanas. Em 1960, a Willys-Overland apresentou propostas às Forças Armadas Brasileiras, oferecendo versões militarizadas do Jeep para substituir os obsoletos Ford GPW, Willys MB e M-38A1. As atualizações continuaram ao longo da década: em 1965, o modelo passou a contar com uma caixa de mudanças de três marchas com primeira sincronizada; em 1966, incorporou uma roda livre automática e substituiu o dínamo por um alternador no sistema elétrico. Essas inovações reforçaram a confiabilidade e o desempenho do Jeep, atendendo às crescentes demandas do mercado. A popularidade do Jeep impulsionou a Willys-Overland a expandir suas operações. Em resposta à alta demanda, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, a empresa inaugurou uma nova planta industrial em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, dedicada à produção de veículos e peças de reposição. O material publicitário da época celebrava o Jeep como o “cavalo de ferro”, um símbolo de resistência capaz de enfrentar as adversidades de um Brasil em desenvolvimento, conquistando o imaginário popular com sua robustez e espírito aventureiro. Em outubro de 1967, a Ford do Brasil anunciou a aquisição total das ações da Willys-Overland do Brasil S/A, até então controlada majoritariamente por uma sociedade entre a Renault Motores, da França, e a Kaiser Motors Company, dos Estados Unidos. Apesar de contar com dezenas de milhares de acionistas brasileiros, a maioria detinha participações minoritárias ou sem direito a voto. Com a aquisição, a Ford assumiu o controle efetivo da empresa, herdando um valioso legado que incluía unidades industriais modernas, propriedades intelectuais e um portfólio diversificado de produtos, com o Jeep como carro-chefe.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
A história da utilização de veículos utilitários leves com tração integral 4x4, conhecidos como jipes, nas Forças Armadas Brasileiras teve início em 1942, no contexto da adesão do Brasil ao programa norte-americano Lend-Lease Act (Lei de Arrendamentos e Empréstimos). Esse acordo, firmado durante a Segunda Guerra Mundial, previa a cessão de aproximadamente dois mil jipes ao Brasil, sem padronização por fabricante ou modelo. Não há registros oficiais que detalhem a proporção de veículos fornecidos pela Ford Motor Company ou pela Willys-Overland Company, mas os primeiros lotes, compostos por veículos novos e usados provenientes da frota e da reserva estratégica do Exército dos Estados Unidos, começaram a chegar ao país a partir de março de 1942. Dentre esses veículos, 655 foram enviados diretamente à Itália para equipar a Força Expedicionária Brasileira (FEB). A experiência operacional adquirida pelo Exército Brasileiro em um cenário de conflagração com os jipes foi inestimável, moldando a doutrina motomecanizada do Exército Brasileiro nas décadas seguintes. A frota de jipes, complementada por outros veículos de transporte, proporcionou às Forças Armadas Brasileiras, especialmente ao Exército Brasileiro, uma capacidade de mobilidade sem precedentes entre as décadas de 1940 e 1950. Essa mobilidade fortaleceu as operações de infantaria, permitindo maior agilidade e eficiência em diversos cenários. Com o passar dos anos, o desgaste operacional e a obsolescência dos jipes começaram a impactar sua disponibilidade. A falta de manutenção adequada e a dificuldade de obtenção de peças de reposição, tendo em vista que muitos destes modelo tiveram sua produção descontinuada, agravaram o cenário, resultando em índices preocupantes de veículos inoperantes. Para enfrentar essa crise, o governo brasileiro negociou com o Departamento de Defesa dos Estados Unidos a aquisição de novos lotes de jipes usados, classificados como material excedente de guerra (war surplus). Desta maneira dentro dos termos dos programas de ajuda militar seriam cedidos um grande numero de veículos deste tipo  provenientes dos estoques estratégicos norte-americanos. Ao serem recebidos estes passariam a substituir os substituíram as viaturas mais antigas e desgastadas, ajudando a restaurar parte da capacidade operacional do Exército Brasileiro. No final da década de 1950, o Exército Brasileiro intensificou a modernização de sua frota com a incorporação de jipes produzidos no período pós-guerra, como os modelos Willys M-38A1 e M-38A1-C, este último equipado com canhões sem recuo M-40 de 106 mm. Essas aquisições apesar de em reduzida escala representaram um avanço significativo, trazendo maior confiabilidade e adaptabilidade às operações militares.

