A75 - A76 e B76 Stearman PT-17


História e Desenvolvimento.
A história da Stearman Aircraft Company representa um capítulo emblemático do empreendedorismo e da engenhosidade norte-americana, marcada por inovação, resiliência e os desafios impostos pelo contexto histórico do início do século XX. Fundada em 10 de dezembro de 1926, na cidade de Venice, Califórnia, por Lloyd Carton Stearman, um visionário engenheiro aeronáutico, a empresa surgiu em um momento de efervescência tecnológica, quando a aviação ainda engatinhava, mas já prometia transformar o mundo. Ao lado de Stearman, a companhia contava com Fred Hoyt como vice-presidente e George Lyle como secretário, formando uma equipe determinada a deixar sua marca na nascente indústria aeronáutica. O primeiro marco da empresa foi o lançamento do biplano Stearman C1, em 1927. Embora representasse um avanço técnico para a época, o modelo não alcançou sucesso comercial, com apenas uma unidade construída. Contudo, a Stearman Aircraft Company demonstrou tenacidade ao rapidamente iterar seu projeto, introduzindo o Stearman C2 no mesmo ano. Este modelo, mais refinado, conseguiu atrair o mercado, resultando na venda de 33 unidades. O sucesso inicial incentivou a empresa a continuar aperfeiçoando suas aeronaves, culminando no desenvolvimento do Stearman C3, lançado em 1928. Este biplano robusto, com asas retas e um trem de pouso resistente equipado com amortecedores a óleo, foi projetado para combinar funcionalidade e acessibilidade. Com dois cockpits abertos — um traseiro para o piloto e outro dianteiro com dois assentos para passageiros dispostos lado a lado —, o C3 incorporava melhorias significativas em relação ao C2, como um tanque de óleo de maior capacidade e um compartimento de bagagem ampliado. Equipado com motores que variavam de 128 a 225 cavalos de potência, o Stearman C3 foi concebido para transporte de passageiros e voos executivos, destacando-se por seu desempenho confiável e custo competitivo. Esses atributos se refletiram em seu sucesso comercial, com a venda de 179 unidades, um feito notável para uma empresa jovem em um mercado altamente competitivo. Apesar dos avanços técnicos e do sucesso inicial, a Stearman Aircraft Company enfrentou desafios significativos, especialmente no que diz respeito à gestão financeira. Lloyd Stearman, embora brilhante como engenheiro, não possuía a mesma habilidade para administrar os aspectos econômicos da empresa. Esse obstáculo tornou-se ainda mais crítico com a eclosão da Grande Depressão em 1929, um evento que abalou profundamente a economia global e atingiu em cheio a indústria aeronáutica. A crise reduziu drasticamente a demanda por aeronaves, forçando muitas empresas do setor a encerrar suas atividades ou buscar alternativas para sobreviver. Nesse contexto, a Stearman Aircraft Company foi adquirida pela United Aircraft and Transport Corporation em 1929, uma decisão que garantiu sua sobrevivência, mas marcou o fim do controle direto de Lloyd Stearman sobre a empresa que fundara. Mesmo assim, Stearman permaneceu como presidente, continuando a influenciar o desenvolvimento de novos projetos e deixando um legado duradouro no setor.

Um dos últimos projetos notáveis da empresa sob a liderança de Stearman foi o Stearman Model 6 Cloud Boy, que realizou seu primeiro voo em 1931. Projetado como um treinador básico para o mercado civil, o Cloud Boy também foi oferecido ao Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) sob a designação YPT-9, com a esperança de conquistar contratos militares. Contudo, a aeronave não despertou o interesse das forças armadas, e sua comercialização no mercado civil foi igualmente prejudicada pela persistente crise econômica, resultando na venda de apenas três unidades. Apesar desse revés, o Cloud Boy simbolizava o espírito inovador da Stearman Aircraft Company, que continuou a buscar soluções criativas em um período de adversidades. Em 1932, a Stearman Aircraft Company enfrentava mais um período de incertezas e dificuldades econômicas, reduzindo seu quadro de pessoal para apenas vinte e cinco funcionários. No entanto, a empresa conseguiu uma importante oportunidade ao ser subcontratada pela Boeing Aircraft Company para a produção de componentes críticos para o Boeing 247, iniciando assim uma parceria significativa com este gigante da indústria aeronáutica. Como resultado da Lei do Correio Aéreo de 1934, a empresa  United Aircraft and Transport Corporation foi reorganizada, tornando-se a United Airlines Transport Corporation. Este processo culminou na absorção da empresa pela promissora Boeing Aircraft Company, que renomeou sua divisão aeronáutica para Stearman. Todos os projetos originais foram mantidos, incluindo um novo treinador primário derivado diretamente do Stearman Model 6 Cloud Boy, designado como YPT-9, que começou a ser desenvolvido em 1933. A nova aeronave recebeu a denominação comercial de Stearman Model 70, apresentando uma configuração biplano e com dois lugares, sendo especificamente projetada para tarefas de instrução e treinamento. Embora tivesse um desempenho modesto em comparação com aeronaves da mesma categoria, seus projetistas apostaram na excelente relação custo-benefício tanto em termos de operação quanto de manutenção,  como um dos principais diferenciais competitivos do novo produto. Essa decisão mostrou-se acertada, pois as características do Stearman Model 70 atendiam perfeitamente aos requisitos técnicos estabelecidos pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) e pela aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy), que anteriormente definiram em conjunto os parâmetros para o desenvolvimento de uma aeronave de treinamento primário. Uma proposta  técnica e comercial foi apresentada aos militares norte-americanos no final de 1934, e após uma sinalização positiva destes, em  seguida seria realizada  sua apresentação oficial  em voo, com o primeiro protótipo recebendo muito elogios nesta oportunidade.  As impressões positivas causadas pelo Stearman Model 70 resultaram na celebração do primeiro contrato com o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) no final de 1934, envolvendo a aquisição de 61 aeronaves de uma versão aprimorada designada Stearman Model 73. 

Logo em seguida, a aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) firmou um contrato semelhante, recebendo suas primeiras aeronaves no mesmo período, no início do ano 1935. O excelente desempenho operacional da aeronave motivou a Stearman Aircraft Company a buscar um ciclo evolutivo em seu projeto, resultando na criação do Model X-75. A nova versão passou a ser equipada com motores Curtiss Wright R-760 ou Lycoming R-680, ambos com potência de 225 cv. Para o desenvolvimento desse modelo, foram construídos dois protótipos, os quais foram submetidos a um rigoroso programa de ensaios em voo realizado pelo Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC). Esse processo culminou em uma encomenda inicial de 26 unidades equipadas com os motores Lycoming R-680, designadas militarmente como PT-13. Em seguida, a aviação da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) adquiriu mais 20 células, recebendo a designação N2S-1. Em agosto de 1936, o Exército dos Estados Unidos (US Army) solicitou mais 50 aeronaves, agora na versão PT-13A, que foi equipada com o motor Lycoming R-680-7, com potência de 245 cv. Entre outubro e dezembro do mesmo ano, mais 58 unidades foram contratadas para produção. Paralelamente, foi celebrado o primeiro contrato de exportação envolvendo 30 aeronaves destinadas à Aviação Naval da Marinha Argentina, com novos acordos firmados com os governos das Filipinas e do Brasil. Em janeiro de 1937, o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) encomendou mais 26 aeronaves do modelo Stearman PT-13A. O aumento da potência das aeronaves de primeira linha gerou uma demanda por melhorias de desempenho, levando os militares norte-americanos a solicitar à empresa melhorias nas aeronaves de treinamento. Em resposta a essa demanda, foi desenvolvido o Stearman PT-13B, equipado com o novo motor Lycoming R-680-11, de nove cilindros e 280 cv. Este modelo resultou na encomenda de 225 células, que foram entregues entre 1939 e 1941. Dentre essas aeronaves, seis foram convertidas para treinamento em voo por instrumentos, recebendo a designação PT-13C. O próximo modelo a entrar na linha de produção foi o Stearman PT-13D, que passou a contar com o motor Lycoming R-680-17, de nove cilindros e 300 cv, equiparando-se a várias aeronaves de primeira linha. Nesse momento, as ameaças relacionadas ao potencial envolvimento dos Estados Unidos no conflito europeu levaram o governo a intensificar seus investimentos em defesa, resultando na encomenda de mais 700 aeronaves de treinamento primário do modelo Stearman PT-13D. No final de 1939, tornou-se cada vez mais evidente para o governo dos Estados Unidos que a entrada do país no conflito europeu seria inevitável, sendo apenas uma questão de tempo para o fato. Diante dessa perspectiva, tornou-se imperativo que as forças armadas norte-americanas iniciassem um processo de preparação intensiva, com ênfase especial na capacitação de pessoal especializado, incluindo pilotos, navegadores e tripulantes de bombardeiros. 