Apesar deste movimento de renovação com  a incorporação dos "novos"  Willys M-38A1 e M-38A1-C, a rota de jipes das Forças Armadas Brasileiras ainda enfrentava desafios significativos. As quantidades recebidas eram insuficientes para atender às reais necessidades de reequipamento, evidenciando a urgência de renovar esses veículos utilitários leves com tração 4x4. Estudos preliminares indicavam a necessidade de adquirir entre 300 e 600 novos jipes, com preferência por modelos modernos, como as versões atualizadas do Willys M-38 e do Ford M-151 Mutt. Contudo, os altos custos associados a essa aquisição tornavam a iniciativa economicamente inviável à época, face as limitadas dotações orçamentárias. Diante desse cenário, a partir de 1959, o governo brasileiro voltou seus olhares para a indústria automotiva nacional, buscando uma alternativa mais acessível que atendesse às demandas das Forças Armadas e, ao mesmo tempo, impulsionasse a economia do país. A Willys-Overland do Brasil S/A emergiu como uma candidata promissora, oferecendo em seu portfólio modelos como os Jeeps CJ-3, CJ-4 e CJ-5. Dentre eles, o CJ-5 destacou-se como a melhor opção, combinando robustez, versatilidade e uma relação custo-benefício vantajosa. Equipado com o confiável motor Willys BF-161 de seis cilindros a gasolina, produzido localmente, o CJ-5 alcançava um índice de nacionalização superior a 80%, reduzindo custos de aquisição e manutenção. Embora não possuísse características de militarização, como a capota de lona padrão, o modelo atendia às especificações operacionais mínimas exigidas pelo Exército Brasileiro. A escolha do Jeep CJ-5 marcou o início de uma parceria estratégica entre a Willys-Overland do Brasil e as Forças Armadas. Em um primeiro contrato, o Ministério do Exército adquiriu cinquenta unidades, uma decisão que logo foi acompanhada pela Marinha do Brasil e pela Força Aérea Brasileira. Esses veículos atenderam com eficiência às necessidades administrativas e operacionais básicas, comprovando sua funcionalidade em diversos contextos. No entanto, a ausência de características militarizadas específicas revelou a necessidade de uma versão mais robusta, com desempenho operacional comparável ao dos Willys M-38A1 norte-americanos. Para atender a essa demanda, a equipe de projetos da Willys-Overland do Brasil iniciou estudos para desenvolver uma variante militarizada do Jeep CJ-5. O objetivo era criar um veículo que respondesse às expectativas do Exército Brasileiro, mantendo os custos de aquisição, operação e manutenção acessíveis. Esse esforço refletiu o compromisso da montadora em alinhar inovação com as necessidades estratégicas do país, fortalecendo tanto a capacidade operacional das Forças Armadas quanto a indústria nacional.
Para atender a essa demanda, a equipe de projetos da Willys-Overland do Brasil iniciou estudos para desenvolver uma variante militarizada do Jeep CJ-5. O objetivo era criar um veículo que respondesse às expectativas do Exército Brasileiro, mantendo os custos de aquisição, operação e manutenção acessíveis. Esse esforço refletiu o compromisso da montadora em alinhar inovação com as necessidades estratégicas do país, fortalecendo tanto a capacidade operacional das Forças Armadas quanto a indústria nacional. Deste estudo nasceria um novo modelo que passava a apresentar  uma nova carroceria especialmente concebida  para uso militar, com modificações de estampo e estruturais  na parte denominada de “caixão”.  Abandonava-se então a tampa traseira removível e rebatível, sendo substituída por  chapa soldada e reforçada para abrigar o suporte de estepe, quadro de ferramentas primordiais (pá e machado) e um tanque suplementar (camburão) de três litros. Para otimização de espaço e flexibilização de emprego, o banco traseiro quando utilizado (pois era facilmente removido), podia ser dobrado e rebatido para dar acesso rapidamente às ferramentas.  Internamente, os bancos dianteiros eram individuais para motorista e passageiro, revestidos de napa verde em tom esmeralda como padrão, mas alguns poucos em lona verde oliva. O painel de instrumentos manteve a configuração do CJ-5 civil, mas foi adaptado com adições como um botão para luzes traseiras militares e, em modelos posteriores, uma tecla sob o painel para ativar o farol de aproximação e as luzes de parada civil-militar. Os para-lamas traseiros adotaram um design trapezoidal, introduzido no CJ-5 brasileiro de 1962, reforçando a identidade visual do modelo. Uma variante notável foi a versão “canhoneiro” de ¼ tonelada, projetada para suportar armamentos pesados, como o canhão sem recuo norte-americano M-40A1 de 106 mm ou o nacional M-18A1 de 57 mm. Essa configuração eliminava a tampa traseira padrão, facilitando o municiamento do canhão, e era equipada com um para-brisa bipartido, suportes para tanques suplementares de três litros, ferramentas fixadas nas laterais dos para-lamas e o estepe posicionado na lateral dianteira direita. O painel incluía um suporte específico para apoiar o canhão em posição de descanso, garantindo praticidade e segurança. A suspensão traseira da versão canhoneiro foi reforçada com molas helicoidais adicionais para suportar o peso do armamento e da munição, além de absorver o impacto dos disparos, que podiam causar um “salto” no veículo. Essas adaptações tornaram o modelo ideal para substituir os já desgastados Willys M-38A1C canhoneiros, oferecendo maior confiabilidade e desempenho em operações militares. 