Para atender a essa crescente demanda, tanto o Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC) quanto a aviação naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy) identificaram a necessidade urgente de constituir uma extensa frota de aeronaves destinadas ao treinamento primário para milhares de pilotos militares. Nesse contexto, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos passou a consultar os principais fabricantes aeronáuticos do país com o objetivo de viabilizar a produção em larga escala dessas aeronaves de treinamento. Entre as empresas consultadas, destacou-se a Stearman Aircraft Division, que apresentou uma versão aprimorada de seu modelo PT-13D. Assim nasceu o PT-17, que logo foi submetido à avaliação das autoridades militares norte-americanas. Após a aprovação de sua proposta sob os aspectos técnico e comercial, foram iniciadas negociações que culminaram em uma significativa encomenda de 3.500 unidades, cuja produção em série teve início em janeiro de 1940. O Stearman PT-17A, assim como seu antecessor, foi projetado para o treinamento básico de pilotos. Tratava-se de uma aeronave de configuração biplana, com uma estrutura composta por tubos de aço soldados e asas de madeira, revestidas inteiramente por tela. Possuía duas cabines abertas dispostas em tandem, destinadas ao aluno e ao instrutor, e era equipada com o motor radial a pistão Continental R-670-5, capaz de gerar 210 cavalos de potência. Nos primeiros lotes produzidos, destacaram-se 18 unidades configuradas especificamente para treinamento por instrumentos, as quais receberam a designação PT-17B. Em meados de 1941, a produção do PT-17 enfrentou um desafio significativo devido à escassez de motores, o que ameaçava comprometer os prazos de entrega estabelecidos. Diante dessa situação, foram avaliadas alternativas que resultaram na adoção dos motores radiais Jacobs R-755, com 225 cavalos de potência — os mesmos utilizados nos modelos Beechcraft Model 17 Staggerwing e Cessna AT-17 Bobcat. Essa adaptação deu origem a 150 unidades do Stearman PT-18A. No âmbito do Corpo Aéreo do Exército dos Estados Unidos (USAAC), o Stearman PT-17 consolidou-se como o treinador primário padrão. O mesmo conceito foi adotado pela Aviação Naval da Marinha dos Estados Unidos (US Navy), que incorporou o modelo sob a designação Stearman N2S. As versões destinadas à Marinha foram equipadas com uma variedade de motores Continental, incluindo os modelos R-670-14, R-680-8, R-670-4 e R-680-17. Além da versão inicial, foram desenvolvidas variantes aprimoradas, como N2S-1, N2S-2, N2S-3, N2S-4 e N2S-5, totalizando a produção de aproximadamente 4.300 aeronaves. Assim, o Stearman PT-17 e suas variantes desempenharam um papel fundamental no esforço de preparação das forças armadas norte-americanas para o conflito global, atendendo às exigências de formação de pilotos em larga escala com eficiência e confiabilidade.
Em 15 de março de 1941, a Stearman Aircraft Division realizou a entrega da milésima célula ao Exército dos Estados Unidos (US Army) e da milésima primeira aeronave à Marinha dos Estados Unidos (US Navy), marcando um marco significativo na produção do modelo. Posteriormente, em 6 de junho de 1941, o governo norte-americano emitiu o Certificado de Tipo Aprovado nº 743, homologando a versão civil do Modelo 75. Esse certificado abrangia os modelos A75L3 (PT-13) e A75N1 (PT-17), dos quais aproximadamente sessenta unidades foram comercializadas para escolas civis de aviação, como o Parks College of Engineering, Aviation and Technology. Essas instituições, em pouco tempo, também se envolveram na formação de pilotos militares, atendendo às necessidades impostas pelo contexto bélico. O primeiro cliente militar internacional do modelo foi a Força Aérea Real Canadense (RCAF), que, buscando substituir suas obsoletas aeronaves de treinamento, adquiriu trezentas unidades a partir do final de 1941. Essas aeronaves receberam a designação local PT-27. Paralelamente, foi desenvolvida uma versão de exportação, conhecida como Model 76, que, além de cumprir a função de treinamento primário, apresentava capacidade para atuar como aeronave de ataque leve. Essa variante podia ser equipada com dois suportes ventrais, cada um com capacidade para 65 kg, uma metralhadora móvel Colt-Browning MG-28 calibre .30, uma metralhadora fixa do mesmo calibre, além de oferecer maior autonomia e potência em relação aos modelos anteriores. Nos Estados Unidos, o modelo ficou popularmente conhecido por nomes como Kaydet, Boeing Stearman, NS, N2S ou simplesmente PT-17. Sua produção foi distribuída em dezesseis variantes, alcançando um total superior a dez mil unidades entregues entre maio de 1936 e agosto de 1945. Durante a Segunda Guerra Mundial, as aeronaves dessa família desempenharam um papel crucial, sendo responsáveis pela formação de mais de sessenta mil pilotos militares norte-americanos. Com o término do conflito, milhares de aeronaves foram retiradas do serviço ativo tanto pela Força Aérea do Exército dos Estados Unidos (USAAF) quanto pela Marinha dos Estados Unidos (US Navy). Muitas delas foram armazenadas ou transferidas para o setor civil, onde continuaram a ser utilizadas em missões de treinamento e voos turísticos. Além disso, um número considerável foi convertido para atuar na pulverização de lavouras, desempenhando essa função por mais de quatro décadas. Centenas de unidades também foram cedidas a forças armadas de diversos países, incluindo a República da China, Bolívia, Brasil, Colômbia, Cuba, República Dominicana, Grécia, Guatemala, Honduras, Irã, Israel, Nicarágua, Paraguai, Peru e Filipinas. Nessas nações, as últimas aeronaves do modelo só foram desativadas na década de 1960, evidenciando a durabilidade e versatilidade do projeto. Dessa forma, o Stearman Modelo 75 e suas variantes deixaram um legado significativo, tanto no treinamento de pilotos quanto em aplicações civis e militares ao redor do mundo, consolidando-se como um ícone da aviação do século XX.

Emprego nas Forças Armadas Brasileiras.