O Jeep militarizado desenvolvido pela Willys-Overland do Brasil rapidamente conquistou a confiança do Exército Brasileiro, sendo homologado para uso militar em 1961. Em outubro daquele ano, um contrato para o fornecimento de duzentas viaturas foi assinado, marcando um passo significativo na modernização da frota militar brasileira. Esse veículo, projetado com atenção aos detalhes e às demandas operacionais, combinava robustez, versatilidade e acessibilidade, refletindo o compromisso da indústria nacional em fortalecer as Forças Armadas enquanto impulsionava a economia do país. A nova versão, designada como Viatura de Transporte Não Especializado 4x4 (VTNE), incorporou modificações que a tornaram ideal para o uso militar. Presilhas foram instaladas nas laterais e na traseira, acompanhadas de dois suportes traseiros que sustentavam a estrutura superior da capota de lona. Quando não utilizada, essa estrutura em "V" podia ser dobrada e apoiada em suportes fixados nos para-lamas traseiros, garantindo praticidade. A capota, distinta do modelo civil, era fabricada com material antichamas mais resistente e contava com cinco janelas — quatro laterais removíveis e enroláveis —, transformando o veículo em um semi-conversível funcional e adaptável. As portas da capota eram fixadas por suportes soldados nas laterais, que também serviam para segurar cintas de segurança quando as portas eram removidas, além de fixar as extremidades do cajado em posição recolhida. Refletores (“olhos-de-gato”) foram posicionados nas laterais traseiras e no suporte central do estepe, aumentando a visibilidade e a segurança. A traseira do veículo destacava-se pela presença do estepe, um suporte para tanque suplementar de combustível (ou galão de água potável) e um gancho militar padrão “G” para reboque de carretas ou canhões antitanque. Anilhas de fixação, soldadas na base e no para-choque dianteiro, permitiam o transporte do veículo em aeronaves, pontes flutuantes, embarcações ou vagões ferroviários. Para-choques em meia-lua, característicos de veículos militares, completavam o design robusto. Algumas unidades do VTNE podiam ser equipadas com guinchos mecânicos Ramsey (norte-americanos) ou Biselli (nacionais), ambos com capacidade de até 3,5 toneladas, ampliando a funcionalidade do veículo em operações de resgate ou transporte. Para autodefesa, o modelo suportava metralhadoras Browning de calibre .30 ou .50, montadas em suportes fixados no assoalho traseiro, garantindo capacidade de resposta em cenários táticos. Uma variante especializada para radiocomunicação foi desenvolvida posteriormente, equipada com aparelhos de transmissão e recepção instalados no espaço originalmente destinado ao banco traseiro. Esse equipamento, que se estendia ligeiramente além dos para-lamas traseiros, era complementado por uma antena fixada na lateral traseira direita, assegurando conectividade em operações de campo.