Em 10 de fevereiro de 1914, o Brasil testemunhou um marco seminal na história de sua aviação com a fundação da Escola Brasileira de Aviação, localizada no Campo dos Afonsos, no Rio de Janeiro. Estabelecida por meio de uma parceria entre o Ministério da Guerra e a empresa italiana Gino, Buccelli & Cia., a instituição surgiu em um período de efervescência tecnológica global, quando a aviação começava a se consolidar como uma ferramenta estratégica. A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) destacou o potencial militar dos aviões, e o Brasil, embora geograficamente distante do conflito, reconheceu a importância de investir na formação de pilotos capacitados. Em 1916, a Escola Brasileira de Aviação foi sucedida pela Escola de Aviação Naval (EAvN), a primeira instituição exclusivamente militar dedicada à formação de pilotos no país. Três anos depois, em 1919, a criação da Escola de Aviação Militar (EAM), sob a orientação da Missão Militar Francesa de Aviação (MMFA), marcou a integração da aviação como uma arma do Exército Brasileiro. Apesar do entusiasmo inicial, a EAM enfrentou desafios significativos, incluindo limitações financeiras, logísticas e tecnológicas, que dificultaram a consolidação de uma estrutura de treinamento robusta. Nos primeiros anos, a frota da scola de Aviação Militar (EAM) contava com aeronaves como os modelos franceses Morane-Saulnier MS.147Ep2 e MS.130ET2, que, embora adequados para a época, refletiam as limitações de uma aviação ainda incipiente. A primeira renovação significativa ocorreu no início da década de 1930, com a incorporação de biplanos ingleses, como o De Havilland DH-60T Moth Trainer, e de modelos norte-americanos, incluindo o Fleet Model 11, o Waco RNF, o Waco CTO e o Curtiss-Wright CW-16. Essas aeronaves representaram um avanço em termos de desempenho, mas a rápida evolução da tecnologia aeronáutica na década de 1930 revelou sua obsolescência precoce. A disparidade entre os treinadores e as aeronaves operacionais de linha de frente tornou-se um obstáculo para a formação de pilotos preparados para cenários de combate modernos. Reconhecendo a necessidade de modernizar a frota de treinamento, os comandantes da Aviação Militar do Exército Brasileiro lançaram, no segundo semestre de 1936, uma concorrência internacional para a aquisição de até trinta aeronaves de treinamento avançado. O edital foi direcionado a fabricantes de renome da França, do Reino Unido e dos Estados Unidos, refletindo a ambição de alinhar a aviação militar brasileira aos padrões globais. As propostas foram avaliadas sob critérios técnicos e comerciais, com o objetivo de selecionar aeronaves que atendessem às necessidades estratégicas do país. O esforço para modernizar a formação de pilotos ocorreu em um momento de profundas transformações. A Revolução de 1930 e o governo de Getúlio Vargas impulsionaram a modernização das forças armadas brasileiras, enquanto a corrida armamentista global da década de 1930 destacava a importância da aviação militar. 

A concorrência internacional, promovida no segundo semestre de 1936, atraiu propostas de fabricantes de renome da França, do Reino Unido e dos Estados Unidos. Dentre elas, destacou-se a oferta da Stearman Aircraft Division, uma empresa norte-americana já reconhecida por sua expertise na produção de aeronaves de treinamento. A proposta apresentada pela Stearman centrava-se na versão de exportação do PT-13A, designada como Stearman Model 76, uma aeronave projetada não apenas para atender às demandas de formação de pilotos, mas também para desempenhar funções táticas, como ataque leve. Suas características técnicas incluíam adaptações notáveis, como a possibilidade de instalação de cabides ventrais para bombas e metralhadoras Colt-Browning MG-28 calibre .30, destinadas à autodefesa, além de tanques suplementares que ampliavam a capacidade de combustível em 110 litros. Equipada com o motor Wright R-975-E3 de 420 cavalos de potência, a Model 76 se destacava como a variante de maior desempenho dentro de sua família, oferecendo uma combinação de robustez, versatilidade e custo competitivo que a tornou particularmente atraente para o Exército Brasileiro. A Diretoria de Aeronáutica do Exército Brasileiro, após uma análise detalhada das propostas, optou pela oferta da Stearman, formalizando um contrato para o fornecimento de trinta unidades do Model 76, adaptadas às especificações nacionais. Para atender às exigências brasileiras, as aeronaves foram configuradas com instrumentos em sistema métrico e incluíam a provisão para uma metralhadora móvel na nacele traseira, ampliando sua capacidade operacional. A encomenda foi dividida em dois lotes distintos: o primeiro, designado Model A76-C3, contava com uma metralhadora fixa instalada na asa direita inferior, reforçando sua capacidade de combate; o segundo, identificado como Model B76-C3, substituía a metralhadora por uma câmera fotográfica Fairchild K-3B, conferindo versatilidade para missões de reconhecimento aéreo. Essa dualidade de configurações refletia a visão estratégica do Exército Brasileiro, que buscava aeronaves capazes de atender tanto às necessidades de treinamento quanto às demandas operacionais em um contexto de modernização militar. O processo de produção e entrega das aeronaves foi meticulosamente planejado. Em maio de 1937, as primeiras unidades foram concluídas nas instalações da Stearman Aircraft Division, em Wichita, Kansas. Uma comitiva de oficiais brasileiros deslocou-se aos Estados Unidos para inspecionar as aeronaves, garantindo que atendessem às especificações acordadas. Após a aprovação, os aviões foram desmontados, acondicionados em caixas de madeira e transportados por via naval até o porto do Rio de Janeiro, em um trajeto que durou aproximadamente vinte dias. No Brasil, as aeronaves foram trasladadas por via terrestre até o Parque Central de Aviação do Exército, localizado no Campo dos Afonsos, onde equipes técnicas enviadas pela Stearman supervisionaram a remontagem e realizaram ensaios de voo para certificar sua plena operacionalidade. Esse cuidado no processo de integração reflete o profissionalismo e o compromisso com a qualidade que marcaram a modernização da Aviação Militar brasileira.
Em 9 de julho de 1937, o primeiro Stearman A76-C3 realizou seu voo inaugural nos céus brasileiros, marcando o início da integração dessas aeronaves à Aviação Militar do Exército. Por sua vez, o primeiro exemplar do modelo B76-C3 foi declarado operacional no final daquele mesmo mês, efetuando seu voo inicial em 11 de setembro. A incorporação da última célula à frota ocorreu no final de dezembro, concluindo o processo de entrega conforme o cronograma estabelecido. À medida que as aeronaves eram finalizadas no Parque Central de Aviação do Exército, no Campo dos Afonsos, elas eram transferidas para a Escola de Aeronáutica do Exército (EAerEx), onde passavam a integrar a frota operacional. Os alunos que haviam concluído a fase de instrução primária em 1937 começaram a utilizar os Stearman A76-C3 e B76-C3, entrando em contato direto com essas novas aeronaves. Nesse período, os cadetes iniciaram o aprendizado dos fundamentos do voo militar, que incluíam técnicas de voo em formação, manobras básicas de acrobacia e o cumprimento de outros elementos previstos no currículo de instrução. As características avançadas dessas aeronaves permitiram a introdução de um treinamento mais robusto e sistemático, abrangendo disciplinas como bombardeio, tiro terrestre e fotografia aérea, superando significativamente as limitações dos métodos anteriormente empregados. Devido a essas capacidades, os Stearman, popularmente chamados de "Estirmão" após a chegada da versão de treinamento primário A75, passaram a frequentar regularmente o campo auxiliar de Jacarepaguá, onde os alunos praticavam as técnicas de tiro e bombardeio. Contudo, a atuação dos modelos A76-C3 e B76-C3 não se restringiu ao espaço aéreo do Rio de Janeiro. Por determinação da Diretoria de Aeronáutica do Exército (DAEx), duas células foram destinadas à cidade de Belém, no estado do Pará, para apoiar as missões do Esquadrão de Adestramento do Núcleo do 7º Regimento de Aviação. De maneira semelhante, outras duas foram enviadas a Belo Horizonte, para operar em conjunto com o 4º Regimento de Aviação. Esta última transferência, entretanto, revelou-se temporária, pois as aeronaves foram posteriormente realocadas de volta ao Campo dos Afonsos. Nos anos subsequentes, enquanto a Aviação do Exército permaneceu ativa, a rotina de operações dessas aeronaves manteve-se estável. Inicialmente, esperava-se que os Stearman cedessem lugar como plataforma de instrução avançada com a chegada dos North American NA-72, recém-encomendados pelo Brasil. Contudo, as primeiras unidades desses novos aviões só foram recebidas em outubro de 1940, às vésperas da criação do Ministério da Aeronáutica (MAer). 