Os jipes ¼ tonelada com tração integral 4x4, produzidos pela Willys-Overland do Brasil nos modelos CJ-5 e CJ-6, tornaram-se peças fundamentais nas operações das três Forças Armadas Brasileiras — Exército, Marinha e Força Aérea. Esses veículos, adaptados para uso militar, destacaram-se pela versatilidade, desempenhando papéis em uma ampla gama de atividades, desde operações administrativas até missões especializadas. Variantes como as versões bombeiro e viatura policial, esta última equipada com sirenes ROTAM no para-lama direito para uso pela Polícia do Exército (PE), e a versão “canhoneiro” ¼ tonelada CSR (canhão sem recuo), utilizada pelo Corpo de Fuzileiros Navais (CFN), demonstraram a capacidade de adaptação do Jeep às demandas específicas de cada instituição militar. A Willys-Overland do Brasil consolidou-se como a principal fornecedora de viaturas não blindadas para as Forças Armadas, especialmente para o Exército Brasileiro, por meio de sucessivos contratos de aquisição. Essa parceria continuou mesmo após a aquisição da empresa pela Ford do Brasil em 1967, quando os jipes passaram a ser designados como U-50. A produção desses veículos se manteve até abril de 1983, refletindo a durabilidade e a relevância do modelo no contexto militar brasileiro. A partir de 1986, muitos desses jipes foram submetidos a um programa de repotenciação conduzido pela empresa Bernardini S/A, em colaboração com o Arsenal de Guerra de São Paulo (AGSP). O projeto incluiu a substituição do motor original pelo General Motors 2,5 litros de quatro cilindros (modelo 151, também utilizado no Chevrolet Opala 4.1S), que entregava 82 cavalos a 4.400 rpm e torque de 17,1 kgfm. Além da modernização do motor, foram implementadas melhorias no sistema elétrico, como limpadores de para-brisa elétricos, caixa de fusíveis sob o painel, nova chave para setas, luz alta e baixa com indicador LED, comando de afogador atualizado, pisca-alerta e um chicote elétrico renovado. O sistema de iluminação foi adaptado ao padrão NATO, incorporando chaves militares específicas. Essas modificações trouxeram maior autonomia, com um novo tanque de combustível que reduzia o consumo, e aumentaram a capacidade de carga. O programa de repotenciação garantiu uma sobrevida significativa a esses jipes, permitindo que algumas unidades permanecessem em operação até os dias atuais, um testemunho da robustez e longevidade do projeto. Os jipes militarizados da Willys-Overland do Brasil transcenderam sua função utilitária, tornando-se símbolos de resiliência e adaptabilidade. Sua presença em diversas operações das Forças Armadas, aliada ao sucesso dos contratos com a Willys e, posteriormente, com a Ford, destacou a importância da indústria automotiva nacional no fortalecimento da defesa do país. O programa de repotenciação, conduzido com precisão pela Bernardini e pelo AGSP, assegurou que esses veículos continuassem a servir com eficiência, mesmo décadas após sua fabricação inicial.

Em Escala.
Para representarmos o Jeep Willys CJ-3 matrícula “EB 23465”, empregamos por base o modelo em die cast na escala 1/32 produzido pelo fabricante New Ray.  Como este apresenta a versão a Willys MB 1941, para se configurar o modelo pretendido é necessário realizar uma serie de modificações em scratch build, com destaque para os paralamas, grade frontal e conjunto de faróis. Outras alterações de menor expressão foram também implementadas como o armamento orgânico da viatura, com o resultado final podendo ser considerado aceitável. Outra opção para se representar este modelo pode ser obtido fazendo uso do modelo M-38A1 produzido pela AFV Club. Fizemos uso de decais produzidos pela Decal & Books , presentes no set especial “Forças Armadas do Brasil 1983 – 2002”.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura tático camuflado em dois tons, empregado na maioria de todos os veículos em uso no Exército Brasileiro a partir do ano de 1983. Anteriormente estes veículos ostentavam o padrão anterior, totalmente em verde oliva, a exemplo do esquema tático norte-americano utilizado durante Segunda Guerra Mundial. Empregamos tintas e vernizes produzidos pela Tom Colors.

Bibliografia :
- Willys - Lexicar - https://www.lexicarbrasil.com.br/willys
- Primeiro Jeep Nacional https://quatrorodas.abril.com.br/noticias/willys-jeep-universal-ford-jeep-cj-5/
- O Jeep Militar no Brasil - http://jeepguerreiro.blogspot.com
- Veículos Militares Brasileiros – Roberto Pereira de Andrade e José S Fernandes