Diante desse contexto, a transição planejada não se concretizou de imediato, cabendo aos responsáveis pela futura Escola de Aeronáutica implementar as adaptações necessárias para atender às demandas emergentes da nova estrutura organizacional. Assim, os Stearman A76-C3 e B76-C3 desempenharam um papel essencial na modernização do treinamento de pilotos militares brasileiros, oferecendo uma plataforma versátil que contribuiu para o aprimoramento técnico e tático da Aviação Militar até o início da década de 1940. Neste mesmo período a Aviação Militar do Exército começaria a enfrentar uma situação delicada, pois sua frota de aeronaves de treinamento primário, que na época era composta por aeronaves de concepção antiga,  como os De Havilland DH-60T Moth Trainer e Muniz M7 e M-9,  passavam a apresentar cada vez menores índices de disponibilidade operacional. Este fator se dava principalmente pela falta de peças de reposição mais notadamente pertinente aos motores Havilland Gipsy Major,  que eram de origem inglesa e se tornariam extremamente escassos para a aquisição  devido ao início da Segunda Guerra Mundial. Desta maneira a fim de evitar um apagão em seu processo de instrução básica, a Diretoria de Aeronáutica do Exército (DAEx) sairia em buscas de alternativas. Porém diante do conflito em curso,  as fontes europeias seriam descartadas, buscando-se assim uma opção norte-americana. A escolha natural recairia sobre o modelo de instrução básica o Stearman A75-L3, pois afinal, excluindo itens como motor, tanques extras de combustível e material associado ao armamento, esta versão era praticamente idêntica as aeronaves  Stearman A76-C3 e B76-C3 em operação no pais. Esta aquisição viria a criar uma certa padronização dos processos de manutenção e fluxo de peças de reposição.  No início do segundo semestre de 1939 seria celebrado um contrato prevendo a aquisição de vinte células deste modelo, com o Brasil se tornando o primeiro operador dessa versão do Stearman Model 75. As primeiras células seriam recebidas desmontadas na sede da Escola de Aeronáutica do Exército (EAerEx) em março de 1940, sendo prontamente montados no local sobre a supervisão de técnicos da Stearman Aircraft Division. Estas aeronaves seriam montadas e colocadas em condições de voo em maio do mesmo ano, passando logo a ser empregadas no processo de instrução primária, repartindo suas surtidas de treinamento com os poucos Munis M-9 ainda em operação. Em função das diferenças presentes entre os dois modelos os A75-L3 foram apelidados de "Stirminhas" e os A76-C3 e B76-C3 de “Stirmões “em uma clara alusão ao desempenho de ambos. Mas o uso dos Stearman A75-L3 na Aviação Militar  do Exército seria breve, pois em janeiro de 1941, seria criado o Ministério da Aeronáutica (MAer), e aquelas aeronaves logo passariam para o controle da Força Aérea Brasileira. 
Em 20 de janeiro de 1941, a Aviação Militar do Exército contava ainda com vinte e sete aeronaves dos modelos Stearman A76-C3 e B76-C3, além de dezenove unidades da versão de treinamento primário A75-L3 em operação. Essas aeronaves, juntamente com o pessoal operativo associado, foram transferidas para a recém-criada Força Aérea Brasileira (FAB), que as incorporou à sua estrutura de treinamento na Escola de Aeronáutica (EAer). Nesse contexto, a Aeronáutica passou a dispor de um significativo número de aeronaves destinadas à formação de pilotos, embora estas fossem de diferentes tipos e origens, o que refletia a diversidade herdada da antiga Aviação Militar. A partir de 1942, o processo de formação de cadetes foi estruturado com a seguinte utilização de aeronaves: os alunos do terceiro ano iniciavam sua adaptação ao voo em grupo utilizando o A75-L3, conhecido como "Stirminha", prosseguiam para o BT-15 e concluíam o curso no North American NA-72, redesignado como T-6. Na etapa de instrução avançada, o Stearman A76-C3 era empregado no treinamento com armamento, abrangendo tiro frontal com a metralhadora fixa instalada na asa e bombardeio em mergulho, simulando operações como aeronave de ataque. Já o modelo B76-C3, equipado com uma câmera fotográfica Fairchild K-38, além de sua capacidade armamentista, também era utilizado para o ensino de técnicas de aerofotogrametria, ampliando as possibilidades de treinamento. A partir de 1943, com a chegada crescente de novos modelos, como o Fairchild PT-19 para treinamento primário e grandes quantidades do North American T-6 para instrução avançada, a FAB decidiu realocar as aeronaves remanescentes da família Stearman para a Base Aérea de São Paulo (BASP). Nesse local, elas foram integradas ao 3º Grupamento do Curso de Preparação de Oficiais de Reserva da Aeronáutica (GTCPOR), assumindo a missão de formar pilotos da reserva da Força Aérea Brasileira. Em 1944, doze células ainda operacionais foram transferidas para o 2º Grupamento do Curso de Preparação de Oficiais de Reserva da Aeronáutica (GTCPOR), sediado no Galeão, que passou a centralizar as atividades de formação de aviadores da reserva. Nesse mesmo período, as aeronaves começaram a ser retiradas do processo de instrução e redistribuídas a diversas bases aéreas, onde passaram a desempenhar funções administrativas. As últimas unidades do Stearman A75-L3 foram desativadas em 1946, enquanto os modelos A76-C3 e B76-C3 remanescentes tiveram sua baixa em 1947. Após revisão, essas aeronaves foram transferidas ao Departamento de Aviação Civil (DAC), que as destinou a diversos aeroclubes brasileiros, encerrando assim sua trajetória no âmbito militar e iniciando uma nova fase de utilização no cenário da aviação civil. Esse processo reflete a transição da FAB para uma frota mais moderna e homogênea, ao mesmo tempo em que destaca o papel significativo desempenhado pelos Stearman na formação de pilotos durante os primeiros anos da força aérea nacional.

Em Escala.
Para representarmos o Stearman A75-L3 "K-132” nas cores da Aviação Militar do Exército Brasileiro, quando sua operação junto a Escola de Aeronáutica do Exército (EAerEx)  fizemos uso da única opção disponível na época da montagem na escala 1/48, um kit produzido pela Lindberg. Para se compor a versão nacional, não é necessário prover nenhuma alteração com o modelo podendo ser montado diretamente da caixa . Empregamos decais produzidos pela FCM Decals presentes no antigo set 48/04.
O esquema de cores (FS) descrito abaixo representa o padrão de pintura empregado por todos os Stearman A75-L3 e A76-C3 e B76-C3 quando de seu recebimento a partir do ano de 1937. Ao longo dos anos seriam aplicadas pequenas diferenças de marcações para identificar os esquadrões, após sua incorporação na Força Aérea Brasileira (FAB) este esquema de pintura seria mantido se alterando apenas os números de série das aeronaves.


Bibliografia :
-  Boeing Stearman Model A75/A76  - Wikipedia - http://en.wikipedia.org/wiki/Boeing-Stearman_Model_75
- História da Força Aérea Brasileira , Prof Rudnei Dias Cunha - http://www.rudnei.cunha.nom.br/FAB/index.html
- Boeing Stearman no Brasil - Incaer , Aparecido Camazano Alamino - www.incaer.aer.mil.br/ideias_42.pdf
- Aeronaves Militares Brasileiras 1916 – 2015  - Jackson Flores Jr